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sábado, 26 de novembro de 2011

Câmara Cascudo - o maior Escritor e Folclorista Potiguar



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Câmara Cascudo foi maior folclorista brasileiro, nasceu em Natal/RN, em 30 de dezembro 1898. É um dos mais importantes pesquisadores das raízes étnicas do Brasil.
Aos seis anos já sabia ler. Estudou Latim durante três anos com o mestre João Tibúrcio. Em 1922, aprendeu a ler inglês, para acompanhar os viajantes pela África e Ásia. É dele a tradução comentada do livro Travels in Brazil, de Henry Koster.
Estudou no Externato Coração de Jesus e no Colégio Santo Antônio. Chegou a cursar medicina na Bahia e no Rio de Janeiro, porém desistiu do curso e foi estudar Direito na Faculdade do Recife, formou-se em 1928. Concluiu também, no mesmo ano, o curso de Etnografia, na Faculdade de Filosofia, do Rio Grande do Norte. Câmara Cascudo casou-se em 1929, com Dália, com quem teve dois filhos.
Trabalhou como professor, diretor de escola, secretário do Tribunal de Justiça e exerceu atividade de jornalista escrevendo crônica diária no jornal “A República” e outros veículos. Foi divulgador do integralismo e lecionou direito internacional na Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Lançou mais de 150 livros, escreveu até os últimos dias de sua vida, o seu primeiro livro foi “Alma Patrícia” (1921). Em 1939, lançou a obra “Vaqueiros e Cantadores”, livro que destacou o seu nome entre os autores que escreviam sobre a sabedoria popular.
Escreveu sobre os mais variados assuntos. Sua especialização foi na etnografia e no folclore. Por isso é considerado o maior folclorista brasileiro. Publicou, entre outros, as seguintes obras: Vaqueiros e cantadores: folclore poético do sertão de Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará (1939); Antologia do folclore brasileiro (1943); Dicionário do folclore brasileiro (1954); A vaquejada nordestina e suas origens (1974).
Nunca abandonou a sua terra natal. Em 1965, lançou o livro “História do Rio Grande do Norte”. Fundou a Sociedade Brasileira de Folclore, e até os dias de hoje é referência de autor e pesquisa relacionada ao folclore brasileiro.
Publicou suas obras no Brasil e no exterior, por não querer abandonar a sua terra não aceitou ser membro da Academia Brasileira de Letras, e ainda rejeitou o convite para ser reitor da Universidade de Brasília, convite feito na época pelo então presidente Juscelino. Faleceu em Natal, no dia 30 de julho de 1986.
"Sou um homem mais de fé do que de culto. Posso recusar a extrema-unção, vou me entender pessoalmente com Deus." (Câmara Cascudo)

OS MONXORÓS

Por: Jornalista Geraldo Maia do Nascimento

Antes da chegada do colonizador, a terra já era ocupada. Mas na passagem devastadora dos povoadores dos sertões, os primitivos habitantes foram sendo escravizados, massacrados e expulsos de suas terras e nelas os povoadores fincaram os mourões das porteiras dos currais de gado. Já não havia mais lugar para os nativos. E quem eram esses nativos? Eram os Mouxorós, Monxorós ou Mossorós, da tribo carirí, que habitaram a região até quase metade do século XVIII, o século do povoamento mossoroense. 
 
 Segundo alguns historiadores, como é o caso de J.C.R. Milliet de Saint-Adolphe, autor do “Dicionário Geográfico, Histórico e Descritivo do Império do Brasil” , foi dessa tribo que veio o nome do rio. E do rio o nome da Cidade. Explica o mesmo, quando se refere ao rio Apodi: “Dá-se d’ordinário o nome de Mossoró a sua embocadura, por causa da vizinhança das salinas, e d’uma aldeia desse nome”. Existia, portanto, uma aldeia indígena denominada Mossoró, Mouxorós ou Monxorós, e habitada pelos indígenas deste nome. 
Sobre essa tribo, pouco sabemos. Nas histórias oficiais do Rio Grande do Norte, quase nada encontramos. Apenas Câmara Cascudo se ocupa do assunto. Segundo ele, “os Mouxorós ou Monxorós (Mossorós), cariris, vagavam pelas margens do atual Mossoró em seu derradeiro trecho e também Upanema. Com os Pégas se uniram e com eles mataram muito gado, provocando correria repressiva dos curraleiros de Campo Grande (Augusto Severo) contra eles. Habitaram depois a serra dos Dormentes (Portalegre), outrora de Manoel Nogueira Ferreira, situador valente”. 
Informa ainda Cascudo que “ Carlos Vital Borromeu e seu irmão Clemente Gomes d’Amorim, em 1740, ajudados pelos Paiacús, desalojaram os Pégas e Mossorós dos aldeamentos serranos. Passaram então a viver na serra da Cipilhada, posteriormente denominada Serra de João do Vale”. Nonato Mota, em “Notas Históricas”, Comércio de Mossoró, 12 de julho de 1914”, completa a história informando que “os Pégas e Mossorós foram transferidos para a aldeia de Mopibu ou Mipibu, onde se dissolveram etnicamente”, esparsos e fracos ante a tentação do álcool, levando uma vida totalmente diferente da que estavam acostumados, sendo obrigados a trabalhar, plantando e colhendo, tarefa que a tribo confiava às mulheres, descaracterizando as funções da tribo. 
Não se sabe de onde vieram os Mossorós. Se vieram do Ceará, pelo Jaguaribe ou pelo planalto para o Apodi. Sabe-se, no entanto, que eram fortes, ágeis, indômitos, atrevidos, incansáveis. Eram bons caçadores e achavam no gado trazido pelos colonizadores, alvos fáceis para as suas flechas. Da caça abatida tiravam a carne que era comida assada ou chamuscada. Dormiam no chão nu, ignorando e depois quase desprezando a rede de algodão dos tupis, tendo a esteira como requinte para os fracos, segundo informação de Cascudo. Corriam dias inteiros, lépidos, gritando, rindo, cantando.
As mulheres eram oleiras. Não tão hábeis como às cunhãs tupis, mas faziam os utensílios que necessitavam; plantavam e colhiam. Os homens iam à caça, com armas de arremesso, a pesca, a colheitas de frutos e mel de abelha. Não tinham reservas nem celeiros. Faziam vinho de raízes e frutos, fermentando-os, apressados pela salivação. Sob o efeito do vinho, dançavam, em rodas, erguendo os braços, festejando a Lua Nova num bailado que durava a noite toda. 
Não podiam ser civilizados. Só podiam existir como tinham sempre vivido, livres, vivendo da caça e da pesca, dançando, gritando aos ventos o sabor da liberdade. Quando foram pacificados, não se habituaram a paz da disciplina dos brancos. Sem liberdade, não resistiram; morreram todos. 
E assim passaram os Mossorós, deixando para a terra que um dia lhe pertenceu o legado do nome e do amor pela liberdade. Essa liberdade, que emana da terra, tem sido o brado forte e retumbante do povo mossoroense.
Geraldo Maia do Nascimento
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ZÉ DO MESTRE

Fotos do Tuíca e do Zé do Mestre
Zé do Mestre nasceu em 1938  no município de Salgueiro, Pernambuco. O famoso Zé do Mestre começou na arte com apenas 6 anos de idade, junto com seu pai Luiz Eugênio Barbosa, o mestre Luiz. Zé fabrica roupa de vaqueiros, confeccionava  a indumentaria de couro de Luiz Gonzaga e tem suas peças exportadas para nove países, entre eles o Canadá, Holanda e EUA. Entre figuras de destaque que tem indumentarias de (roupa de vaqueiro) couro produzidas pelo Zé do Mestre, a presidente Dilma Rousseff, o ex-presidente Lula e o rei Juan Carlos da Espanha. Além de grande artesão Zé do Mestre se considera um ambientalista, amante e defensor da natureza e poeta. Ele reside atualmente no interior de Salgueiro, distante 17 km da sede. 
Uma estrofe de poesia do Mestre: 
"Eu sou vaqueiro afamado de bois das caatingas 
Sou poeta, artesão e ambientalista
Sou irmão do sabiá 
Sou primo do Patativa." 










ATOR LEMBRA COMO FEZ A VOZ DE LULA NO CINEMA

  (Foto: Divulgação)
Rui Ricardo Diaz em "Lula, o Filho do Brasil"

Há dois anos sem encontrar seu personagem mais famoso em 13 anos de carreira, o ator Rui Ricardo Diaz, protagonista do filme Lula, o Filho do Brasil, de Fábio Barreto, ficou surpreso com um detalhe quando ouviu a notícia de que o ex-presidente Lula estava com câncer na laringe.
“O que mais me espantou foi o fato de o câncer poder deixar uma alteração na voz”, disse em conversa com Poder Online. Para ficar com o tom de voz parecido com o do ex-presidente, o ator assistiu a diversos vídeos do tempo da época de militância do líder sindical e precisou de consulta com uma fonoaudióloga para fazer exercícios que dessem a ele o tom vocal de Lula.
No ano que vem, Diaz viverá outro protagonista nos cinemas. Ele será Zé Olimpio em Aos Ventos que Virão, de Hermano Penna.
O filme é inspirado na história de José Francisco do Nascimento, o Zé de Julião, cangaceiro do bando de Lampião que sobreviveu ao episódio da Gruta do Angico, em 28 de julho de 1938, onde morreram Lampião e Maria Bonita.
Como a grande maioria dos brasileiros, o ator torce à distância pela recuperação de Lula, de quem ouviu a voz – pessoalmente – apenas duas vezes na vida.
Poder Online – Como você recebeu a notícia sobre o câncer do ex-presidente Lula?
Rui Ricardo Diaz – Estava participando do 7º Festival de Cinema Brasileiro de Goiânia quando soube. Fiquei muito surpreso e lamento muito por isso. O que mais me espanta é o fato de o câncer poder deixar uma alteração na voz do ex-presidente, que é uma de suas grandes marcas. Antes das filmagens, assisti muitos vídeos da fase sindicalista do Lula e baixei um pouco a minha voz, para deixar mais grave e se aproximar do tom da voz dele. Não tive nenhum encontro com Lula durante a produção do filme.
Poder Online – Você pretende visitar o ex-presidente?
Rui Ricardo Diaz – Não tenho uma relação próxima com Lula. Estive com eles apenas duas vezes, em novembro de 2009: na primeira exibição pública do filme, na abertura do abertura do 42º Festival de Cinema de Brasília, e na pré-estreia em São Bernardo do Campo. Desde lá, não nos falamos mais.
Poder Online - Como você acha que Lula enfrentará essa fase?
Rui Ricardo Diaz – Pelo que conheci e envolvendo como me envolvi na história dele, creio que o Lula, que já passou por tantas dificuldades, passará por essa também. Ele é um homem forte. E em breve estará de novo representando o Brasil como ele vem representando.
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Geraldo Ferraz e a ALANE

Décio Canuto, João de Sousa Lima e Geraldo Ferraz em manhã de Cariri Cangaço

É com muita satisfação que informamos aos leitores do cariricangaco.com que nosso Conselheiro, pesquisador e escritor pernambucano,
 Geraldo Ferraz foi eleito neste sábado,
vice-presidente da ALANE -
Academia de Letras e Artes do Nordeste,
 biênio 2012 / 2013,
tendo sido eleito na mesma chapa como presidente, o escritor Melchiades Montenegro.

A posse da nova diretoria se dará no dia 27 de Janeiro de 2012, no Centro Cutural dos Correios, na Av. Marques de Olinda, em Recife.

Entrevista com Frei Fernando Rossi: os Franciscanos no Nordeste

Frei Fernando Rossi

A presença da ordem franciscana no Nordeste brasileiro data de 1641, com a vinda dos frades “capuchinhos”, de origem francesa, Frei Claude d Abbeville e Frei Ivo d Evreux, no porão de um navio carregado de escravos procedentes da Guiné Francesa.
Naquela época, Pernambuco estava sob o domínio holandês, sendo Governador da colônia o Conde João Maurício de Nassau-Siegen, que mandou alojar, separadamente, os frades, nos Conventos de São Bento, de São Francisco e do Carmo, em Olinda.
Os “capuchinhos” franceses apoiaram os portugueses contra os holandeses e, como recompensa, o General-governador Francisco Barreto doou à ordem religiosa uma casa de sobrado, no bairro de Santo Antônio, em 1655, para que fossem construídas a Igreja de Nossa Senhora da Penha e um hospício, em Recife.
Os primeiros “capuchinhos”, de origem italiana, a se estabelecerem no Recife foi no ano de 1705. Os frades italianos fizeram longas viagens em “missões” por todo o nordeste. Vieram, entre outros: Frei Serafim de Catânia, que pregou no Piauí entre 1874 e 1886 e construiu a Igreja de São Benedito; e Frei Cassiano de Comacchio, que pregou no Ceará assistindo aos fragelados da  seca, em 1888, tendo construído a matriz de Itapipoca, o açude das nações e reformou o Santuário de São Francisco de Canidé, no ano de 1889.
A chegada de Frei Damião (Pio Giannotti, nascido em Bozzano, Itália) ao Brasil, aos 33 anos, aportando no Recife e estabelecendo-se no Convento da Penha, em 17 de maio de 1931, deu início uma nova “missão” franciscana no nordeste, já que os frades “napolitanos” (vindo de Nápoles, Itália), viviam nos conventos ou nas Igrejas, distantes do povo humilde do interior do sertão.
Frei Damião, depois de três meses em Recife, mesmo sem falar corretamente o idioma português, iniciou o seu incansável trabalho missionário, peregrinando pelos estados. Foram 66 anos de “Santas Missões”, realizadas em quase todas as cidades nordestinas. Na companhia de Frei Fernando Rossi, seu companheiro de jornada por 50 anos, Frei Damião realizou pregações, matrimônios, confissões, batismos e crismas, com autorização de Bispos.
Eis abaixo a entrevista de Frei Fernando Rossi concedida ao jornal “A Tribuna do Sertão”:
Tribuna do Sertão: Como se deu sua ida para o Convento Franciscano?
Frei Fernando: Eu estava com 8 anos de idade. Na minha cidade [Massa-Carrara] tinha um Convento dos “Capuchinhos”, onde morava Frei Damião. Eu era “coroinha” do convento. Todos os dias eu ia ajudar na missa. Frei Damião muito calado, fechado, falava comigo e eu não gostava dele, porque todo menino gosta de padre alegre. Eu me escondia dele, na sacristia, para não ajudar na missa. Quando eu chegava em casa minha mãe me repreendia, dizendo: “Você não ajudou na missa de Frei Damião?”. Ela me castigava e me mandava para a escola, sem tomar café. E dizia: “Amanhã, se você não ajudar Frei Damião na missa, você vai se ver comigo”. [...] Certa vez, eu fui com Frei Damião para o cemitério, aonde ele ia celebrar uma missa. No caminho, ele me perguntou: “Você quer ser frade?” E eu respondi: “Quero não!” E ele indagou: “Por que você não quer ser frade? O que você quer ser, quando crescer? Eu lhe respondi: “Quero ser engenheiro, como meu avô !” Tudo isso ele me contou aqui no Brasil. [...] Em julho de 1929, quando eu tinha 11 anos, fui com minha família para a praia, distante quatro quilômetros. Certo momento, eu estava sozinho numa parte da praia e vi Santo Antônio na minha frente, olhando para mim, bonito, com aquela coroa de frade e um menino no colo. Fiquei extasiado, olhando para ele. E ele desapareceu. Depois, então, desejei ser como ele. Contei para minha mãe, para minha avó. Minha avó, disse: “Eu preferia que você fosse padre, porque tem mais dinheiro, tem uma paróquia, e pode sustentar os pais”. E eu lhe disse: “Quero ser frade, quero ser frade”. Voltei ao convento e contei para Frei Constantino e para Frei Damião: “Quero ser frade !” Frei Damião, rindo, revelou: “Você disse que não queria ser frade”. [...] Minha mãe me levou para o seminário em 14 de outubro de 1929. E eu só voltei para a minha cidade em 1942, quando já era sacerdote para “cantar” a primeira missa, porque no seminário não havia férias. [...] A minha vocação se deve a minha visão de Santo Antônio, na praia. [...] Eu acho que fui um predestinado para ser frade.
CONTINUA…
Tribuna do Sertão: Por que o Senhor se considera um predestinado?
Frei Fernando: Aos dois anos de idade, eu tive a difteria [doença contagiosa, toxi-infecciosa, transmissível, causada por bactéria que se aloja nas amídalas, na faringe, na laringe, no nariz, em outras mucosas e na pele]. Fiquei entre a vida e morte, por vinte e um dias. No hospital, o médico disse para a minha mãe: “a criança não chega às 11 horas. Não me procure, porque eu vou para o teatro”. Fiquei todo roxo, o coração havia parado. A freira disse para minha mãe: “Dona Ana, seu filho está morto”. Minha mãe abriu a porta, e no corredor viu a imagem de Nossa Senhora do Rosário de Pompéia. Ela se ajoelhou e disse: “Virgem Santíssima, salve meu filho!”. E chorou. [...] Quando ela voltou ao quarto, meus olhos estavam abertos. Passei bem à noite. [...] Naquele tempo toda criança morria. De mil crianças, escapava uma! Tem um grande poeta da Itália, chamado Giosue Carducci [1835-1907], que escreveu uma poesia – A MORTE – retratando a difteria. Uma doença terrível. [...] Pela manhã, chegou o médico e deu logo um grito: “Morreu!” Mas, após me examinar, disse: “Está fora de perigo”. Minha mãe lhe contou que havia “falado” com Nossa Senhora. Ele jogou o chapéu no chão e exclamou: “Não fale em Deus, não fale em Nossa Senhora, porque eu não creio em nada”. Ele era ateu. Isso aconteceu em 1920. [...] Em 1947, já aqui no Brasil, depois que eu contei tudo isso a Frei Damião, ele comentou: “Você estava predestinado a me acompanhar nas Santas Missões, porque para Deus tudo é presente, nada é futuro”.
Tribuna do Sertão: Como ocorreu seu reencontro com Frei Damião?
Frei Fernando: Quando cheguei ao Brasil, em 1946, éramos cinco frades italianos. Três foram escolhidos para “confessores” em Maceió: Frei Bernardino, Frei Crispim e Frei Gerônimo. E dois ficaram no Convento da Penha, no Recife, como missionários pregadores: eu, Frei Fernando, e Frei Jorge. Isso porque, na Itália, eu já pregava nos púlpitos altos da Igreja. [...] No dia 20 de janeiro de 1947, no Convento da Penha, aparece Frei Damião, com uma maleta na mão. Olhou para mim e disse: “Você é aquele menino que me ajudava na missa?” Eu respondi: “Sou!”. Ele perguntou: “Está satisfeito?” Eu respondi: “Estou!” Ele continuou: “Como vai sua mãe?” [...] Eu perguntei: “Frei Damião, o Senhor anda sozinho?” Ele respondeu: “Ninguém quer me ajudar!” [...] Depois, ele olhou para mim e disse: “O Senhor quer me ajudar?” Eu respondi que não sabia falar em português. Não sabia dizer “bom dia”. Então, ele me aconselhou: “Estude português, quanto antes, porque você vai me ajudar!”. Ele profetizou, né?
Tribuna do Sertão: E as Santas Missões quando aconteceram?
Frei Fernando: Quando chegou o mês de março, eu já tinha decorado três páginas do Evangelho de Cristo. Lembro-me que o primeiro evangelho que eu expliquei foi aquele que fala do “Bom Pastor”… Eu sou bom pastor… [...] Quando foi no mês de julho, em Recife, o Ministro Provincial me procurou: “Deixe a companhia de Frei Jorge. Você agora vai ajudar Frei Damião. Você já pode confessar, pois o bispo já lhe deu licença” [...]. No dia 7 de julho de 1947 eu entrei na Igreja de Açu, perto de Mossoró, no Rio Grande Norte. Interessante é que, na Diocese de Mossoró, Frei Damião nunca tinha pisado, mesmo já estando no Brasil há 16 anos, porque o Bispo de Mossoró, Dom Jaime de Barros Câmara (aquele que foi Cardeal no Rio de Janeiro), não permitiu que Frei Damião fosse até lá. Frei Damião entrou na Diocese de Mossoró, após a chegada do novo bispo, Dom João Batista Portocarrero Costa, que conhecera antes em Roma e o havia reencontrado em Recife. Eu e Frei Damião ficamos em Mossoró, durante os meses de julho a novembro, em meio às Paróquias e às Capelas, pregando, confessando e crismando. Atendemos mais de 80 mil pessoas. [...] Em Novembro voltei para casa, para o Recife, passei uns dias. O Guardião do Convento perguntou-me: “Quer voltar?”. Eu disse: “Quero”. E assim, eu continuei seguindo Frei Damião, até o ano de 1997 [data da morte do missionário capuchinho].
Tribuna do Sertão: Por que a Província de Lucca, na Itália, resolveu enviar Frei Damião e Frei Fernando para o Brasil?
Frei Fernando: No Brasil existiam os “capuchinhos” napolitanos, vindos de Nápoles (Itália). Então, os superiores de Roma mandaram ao Brasil um Visitador Apostólico para saber o que esses frades estavam fazendo no país. Aí foi descoberto que esses padres viviam no convento, só rezando e comendo, sem nenhum trabalho lá fora. Por isso os superiores resolveram enviar ao Brasil os “capuchinhos” da Província de Luccas para substituir os “napolitanos”. Foi assim que vieram para o Brasil, Frei Felix, Frei Damião, Frei Otávio, eu, entre outros missionários.
Tribuna do Sertão: Como foi a chegada dos frades italianos na Vila São Francisco, em Quebrangulo?
Frei Fernando: Até 1972 os frades brasileiros não gostavam de ficar na Vila. Nessa época, Frei Otávio, da Província de Luccas, chegou à Vila e ficou até 1992. Em 1993 ele adoeceu, fraturou o fêmur e voltou para o Recife, onde faleceu em 19 de janeiro de 1996, tendo causa morte o infarto. Eu e Frei Damião trouxemos seu corpo para Vila São Francisco, onde está sepultado no cemitério do povoado, ao lado do beato Franciscano.
Tribuna do Sertão: Um ano depois da morte de Frei Damião, o Senhor declarou que sentia muita saudade dele. O Senhor confessou: “É a saudade de um filho que perde o Pai”. Como era sua convivência com o missionário?
Frei Fernando: Eu trabalhei com Frei Damião durante 50 anos. Não foram cinqüenta dias. Tudo eu fazia para ele. Com sua morte, eu fiquei triste, arrasado. Senti o mesmo que senti com meu pai. Abri a tampa do caixão e beijei a cabeça dele. Com a morte dele, no dia 31 de maio de 1997, terminei a minha vida missionária. [...] 15 dias depois, o Frade Deferidor-Geral da Itália, que tinha vindo para o sepultamento de Frei Damião, chamou-me na mesa, juntamente com Frei Tito, Frei Bernardino e Frei Egídio, e falou: “Os senhores sabem que não podem mais ficar aqui no Convento. Terão que ir embora, porque tudo aqui pertence aos frades [capuchinhos] brasileiros”. Cada um escolheu um lugar para viver. Eu vim para a Vila São Francisco, porque aqui não tinha ninguém e aqui eu guardo muitas recordações de Frei Damião. Para vir para a Vila, eu pedi autorização ao meu Provincial, porque eu não gostaria de voltar mais para a Itália. E telefonei para o bispo Dom Fernando Iório,de  Palmeira dos Índios, pedindo-lhe permissão para ficar aqui, em sua Diocese. E ele me acolhei, fraternalmente.
Everaldo Damião
FREI  FERNANDO
Giuseppe Rossi, o Frei Fernando fez 90 anos de idade no dia 18 de junho. Ele nasceu na província de Massa-Carrara, na Itália. Ordenou-se padre em 1942 e, quatro anos depois, aportou no Recife (Brasil) para ser frade auxiliar de Frei Damião de Bozzano. Houve uma celebração litúrgica pelo Bispo Diocesano, Dom Dulcênio de Mattos, além de uma grande comemoração.
Os romeiros do Agreste e do Sertão foram à Vila São Francisco, em Quebrangulo, para homenagear o companheiro de Frei Damião, por mais de 50 anos.

POETA E ESCRITORA FLAUZINEIDE MOURA VISITA MOSSORÓ, E A ESTÁTUA DO JORNALISTA DORIAN JORGE FREIRE


Busquei uma daquelas belíssimas crônicas de Dorian Jorge neste livro, e encontrei a emoção de ver esta obra e a saudade de seus escritos. Quem quiser saber mais sobre o jornalista é só consultar no google.

A estátua, em homenagem ao jornalista Dorian Jorge Freire, encontra-se na Praça da Rendenção em frente à Biblioteca Ney Pontes.


Canudos e o centenário de “Os Sertões”

Por: Jornalista Geraldo Maia

Foi com o objetivo de aproveitar o centenário de lançamento de “Os Sertões”, de


Euclides da Cunha, e conhecer a área onde se deu a saga de


Antônio Conselheiro, que uma caravana formada por 40 pessoas, entre alunos e professores da UERN – Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, além de pesquisadores da SBEC – Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço e alguns convidados, embarcaram com destino a Canudos/BA, atravessando o sertão de cinco Estados, numa jornada de mais de mil quilômetros.



A partida se deu em Mossoró, às 5:00h da manhã do dia 04 de dezembro de 2002, num percurso pré-determinado que passou pelas cidades norte-rio-grandense de Assu, São Rafael, Jucurutu e Caicó, seguindo na Paraíba por Santa Luzia, Patos e Teixeira. Em Pernambuco passamos por São José do Egito, Sertania, Arco Verde e Águas Belas, seguindo depois por Paulo Afonso, já no estado da Bahia, onde pernoitou. A jornada prosseguiu no dia 05 de dezembro por Geremoabo, Ribeira do Pombal, Tucano, Euclides da Cunha e Canudos, num total de 1.045 Km percorridos. 
No dia 06 a caravana visitou Monte Alegre, o vilarejo que restou com o fim de Canudos. Muitos dos habitantes são descendentes de conselheristas, razão pela qual preferem chamar o local de Canudos Velha. Existe no local um conjunto de Igreja, uma estátua do
Conselheiro e um pequeno museu mantido pelos habitantes, onde estão expostos os vestígios da guerra. São relíquias como espingardas, balas, capacetes de soldados e outros objetos achados pelas redondezas. O vilarejo é banhado pelo açude Cocorobó, que esconde em suas águas o que restou da Canudos de Antônio Conselheiro.
 Na tarde daquele mesmo dia começou a programação oficial do aniversário de “Os Sertões”, com a chegada a Canudos de autoridades, que foram recepcionadas por vaqueiros em trajes típicos, tendo como cenário o Memorial Antônio Conselheiro.
 
A noite, inauguração do Memorial com uma série de eventos que ia desde palestras a lançamento de livros de autores como Oleone Coelho Fontes, Eldon Dantas Canário e outros, além de mostra fotográfica e artística sobre Canudos. 
No dia 07, Sábado, a caravana visitou os sítios histórico-Arqueológico do Parque Estadual de Canudos.
Parque Estadual de Canudos
Houve também manifestações populares da cultura sertaneja. Na tarde daquele mesmo dia, uma série de palestras foram ministradas pelos professores que acompanhavam a caravana. 
Na opinião dos alunos, aquele estava sendo um momento único de aprendizado, pois estavam tendo a oportunidade de encurtar a distância entre os livros e a realidade da guerra.
Segundo Lemuel Rodrigues, professor da UERN e coordenador da caravana, “os alunos participantes são favorecidos, pois têm a oportunidade de visitar em campo, além de discutir a teoria, o que facilita o trabalho em sala de aula. Ganha o professor em credibilidade, além de suscitar o interesse nos outros alunos pelo tema e pela viagem”. 
A programação encerrou-se com a exibição do filme “A Guerra de Canudos”, na noite do Sábado, coroando assim o evento que foi tido por todos os participantes como de excelente qualidade. 

O retorno deu-se na madrugada do Domingo, dia 08 de dezembro, por um outro percurso. Na nova rota, a caravana atravessou o
Raso da Catarina, uma das regiões mais inóspitas do nordeste brasileiro, passando pelas cidades de Bendengó, Formosa, Macururé, Chorrochó e Ibó, na Bahia; Salgueiro e Pena Forte, em Pernambuco; Jati, Brejo Santo, Milagres, Barro, Cachoeira dos Índios, Cajazeiras, São João do Rio do Peixe e Uiraúna, no Ceará, entrando no Rio Grande do Norte através de Major Sales, Rafael Fernandes, Pau dos Ferros, São Francisco do Oeste, Itaú, Caraúbas, governador Dix-sept Rosado e Mossoró, onde chegou por volta das 17:00h, num percurso de 661 Km, ou seja, quase metade do percurso usado na ida para Canudos.
Extraído do blog do GEMAIA

SANTA LUZIA DO MOSSORÓ

Por: Jornalista Geraldo Maia
Jornalista Geraldo Maia e historiador Vingt-un Rosado Maia
 
Os primeiros sesmeiros da Região Oeste, nas Ribeiras do Apodi, Mossoró e Upanema, quando aqui se instalaram, trouxeram as suas devoções e Santos Protetores. Já no primeiro quartel do século XVIII, terras da Ribeira do Upanema, a uns trinta quilômetros de Mossoró, foram concedidas aos Freis Carmelitas do Recife, que ali construíram uma residência e uma pequena Capela do Carmo. Havia também, nessa região, um Sítio ou Fazenda “Santa Luzia”, e ao lado se construiu uma pequena ermida, entre os Paredôes e Barrocas, onde os Freis Carmelitas realizavam atos religiosos.
 Os proprietários da “Fazenda Santa Luzia”, Sargento Mor Antônio de Souza Machado, português residente em Russas, Ceará, requereu ao visitador diocesano de Olinda, Pe. Inácio de Araújo Gondim, de passagem por Aracati, autorização para erigir uma Capela em homenagem à Virgem de Siracusa, para fazer cumprir uma promessa de sua esposa D. Rosa Fernandes, no qual foi atendido, em sua petição com data de 5 de agosto de 1772. Existia, porém, uma condição: que a Capela fosse construída em pedra e cal e que houvesse um patrimônio em terras doada à Santa. As exigências foram aceitas e as providências foram tomadas pelo Sargento Mor Souza Machado, de modo que em janeiro de 1773 a Capela já estava pronta, construída com os cruzados do Sargento Mor e o auxílio dos devotos circunvizinhos, no mesmo local onde hoje se encontra a Catedral de Santa Luzia. Mas a pequena Capela não tinha a imagem da Santa. Até que em 1779, D. Rosa Fernandes manda trazer de Portugal uma imagem de Santa Luzia, em madeira, adquirida pelo valor de 25$600. Essa imagem é a mesma que até hoje é conduzida nas procissões e peregrinações. 
Santa Luzia nasceu em Siracusa em 281 da era cristã, descendente de uma família patrícia e abastarda. Sua mãe, Eutíquia, era uma nobre matrona que a educou na fé cristã. Naquela época, o cristianismo que ainda estava em perseguição, ia triunfando lentamente sobre o mundo pagão. Mas era uma época em que defender a fé, caracterizava-se como risco mortal. 
Luzia tornou-se uma moça bela, rica e herdeira única de fabulosa fortuna. Isso fez com que logo despertasse o interesse dos jovens de sua época, particularmente de um rapaz pagão, apegado à boa vida e aos prazeres, que dizia-se apaixonado. Mas ela, Luzia, havia se consagrado totalmente a Deus pela renúncia do amor carnal, das paixões terrenas e da vida conjugal. 
Naquela época, Diocleciano, Imperador romano, havia instaurado a 10ª perseguição contra o cristianismo nascente. Para os cristãos não restava outra escolha a não ser sacrificar-se aos deuses e ao Imperador, ou o martírio.
Vendo-se rejeitado por Luzia, o seu pretendente valeu-se do decreto imperial que ordenava a perseguição aos cristãos, como instrumento de vingança, e a denunciou ao prefeito de Siracusa, Pascásio, que não perdia tempo em fazer algo para agradar ao Imperador. Presa, Luzia negou-se a render culto aos ídolos. Isso irritou o Prefeito Pascásio que a condenou a pena capital. E no dia 13 de dezembro do ano de 304, Luzia era decapitada. Esse foi o seu “dies natalis”, o dia do seu nascimento, como a Igreja denomina, na vida dos santos, o dia em que nascem para a Vida Eterna. 
E Mossoró comemora o dia de Santa Luzia com grande festa, festa essa que começa normalmente no dia 03 de dezembro e segue até o dia 13. O encerramento da festa se dá com a procissão que sai da Catedral, percorre diversas ruas da cidade e volta a igreja, acompanhada de grande massa humana. 
A cada ano, a procissão de Santa Luzia aumenta com a vinda de romeiros de municípios de todo o Estado e até de Estados vizinhos. Foram quase 150 mil pessoas que acompanharam a procissão no ano passado, o que a torna uma das maiores manifestações religiosas do país. Eram crianças, jovens, adultos e idosos emocionados que seguiam a procissão. 
13 de dezembro, dia de Santa Luzia, Padroeira de Mossoró. Nesse dia, a comunidade católica mossoroense em procissão pelas ruas da cidade, entoa em uníssono o famoso refrão: Ó Santa Luzia, pedi a Jesus, que sempre nos dê, dos olhos a luz.

Extraído do Blog do GEMAIA

2º MotoCross de Messias Targino neste domingo dia 27.

Velocidade e aventura irão marcar o 2º MotoCross de Messias Targino, que será realizado neste domingo dia 27, a partir das 14hs, em uma pista montada próxima a cidade na BR 226 estrada que liga Messias Targino a Janduís.

A segunda edição de o evento estar incluso no calendário da Copa Altoestana de MotoCross 2011.

O organizador do MotoCross Anderson Medeiros, disse que toda estrutura está pronta e que serão mais de R$ 3.500 em Prêmios. “Já recebemos a confirmação de grandes Pilotos do estado do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte”, informou Anderson.

Fonte: Blog Pôla Pinto

Moreno e Duvinha - Viagem aos tempos de Lampião

Por: Jotabê Medeiros - Belo Horizonte


Casal de pistoleiros dos anos 30 fugiu a pé para Minas Gerais e foi reencontrado na semana passada.
Matou 21 - 1 deles com uma só facada. Pôs para correr três policiais na saída de um baile. Viajou de carona em trem de bóias-frias, pendurado do lado de fora, e afogou dezenas de bicho-de-pé com querosene. Andou três meses do sertão de Pernambuco até Montes Claros, em Minas, comendo miolo de chique-chique e casca de árvore. Na mão de um benfeitor de beira de estrada deixou a estimada pistola alemã Mauser. As balas, uma lata cheia, escondeu num tronco.
Isso tudo foi há 70 anos. Hoje, o antes temido cangaceiro usa camisa muito branca de mangas compridas com abotoaduras de plástico brilhante nos punhos, chapéu de feltro e sapato mocassim. Está afundado no sofá do andar superior do modesto sobrado no Jardim Tupi, bairro simples de Belo Horizonte. Não tem mais de 1,60 m de altura. Tenta levantar para cumprimentar o visitante, mas logo volta a seu posto compulsório no sofá, mal resignado. Aos 96 anos, sua saúde parece muito boa, danada de boa, mas ele guarda apenas como lembrança incômoda a memória espantosamente nítida daquele rapaz de 20 e poucos anos que ele foi, e que corria das volantes, se esquivando das balas e, eventualmente, extorquindo, matando e roubando.


José Antonio Souto, ou Zé Pernambuco, como é conhecido no bairro mineiro, foi o cangaceiro Moreno, do bando de Virgílio (cunhado de Lampião, um dos mais cruentos cangaceiros dos anos 30).
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Virgínio está sentado ao lado de Lampião
Sua mulher, Durvalina Gomes de Sá, a Duvinha, foi do bando de Lampião, companheira primeiro de Virgílio e, após sua morte numa tocaia, de Moreno. Se o leitor viu o filme Baile Perfumado, de Lírio Ferreira e Paulo Caldas (com imagens do raríssimo documentário do libanês

Benjamim Abrahão sobre Lampião e seu bando, feitas nos anos 30), Duvinha é aquela cangaceira bonita de cabelos compridos que brinca com uma pistola entre os homens de Lampião, apontando-a para a câmera e dançando.
Moreno lembra-se com precisão da data em que os dois deixaram o cangaço: 2 de fevereiro de 1940. Desde então, Moreno e Duvinha nunca mais falaram sobre seu passado, sobre os anos em que as balas ricocheteavam à sua volta e estavam entre os fora-da-lei mais procurados do País. Adotaram um código de silêncio. Nem os filhos sabiam de algo. Mas o segredo durou até a semana passada.
Moreno e Duvinha foram localizados há alguns dias pelo cineasta cearense
Wolney Oliveira (de Milagre em Juazeiro), em campo para colher depoimentos para seu novo documentário, Lampião, o Governador do Sertão.
Neli e o cineasta Aderbal Nogueira
Uma das filhas do casal, Neli, ajudou o cineasta - a chave foi um filho que Duvinha e Moreno deixaram com um padre, em Tacaratu, no sertão pernambucano, enquanto fugiam. Moreno só contou sobre o passado por medo de jamais reencontrar o filho,
Inácio e Rostand Medeiros
Inácio, antes de morrer (eles o reencontraram, ele vive hoje no Rio de Janeiro e opõe-se à idéia de que os pais dêem entrevistas sobre seu passado). "Na idade que estou, achei que morria logo. Não queria deixar eles enganados."
Existem pouquíssimos ex-cangaceiros vivos. Mais raro ainda é encontrar um casal do cangaço, testemunhas privilegiadas da organização social, afetiva, militar e estratégica daquele tipo de movimento que atravessou o século 19 e chegou à metade do século 20. Um movimento mitificado pelas esquerdas como uma experiência autônoma de guerrilha (e exemplo da insurreição do povo contra as injustiças dos poderosos) e definido pela direita apenas como grupos de saqueadores, estupradores e oportunistas explorando duplamente a população. O sobrado do Jardim Tupi já está ficando pequeno para tanta gente que está vindo fazer o refino da história.
É o único casal de cangaceiros sobrevivente que existe. “O mais importante é que eles têm fatos novos, que podem esclarecer muito sobre a história do cangaço e, por conseqüência, do Nordeste”, diz o escritor
Moreno e João de Sousa Lima
João de Sousa Lima, recém-chegado de Paulo Afonso (Bahia), anotando e fotografando tudo. "É uma beleza!", diz apenas
Expedita Ferreira, filha de Lampião, que foi a Minas com a filha Vera para ver e ouvir Moreno e Durvalina.

Ouvindo a palavra de Moreno, sempre minucioso nos detalhes, sempre passando ao largo da emoção, esquematizando sua vida apenas como uma seqüência de fatos definidos por forças alheias à sua vontade, tanto as teses da esquerda e da direita sobre o cangaço não parecem sólidas. "Matei para não morrer", diz Moreno, antes de começar a contar sua história. "Nasci em Tacaratu, Pernambuco, fui batizado em Mata Grande e criado em Brejo Santo (Ceará). Nunca tive documento, mas, pelas minhas contas, tenho 96 anos." Tinha muita vontade de ser polícia, e foi a Juazeiro para tentar um posto, mas só tinha 17 anos e não lhe deram atenção. Empregou-se então em uma propriedade rural em Cajazeiro do Rio do Peixe, na Paraíba.
Era o fim dos anos 20. Ali, em Cajazeiro, em sua versão, uma mulher chamada Antônia lhe atribuiu uma calúnia, sevícias numa sobrinha, o marido da mulher veio para cima dele e ele o matou com uma facada só. Foi quando seu caminho começou a entortar. Teve de ir para longe, viajou muito. Em Camela, Pernambuco, pegou uma febre tremedeira que o deixou seis meses doente. Quando sarou, envolveu-se em briga com três policiais em Santo Amaro e, em vez de conseguir inimigo, um sargento no qual bateu lhe arrumou um emprego num quartel. Mas não foi efetivado na polícia. Foi barbeiro, cavoqueiro e marreteiro e, um dia, trabalhava de segurança para um pequeno fazendeiro quando o lugar se encheu de cangaceiro.
Queriam 200 mil réis do fazendeiro, Moreno teve de intermediar a negociação. O chefe dos cangaceiros era Virgílio, que gostou da coragem do negociador. Convidou Moreno para tomar café no acampamento e a seguir com eles. Ele ficou de pensar. "Deu oito dias e eles voltaram para me buscar. Deram-me rifle, bala, cartucheira. Ficou aquele bobo lá no meio daquela homarada", conta.

Durante alguns dias, tudo parecia tranqüilo e bom na vida iniciante do cangaço. Mas um dia Virgílio chegou para Zé dizendo que trazia um presente para ele. "O presente era um homem. Eu entendi logo que era para eu matar", conta. Era o teste definitivo. Zé não tinha uma Mauser, eles lhe deram uma. Disse que não sabia atirar. Ensinaram a manobrar. Ele pensou e disse a Virgílio, sem angústia. "Seu expediente será feito." Caminhou até o sujeito. "Apertei o gatilho e o homem tombou para o lado. Nunca fiquei sabendo quem era e quem não era."
Deram-lhe então o chapéu e a roupa azul de couro, ensinaram a apagar o rastro no bico da alpercata, e a não passar por ramo de árvore sem deixar o ramo para trás. O apelido Moreno foi o cangaceiro Luís Pedro, do bando de Lampião, quem lhe aplicou. "Não tive caderneta, mas não foi pouco não", ele responde, quando indagado sobre o número de homens que matou. "Entre polícia e paisano são 21, que tenho certeza. Mas tinha muito coiteiro que avisava a polícia quando a gente ia para a cidade fazer compras. Aí a gente matava", lembra.

Só não fez judiação com ninguém, garante. "Urubu comeu muito cangaceiro. Mas eu nunca cortei a cabeça de ninguém. Já tá morto, para que fazer mais? Isso aí é uma brutalidade", diz. E quanto à castração de lavradores, crueldade também atribuída ao cangaço? "Essa conversa de capar eu assuntei, mas não assisti não."

"Por que a senhora entrou para o cangaço?" Dona Duvinha, que foi a mais bonita daquele bando de Lampião - bem mais formosa que Maria Bonita, Moça Velha ou Inacinha. Ela responde de bate pronto: "Porque eu gostava de um cangaceiro (Virgílio). Eu era medrosa. Tinha a Mauser, tinha rifle, tinha punhal. Mas era só de boniteza", lembra Duvinha. Do cangaço, a bela mulher de Virgílio traz, além do atual marido, um terrível ferimento de rajada de metralhadora na perna esquerda e um pé semiparalisado, conseqüência de picada de jararaca. Essa doeu. "No mesmo instante, eu fiquei cega. Urinava sem parar, puro sangue."
E Lampião, era mesmo aquele sujeito de ruindade pura que diziam? "Era bom. Ele andava na razão dele. Grosseria foi o que fizeram com ele, com a família dele, a mãe, os irmãos."

Sentados na sala do seu sobrado em Belo Horizonte, cercados pelos filhos João Batista, Murilo e Neli, Duvinha e Moreno assistem às imagens que mostram o bando de Lampião em seu acampamento. Vão reconhecendo velhos companheiros de cangaço. Moreno lembra-se de como teve de se opor a que Corisco matasse uma das mulheres do grupo, Maria de Pancada, e quase teve de enfrentar em duelo o terrível cangaceiro. Mas Corisco lhe deu razão e ele salvou Maria, que foi mandada embora.

Mas o momento-chave é quando Durvalina reconhece a si mesma, dançando e brincando com as armas. A filha Neli chora. "Como era bonita, minha mãe! E como era feliz!" O irmão João Batista a consola: "Não chora, minha irmã. O que passou, passou. Temos de viver no presente." João Batista diz que errado seria esconder esse passado, que é parte da história do País, que pode ajudar a esclarecer fatos importantes da vida da Nação. "Temos orgulho dos nossos pais."
Moreno, que detestava fotos recusa a tese de que sua figura aparece também nas imagens mostradas na TV. Segundo ele, trata-se de um outro cangaceiro também chamado Moreno, diz, só que este era paraibano. "Meu cabelo era grande, meu chapéu muito bem-feito. E eu não carregava a arma desse jeito. Nunca estive do outro lado da Bahia. Declarei hoje coisas que deveria ter guardado silêncio. Agora, um cangaceiro que não sou eu vou dizer que sou eu?", reage indignado.
Observação: Este trabalho foi publicado no dia 24-06-2006