Por Susi Ribeiro Campos
Boa noite
amigo José Mendes Pereira, como lhe prometi, escrevo aqui algumas lembranças de
minha convivência com minha sogra Sila, ex-cangaceira de Lampião.
Após algumas
visitas que fizemos em seu lar, Dona Sila e eu sempre que possível, nos
comunicávamos por carta, inclusive ela me ajudava nos estudos sobre o Cangaço
que continuavam na escola.
Em 1980, eu
então com doze anos de idade fui passar minhas férias escolares no apartamento
de minha avó, que morava ao lado do Shopping Ibirapuera, e naquela época, ficar
dias ao lado de um Shopping, era uma maravilha para uma criança.
Marcamos o dia
e ela foi nos visitar.
Minha avó,
Elfrida Clara Alves Machado Ambrogini, era baiana, de Salvador, mas que havia
sido criada em São Paulo, onde chegou com seus pais ainda criança, por motivo de
trabalho do meu bisavô. Casou-se com
um italiano e passou a integrar totalmente a comunidade europeia.
Lembro-me que
mesmo assim sua frase preferida era:
"Ai que saudades que eu tenho da
Bahia"!
Os comentários
dos parentes que haviam ficado na Capital Baiana, seguiam os jornais da época, e
ela realmente tinha verdadeiro pavor do nome "Cangaceiro." Não foi fácil
explicar a ela que os cangaceiros não eram o que os jornais da época diziam,
mas que os jornais trabalhavam do ponto de vista do Governo da época.
Quando Sila
chegou, com ar alegre, bonita, bem vestida, perfumada como sempre foi, minha avó
não queria acreditar que se tratava de uma ex-cangaceira de verdade.
Sila e ela
enfim, ficaram muito amigas. conversaram por muito tempo sobre costura, tema
que agradava a ambas.
Sila era muito
alegre ao conversar comigo e com minha avó..., mas dentro de seu olhar, eu sentia
uma tristeza escondida, uma mulher que havia sofrido muito... lutado a vida
inteira para criar seus filhos de forma digna.
Havia
trabalhado duro ao lado do marido Zé Sereno e até mesmo se recusava a aceitar
um emprego muito bom, de costureira, em uma fábrica, pois haviam descoberto que
ela estava grávida e, segundo nos contou, se não "tirasse a criança"
nada de emprego. Mesmo
precisando muito, ela se indignou e não aceitou, estava grávida de Wilson.
Só por esse
motivo que ela deve ter mencionado a outras pessoas também, tenho tanto a lhe
agradecer, pois foi através dela que meu falecido esposo Wilson Ribeiro de
Souza, ou simplesmente Ribeiro, como gostava de ser chamado pelos amigos, veio a este mundo. Seus olhos
brilhavam de emoção ao contar suas histórias, era muito "viva", tinha
muita energia!
Era morena
clara como Wilson, cabelos ligeiramente ondulados, curtos, bem alinhados, olhos
castanhos, alta e magra, mas muito estilosa, roupas bem cuidadas, sóbria,
discreta, uma senhora Dona Sila.
Olhou minha
avó e perguntou: "- Nossa! É baiana? Tão branquinha para ser da Bahia"
ao que minha avó respondeu que apenas havia nascido em Salvador, foi criada na
Cidade fria e cinzenta de São Paulo, onde todo mundo fica branco demais, além
de ser neta de portugueses.
Lea
Ambrogini de Lima e sua filha Susi Ribeiro Campos
Foi uma grande
alegria para mim poder mostrar à minha avó (meu avô italiano já havia
falecido), a meus pais, e a toda uma escola, na época eu estudava ainda no "Colégio Maria Imaculada" no Bairro do Paraíso em São Paulo, que o Cangaço e os
Cangaceiros eram "gente igual a gente" só que com uma diferencial: Grandes Batalhadores, pessoas que sofreram muito para chegar a serem vistos sem preconceitos pelos paulistas, paulistanos, e até mesmo pelos nordestinos das grandes cidades, que os conheciam apenas "de ouvir
falar", através da mídia da época, que eram os Jornais.
Minha avó, a
qual eu chamava de Pitinha, ficou muito amiga de Sila e propôs a ela, se
poderia ser minha madrinha de Batismo, pois eu, por motivos da diferença
religiosa entre meus pais, ainda não havia sido batizada.
Esse fato
acabou por não acontecer, mas desde então, eu passei a chamá-la de Madrinha até
o fim de sua vida. Fui batizada já adulta, em São Paulo, antes de me casar com
Wilson.
Batismo de
pessoa adulta na década de noventa, se realizava de uma só vez, após um curso,
o "Batismo/Primeira Eucaristia e Crisma" de uma só vez, na Igreja Santa Maria
Goretti no Butantã/Vila Gomes.
Desculpe por
não poder lhe fornecer fotos amigo José Mendes Pereira, mas após o que
aconteceu quando fiquei viúva de Wilson, e fui completamente roubada pela
família evangélica que mencionei no primeiro texto, tudo que consegui de fotos
que tenho hoje foi recolhido nos lixões e terrenos baldios da cidade por onde
procurei.
Fotos de Sila e Dadá
Sila, Ilda
Ribeiro de Souza (há controvérsias sobre seu verdadeiro nome, e eu procuro não
entrar no assunto, pois é fruto do trabalho de pesquisadores) segundo seus
documentos pessoais, nasceu no dia 24 de outubro de 1919, sei disso, pois, posteriormente quando convivi com ela, já como minha sogra, a acompanhava ao
médico e portanto a ajudava com seus cartões e RG.
Sobre nossa
convivência "nora/sogra" lhe escreverei outro dia.
Muito obrigada
pela oportunidade, meu amigo!
Meu desejo é
que Sila hoje descanse na Paz de Deus! ELA
FOI, É, E SEMPRE SERÁ UMA GRANDE GUERREIRA ATÉ O FIM!
Com toda
admiração da nora,
Susi Ribeiro
Campos.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com