Por Paulo Gastão
Paulo Gastão e Juliana Ischiara
Em determinado
momento as famílias de Sigismundo e Pereira se cruzam quando seus filhos
Raimundo e Vanice se casam e vão residir em Brasília nos seus primeiros anos de
existência, já tendo se tornado a jovem Capital Federal. Não sabemos as causas
durante passadas festas do Natal, Raimundo desapareceu e até hoje nenhuma
notícia do seu paradeiro. Chico foi para Roma, tornou-se escritor, professor e
jornalista. Consegue no final da vida transformar sua grande obra em peça de
teatro. E assim Vingança, Não teve inicio a sua grandiosa caminhada. Pelos
caminhos do radioamadorismo nos aproximamos de um colega que operava na cidade
de Aracaju.
Fazenda Jacu
da família Pereira, em Nazarezinho
Era ele frei Lauro, frade da mesma ordem de Albano e que por nossa solicitação,
sem saber do que se tratava, quando nós queríamos conhecer mais um filho de
Chico Pereira. O tempo se passa e frei Lauro de descendência alemã, passa a
residir em Campina Grande, onde viemos a conhece-lo. Naquela oportunidade para
nós rara, lhe fizemos completo relato do por que da nossa solicitação. Mas,
frei Albano já havia sido transferido e não sabíamos do seu paradeiro. Durante
longo período não conseguimos saber do paradeiro do frei Albano. Mais uma vez
quem nos salva é frei Lauro, confirmando a presença desejada no Santuário do
Canindé no Ceará. Surge que recebemos convite do amigo de caminhadas nas
caatingas atrás de depoimentos do tempo de cangaço, Aderbal Nogueira, que nos
estende convite para colhermos algumas imagens na Serra Grande ou Serra da
Ibiapaba e assim chegamos até a gruta de Ubajara.
Aderbal
Nogueira, Paulo Gastão e José Mendes, do blog "Mendes e Mendes"
Seguimos em busca de Sete Cidades já em território piauiense e fina neblina nos
roubou a grande oportunidade de filmarmos as belezas construídas pela
natureza. Seguindo viagem nos deparamos com Guaraciaba do Norte e
procuramos pelo bisneto de Antônio Conselheiro, porém, não se encontrava na
cidade naquele momento. Então nos dirigimos até a cidade de Ipú, fotografamos e
filmamos a bela cachoeira e procuramos nos aperceber da brilhante figura de
Leonardo Mota, também identificado de Leota, magistral pesquisador,
memorialista e folclorista cearense. Estará chegando uma grande data, ou seja,
o sesquicentenário do coronel Delmiro Gouveia o maior empreendedor do Nordeste
brasileiro e como a memória do homem de hoje é pequenina por demais, não
deveremos comemorar absolutamente nada. Uma vergonha para o Nordeste e para o
Brasil. E chegamos ao começo da noite, a cidade de Canindé em festa, a igreja
não cabia mais ninguém e teria sido momento de abraçar frei Albano. Nunca
pensamos que a cidade estivesse em festa e terminamos indo dormir em Fortaleza.
Afinal Jarda
viu seus filhos encaminhados na vida do bem, a enaltecer a memória do
pai. Afinal o pai, o homem, o cangaceiro, o cabra macho, ganha espaço no
nosso relato. Com a morte do seu genitor o que se tinha em casa era a não
violência, era o perdão, o afastamento da vingança que não lavaria a lugar
algum. Do outro lado, o mundo via as posições inversas, ou seja, deveria
existir a vingança, que a família não poderia ser desmoralizada e assim num
crescendo difícil de mudança de comportamento. Conselhos e pedidos foram feitos
a Francisco Pereira, o Chico Pereira para não estabelecer a vindita. Mas, o
bicho homem depois de decidir o que deseja torna-se impenetrável nas suas
decisões, e assim, o filho que perdera o pai vendo que a justiça nada resolvia,
tomou do mosquetão e ganhou a caatinga em busca do seu desafeto.
Consegue trazê-lo e coloca-o na prisão. Algum tempo depois está o criminoso na
rua. Chico Pereira resolve ampliar sua capacidade de luta e percorre terras
vizinhas no próprio estado e viver muito além, percorrendo trilhas nos estados
do Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte.
Localidades
que fizeram parte do universo de Chico Pereira. Na Paraíba temos: a partir de
Nazarezinho, Sousa, São Gonçalo, Lastro, Antenor Navarro, Fazenda Jacú,
Cajazeiras, Condado, Malta, Sítio Pau Ferrado, Coremas, Patos, Santa Luzia, Campina
Grande, Guarabira. No Rio Grande do Norte anotamos Acarí, Serra da Rajada,
Currais Novos. Esta nomenclatura está estabelecida no livro Vingança, Não,
página 18, da Livraria Freitas Bastos, 1960.
Porém as
andanças de Chico Pereira se estenderam por um território bem mais amplo. Nas
suas andanças Chico Pereira passa a conhecer nomes pouco conhecidos até hoje,
como seja: Estrela do Norte, Jandaia, Serra Negra, Maçarico, Caboré, Jordão, Estrela
Dalva, Corró, Moitinha, Curió, Perigo e muitos outros. Sua mãe pedia para
acabar com aquelas andanças perigosas e Chico dizia que queria primeiro casar.
Casamento ocorrido por procuração no dia 25 de maio de 1925 na matriz de
Pombal. A noiva de 14 anos apenas de nome Jardelina Nóbrega. Depois tomaria o
rumo de Goiás para onde já teriam ido Luís Padre, Sinhô Pereira e Zé Inácio do
Barro. Era ele bem informado dos acontecimentos que ocorriam no atribulado
mundo. Permaneceu no seu torrão natal.
Paulo Gastão
em Conferência no Cariri Cangaço dentro do Parahyba Cangaço, ao lado de João de
Sousa Lima e Wescley Rodrigues
Patos de
Princesa, hoje Irerê, recebeu a visita de Chico Pereira sob os auspícios do
coronel Marcolino Diniz, seu amigo pessoal. Fora da vila residia na casa
grande, o major Floro, proprietário de terras, gado. Homem que implantou
energia elétrica em fins do século XIX, mesmo antes de Triunfo.
Quanto a sua
prisão a literatura oral menciona que os Presidentes (hoje governadores) dos
estados da Paraíba João Suassuna e do Rio Grande do Norte Juvenal Lamartine de
Faria entraram em acordo no sentido de exterminar a chaga do cangaço nos seus
territórios. Juvenal esteve a frente do governo potiguar desde 01 de janeiro de
1928 até 05 de outubro de 1930. Correu mundo a seguinte afirmativa: Juvenal
Lamartine caçava a cabeça de Chico Pereira em toda região nordestina desde o
dia que tomou conhecimento de que um sua parenta, moça bonita e prendada,
estava apaixonado por Chico Pereira e com ele queria casar. Juvenal encetou
caçada até que consegui prender Chico Pereira que numa trágica viagem os
policiais que o transportavam viraram o carro por cima do preso e para encobrir
o crime simularam o acidente. Seu mausoléu está fincado às margens da BR-427,
quilometro 177 e está a 18 km de Currais Novos do lado esquerdo de quem vem de
Natal para Acarí. Na noite tenebrosa da covardia, Chico Pereira encontrou a
morte.
Resumindo,
Chico Pereira passou a conhecer mundos dos estados de Pernambuco, Ceará e Rio
Grande do Norte, onde praticou assaltos, crimes, sozinho ou com seu pequeno
bando e foi na cidade de Acarí no estado do Rio Grande do Norte instaurado o
Processo Crime contra o paraibano, amor de Jarda.
Local onde foi
morto Chico Pereira, na Rodovia BR 226, sentido Currais Novos-Natal.
Vejamos a força do relato oferecido por P. Pereira Nóbrega, a pag. 126.
27 de julho de
1924. As quatro da madrugada, Sousa estava cercada. Os 84 homens formavam
quatro pelotões sob a chefia de Chico Pereira, Levino, Antônio Ferreira, Chico
Lopes. Três grupos algum tempo ficaram piquetando as principais entradas da
cidade, para impedir qualquer socorro de fora. Chico Pereira foi bater à
porta da delegacia, acordando as autoridades.
- Tenente
Salgado, me desculpe. Não esperava que o senhor estivesse aqui. Se
soubesse, não teria vindo, por atenção à sua pessoa. Mas já é tarde para voltar
a trás. Comunico à polícia que Sousa está cercada. Vamos abrir fogo contra
Otávio Mariz. Se quiserem podem reagir. Se quiserem podem sair em paz.
O Tenente Salgado sabia que estava só. Reagir era suicídio. Às sete horas da
manhã batia retirada. O resto da polícia cumpriu o que dissera às vésperas:
passividade absoluta ante os cangaceiros. Eles também foram gratos. A
polícia não fez mal... Arrolado num processo de mais de 800 páginas está
um memorandum do juiz de direito, dirigido ao Presidente do Estado, em que
depõe sobre militares:
É de lamentar que a força da polícia, composta de 10 a 12 praças, sob o comando
do sargento Apolônio, não tinha se movido a menor diligência de rebate aos
assaltantes, pois não disparara uma só arma, conservando-se indiferente no seu
cômodo aquartelamento na cadeia, de onde observava o trânsito constante e
desassombrado dos cangaceiros, ostensivamente senhores de tudo e de
todos. “O Tenente Salgado” que ali viera pronto e solícito a reunir-se ao
destacamento local no dia anterior à negregada tragédia, não encontrou
infelizmente apoio e solidariedade daquela força para a resistência ao ataque
que se pressentia, tendo declarado o sargento que os soldados não atirariam se
fosse realizado o assalto à cidade pelos referidos bandidos.
Rachel de
Queiroz
A história de
Chico Pereira nos chega pelas mãos da querida escritora Raquel de Queirós, que
no seu prefácio intitulado ÊSTE LIVRO, diz: ”Este livro, é um livro de padre,
mas é também um livro duro, que conta uma história imensamente dramática. Nele
não se poupa ninguém – embora não se acuse ninguém. É um depoimento que
impressiona pela honestidade – e se às vezes como obra de arte que é, alça às
puras alturas da beleza, nunca perde a severa imparcialidade que representa a
marca principal”...
Procura Raquel
concluir sua apresentação com o brilhante depoimento: “Conheci este ano a moça
Jarda. A esposa-menina de Chico Pereira. Digo moça, porque realmente ainda está
muito jovem, embora marcada por tantas tragédias. É uma mulher bonita, de fala
mansa e gestos tranquilos. Vive para os netos que lhe deu o filho engenheiro e
pelo amor dos dois outros filhos – um frade e um padre. Conversamos feito
amigas de muito tempo – e, curiosamente, Jarda não me deu a impressão da viúva
esmagada por um acúmulo de dramas; pareceu-me antes uma pessoa que lutou muito
e acabou triunfando. E os dois filhos, ministros de Deus, são a evidente razão desse
triunfo. Pois, ao encaminhá-los para o sacerdócio, ela não o fazia como uma
reparação, como um sacrifício propiciatório pelos pecados do pai. Parece ao
contrário que ela queria provar – e provou – que se o sangue de Chico Pereira
lhe deu tais filhos – quem tinha razão era ela em o amar quando vivo e lhe
venerar a memoria depois de morto. São os filhos de um guerreiro, que serviu
uma causa errada sim, mas a serviu com bravura e desprendimento e, por ela
morrendo, pagou todos os erros de que se culpara”.
Texto
apresentado pelo pesquisador e escritor Paulo Gastão em Conferência do Cariri
Cangaço em Nazarezinho, dentro do Parahyba Cangaço em junho de 2013.
Paulo Medeiros Gastão
Sócio Fundador da SBEC
Conselheiro Cariri Cangaço
http://cariricangaco.blogspot.com
http://blgodomendesemendes.blogspot.com