O Sr. Augusto
Gouveia residia em Recife e através dos jornais, lia as proezas de Lampião no
Sertão. Achava ele que tudo aquilo era alarme dos jornais, que Lampião não era
nada daquilo que se comentava. O homem incutiu o desejo de ir ao Sertão,
enfrentar o cangaceiro e seu bando. Para isso, apresentou-se ao Dr. Eurico de
Souza Leão, chefe da Polícia de Pernambuco. Aquela autoridade estranhou aquele
desejo, sabia que o homem estava mal informado a respeito de Lampião.
Argumentava Augusto Gouveia, quero mostrar a Pernambuco e ao mundo que tiro a
fama do furioso cangaceiro. Para a sua captura, só precisava de seis ou sete
soldados, cada um com cinco cartuchos e um maço de cordas para amarrá-lo.
Garantiu que o traria preso para o Recife. Dr. Eurico duvidou, achando aquilo
inteiramente impossível. Procurou fazê-lo desistir da ideia tão absurda,
inclusive disse que, ele era um civil sem conhecimento militar, principalmente
das guerrilhas do Sertão, que retirasse do pensamento aquele desejo.
Respondeu Augusto Gouveia que na realidade era um civil, sem conhecimento
militar, mas queria mostrar que era homem e que vestia calça. Considerando a
forte insistência do homem, o Dr. Eurico de Souza Leão resolveu mandá-lo para o
Sertão. O Governo o comissionou no posto de Tenente, mandando-o apresentar-se
ao Major Theophanes Torres, em Vila Bela (atual Serra Talhada), onde foi
duramente aconselhado pelo Major a desistir dessa ilusão, inclusive disse que
ele estava seriamente enganado com Lampião, que o mesmo não era de brincadeira.
Nada fez o novo oficial desistir, passou então o Major Theophanes à sua
disposição sete soldados e todo armamento exigido pelo homem. Por só usar calça
preta e paletó marrom, foi logo batizado por Casaca Preta, Casaca de Couro e
Garra de Couro, com esses apelidos, ficou Augusto Gouveia conhecido no Sertão
de Pernambuco.
Através de informações, seguia o Tenente Casaca Preta e seus companheiros a
procura de Lampião. Próximo ao distrito de Roças Velhas, no atual município de
Calumbi, encontraram-se duas Forças, uma da cidade de Custódia, comandada pelo
Sargento Maurício Vieira de Barros e outra da cidade de Flores, comandada pelo
Sargento Wanderley, que vinha em perseguição aos bandidos. Entraram em
palestra. Terminada a mesma o Sargento Wanderley despediu-se, dizendo que ia
voltar para Flores, pelo mesmo caminho, que nada tinha a ver com Lampião.
Seguiu o Sargento Maurício na trilha dos bandidos, ao chegar à Fazenda
Barreiros, município de Vila Bela, avistaram distante, um homem dando com os
braços. Por não saber de quem se tratava, a força ficou na expectativa. O homem
vinha montado em burro, outros vinham armados, e a pé. Aproximou-se o referido
homem do Sargento Maurício, perguntou pelos cangaceiros. Respondeu o Sargento
Maurício que estavam por perto, apontou para o lado que os mesmos se
encontravam. O homem vinha tão exaltado e revoltado que o Sargento Maurício,
sem conhecê-lo, pasmou diante de tanta exaltação e revolta. Ficaram pensando de
onde vinha aquele louco, comandando aquela Força. O Sargento Maurício perguntou
com quem estava falando. O homem respondeu: Está falando com o Tenente Augusto
Gouveia (conhecido por Casaca Preta). O Sargento Maurício disse: Seu Tenente
Casaca preta, se quiser brigar siga nessa direção, o senhor vai encontra quem
procura. Avançou Casaca Preta, falou muito alto, ao depara-se com Lampião,
dando voz de prisão, dizendo que não fizesse ação que ele estava de frente com
o Tenente Augusto Gouveia (o famoso Casaca Preta). Lampião, que nunca tinha
visto aquilo, estranhou e disse: Seu Casaca Preta da peste te prepara para
correr, se você nunca viu homem, vai ver agora. Você é doido, mas na minha
volta vai criar juízo, e já!
Gritou Lampião para cabroeira: Pega! Pega! Este garra de couro atrevido para
arrancar as penas dele de unha. Vamos deixar despenado. Nas minhas costas,
Casaca de Couro não cria fama de valente não.
Nesse momento, a pipoqueira de tiro foi tão grande em cima de Casaca de Preta
que o homem ficou desorientado sem saber para onde correr. Deixou a força sem
comando, ardendo-se nas unhas de Lampião. O bravo Tenente, vendo a situação
esbugalhou os olhos de forma que ficou completamente deformado. Jogou o burro
nas águas de um açude existente. Os soldados gritavam: Senhor Tenente, pegue o
homem! Desenrole as cordas! Amarre o homem! Pegue o homem!
Dentro do açude, deixou o burro atolado, com todo equipamento, saiu nadando,
molhado como um pinto. Os olhos em tempo de saltarem da caixa, fazendo medo a
quem o visse; a sua fisionomia não era de gente deste mundo. O homem corria que
nem bala pegava. O próprio Lampião foi quem saiu no encalço, gritando: Não
corra Casaca de Couro! Não corra, Garra de Couro! Não corra, Casaca Preta!
Espera para brigar com Virgulino Ferreira! Escuta o golpe do rifle de Lampião!
Garra de Couro, na carreira que ia, mesmo sem freio, entrou em uma casa pela
porta da frente saindo por outra. Lampião, que vinha no seu faro, foi entrando
na casa e virando tudo, pensando que o homem estivesse escondido dentro de
casa. Como não encontrou, perguntou à dona da casa para onde ele tinha corrido.
A mulher apontou para um lugar diferente. Seguiu Lampião, não encontrando.
Assim aquela mulher, salvou a vida de Casaca Preta. Quando a mulher disse que o
homem havia saído correndo, Lampião disse: Homem não, um cabra safado.
Lampião gritava que tinha tirado e acabado com a mandinga e o catimbó de Casaca
Preta. O capote do famoso Tenente, os cangaceiros conduziram pendurado na ponta
de uma vara, fazendo a maior anarquia. Na carreira, o Tenente Casaca Preta foi
sair em Vila Bela de onde voltou para o Recife.
Fotografias da
Fazenda Barreiros do Coronel Manoel Pereira Lima, Casa da Fazenda Barreiros e a
Marca do tiro que tinha como alvo o Tenente Casaca Preta.
Texto do
livro: Memória de um Soldado de Volante
De: João Gomes de Lira
Fonte: facebook
http://blogdomendesemendes.blogspot.com