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segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Urgente! - Dr. Leandro Cardoso

Leandro Cardoso

Alguns pesquisadores e leitores do nosso

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estão solicitando a participação do médico e pesquisador do cangaço Dr. Leandro Cardoso, com novos textos sobre "Cangaço", pois alguns deles estão preparando livros  e necessitam urgente dos seus artigos.
Os artigos poderão ser publicados em qualquer blog do cangaço.

 Endereço de blogs do cangaço, além de outros mais.

http://cariricangaço.blogspot.com
http://lampiaoaceso.blogspot.com
http://cangaconabahia.blogspot.com
www.joaodesousalima.com
http//portaldocangaco.blogspot.com
http://tokdehistoria.wordpress.com
http://www.conversasdosertao.com
http://www.cangacoemfoco.jex.com.br
www.cicinato.blogspot.com

Como estamos com dificuldades para enviarmos através de e-mails,  resolvemos postar o recado na página do blog.

A dificuldade em nossa página de e-mails está sendo mais para enviarmos.

Atenciosamente,

http//blogdomendesemendes.blogspot.com 

SERTANEJAS VESTIDAS DE SOL

Por: Rangel Alves da Costa*
Rangel Alves da Costa

Aura ensolarada e tez envernizada pelo calor do dia; olhar meigo e distante e sorriso sempre acenando; uma sertaneja, uma mulher vestida de sol. Os romances, as novelas, a poesia e até as conversas de boca a boca sempre reconheceram a beleza simples e singela da mulher sertaneja.

E uma passagem bíblica, logicamente expressa noutro contexto, servirá muito bem para sintetizar tal reconhecimento. Diz o Livro do Apocalipse, 12,1 que:  Apareceu em seguida um grande sinal no céu: uma mulher vestida do sol, tendo a lua debaixo dos seus pés e uma coroa de doze estrelas sobre sua cabeça.

Ora, a mulher vestida de sol não era outra senão Maria, mãe de Jesus. E Maria, mais que qualquer outro, é nome que simboliza a mulher sertaneja. E estar revestida de sol, tomada pelos seus raios, também não deixa de remeter ao sol sertanejo pairando sobre suas belas filhas.

E mais. No contexto sertanejo, ter a lua debaixo dos pés pode muito bem significar a procura por momentos de paz e felicidade e também os instantes propícios para a caminhada em busca de dias melhores. Tendo o sol sobre sua cabeça, símbolo de luz mas também de padecimento, tem a lua sobre seus pés simbolizando a paz tão almejada.

E o que seria a coroa de doze estrelas sobre a cabeça da mulher sertaneja? Na Bíblia, as doze estrelas representam os doze apóstolos, aqueles escolhidos para semear as palavras de Deus. Perante a realidade sertaneja, cujo aprendizado é fruto da vivência no seu chão, a coroa de doze estrelas seria o diadema refletindo as singularidades dessa mulher também singular.


Tais singularidades podem ser encontradas em algumas características sempre existentes na verdadeira mulher sertaneja. Desse modo, as doze estrelas seriam: simplicidade, humildade, perseverança, amizade, destemor, honestidade, singeleza, religiosidade, beleza, meiguice, cordialidade e força.

Eis, assim, a mulher sertaneja vestida do sol de seu mundo, caminhando em busca de reconhecimento e conquistas, sempre ornada com as características básicas que lhes dão singularidade e encanto. E não haverá alguém que tenha bons olhos para ver, sincero coração para sentir e razão para discernir, que não veja em cada uma a mais pura expressão da singela e encantadora feminilidade.

E não importa se mora numa tapera de barro e cipó, nos escondidos da mataria distante, nas margens empobrecidas dos centros urbanos ou nas cidades. Não importa se usa chinelo de dedo ou sapato enfeitado, se usa vestido de chita e flor no cabelo ou roupa comprada em butique. Não importa se pobre ou rica, bastando que se revista daquele sol sertanejo para ser reconhecida na sua beleza.

Contudo, mesmo o sol sertanejo, reconhecido pela sua força e fulgor, deixa de brilhar sobre aquelas cabeças que, falseando sua vivência e seu meio, insistem em transgredir as características e conceitos próprios da mulher sertaneja. Tomadas pelos modismos, tantas vezes omitindo o seu próprio chão, acabam se desvirtuando nas tentativas de ser aquilo que, por destino e escolha divina, não lhes foi permitido.

Mas as ovelhas desgarradas logo deixam de ser reconhecidas pelo rebanho. E naquelas que continuam abraçando sua terra com orgulho e prazer, que permanecem com hábitos e costumes próprios de seu mundo ou que se tornam modernas sem ser diferentes, nestas sempre será avistada toda a beleza cabocla.

Pois, repetindo sempre, beleza sem igual é a desta mulher. Desde aquela mocinha que ao entardecer fica sonhando na sua janela, aquela outra que se respinga de lavanda para atrair olhares sempre apaixonados, ou ainda aquela outra que simplesmente passa e os olhares se enchem de graça e a paisagem agrestina agradece por existir assim tão majestosa. E também a já envelhecida, calejada pelas labutas tantas. Uma flor, ou flores sertanejas. Simplesmente isso.

A bela flor do cacto e do inexistente jardim sertanejo. Inexistente pela aspereza da terra e pela sequidão do tempo, mas quando existir ali garantida já estará sua flor: bela flor que é essa mulher vestida de sol.

Poeta e cronista

blograngel-sertao.blogspot.com

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A morte de Lampião e seus cabras - Parte II

Por: Barros Alves

Chacina e profanação dos cadáveres

Os relatos do cerco a Angico dizem que o ataque foi rápido e definitivo. Durou apenas cerca de vinte minutos e poucos conseguiram escapar da morte. Naquela manhã fatídica para o grupo de Lampião, tombaram sem vida em Angico, onze cangaceiros dos 34 presentes. 

Lampião e Maria Bonita

Lampião foi um dos primeiros a ser fuzilado. Maria Bonita também caiu sob o fogo  dos homens do tenente João Bezerra. Os que não conseguiram fugir foram chacinados. Após o morticínio, a soldadesca avançou sobre os corpos e praticou mais um crime:a pilhagem dos pertences dos mortos, quais sejam jóias ouro e dinheiro.

Tenente João Bezerra

Se a ação desumana contra o grupo de Lampião fosse praticada nos dias hodiernos, seria severamente punida em qualquer lugar do mundo ocidental. Naquele tempo, porém, era não apenas tolerada, mas elogiada à boca pequena e pela imprensa, que identificava naqueles que mataram Lampião, verdadeiros heróis. Lembra a pesquisadora Elise Grunspan-Jasmim a esse respeito que "após a matança de Angico, a profanação de cadáveres foi percebida e até reivindicada - principalmente na imprensa do litoral - como um ato necessário para a erradicação de um mal que assolava toda a sociedade. Os matadores de Angico granjearam o estatuto de heróis e serviço da nação". Com efeito, os soldados que mataram Lampião e os cabras e mulheres que com o chefe se encontravam em Angico, saquearam os cangaceiros e ainda receberam do governo, polpuda recompensa em dinheiro, recompensa esta, sem dúvida, aquém daquilo que pilharam, pois, segundo disse 

O ex-cangaceiro Volta Seca

Volta Seca, um jovem cangaceiro que cumpriu pena de prisão, "-Lampião carregava consigo um verdadeiro tesouro em dinheiro, jóias e barras de ouro".

CONTINUA...

Revista Noprdestevinteum
Edição nº. 41 
Ano IV
Dezembro/2012

Gentilmente cedida pelo poeta, escritor e pesquisador do cagaço Kydelmir Dantas

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POR QUE AMAMOS O CARIRI CANGAÇO?

Por: João de Sousa Lima

Amamos o Cariri Cangaço simplesmente pelas figuras humanas que cercam todo o evento. É fácil lembrar seus rostos, seus jeitos e até alguns costumes individuais. É bem verdade que amamos uns mais que outros.

O encontro com os amigos e artistas

O Cariri Cangaço emociona em suas palestras, em algumas nos enfada pela dinâmica e seu conteúdo, sem nunca, porém deixar de nos ensinar alguma coisa, dando oportunidade de colocarmos nossas “verdades” em debates acirrados.  

As diversas palestras

A longa programação em seus trajetos distintos deixa-nos  exaustos, porém  somos  sempre recompensados  de alguma forma por seus conhecimentos adquiridos.

Cariri cangaço concentra pesquisadores do Brasil...

O mais difícil do Cariri Cangaço é mesmo esquecer as pessoas que compartilham momentos. Como esquecer Jadilson “Falcão” Ferraz com suas piadas e a bela voz entoando Luiz Gonzaga? Como esquecer Manoel Severo que com sua maestria consegue agradar Gregos e Troianos? 

Uma turma animada

Como esquecer a amizade fiel  de Dr. Leandro Cardoso?  Como Esquecer Honório de Medeiros e sua eterna amabilidade? Esquecer Ivanildo Silveira e seu anedotário?

As mulheres foram o centro das atenções

Sempre me lembro da eterna voz “ecoante” de Antonio Vilela, da sombrinha de Aninha do Ó, do colorido “modelito” de Nely Conceição, do carinho de Juliana Ischiara, do vigor de Diana Rodrigues (e de seus presentes), da mais nova participante Iris, 

Várias cidades realizam o evento

das boas conversas e da educação bem lapidada de Geraldo Ferraz e sua esposa, de Luiz Ruben, da receptividade do memorialista Bosco André, 

Diana Rodrigues presenteia João de Sousa Lima com uma linda tela

das perfeitas “imitações” de Kiko Monteiro, do silêncio de Jorge Remígio, do esforço de Felipe Marques, das tiradas engraçadas do sargento Narciso (Meu Capitão),  da dupla perfeita (pai e filho) Thomás e Afrânio Cisne,

Maria Bonita retratada por Diana

do “elétrico Cheirozinho”, dos “cremes” de Lívio Ferraz,  do Dr. Archimedes Marques e sua esposa Elane, das piadas de Luiz Alberto e sua “eterna paixão”  Nildinha, de Reginaldo “Gonzaga”, 

Antonio Vilela entrevista João de Sousa Lima

do mais “prestativo” de todos os mestres: Wilson Seraine, do “dedo afiado de Afrânio sempre futucando alguém e perguntando: “Quem É”? do “Sebo ambulante” de Pereira e sua esposa, da lente rápida de Leopoldo,

 
Encontro de amigos

da família do querido Alcino Alves Costa, do sorriso de Ingrid e da agilidade de Pedro Gurgel,  do secretário Zé Cícero, das imagens de Aderbal Nogueira, 

As visitações aos pontos históricos

das risadas inconfundíveis de Kidelmir “Kil” Dantas, da arte “punhalesca”  de Lourinaldo, do radialista Marcos Lima, dos “Roteiros” 

O carinho de Geraldo Ferraz e Ivanildo Silveira

de Jairo Luiz, do “Bisaco” de livros de Rubinho Lima, da grande amizade do “Coronel” Ângelo Osmiro,  do amigo paulistano Sabino Basseti.

Cariri Cangaço 2013 deixa saudades

Muitos outros amigos passaram por lá, alguns me esqueci de colocar na relação mais creio estarem ai os que mais me deixaram falta nesse Cariri cangaço 2013.

Cariri Cangaço 2013

Além de tudo isso é lá que pontuamos fatos, eternizamos memórias, vasculhamos histórias, aprendemos pra vida.

Lourinaldo sua arte e um presente inesquecível

É lá que apresentamos  teses, ajustamos conhecimentos, debatemos assuntos, expomos descobertas, registramos  

O cangaceiro Ivanildo sangra Juliana...

no livro do tempo nossos rastros percorridos nos campos da pesquisa e perpetuamos assim as tradições e oralidades dos nossos antepassados para que no futuro tenhamos uma geração que conheça sua própria história de vida.

O radialista Marcos Lima e João de Sousa Lima

Saudades do Cariri Cangaço e seus personagens tão cheios de contradições  e que mesmo assim aprendemos a amar...

Sargento Nasciso

Paulo Afonso, 22 de setembro de 2013.

João de Sousa Lima
Historiador e escritor
Membro da ALPA – Academia de Letras de Paulo Afonso
Membro do GECC – Grupo de Estudos do Cangaço do Ceará
Membro Efetivo do Cariri Cangaço

Enviado pelo poeta, escritor e pesquisador do cangaço Kydelmir Dantas

Para mim, pessoalmente, o melhor do Cariri Cangaço... Reencontrar os amigos e sentir o quanto somos queridos.

Abração nos cabras e 'xêro' carinhoso nas cabrochas.


Kydelmir Dantas
MOSSORÓ - RN
Fone: (0xx - 84) - 3323 2307


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De Virgulino a Lampião - Samamultimídia - Parte III


Casa onde nasceu Lampião

No mês de julho, houve festa em Poço do Negro em homenagem ao Senhor São João, dentro dos sentimentos religiosos de devoção e das folganças tradicionais. Parentes, amigos, convidados, chegando e recebidos, nos alegrados dos cumprimentos de praxe, pelo anfitrião José Ferreira: “Têja a gosto. Faça de conta qui tá na sua própria casa”.

A casa onde Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, nasceu e foi criado por Dona Jacosa, sua avó.

As donzelas, com vestidos de chita estampada e flocados de babados e fitas, rescendendo a água de cheiro, flor no cabelo e rosto empoado, dengo no olhar e graça no sorriso brejeiro, se divertiam na arte da galantaria e dos namoricos com a rapaziada garrida e aromada, de camisa listrada e chapéu de palha, a malinagem musicando a natureza.

Na sala de visitas da casa, encostado na parede, ornada com flores de papel de seda de mistura com ramos de melindre e festões de bambu e alfinete, via-se o pequeno santuário de cedro, com o quadro de vidro emoldurado, do Senhor São João Batista, todo enfeitado de fita de cores variadas e de flores naturais: angélicas, cravos e beneditas.

Às sete da noite, enquanto lá fora espoucavam, a intervalos, os foguetes de três bombas, dentro da sala, acendidas as velas de cera, deu-se início à reza da “Novena” tirada pela voz forte e segura da “puxadeira” 

Tia Jacosa - avó de Lampião

Tia Jacosa: terço, ladainha cantada em honra a Nossa Senhora, responso, orações e cânticos. Tudo ar respondido no “fino” e no “grosso”, arrastado, longo, repetido, sonolento.

- “Cantemo e lovemo.
Apois é o que Deus qué,
Sinhô São João Batista.
Ele é fio de Isabé,
Tombém de Zacaria,
É primo de Jesus
E subrinho de Maria...”

Em seguida, era a cerimônia da Beijação, na qual, acompanhada de música característica Zabumba, em movimentos combinados e conservando o ritmo do passo, todos, um a um – observados pelos circunstantes em volta, respeitosos apreciando – se ajoelhavam diante do oratório, beijavam o Santo, recebiam um “relinque” (fita com a medida do Santo) e depositavam sua esmola no prato ao lado, como tributo espontâneo de auxílio, enquanto o coro, cantando, disciplinava:

“De um a um,
Ao pé do artá
Se ajoei premero
Pra pudê beijá
Sinhô São João
Nossa proteção”.

Atiradores, na banda de fora da casa, papoucavam o oco do mundo, com as descargas medonhas de seus bacamartes e reúnas para despertar o Senhor São João no céu!

Findo o ritual religioso, enquanto a fogueira pegava, os convivas provavam das tradicionais canjica e pamonha, do milho cozinhado e do café, fumegante e cheiroso, torrado no caco e adoçado com rapadura. No borralho da fogueira, crepitando e alumiando mais a madrugada, assavam-se espigas de milho, enroladas na própria palha e batata doce com casca. Estrondavam os foguetões de bomba anunciando o princípio da festa!

Primeiro a quadrilha. O tocador de harmônico, acompanhado de triângulo, reco-reco e maracá, dera o sinal para começar. As marcas eram tiradas por Virgulino, o grande animador de toda festa, lá no francês dele: “anarriê” (en arrière), “alevantú” (elevez tous), “chãdidama”, (Chantez, dames!) “outrefuá” (autre fois)...  Os pares avançavam, recuavam, girando e girando no balancê embriagante da animação.

O melhor da festa, além do baião, era dança do coco de roda, formada de pares em torno da fogueira. Vez por outra, o próprio Virgulino, ao mesmo tempo em que fazia o fole gemer nas suas hábeis mãos, tirava no repente as loas, bulindo com os presentes, que respondiam em coro, sapateando e batendo palmas com as mãos encovadas para dar som grave, no movimento gingado do passo e furta-passo. (Vale dizer que Virgulino era vigoroso e fluente nos “repentes” da poesia improvisada, a qual requer grande agilidade mental, prontidão de espírito e inteligência viva. Naquele tempo, como depois do cangaço, ocasiões houve em que ele manteve longas conversas em versos no repente, enquanto seu interlocutor falava em prosa!)

Eram assim os Ferreiras: gente sociável, boa e amiga, cultuando a alegria de viver, sobressaindo-se Virgulino, que mais tarde no cangaço, transformaria seu bando em guerrilheiros alegres, tocando, xaxando e cantando até nos combates:

“Meu rifle atira cantando
Em compasso assustador.
Faz gosto brigar comigo
Porque sou bom cantador.
Enquanto meu rifle trabalha
Minha voz longe se espalha
Zombando do próprio horror!”

Porém, a distância em que estavam em relação a Zé Saturnino era muito curta para não sofrerem a influência peçonhenta de seu ódio. Assim, os irmãos Ferreiras em Nazaré eram considerados forasteiros, não eram vistos com bons olhos porque tinham vindo de brigas e no ar pairavam desconfianças, na verdade, resultantes de venenos destilados pelo inimigo, que não perdia ocasião para mansiná-los. Essas más inculcas lhes sabotavam contatos e a formação de amizades. Enfim, Zé Saturnino, inconformado com a modesta recuperação dos Ferreiras, muito embora através do trabalho honesto, não manteve o compromisso firmado de não mais os perseguir.

-    Qual o quê! Trato com cabras ruim não vale nada... – sempre repetia ele.

Ruínas da casa de seu primeiro inimigo, Zé Saturnino, num sítio vizinho ao de sua avó. A parede ainda guarda marcas de balas atiradas por Lampião e seus irmãos.

E num dia de feira, no mês de Setembro, acompanhado de uns cabras e armado até os dentes, invadiu Zé Saturnino a cidade de Nazaré com o pretexto de cobrar um tal de Agripa Eusébio o pagamento de um cavalo, que o mesmo lhe comprara fiado. Nisto, vem chegando Virgulino para a feira. Desse dia em diante fechou-se o tempo e novos tiroteios tiveram vez entre os inimigos, sempre, até então, com os Ferreiras na defensiva e, do outro lado, um despotismo cruel num disparate de tiros que despejavam sem nenhum motivo.

Depois desses acontecimentos, compreendeu Virgulino para onde o destino irresistível o empurrava: “a prevalência do destino”, conforme ele chamava. O terrível inimigo não queria deixá-los viver em paz, nem mesmo viverem somente. Teria de enfrentá-los para não se acabar. A aturação passara da conta, e era ele, como todo sertanejo, paciente, mas não era tolerante não! Iria mostrar que onça não se cutuca com vara curta. Não ficaria mais na defensiva, nem na desvantagem, a bem dizer, sozinho, com seus dois manos. O inimigo tinha pessoal numeroso, era cheio de recursos e tinha o apoio da política.

José Ferreira, perdidas de vez as esperanças de paz, vivia apreensivo e sem atinar no rumo dos avexamentos e perseguições de volta. E agora piores, se intensificando. Sentia também, ia enfraquecendo a autonomia para conter e controlar o ardor dos filhos inconformados, já virando a cabeça.


Zé Saturnino, segundo tudo indicava, estava resolvido a desgraçá-los de qualquer maneira embora fosse tão grande o mundo, e isso porque considerava incômoda a existência deles para a expansão dos seus “domínios”. Diz Tolstoi que a miserabilidade do espírito humano pode mudar a máscara quantas vezes entender, mas nunca esses disfarces conseguirão alterar o aspecto do focinho imundo, que será sempre o mesmo em toda parte. Homens como Saturnino, egoístas, invejosos, insuportavelmente insistentes e maus, costumam não lembrar-se de que quando se faz a desgraça dos outros ela pode os alcançar de ricochete.

CONTINUA...

http://www.samamultimidia.com.br/artigo-detalhes.php?id=2382

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Carlos André por Oséas Lopes - A espera que vendeu um milhão de discos


Quando Carlos André resolveu gravar Se meu amor não chegar, teve gente que o alertou: "Essa música é popular demais para o senhor." Colocaram a canção lá no lado B de um compacto duplo. Em poucos dias, tornou-se sucesso que fez o disco sumir das prateleiras. O hino do homem que sofre à mesa de um bar é até hoje uma das âncoras que mantém o cantor no mercado: além dos shows, de frequência semanal, ele também media apresentações de colegas como Roberto Müller e José Ribeiro. "Se eu gravasse 'o quebra mesa' hoje, ficava rico".

“O Rei dos Motoristas de Táxi”. Carlos André estava chegando a Manaus para mais um show quando viu o cartaz que anunciava a sua apresentação naquela noite. Era ali apresentado a mais um título que indicava tanto o seu lugar quanto o de seus fãs na pirâmide sociocultural do País. Conhecia outros: era “artista de cabaré”, “cantor de brega”, fazia “música de empregada” (e de caminhoneiros, pedreiros, manicures, serventes, estivadores, putas). Carlos e os outros cantores do romântico popular eram os tenores de uma enorme parcela de trabalhadores que prestavam serviços pouco prestigiados para a classe média criada com banquinho e violão. Serviam – antes mais, hoje menos – como contraponto daquilo que era “de bom gosto” ou, no máximo, cabiam na esfera do folclórico e do risível.

Nesse sentido, era quase um impropério, entre intelectuais e demais esclarecidos do Brasil de 1975, ouvir e cantar versos como “Não posso mais, eu confesso/ Confesso que vou chorar/ Eu hoje quebro essa mesa/ Se meu amor não chegar”. Escondida na última faixa do lado B do compacto duplo O apaixonado, a música Se meu amor não chegar (Lindolfo Barbosa e Wilson Nascimento) provocou um sismo nas rádios do País quando foi lançada. Foi em grande parte por causa dela que o artista nascido em Mossoró, no Rio Grande do Norte, foi parar em Manaus: virou astro nas regiões Norte e Nordeste do País, aquelas que melhor acolhiam tais artistas e, por isso mesmo, terminavam fazendo parte do cimento do preconceito em relação a tal produção. Esse olhar negativo era duplo: enquanto direitistas julgavam as músicas como cafonas, esquerdistas viam ali o subjugo do intelecto a favor da alienação. “A esquerda era muito elitizada”, conta Carlos André, cujo escritório é decorado com várias capas de discos, inclusive aquele que traz o “Quebra-mesa”, como seu maior sucesso ficou conhecido. O enorme interesse pela música agradou imensamente à gravadora Beverly: um milhão de cópias foram vendidas, instigando a empresa a realizar mais cinco discos com o mesmo título O apaixonado (que distinguiam-se pelo número do volume: 2, 3, 4, 5, 6).

Trio Mossoró - João, Hermelinda e Oséas Lopes

Foi o momento máximo de um artista que havia iniciado a carreira no fim da adolescência, quando fez parte do Trio Mossoró (ao lado dos irmãos Hermelinda e João, ele usava o nome de batismo, Oséas Lopes). O trio, formado nos anos 50, fez sucesso em um Sudeste que consumia com certo apetite o forró e o baião, sendo Luiz Gonzaga o mais cortejado nome. Quando o interesse por tais ritmos começou a arrefecer, foi a vez de a música romântica trazer seus ídolos – e foi aí que Carlos André deixou Oséas para trás, gravou suas dores – e estourou.

Queria ser artista desde criança: usava folha de carnaúba como se fosse sanfona, gostava de chamar atenção de quem estava ao seu redor. “Na vesperal de domingo, o programa era ir ao cinema ou ver Oséas Lopes pular da ponte.” Prestou serviços pouco comuns, como pintar carroceria de caminhão e entregar bilhetes para o delegado soltar este ou aquele preso. Nessa época, usava uma bicicleta que tinha um motorzinho. Mas gostava mesmo era de cantar, aprendeu ouvindo a própria mãe, que cozinhava e arrumava a casa soltando a voz. Esse gosto foi observado por Canindé Alves, locutor da Rádio Tapuyo, que chamou o rapaz lá no estúdio. Ele cantou uma música para Nossa Senhora Aparecida e fez sucesso. “Eu era o cara mais famoso da cidade.” Só que a cidade era pequena demais para o nível de aparecimento que Oséas queria: decidiu ir para Fortaleza. Também achou pequena. Veio para Recife e se apresentou no programa de Fernando Castelão (o popularíssimo Você faz o show, apresentado aos domingos na TV Jornal). Trabalhou também com Orlando Silva, criador de novelas para a mesma emissora. Mas não era exatamente o que queria: voltou para Mossoró e para o antigo emprego, no qual ganhava bem. Mas queria mesmo o Rio de Janeiro. Em 1959, arrumou as malas e pegou um navio. Foram sete dias e sete noites navegando até chegar ao porto da cidade. Instalou-se em um dos galpões localizados no bairro de São Cristóvão. Lotado de nordestinos que também buscavam algo dourado na cidade, o local quase não conseguia abrigar mais uma rede. “Era um depósito de sal. Não tinha lugar pra mim. Aí um vigia, Calazans, que também era de Mossoró, encontrou um canto pra minha rede. Mas era bem no local onde passava o trem. Eu tinha que acordar todo dia às 5h30, pois o trem passava às seis. Calazans me acordava gritando ‘Olha o trem!’ Eu pagava a ele comprando uma abacatada e um pastel, toda manhã.”

Apesar de contar com o apoio financeiro do pai, cuja renda permitia uma confortável vida familiar, Carlos André começou a fazer bicos – e foi mais ou menos por causa de um deles que mais tarde obteve a incrível soma de um milhão de discos vendidos. Estava entregando uma carta no edifício da Rádio Nacional quando encontrou o prestigioso Trio Irakitan, contratado da casa. Também vindos do Rio Grande do Norte, Edinho, Paulo e Joãozinho ficaram sabendo que o conterrâneo estava há quase um mês no Rio experimentando um pouco confortável anonimato após sair de Mossoró, onde era celebridade. Oséas também aproveitou o laço geográfico que os unia: o trio possuía um programa na rádio, o que o ajudou a chegar a nomes como Rildo Hora (caruaruense exímio na harmônica) e Paulo Gracindo, apresentadores do programa Gaita Hering. Conseguiu ser contratado e logo saiu do galpão de sal. Os irmãos de Oséas vieram do RN e continuaram a parceria iniciada no Nordeste. Em 1962, lançaram Rua do namoro, em 1965, Quem foi o vaqueiro. Ganharam o troféu Elterpe (o maior da música popular nacional nos anos 60) com a música Carcará, aquela que dois anos depois transformaria uma jovem Maria Bethânia, cantando no Teatro Oficina, em mito. Foram mais dez discos até que, em 1972, Oséas Lopes decidiu ser Carlos André e o trio chegou ao fim.

O apaixonado veio em 1974 e logo todos cantavam as dores do homem que se perguntava “Pra que dois copos na mesa/ e uma cadeira vazia?” Ironicamente, a canção que tornaria Carlos André nacionalmente famoso quase não era gravada – foi considerada por alguns como “popular demais” para ser interpretada pelo cantor. Seu conteúdo atormentado, pouco contido, dramático, soava meio... brega. “Diziam: ‘Essa música é muito sem-vergonha para o senhor cantar’. Mas se ser brega é agradar o povão, então eu sou.” Lançou mais 32 discos, boa parte deles gravados enquanto Carlos também trabalhava como diretor artístico da Copacabana, que o contratou em 1979. Produziu trabalhos de artistas como Luiz Gonzaga (“Ele ajudava todo mundo”). Com dinheiro no bolso e fama, Carlos André não entrou na rotina padronizada dos artistas populares que o cercavam, preferindo não envolver-se em farras intermináveis, onde a soma bebida e mulheres era regra. “Eu era muito família, saía do show e ia direto pro hotel.” Nos anos 80, lançou seis discos e mais uma coletânea, trabalhos que foi realizando até sair da Copacabana, no fim da década. A década de 90 vaticinou o fim de uma época, e foi justamente nela que Carlos André iniciou um quase caminho de volta: foi morar em Fortaleza, cidade que sempre cortejou os cantores populares – e onde vários deles, a exemplo de Genival Santos, presente nesta série, vivem. Foi o momento no qual regravou um sucesso popular, Siboney (Ernesto Lecuona e Dolly Morse), que se tornou famoso nas rádios nordestinas.

Recife, no entanto, continuava a ser o polo regional de música, o que logo atraiu o artista: em 1996, veio para a capital a convite de João Florentino, dono da Polydisc, produzir a famosa série 20 Super Sucessos (na qual os hits de cantores como Roberto Muller, José Ribeiro, Adelino Nascimento, Waleska, Fernando Mendes e Leonardo foram compilados). Trabalhou durante anos na empresa até ser desligado. O mercado já sentia os efeitos da gravação caseira de discos. “A pirataria acabou com a produção”, diz Carlos André, que, naquele momento, voltara a também ser Oséas Lopes, o homem à frente do escritório local da Sociedade Brasileira de Administração e Proteção dos Direitos Intelectuais (Socinpro). É desse trabalho, além dos shows que faz e ainda produz, que vive hoje. “Se o ‘Quebra-mesa’ fosse sucesso hoje, eu estaria rico”, comenta ele, que, religiosamente, durante seus shows, desce até a plateia para cantar seu maior hit ao lado dos fãs. “Não acho cansativo, acho gratificante. Quando a música se imortaliza, não se acaba mais. Estamos fazendo shows com sucessos de ontem”, comenta, referindo-se a colegas como Müller e Bartô Galeno (seu maior parceiro nas mais de cem composições que escreveu, músicas como Toma juízo mulher, Vou devolver a cama, Vou dormir no chão). No escritório da Socinpro, ele vai recebendo interessados em contratar seu show ou de outros cantores – é difícil manter sua atenção contínua na entrevista enquanto ele tenta marcar datas e estabelecer preços. Nas cerca de duas horas, no primeiro encontro com Carlos, seu telefone tocou 13 vezes (celular e fixo). No último deles, o artista recebia mais uma proposta de show. “Estou em uma entrevista, mas me ligue depois. Você sabe que quando quiser um brega é aqui. E é de qualidade”.

Fonte: http://jconlineinteratividade.ne10.uol.com.br/romanticos/carlos_andre.html

Enviado pelo pesquisador José Edilson de Albuquerque Guimarães Segundo

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