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terça-feira, 8 de outubro de 2019

FERREIRA DA GAZETA - SERESTEIRO

Por José Mendes Pereira
Ferreira da Gazeta

José Ferreira Filho nasceu em Mossoró no dia 15 de Agosto de 1946.  Quando criança fez de tudo para adquirir o sustento,  como por exemplos: levar feira, mala, dar recados, vender guloseimas, bombons e outros.

Começou a trabalhar em jornal muito jovem e no dia 10 de Junho de 2010, havia completado  cinquenta anos no ramo gráfico. Era uma das suas paixões e jamais deixou de fazer um bom trabalho; tinha interesse pelo jornalismo. Iniciou na tipografia   derretendo  o chumbo para alimentar as linotype.

Na continuidade dos seus trabalhos foi oferecido a oportunidade de aprender a operar uma linotype, máquinas que eram muito difícil para um principiante, mas sendo inteligente, logo passou a ser um dos operadores profissionais de uma delas no joranl O Mossoroense,  e foi um grande linotipista. Após sua saída do jornal "O Mossoroense" foi para a "GAZETA DO OESTE, a convite de seu fundador, Canindé Queiroz, em 1982.

E no dia  30 de Abril de 1982, foi nomeado chefe das oficinas da gráfica. Mas  como ainda tinha um acordo com o jornal "O Mossoroense", tomou posse somente no "Jornal Gazeta do Oeste", no dia 02 de Junho de 1982. Ele foi o autor da série "Nossos Valores". Devido ter trabalhado muitos anos na "Gazeta do Oeste, foi alcunhado por "Ferreira da Gazeta".
            
Nos anos setenta ele e eu trabalhamos juntos na "Editora Comercial S/A., nos dias de hoje extinta. Era uma empresa que dominava duas emissora, "Rádio Difusora de Mossoró" e "Rádio Difusora de Areia Branca", sendo que esta última foi desativada, não sei, talvez por não estar com a documentação legal. E uma rede de cinemas, "Cine Caiçara de Mossoró", "Cine Jandaia de Mossoró" e "Cine Miramar de Areia Branca".
            
No período em que nós trabalhávamos juntos José Ferreira já era linotipista, e eu fazia as confecções manuais das chapas, isto é, juntando letras por letras para fazer as composições. Posteriormente José Ferreira saiu da "Editora Comercial S/A.", e eu que já havia aprendido operar a linotype, passei a ser o linotipista da empresa, quando fazia as composições de orçamentos de diversas prefeituras do Alto Oeste potiguar.
           
Além dessas eu fazia linotipicamente a composição dos livros da "Coleção Mossoroense", uma Fundação criada pelo Dr. Vingt Rosado Maia, sendo que esta dava (quase extinta) oportunidade a diversos autores de livros, tanto a profissionais como  principiantes.

FERREIRA - ARTISTA

José Ferreira Filho não só foi jornalista como também foi um dos melhores seresteiros de Mossoró e da região. Gostava de divertir o seu cativo público em diversas casas de Shows. Tanto era amante do jornalismo como também da música.
          
Em anos remotos, na década de setenta, eu residia na "Casa de Menores Mário Negócio", uma instituição que dava assistência a menores, e era sob o domínio do "SAM" -  Serviço de Assistência ao Menor", que foi substituído pela "FEBEM", e José Ferreira Filho era casado com uma senhora irmã da Vice-diretora desta instituição. Como eu ainda aos dezesseis anos tocava pouco e ruim e não podia comprar um, tomei emprestado o seu, mas por má sorte quebrei o seu amado e zeloso violão.
            
Os dias foram se passando e eu com vergonha de falar para ele o que tinha acontecido com o seu instrumento, fiquei na moita. Mas como não havia outro jeito, contei o que tinha acontecido. Mas ele foi compreensivo e me pediu que eu mandasse consertá-lo, isso acontecia com qualquer um.
           
Procurei um marceneiro de primeira categoria e mandei consertá-lo. Dias depois eu fui entregá-lo. Não sei se foi apenas para me agradar, mas o serviço feito pelo carpinteiro foi elogiado por ele.
            
Os tempos se passaram e perdemos por completo o contato. Anos depois eu soube que ele estava fazendo serestas por essa Mossoró e região. E posteriormente o encontrei e lhe fiz a seguinte pergunta:
            
- Ferreira, quando você descobriu que é cantor?
            
Ele me respondeu o seguinte:
            
- Para te falar a verdade nem eu mesmo sei. Comecei a me apresentar por aí, o público tem gostado e eu continuo fazendo as minhas serestas.
            
José Ferreira foi sem dúvida um dos melhores seresteiros de Mossoró.
           
José Ferreira Filho ou Ferreira da Gazeta faleceu no dia 17 de Agosto de 2010, vítima de problemas pulmonares.

PALAVRAS DO POETA ANTONIO FRANCISCO


"Em um momento que quase cheguei a falecer, Ferreira fez um poema pedindo a Deus para não me levar. Hoje tenho certeza que o céu levou meu amigo por que estava precisando de pessoas boas por lá”.

Antônio Francisco Teixeira de Melo (Mossoró, 21 de outubro de 1949) é um cordelista potiguar. É filho de Francisco Petronilo de Melo e Pêdra Teixeira de Melo. Graduado em História pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). Poeta popular, cordelista, xilógrafo e compositor, ainda confecciona placas.
          
Aos 46 anos, muito tardiamente, começou sua carreira literária, já que era dedicado ao esporte, fazia muitas viagens de bicicleta pelo Nordeste e não tinha tempo para outras atividades. Muitos de seus poemas já são alvo de estudo de vários compositores do Rio Grande do Norte e de outros Estados brasileiros, interessados na grande musicalidade que possuem.
           
Em 15 de Maio de 2006, tomou posse na Academia Brasileira de Literatura de Cordel, na cadeira de número 15, cujo patrono é o saudoso poeta cearense Patativa do Assaré. A partir daí, já vem sendo chamado de o “novo Patativa do Assaré”, devido à cadeira que ocupa e à qualidade de seus versos.

POESIA DO GRANDE POETA ANTÔNIO FRANCISCO

A Casa que a Fome Mora 


Eu de tanto ouvir falar
Dos danos que a fome faz,
Um dia eu sai atrás
Da casa que ela mora.
Passei mais de uma hora
Rodando numa favela
Por gueto, beco e viela,
Mas voltei desanimado,
Aborrecido e cansado.
Sem ter visto o rosto dela.

Vi a cara da miséria
Zombando da humildade,
Vi a mão da caridade
Num gesto de um mendigo
Que dividiu o abrigo,
A cama e o travesseiro,
Com um velho companheiro
Que estava desempregado,
Vi da fome o resultado,
Mas dela nem o roteiro.

Vi o orgulho ferido
Nos braços da ilusão
Vi pedaços de perdão
Pelos iníquos quebrados,
Vi sonhos despedaçados
Partidos antes da hora,
Vi o amor indo embora,
Vi o tridente da dor,
Mas nem de longe via a cor
Da casa que a fome mora.

Vi num barraco de lona
Um fio de esperança,
Nos olhos de uma criança,
De um pai abandonado,
Primo carnal do pecado,
Irmão dos raios da lua,
Com as costas seminuas
Tatuadas de caliça,
Pedindo um pão de justiça
Do outro lado da rua.

Vi a gula pendurada
No peito da precisão,
Vi a preguiça no chão
Sem ter força de vontade,
Vi o caldo da verdade
Fervendo numa panela
Dizendo: aqui ninguém come!
Ouvi os gritos da fome,
Mas não vi a boca dela.

Passei a noite acordado
Sem saber o que fazer,
Louco, louco pra saber
Onde a fome residia
E por que naquele dia
Ela não foi na favela
E qual o segredo dela,
Quando queria pisava,
Amolecia e Matava
E ninguém matava ela?

No outro dia eu saio
De novo a procura dela,
Mas não naquela favela,
Fui procurar num sobrado
Que tinha do outro lado
Onde morava um sultão.
Quando eu pulei o portão
Eu vi a fome deitada
Em uma rede estirada
No alpendre da mansão.

Eu pensava que a fome
Fosse magricela e feia,
Mas era uma sereia
De corpo espetacular
E quem iria culpar
Aquela linda princesa
De tirar o pão da mesa
Dos subúrbios da cidade
Ou pisar sem piedade
Numa criança indefesa?

Engoli três vezes nada
E perguntei o seu nome
Respondeu-me: sou a fome
Que assola a humanidade,
Ataco vila e cidade,
Deixo o campo moribundo,
Eu não descanso um segundo
Atrofiando e matando,
Me escondendo e zombando
Dos governantes do mundo.

Me alimento das obras
Que são superfaturadas,
Das verbas que são guiadas
Pro bolsos dos marajás
E me escondo por trás
Da fumaça do canhão,
Dos supérfluos da mansão,
Da soma dos desperdícios,
Da queima dos artifícios
Que cega a população

Tenho pavor da justiça
E medo da igualdade,
Me banho na vaidade
Da modelo desnutrida
Da renda mal dividida
Na mão do cheque sem fundo,
Sou pesadelo profundo
Do sonho do bóia fria
E almoço todo dia
Nos cinco estrelas do mundo.

Se vocês continuarem
Me caçando nas favelas,
Nos lamaçais das vielas,
Nunca vão me encontrar,
Eu vou continuar
Usando o terno Xadrez,
Metendo a bola da vez,
Atrofiando e matando,
Me escondendo e zombando
Da Burrice de vocês.

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NA GRANDEZA DA SIMPLICIDADE

Clerisvaldo B. Chagas, 8 de outubro de 2019
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.195

        Caminhando pelas trilhas sertanejas, não nos escapam as margaridas do campo, as folhas orvalhadas, a saudação maviosa dos pássaros selvagens ou os rastros identificativos da fauna. Longe dos palácios, dos ouros incrustados, da ambição desumana, descobre-se e bebe-se à vontade a simplicidade da Natura na mão do Criador. Surge a reflexão da nossa jornada e o sinal verde para os passos do caminhante. Muitas vezes o homem humilde também faz parte da moldura de quem enxerga, porque a soberba não identifica o singelo que orna a existência.

CARRO DE CARNEIRO. (FOTO: PREFEITURA/DIVULGAÇÃO).
E de repente surge na estrada um artesanato vivo. Carrinho de carneiro, cópia fiel do carro de boi. Conduzindo pequena carga, as duas parelhas são conduzidas pelo carreiro com o mesmo traje adulto e seus acessórios. No carrinho está a obra prima do artesão: mesa, eixo, fueiros, chedas, cabeçalho... E os carneiros com os mesmos arreios dos bovinos. Trela, sininho, correia e muito brilho. Ali está o cambão, ligando a parelha da frente à do coice. No último fueiro vai o azeite para a cantoria do eixo, dentro do chifre pendurado. À frente o condutor – chapéu de couro de bode, facão de arrasto e vara de ferrão – parece uma criança feliz ao conduzir o seu briquedo. A vontade de quem vê a cena é de colocar carneiros e carrinho no colo e embalar.
Mas aquele carrinho de carneiros não é fato isolado. Você encontra vários na região de Olivença, São José da Tapera e Poço das Trincheiras, onde existe até festival no sítio Saco do Ramalho. Também existem carro de bode e até de jumento. Durante a Festa do Carro de Boi, no alto sertão de Inhapi, os carros mirins fazem questão de acompanhar o desfile dos grandes até aquela cidade para o magnífico Encontro dos Carreiros. Uma promoção rural entre sindicato e prefeitura com repercussão nacional. Você poderá apreciar carro de carneiro com até oito parelhas e vibrar com o tradicionalismo e as coisas mais simples do sertão.
Ô mundo véi de meu Deus!
Ô Nordeste nosso mundo!


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A DEFESA DE JARARACA


Por Honório de Medeiros


“Quem tudo compreende, tudo perdoa” (Leon Tolstoi).

No dia 9 de junho de 2017, a partir das nove horas da manhã, em Mossoró, no Fórum Municipal, atuei como advogado de defesa no júri simulado, sob a presidência do juiz Breno Valério Fausto de Medeiros, que julgaria Jararaca. Era a comemoração do aniversário da defesa de Mossoró ante o ataque do bando de Lampião. A acusação ficou a cargo do advogado Diógenes da Cunha Lima. Terminados os trabalhos o Conselho de Sentença houve por bem inocentá-lo por seis votos a um (6X1). Segue, abaixo, o texto que norteou minha participação.


1. Esta é uma história de perdão, não de julgamento. “Quem tudo compreende, tudo perdoa”. 

2. Antes, entretanto, peço permissão às senhoras e senhoras para mergulhar nas águas do meu próprio passado. 

3. Pois foi aqui mesmo, nesta Mossoró libertária, que eu nasci e cresci, ao lado da Igreja de São Vicente. 

4. Ali ficava a casa de Rodolpho, depois a de Alfredo, e em frente, a dos Hollanda. Do lado, a de Joaquim Perdigão. Atrás, a de Pacífico Almeida. No final, a de Ezequiel Fernandes. Era o chamado Bairro Novo, escassamente povoado. A todas essas casas dominava a Igreja, à sombra da qual jogávamos bola e brincávamos de bandeirinha, no mesmo chão que foi pisado pelos cangaceiros, dentre eles José Leite de Santana. 

5. Por que estiveram ali? Por que atacaram Mossoró? 

6. Por que atacaram Mossoró? 

7. Compilei quatro teorias. José Leite de Santana é fundamental para que se entenda a quarta teoria. José Leite de Santana, Ferrugem e Mormaço disseram que Lampião nunca pensou em invadir Mossoró. José Leite de Santana abriu o jogo para Lauro da Escócia. José Leite de Santana quis falar com Rodolpho Fernandes e não deixaram. José Leite de Santana por isso mesmo foi morto. 

8. Mas como falar em José Leite de Santana sem falar no cangaço? Como falar no cangaço sem falar da época no qual o cangaço aconteceu? Como falar daquela época sem recordar as condições de vida do sertanejo nordestino, fonte de onde o cangaço emanou? Como falar dessa fonte sem entender a crucial diferença entre os resignados e os que não se submeteram? Como abordar essa questão sem perceber que dentre os que não se submeteram estão aqueles que tomaram o caminho do mal, enquanto outros, o do bem? Como não compreender que nem sempre a opção pelo caminho do mal foi algo ao qual se pudesse resistir, tamanha a incapacidade de se ter, nas próprias mãos, o próprio destino? 

9. Esses são os outsiders, os irridentes, os insubmissos, os irresignados, os diferentes, os revolucionários. Esses são o sal da terra, para o bem ou para o mal. Trágico quando é para o mal, como no caso de José Leite de Santana; sublime, quando o é para o bem, como no caso de tantos aos quais devemos nosso avanço enquanto espécie. 

10. O cangaço é a história de rebeldes. Podemos subjugar rebeldes. Podemos condenar rebeldes. Podemos matar rebeldes. Mas não podemos impedir que a memória de suas existências acicate o nosso repouso envergonhado. O cangaço é a história de homens que resolveram se vingar; de homens que não aceitaram serem escravos; de homens que optaram por sobreviver SEM LEI E SEM REI, nos mesmos moldes dos desbravadores dos nossos sertões, numa liberdade absoluta, uma liberdade de fera, a liberdade da qual nos falou Hobbes em O Leviatã. O cangaço foi o último suspiro dos desbravadores do Sertão, aqueles mesmos que disputaram a terra com os índios ferozes, palmo a palmo, sangue a sangue, numa guerra contínua e esquecida do resto do mundo. A guerra dos bárbaros. 

11. José Leite de Santana foi assim. Percebemos isso em seu olhar na célebre fotografia tirada na prisão em Mossoró. Passei muito tempo olhando para a fotografia. Ali não estava apenas o olhar de quem está ferido. Ali estava, muito mais que isso, o olhar de quem foi subjugado à força, mais uma vez. É o olhar de uma fera de quem tiraram sua liberdade. É o olhar de quem vai morrer. 

12. José Leite de Santana já nasceu subjugado, e contra essa subjugação lutou até o último instante: nasceu bastardo, pobre, preto e desvalido. Um infame. Infame antes mesmo de ser um homem mal. 

13. Não se trata de dizer que o meio fez a escolha dele. Não podemos cair nessa armadilha. Ele escolheu seu caminho. Outros fizeram opções diferentes. O comum dos mortais escolheu vergar sob o peso da escravidão diária. Pagou por isso. Mas antes mesmo da escolha, o destino já o tinha jogado na lata de lixo dos dejetos humanos. 

14. Como julgar José Leite de Santana com os nossos olhos? Um homem que não tinha o que comer, se não chovesse, e não chovia; não tinha médico; não tinha dentista; não tinha transporte; não tinha estudo; não tinha dinheiro; não tinha passado, não tinha presente, não tinha futuro, não tinha nada. 

15. Pois foi este homem, refugo da vida, que nos permitiu levantar um pouco a cortina, o véu que esconde a verdade dos fatos, morreu violentamente e o povo o transformou em herói e o santificou. 

16. Herói por que ousou a coragem da loucura ou a loucura da coragem de viver sem lei e sem rei, os últimos deles. 

17. Santo por que intercede, lá entre os acolhidos pela infinita bondade de Deus, pelos que sofrem, para assim purgar as dores que causou neste mundo de miséria e sofrimento. 

18. Não é possível ver-se nas intercessões dessa alma torturada a quem o julga lá no Alto, em defesa dos que ficaram para lhes minorar a dor, um pedido de perdão por todo o sofrimento que causou quando vivo? 

19. Não é ele um dos cainitas, dos quais nos falou Herman Hesse, um dos escolhidos por Deus para ser as trevas que valorizarão a luz? 

20. Por que não podemos perdoá-lo, se perdoamos São Paulo; Pe. Cícero; Santo Agostinho; Maria Madalena; São Longino, o chefe dos soldados romanos que, no caminho para a crucificação de Jesus, perfurou o peito dele com uma lança? 

21. Somente a Santa Igreja pode, pelo Princípio Petríneo das Chaves, dizê-lo oficialmente santo. Mas assim como Padre Cícero, para o povo, ele já o é. 

22. Se o condenamos hoje, condenamo-lo novamente; se o absolvemos estamos a ele ofertando o nosso perdão. 

23. Reconstituamos os últimos dias de José Leite de Santana: 13 de junho, final da tarde: é ferido; 14 de junho, pela manhã: é traído por Pedro Tomé; à tarde: concede a célebre entrevista a Lauro da Escócia; o ordenança do sargento Kelé tenta lhe arrancar o dedo, para ficar com um anel; 15 de junho: identifica os cangaceiros na foto de José Octávio; 16 de junho: o Tenente Laurentino de Moraes viaja para Natal; 17 de junho: o Tenente Laurentino volta de Natal; 18 de junho: o laudo cadavérico é assinado pelo Juiz Eufrásio Mário, pelo Tenente Laurentino de Moraes e por Dr. João Marcelino; 19 de junho: manda pedir para falar em particular com Rodolpho Fernandes; 20 de junho, naquela noite tenebrosa, às 23 horas, mais ou menos, é assassinado sob a vista dos Tenentes Laurentino de Moraes, Abdon Nunes e João Antunes; Sargentos Pedro Sylvio, João Laurentino Soares, Eugênio Rodrigues; Cabos José Trajano e Manoel; soldados Militão Paulo e João Arcanjo; motorista Homero Couto. 

24. Coube aos soldados o trabalho sujo, como coube quando mataram Lampião, na degolação de Maria Bonita ainda viva. As volantes eram semelhantes ou piores que os cangaceiros. 

25. Dirá depois Luiz da Câmara Cascudo: “Ferido de morte, acuado como uma fera entre caçadores, impassível no sofrimento, imperturbável na humilhação como fora em sua existência aventurosa e abjeta, herói-bandido, toda a valentia física e a resistência nervosa da raça de índios e dominadores dos sertões, reviviam nele, empoçado no sangue, vencido e semimorto. Aquela força maravilhosa, orientada para o crime, dispersava-se lentamente..." 

26. Absolvamos o cangaço e perdoemos José Leite de Santana. Ou, melhor, perdoando José Leite de Santana, absolvamos o cangaço.

Jararaca preso e ferido na Cadeia Pública de Mossoró, algum tempo antes de ser morto pela polícia, no cemitério de Mossoró, na noite de 20 de junho de 1927.


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A FESTA DE SÃO SEBASTIÃO EM BONSUCESSO: PROJETO DE RECONHECIMENTO COMO BEM RELIGIOSO, HISTÓRICO E CULTURAL DE NATUREZA IMATERIAL

*Rangel Alves da Costa

A bela e atraente povoação ribeirinha de Bonsucesso, surgida em longínquos tempos às margens do Rio São Francisco, no atual município sergipano e sertanejo de Poço Redondo, possui uma característica peculiar na sua religiosidade. É devotada, ao mesmo tempo, a três santidades: Nossa Senhora do Rosário, padroeira oficial, São Sebastião como co-padroeiro, e ainda São Francisco, como patrono das águas e da vida do povo ribeirinho.
A escolha de Nossa Senhora do Rosário como padroeira da povoação surgiu principalmente como reconhecimento à devoção pela santa de uma importante família desbravadora da região. Contudo, muitos afirmam que também como assimilação de Bonsucesso, no Rio de Janeiro, cuja padroeira é Nossa Senhora do Rosário. Na povoação ribeirinha sergipana, a comemoração da santa ocorre no dia 07 de outubro.


Mas é São Sebastião o santo verdadeiramente enraizado na cultura popular e religiosa da população de Bonsucesso. E tanto assim que a festa em sua devoção, alongando-se pelo mês de janeiro, além dos cultos e ofícios religiosos, também transforma o Velho Chico como altar de louvor e preces, com eventos em suas águas e suas margens. Acerca do seu histórico, assim ensina o cientista religioso e cidadão ribeirinho Klaiton Santos Gomes:
“A devoção a São Sebastião, no Povoado Bonsucesso teve seu início nos idos de 1910, quando a povoação passou por um surto de doença denominada peste, pelos moradores. Segundo narram alguns moradores, um negro de nome "Culodino", vindo da cidade de Propriá, chegou a Bonsucesso com a imagem do Glorioso Mártir São Sebastião. Chegando às terras de Bonsucesso cessou tal doença, e muitas curas e milagres foram atribuídos à pequena imagem de madeira de aproximadamente 70 cm, que ao longo do tempo foi arrastando fiéis de várias partes do Estado de Sergipe e outros estados, que vêm à povoação em 20 de Janeiro para agradecer pelas graças alcançadas.
É de suma importância destacar que, provavelmente a devoção a São Sebastião, também tenha fortes indícios de estar ligada ao "Sebastianismo", onde a figura central é o rei de Portugal Dom Sebastião. Quando rei de Portugal foi Dom Sebastião quem provavelmente difundiu a devoção a São Sebastião na cidade do Rio de Janeiro, originariamente fundada com o nome de Cidade de São Sebastião, por ser o santo seu onomástico, trazendo uma imagem do mesmo ao Rio e o tornando padroeiro local. A partir daí se difundiu em todo o Brasil e principalmente no Nordeste, chegando a Bonsucesso.
Um dos marcos desta devoção em Bonsucesso foi o centenário da chegada da primeira imagem de São Sebastião. Todas as comunidades da Paróquia Nossa Senhora da Conceição de Poço Redondo vieram festejar com a comunidade local o grande dia, quando todos, em fervorosa manifestação de fé, celebraram os 100 anos de devoção a São Sebastião”.
Pois bem. O entrelaçamento de fé e devoção entre o povo ribeirinho de Bonsucesso e São Sebastião foi tomando aspirações tão grandiosas que agora o seu povo, com as bênçãos da igreja e das comunidades de pescadores e dos povos do rio, agora proclamam uma luta maior: o Reconhecimento da Festa de São Sebastião como bem histórico e cultural, de natureza imaterial. Quer dizer, a busca da preservação, através de lei e da parceria entre sociedade e Estado, de tão importante manifestação religiosa.


É no sentido de dar formalização a um projeto de reconhecimento dessa potencialidade religiosa, histórica e cultural de Bonsucesso, que a comunidade está unindo forças para que a aspiração popular se transforme em lei. Como norteamentos preliminares, e sob o comando de Quitéria Gomes, Klaiton Santos Gomes, Damião Rodrigues Feitosa, Manoel Belarmino, Erionésia Correia e Rangel Alves da Costa, dentre outros da comunidade, é que reuniões preparatórias serão realizadas, tendo um primeiro encontro já tendo acontecido no último dia 4, com a próxima reunião marcada para a noite de sexta, dia 11, em Bonsucesso.
O objetivo maior será, portanto, que a Festa de São Sebastião em Bonsucesso não continue apenas como um evento de calendário, mas como manifestação religiosa legalmente preservada e mantida sob a proteção da comunidade, da igreja, do município e do Estado.

Escritor
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CORDEL - A CONFISSÃO DE ANTÔNIO SILVINO

De Leandro Gomes de Barros

Antônio Silvino, um dia,
Pensava na sua vida,
Dizendo: - Minha existência
Neste mundo foi perdida
Eu perco a graça do eterno
E o carrasco do inferno
Me espera de mão erguida!

Dessa vez, encontrou um padre,
Entrando em conversação.
Disse o padre: - Não se entregue
A tal desesperação!
Jesus, nosso salvador,
Não despreza o pecador
Tá no céu de prontidão!

Do acervo do José João Souza

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GIULIA TOFANA, A ASSASSINA DE MARIDOS (1600-1659)


Se você pensa que Elizabeth Bathory ou Aileen Wuornos foram as maiores assassinas em série da história está equivocado. A partir de agora vamos lhe apresentar a história de uma envenenadora italiana chamada Giulia Tofana, que viveu no século XVII, e que é considerada por muitos pesquisadores como a assassina feminina mais prolífica da história.

As mulheres ao longo da história tiveram pouco controle sobre suas vidas. Apesar de algumas figuras terem se destacado ao longo dos séculos, de modo geral, as mulheres tinham muito pouco poder financeiro, social ou político.

As filhas da nobreza eram tratadas como propriedade por seus pais e maridos, seu casamento era usado para intermediar negócios ou selar alianças políticas. Enquanto isso, as mulheres de classes mais baixas estavam frequentemente presas em casamentos abusivos e sem amor.

Embora o homem também estivesse submetido aos mesmos ditames sociais, podemos sem sombra de dúvida afirmar que a situação feminina neste contexto era mais delicada e sujeita a vulnerabilidade.

Como já citamos, as mulheres eram primeiro propriedade de seus pais e depois de seus maridos. Em segundo lugar, porque se um marido maltratava sua esposa, abusava dela tanto psicológica, sexual ou fisicamente, a mantinha na pobreza, a prostituía ou a colocava em risco com gravidezes constantes, não havia divórcio e nenhuma proteção legal.

A única maneira de uma mulher se livrar de um casamento ruim era a viuvez. E foi justamente essa situação que possibilitou que Giulia Tofana se tornasse provavelmente a assassina mais prolífica da história. Temos poucas informações confiáveis sobre essa enigmática personagem.

Nascida em Palermo, na Itália, por volta de 1600 ou 1620, Giulia Tofana foi descrita muito bonita, assim como sua mãe Thofania d’Adamo, que foi executada em julho de 1633 por matar o marido. Seria a mãe de Giulia vítima de abusos do marido? Porque ela o matou? Não sabemos, mas isso pode nós dar um vislumbre das ideias e conceitos que permeariam a mente de Giulia.

Afirma-se que Giulia passou muito tempo em companhia de farmacêuticos, e esteve presente quando estes elaboravam suas poções. Ela provavelmente aprendeu suas primeiras lições com os mesmos, mas também podemos cogitar a possibilidade da maior parte dos conhecimentos de Giulia advirem de sua mãe.

O que se sabe é que Giulia tornou-se uma envenenadora profissional, ajudando mulheres infelizes a obter “divórcios” precoces. Não sabemos quando ela abriu o seu “negócio” exatamente, mas de acordo com sua confissão, isso aconteceu em 1633 e ela logo adquiriu uma grande clientela. Enquanto a maioria das mulheres permanecia em silêncio diante de injustiças e abusos, nem todas as mulheres toleraram tal situação.

E Giulia oferecia uma saída, por mais controversa que fosse. Ela concedia liberdade por assassinato com Aqua Tofana – um veneno indetectável que matava e mata até hoje o homem mais robusto. Sua composição exata é desconhecida, mas sabe-se que o arsênico, a beladona e o chumbo eram componentes da mistura; ingredientes que também eram usados nos cosméticos da época.

Dizia-se que a mistura não tinha odor, cheiro ou sabor, o que tornava o envenenamento muito difícil de ser detectado, tanto em vida quanto em morte. Sendo assim, era muito fácil para uma esposa infeliz depositar a mistura na bebida ou comida do marido. Posteriormente poder-se-ia alegar um mal súbito.

Giulia distribuiu o seu “produto” de duas formas: disfarçado de maquiagem em pó ou escondido em pequenos frascos exibindo imagens de Nicolau de Mira.

Giulia praticou seu ofício furtivamente por décadas, mas precisamente entre os anos de 1633 e 1651. Ela viveu em Palermo, depois em Nápoles e finalmente em Roma. Durante esse período, ao lado de sua filha, Girolama Spera, calcula-se que ela teria sido responsável indiretamente pelo assassinato de mais de 600 homens.

Mas tudo veio por água abaixo no ano de 1659, quando as atividades de Giulia acabaram sendo descobertas, graças à indecisão de uma cliente. A mulher em questão impediu que o marido ingerisse uma sopa envenenada. O homem desconfiado exigiu saber o porquê. Ela então revelou todos os detalhes de sua trama, incluindo o nome de seu fornecedor.

A revelação logo chegou aos ouvidos das autoridades. Logo, a notícia se espalhou por todo o país. Uma caçada humana se seguiu. Giulia teria se escondido em uma igreja clamando santuário, mas logo os cidadãos de Roma invadiram o local a arrastando para longe. Eram motivados pelo boato de que ela havia envenenado a água dos rios e poços.

Giulia Tofana confessou sob tortura, realizada pelas autoridades papais, ter matado cerca de 600 homens no período de 18 anos entre 1633 e 1651. Ela também forneceu os nomes de seus clientes e colaboradores. O caso foi um verdadeiro escândalo na época.

Giulia Tofana e sua filha, juntamente com sua equipe de funcionários, foram executadas em julho de 1659 no Campo de Fior. Alega-se que seu corpo teria sido devolvido para a igreja que a abrigou.

Alguns dos que ela nomeou conseguiram fugir, mas muitos foram capturados e executados. Os mais influentes e mais ricos foram silenciosamente mortos na prisão ou se livraram das acusações mediante suborno. Muitos fingiram ignorância sobre o veneno, alegando que compraram pensando tratar-se de um cosmético. Os menos sortudos, ricos ou inteligentes foram enforcados ou encerrados nas masmorras do Palazzo Pucci.

Embora a maioria das pessoas discordem do fato de Giulia e suas clientes usarem o assassinato como única opção de se livrarem de companheiros abusivos e seguir em frente, as mesmas reconhecem que suas ações criminosas tinha o intuito de melhorar suas condições de vida. No entanto, outros vão mais além elevando Giulia Tofana ao status de heróina e justiceira. Qual é a sua opinião sobre o caso? Deixe nos comentários!

Este artigo foi redigido por Fernanda da Silva Flores

A autora permite a livre divulgação deste texto e a tradução integral ou parcial do mesmo, sem alterações ou falsificações, para outras línguas desde que seja citada a fonte e a autoria.

Aviso:

Este artigo foi escrito da maneira mais isenta possível, de acordo com as informações coletadas de nossas fontes, que estão compiladas logo abaixo. Se deseja saber mais sobre o tema abordado aconselhamos que você pesquise mais a fundo. Não defendemos ideologias ou posicionamentos políticos em nossos trabalhos. Somos a favor de um trabalho ético e transparente para com os nossos leitores e seguidores. Se deseja entrar em contato envie um e-mail para: asrainhasmalditas@gmail.com. Você será respondido o mais breve possível.

Revisão textual de Wesley Oliveira Lima.

Fonte:

HARVEY, Ian. The Most Prolific Female Assassin in History. Disponível em: <https://www.thevintagenews.com/2018/10/22/giulia-tofana/>. Acesso em: 2. out. 2019.

TILSTRA, Elisabeth. The Deadly Elixir of Giulia Tofana. Disponível em: <https://the-line-up.com/giulia-tofana>. Acesso em: 2. out. 2019.

Giulia Tofana Poisoned 600 Men – Beautiful Sicilian Woman And Her Deadly Mission. Disponível em: <http://www.ancientpages.com/2018/02/22/gulia-tofana-poisoned-600-men-beautiful-sicilian-woman-deadly-mission/>. Acesso em: 2. out. 2019.


Extraído do blog saiba história do do professor AdinalzirLamego.


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BENJAMIN ABRAÃO

Acervo Moustafá Veras

BENJAMIN ABRAÃO! A HISTÓRIA DO CANGAÇO DEVE MUITO A ESSE HOMEM.


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BORNAL ENSINADO POR DADÁ

Por Indaiá Santos


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OS CANGACEIROS DE VERDADE!

Por Marcos Nogueira

Ao me referir ao filme “Os Cangaceiros”, que no ano de 1953 foi levado às telas, algumas  lembranças relacionadas com essas figuras legendárias me vieram à memória. O épico nordestino mostrou Lampeão como um líder nato, justo com seus comandados, porém violento e insensível com os demais, aos quais aplicava suas próprias leis. Talvez no filme o tenham retratado muito mais fielmente do que se possa imaginar.

De fato Lampeão e seu bando levavam pavor aos ermos lugares dos sertões nordestinos, justificando a perseguição policial que lhe dedicaram os governos da maioria dos Estados daquela região.

O semi-árido sertão nordestino.
A caatinga predominante no sertão nordestino.

Para minha surpresa durante a fase jornalística de meu tio e sogro Luiz Nogueira Filho, com 25 anos, entre seus artigos publicados no “O Serrinhense”, jornal de sua cidade natal, havia um datado de 12 de abril de 1931 cuja manchete “Inacreditável Indiferença”, demonstra claramente o que representava Lampeão e sua gente para a população da região.Vamos acompanhar alguns trechos dessa reportagem feita por quem testemunhou tais acontecimentos naquela época.

“Há poucas horas que estou em Queimadas e já posso auferir do pavor que assalta a sua pacata população, na iminência de sofrer a segunda investida do famigerado bando de Lampeão. Em poucos minutos que privei com alguns elementos representativos locais, senti a angústia que a todos domina com as notícias recebidas pelo delegado local cap. Antonio Ferreira de Araujo, transmitidas que foram por seu colega de Itiúba de que o bandido toma rumo desta vila.”

Em seguida Luiz descreve as providências de socorro que em vão são solicitadas ao governo da Bahia, resultando na manchete de seu artigo. Fica ainda mais claro o que se pensava do bando de Lampeão ao continuarmos a ler a reportagem.

“Aproxima-se de uma localidade a horda de bandidos, o grupo de assassinos salteadores do século XX; a autoridade local, sem elementos para enfrentá-la apela para o Chefe de Polícia (...) e não consegue arrancar uma palavra de quem tem a obrigação de atendê-la em tão difícil situação.”

Refere-se aí o jovem repórter à solicitação do reforço de apenas nove homens armados a mais, já que regularmente essas cidades possuíam no máximo três policiais, além do delegado, para os ajudar no caso de enfrentamento com o bando de cangaceiros. Conclui o jornalista nato sua longa e indignada reportagem com a frase “...O Nordeste debate-se nas malhas de um crime sem precedentes, (...) enfrentando bandoleiros que zombam da polícia baiana, da mesma forma que os poderes estabelecidos zombam de seus constantes apelos e clamores.”

Lampeão (primeiro da esq.p/dir.) em Pombal - 1928

Em outro número desse mesmo periódico datado de 28 de dezembro de 1928, encontramos sob a manchete “Lampeão fazendo um raid automobilístico – suas declarações em Tucano” uma raríssima entrevista com Virgulino Ferreira o Lampeão, tratado como “capitão”, na qual ele tenta explicar e até justificar a causa de sua marginalidade. Acompanhemos alguns trechos.
 
– Que idade tem o capitão?

- Tenho 28 anos de idade.

- Há quantos anos vive em luta?

- Há 14 anos.

- Quais os motivos que levaram o capitão a abraçar essa vida acidentada e perigosa?

- Questões de família e sobretudo o assassinato de meu pai. Meu pai não sabia manejar uma arma. Possuía um criatório regular e isso despertou a cobiça de um vizinho nosso que não nos olhava com bons olhos. De uma feita quando meu pai reunia o gado foi atacado traiçoeiramente por esse vizinho. Assassinado meu pai fui para a companhia de um tio, que abandonei quando atingi a idade de 14 anos, para executar meu plano de vingança e de lá para cá não abandonei mais a vida do cangaço.”

Adendo: http://blogdomendesemendes.blogspot.com

"A data de 14 anos não bate com a real data do cangaceiro Lampião. Quando o seu pai foi assassinado ele já passava dos 22 anos".

Em outro trecho lhe é perguntado o porquê de haver se retirado de Pernambuco, ao que ele responde:

“- Eu lhe conto. Em Pernambuco até as folhas das árvores são minhas inimigas. Lá, quando eu dormia ou descansava embaixo de uma árvore, sempre trazia uma bala na agulha de minha carabina receando que caísse sobre mim alguma “folha inimiga”. (...) Eu sei que esta vida não é lá muito boa, mas se tenho sofrido, em compensação, tenho gozado bastante. E o que é a vida? Sofrer e gozar.”

O município de Tucano é vizinho ao de Serrinha, terra dos Carneiro Ribeiro e dos Nogueira, conhecidos por sua retidão, valentia e destemor. Talvez por essa razão a última pergunta feita pelo repórter ao capitão Virgulino.
    
“- O capitão não receia que uma força lhe ataque inesperadamente nesta vila?

- Qual nada, em Serrinha o destacamento conta 9 praças e eles não virão até cá.”

Por alguma razão Virgulino mesmo com seu bando em maior número, evitou entrar em Serrinha. Dando por encerrada a entrevista resta ao jornalista observar a retirada do bando e seu líder acomodados na carroceria de um caminhão que haviam “requisitado rodando pelas ruas desta vila entoando canções despreocupados, felizes, inteiramente alheios aos comentários da população que assistia a esse quadro inétido, como se fora um sonho irrealizável.” Palavras no repórter.

Uma outra entrevista julho de 1928 no jornal “O Povo”, trazia a seguinte manchete e chamada de primeira página: “A palavra de Lampeão – O monarca selvagem dos sertões” e complementava com a frase do chamado “jaguar bravio do nordeste” - “Não sou cangaceiro por maldade minha, mas pela maldade dos outros...” 

O Governo da Bahia na tentativa de conseguir conter Lampeão, chegou a publicar e distribuir anúncio de recompensa por sua captura, tal qual se fazia no velho oeste americano.

Recompensa de 50 contos de réis, pequena fortuna na época.
Grupo de Cangaceiros em Mossoró.

Há apenas uma contradição no filme, que assisti quando garoto, talvez para mostrar o cangaceiro como cowboy ao estilo americano, a grande quantidade de cavalos utilizados como montaria pelo grupo de Lampeão. Pela entrevista acima, o bando ao deixar a localidade em que se encontrava saiu sobre a carroceria de um velho caminhão, o que demonstra a ausência desses animais devido certamente à dificuldade em mantê-los, nessa região tão carente de pasto e água. Em nenhuma das fotos feitas por Benjamim Abraão, que se juntou ao bando para reportar e filmar com a permissão de seu líder, se vê tais montarias. No máximo em alguma oportunidade poderiam se valer de pequeno grupo de resistentes jegues, mas apenas para carregamento de mantimentos, um companheiro ou companheira adoentado além de outros apetrechos desses verdadeiros nômades sertanejos.

O fotógrafo confraternizando com Lampeão.
O pequeno e resistente jegue, típico animal de carga do nordeste.

A morte de Lampião não foi por acaso, ele foi vítima de uma manobra policial que deu certo entre tantas outras frustradas. Como não era fácil de ser encontrado, quem ajudasse de alguma forma para sua localização, era sustentado a peso de muito dinheiro e sabia muito bem que se fosse descoberto e delatado, ou se fracassasse na tentativa de sua captura, pagaria bem caro com a vida sua e de seus familiares. Desse modo a chamada “Volante”, grupo composto de quase trinta homens que perseguia os cangaceiros, comandado por um certo tenente Bezerra, da Força Alagoana, conseguiu por meio de informantes da região cercar o bando de cangaceiros já reduzido, por deserção ou morte, na madrugada de 28 de julho de 1938, num lugar denominado de “Grota do Angico” em Sergipe. Surpreendidos enquanto dormiam em mais um acampamento, onze cangaceiros foram mortos entre eles Lampeão e Maria Bonita. Os que conseguiram fugir se embrenharam na caatinga e viveram escondidos por vários anos. Alguns foram presos ou se entregaram à policia, outros mais tarde seriam descobertos já idosos e senis.

A volante, alguns soldados eram disfarçados de cangaceiros.
A Grota do Angico, local onde dormiam e foram surpreendidos pela Volante.
Presos ou anistiados. Cobra Verde, Vinte e Cinco, Peitica, Maria Jovina,
Pancada, Vila Nova, Santa Cruz e Barreira, (advogado?)

Como havia a necessidade de se apresentar provas definitivas de que o bando havia sido dizimado, o tenente Bezerra ordenou que as cabeças dos mortos fossem decepadas e colocadas em latas com sal para serem transportadas com a finalidade de exibi-las em praça pública. Por fim foram mumificadas e mantidas em exibição pública por vários anos no museu Nina Rodrigues, no prédio que ocupava no Centro Histórico da Cidade do Salvador, próximo ao Pelourinho. Em 1967 estive por lá e pude visualizar essa terrível exibição.

De baixo para cima, Lampeão, Quinta-Feira, Maria Bonita e Luiz Pedro,
Mergulhão, Elétrico e Caixa de Fósforo, Enedina, Cajarana, não conhecido e Diferente)

Nos dias de hoje tais exemplares macabros já não mais são vistos. Longa demanda jurídica de descendentes dos onze cangaceiros mortos, conseguiram que fossem definitivamente sepultadas com alguma dignidade, como merece qualquer ser humano.

Caros seguidores e visitantes.

Como podem constatar, recebi uma informação do Sr. Everton Francisco que vem enriquecer nossa publicação com uma preciosa e rara imagem do grupo de cangaceiros em seus cavalos, o que achava ser apenas uma leitura cinematográfica dessa prática.
Como ele mesmo nos informa, da direita para a esquerda estão
o cangaceiro Ezequiel e marcado com uma cruz Lampeão.

Ainda há quem afirme que o chefe do bando teria se evadido do local do massacre momentos antes da invasão e até que, por motivos políticos, a notícia do fim do bando de Lampeão teria sido forjada para evitar o desgaste moral da força policial que os perseguia. Esta parece ser uma longa polêmica em torno do assunto, com alguns tentando fazer da figura de Lampeão um herói enquanto que documentalmente por meio de jornais da época, como na reportagem de Luiz Nogueira Filho, foi apenas um fora da lei quadrilheiro que roubava, matava e se arvorava de justiceiro.

Lampeão, Maria Bonita e seu bando de cangaceiros.

O tema Cangaceiros, Cangaço e o agreste do sertão, também serviu para que artistas nordestinos demonstrassem, cada um a seu modo e com o passar dos anos, a sua arte simples e expressiva.

Xilogavura de J. Miguel, famoso artista popular nordestino.
Bonecos de argila inspirados nos cangaceiros, arte inspirada nos
trabalhos de Mestre Vitalino.
Xilogravura para a literatura de cordel.
Arte modernista com o tema do cangaço de artista ignorado.

(Imagens e fotos de Benjamim Abraão no Google).

Caros seguidores e visitantes.

Como podem constatar nos comentários, o Sr. Everton Francisco nos esclarece acerca do uso de cavalos pelos cangaceiros. Como não havia encontrado referência a essa prática, imaginei que se tratava apenas de uma leitura cinematográfica a caravana que circulava pelo sertão. Para melhor ilustrar o que disse nos fornece uma rara e bonita imagem do grupo em seus cavalos.


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