Por: Ednilto Neves
Luiz Campos,
aos 73 anos, sente dificuldades para escrever ou recitar: ‘Estou cego, meu
filho’, brinca
Luiz Campos é
uma figura ímpar no meio literário norte-rio-grandense, com uma vida dedicada à
poesia e à cantoria, mas também um homem que sente o peso da idade, depois de
tantas experiências, de muitos poemas escritos e rasgados, de muitas desilusões
e amores fortuitos.
Sentado numa
cadeira, a escutar um noticiário de uma rádio local, o poeta nos recebe para
uma conversa descontraída – como devem ser os diálogos com Luiz Campos – e uma
boa pitada de sarcasmo. “Não tomo café... me ofende mais que uma dose de
qualquer coisa”, brinca.
Na sala, um
freezer enferrujado traz a antiga logo da Pepsi e, sobre ele, alguns copos.
“Estava ouvindo o noticiário. Ultimamente, tenho sonhado muito com o papa... Há
três noites que sonho com ele, com aquela roupa branca, aquela estola amarela,
sentado num trono, e também tenho visto vultos, ouvido vozes. Isso tudo é muito
espiritual, não acha?”, e sorri, irônico. “Certamente, o papa não quer me levar
com ele. Ave Maria!”, diz.
“Tirando as
brincadeiras”, o poeta, aos 73 anos, continua afiado, mas sem escrever, pois a
visão está quase comprometida. Antes, os versos que vinham à mente eram
recitados e um pequeno gravador captava o poema. “Mas esse gravador quebrou e,
desde então, estou sem produzir muita coisa, quase nada... também passei por uns
momentos difíceis, mas sou um cara que não gosto de estar perturbando ninguém.
Em termos de publicação, estou sem condições de escrever ou publicar qualquer
coisa. O que eu tenho são cordéis que já foram publicados. Não tenho mais
livros para vender. Todos foram comprados”, fala.
Durante a
reportagem, várias pessoas o saudaram na calçada. “Poeta Luiz Campos!”, dizia
um; “grande Luiz!”, repetia outro... “Não vejo quem é, apenas falo. São pessoas
que me ouviram cantar em algum lugar ou mesmo leram meus poemas”, comenta.
O poeta
lamenta, porém, sobre uma de suas piores sensações: a de morar sozinho. “Não
foi por escolha, foram as coisas e os acontecimentos que me levaram a morar
sozinho. A solidão é muito ruim, uma coisa que nos massacra. Mas acredito que,
depois de tudo, é isso, realmente, o que eu mereço... não acho que Deus seja
injusto comigo, pelo contrário: ele é e sempre será um Deus justo. Eu tenho o
que mereço, nesse sentido”, salienta, frisando que a vida do poeta não pode ser
fácil.
Adepto da
visão clássica de que grandes poetas foram grandes sofredores e passaram por
momentos difíceis em suas vidas, Luiz Campos se apega a esse conceito e
justifica: “As pessoas elogiam muito os poetas, mas não ajudam na divulgação de
seus trabalhos, deixando-os alheios a qualquer coisa. Sempre foi assim. Os
grandes poetas viveram e sofreram muito. A vida do poeta é sofrida, cheia de
sacrifícios e sofrimentos. Segundo o que eu já li, desde o começo do mundo que
os poetas são sofredores”, diz. “Nenhum grande poeta que eu conheci gozou de
regalias. Agora, os poetastros, esses, sim, são picaretas. Conheço um bocado”,
ironiza. “Os verdadeiros poetas acabam, de certa forma, no esquecimento,
abandonados... como Pinto Monteiro, por exemplo”, exemplifica.
Interrompido
por uma vendedora, Luiz brinca: “Nem olho pro café!” e compra tapiocas.
“Conheço Luiz Campos desde muito tempo, das Cajazeiras”, fala a vendedora. “Ele
é um poeta conhecido”, frisa.
Luiz sorri com
a simpatia da desconhecida. Fala que, sempre que pode, compra para “ajudar ao
pessoal, que está aí na batalha da subsistência”.
A solidão,
essa companheira inseparável...
Mesmo se
sentindo só e com a visão comprometida, o poeta nunca perdeu o bom humor. “Não
sou um cara fechado”, diz, sorrindo, enquanto oferece uma cadeira para o
repórter-fotográfico Ednilto Neves. “Por aqui já passaram grandes nomes da
poesia nordestina. Alguns, hoje, quando vêm a Mossoró, sequer passam por aqui”,
explica. “Esta casa foi quem fez os grandes cantadores. Ivanildo morou aqui,
Luiz Pereira, Luiz Antônio, Antônio Lisboa (que eu criei, pois chegou aqui
ainda menino e ganhou o seu primeiro dinheiro com cantoria ao meu lado) e
tantos outros poetas e cantadores dos bons que estiveram aqui comigo. Como
disse, infelizmente muitos se esquecem da gente, mas alguns se lembram, como
Ivanildo, que sempre que pode aparece por esses lados e até me deu a honra de
me ouvir cantar, já agora, recentemente, quando me apresentei ao lado de Cícero
Nascimento. Ele reconhece meu trabalho, lê meus poemas e divulga minha obra”,
comenta, agradecido.
Aposentado,
Luiz Campos divide seus dias entre algumas caminhadas, conversas com amigos e
diversões eventuais, como ir a alguns eventos, mesmo com todos os problemas de
saúde. “O que me machuca mais é a solidão. No resto, estou em paz. Minha
solidão é meu castigo, pois durante minha vida deixei muitas mulheres apenas
por vaidade e isso pode ter sido o motivo. Também brinquei, juntamente com João
Liberalino, certa vez, com a doença de Elizeu Ventania: passamos perto dele,
batemos nele, de leve, e não falamos. Ele não nos reconheceu, pois já estava
perdendo a visão. Eu e João sorrimos. Não foi uma brincadeira boa. Hoje não
estou do mesmo jeito? Manguei dele e estou do mesmo modo”, confessa.
Para ele, quem
mora sozinho é discriminado. “Não discrimino nem critico; o ruim é assumir a
qualidade do criticado. Moro sozinho e não posso fazer nada quanto a isso.
Também não canto mais e nem posso viajar, devido aos problemas de saúde. Dentro
da cidade, se tiver transporte para me levar em cantorias, até posso me
apresentar. Qualquer pequena viagem de táxi custa certo dinheiro. Às vezes nem
compensa participar, pois não sabemos o que a cantoria vai render”, explica
Luiz Campos.
VIVER
INTENSAMENTE
Para o poeta,
a vida deve ser vivida intensamente. “Tive dezessete mulheres que moraram aqui.
Tenho, nos dezoito Estados que andei, um filho em cada um. Já fui muito boêmio
e, nesse sentido, não tenho do que reclamar”, fala, relembrando alguns períodos
da vida de poeta. “Vivi intensamente, meu filho... aos 73 anos, posso dizer que
vivi muita coisa. Quando a solidão vem, pego de um copo, tomo alguma coisa e me
esqueço. Ela, pelo menos, alivia a solidão, mesmo quando os versos me vêm à
noite e, depois, passam, porque não tenho como registrá-los. Lamento essa parte
e também lamento não ter sido reconhecido por muitos, pois vejo muitas pessoas
ganhando dinheiro às minhas custas, com meus poemas, reproduzindo e vendendo,
sem minha autorização. Tive alguns problemas com alguns poemas clássicos meus,
como Me enganei com minha noiva, que muita gente reproduz sem, ao menos, me
solicitar nada. Isso tem sido uma chateação. Também já vi muita gente fazendo
DVD com meus versos e, claro, ganhando dinheiro”, critica.
No Recife, o
cordel Julgado pelo destino, onde o poeta narra suas desilusões, está sendo
negociado. “Soube por um amigo que muitas pessoas estão comprando esse cordel
lá, mas não mandei nada para Recife”, observa, enquanto dedilha a viola,
companheira de muitos anos...
http://www.gazetadooeste.com.br/cultura-a-solidao-do-poeta-luiz-campos-8780
Crispiniano Neto - no seu livro poesias com Luiz Campos - pág. 51 - publicado em Julho de 1993 - Segue:
...ele tá comendo fusca
César, numa das piadas de Luiz Campos, é irmão de um cantador. César é retardado mental, não faz mal a ninguém e é muito querido pelos cantadores, até pela sua completa inocência.
Porém, nos últimos anos, César que sempre andava com um fusquinha de plástico na mão, degringolou e viu sua mania transformada em tara.
Hoje ele é muito conhecido em Mossoró, pela triste mania de "manter relações sexuais" com fusca. Não adianta trazer um carro mais bonito. A tara dele é por fusca. Parece que todo mundo já entendeu que é desvio mental e mesmo quem não o conhece de perto, dispensa sua loucura. Até mesmo as mulheres, olham, riem e passam ao lado.
No começo, nós tínhamos medo de que as pessoas sem conhecê-lo cometessem alguma violência contra ele.
Foi nesse período que Luiz Campos cantava na presença de um dos irmãos de César, quando surgiu este assunto: Aí Luiz disse:
Amigo tenha cuidado
se não seu nome se ofusca
faça alguma diligência
corra mais, dê uma busca
procure mulher pra César
que ele tá comendo fusca.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com