Publicado em
11 de setembro de 2020
Vista
panorâmica de Canudos, 1897. Foto: Flávio de Barros/Acervo do Museu da
República.
A Guerra
de Canudos foi um confronto entre os moradores da cidade de Canudos e o
Exército Brasileiro, no qual mais de 25 mil pessoas foram mortas. A
cidade era um vilarejo na Bahia, liderado por Antônio Conselheiro, um
líder religioso, e ali moravam seus seguidores.
Mas o que foi
de fato a Guerra de Canudos e quais foram as principais causas que deram início
a ela? É o que você vai ver agora neste artigo! Para começar, vejamos um pouco
mais sobre um de seus protagonistas.
Quem foi
Antônio Conselheiro?
Antônio
Conselheiro, nascido como Antônio Vicente Mendes Maciel, foi um líder
religioso, fundador da cidade de Canudos. Abandonou sua casa e família em
1861, para viajar de povoado em povoado no sertão do Brasil pregando uma vida
de devoção, meditação e santidade, ajudando a reformar e pintar igrejas e dando
os conselhos pelos quais ficou famoso.
O autor Mário
Vargas Llosa conta em seu livro A guerra do fim do mundo que Antônio
Conselheiro surpreendia as pessoas nos povoados em que passava com seus hábitos
diferentes. Não comia nem bebia até chegar na igreja local e rezar. Dormia no
chão, e nos dias seguintes à sua chegada se dedicava em reformar as igrejas e
dar seus conselhos.
Ele dava seus
conselhos nos fins de tarde nas praças e até no meio da rua. Falava sobre o
juízo final e a vida santa, associando os problemas da vida no sertão à chegada
do anticristo, e pregando que somente uma vida de santidade e devoção tiraria
as pessoas da miséria vivida no sertão e os levaria ao céu depois do
apocalipse. Os sertanejos o escutavam e iam de pouco a pouco abandonando suas
vidas para seguir Antônio Vicente em suas pregações no Nordeste.
Foi dessa
maneira que Antonio Vicente Maciel virou o Antônio Conselheiro, pois as pessoas
o chamavam de “o homem que dava conselhos”. Mas a sua trajetória ainda tem
alguns pontos importantes, veja a seguir!
Em 1877, houve
uma das maiores secas da história do Nordeste do Brasil, que somente no
Ceará deixou mais de 100 mil pessoas mortas, vítimas da fome e da sede. Nesta
época, enquanto a maioria das pessoas tentava se mudar para o litoral do
Nordeste, Conselheiro e seus seguidores continuaram viajando de vila em vila,
enterrando os mortos que encontravam e rezando à Deus em cada igreja que
passavam.
Com a proclamação da
república em 1889, Antônio Conselheiro ficou revoltado pois
acreditava na união entre a Igreja e o Estado, e que um Estado sem religião
seria uma das obras do Anticristo para dividir as pessoas. Além disso,
Conselheiro era contra a arrecadação de impostos que foi colocada em
prática a partir da república, pois acreditava que o dízimo era a
forma correta de contribuição.
Dessa forma,
passou a rasgar e queimar panfletos do Governo por onde passava, e incluiu em
seus conselhos uma pregação contra a República, afirmando que esta era o
próprio anticristo. Assim, Conselheiro e seus seguidores ficaram
conhecidos por serem fanáticos religiosos e monarquistas, representando uma
ameaça a República.
Foi nesse
período depois da proclamação da República que Conselheiro fundou a cidade de
Canudos, e mais problemas começaram a aparecer. Quer saber quais? Continue
lendo para descobrir!
Como Canudos
foi fundada?
A cidade
de Canudos foi fundada em 1893 por Antônio Conselheiro junto com seus
seguidores. O local era uma fazenda abandonada que pertencia a um homem
chamado Barão de Canabrava. Em meados de 1893, Conselheiro já tinha mais de 10
mil seguidores, que se instalaram de vez em Canudos.
A cidade de
Canudos era, como retrata o historiador e escritor Eduardo Bueno uma “Utopia
Evangélica”, sendo uma cidade autossustentável, com roças e rebanhos
coletivos. Das plantações e dos rebanhos de cabra, Canudos sobreviva
de forma independente, vendendo inclusive couro de cabra para os Estados
Unidos.
Durante o
período da fundação de Canudos, algumas outras tensões surgiram. Primeiro,
o Barão de Canabrava reivindicou a propriedade em que Conselheiro
havia se instalado com seus seguidores e criado a cidade. Nesse impasse, Conselheiro
não devolveu a propriedade nem fez acordos. Depois, o líder religioso se
recusou a pagar os impostos cobrados dos municípios pois não concordava com tal
prática, alimentando ainda mais a opinião pública de que Conselheiro e seus
fiéis eram fanáticos.
As tensões de
Canudos e Antônio Conselheiro só vinham aumentando, e o pior estava por vir.
Quer saber como começou de fato a Guerra? Continue lendo!
O início da
Guerra de Canudos
A Guerra de
Canudos começou efetivamente depois que Antônio Conselheiro encomendou um
carregamento de madeira de um vendedor em Joazeiro. O vendedor não entregou a
madeira, deixando Conselheiro revoltado, pois já havia pagado pela encomenda.
Com este clima de tensão, surgiu um boato de que os moradores de Canudos viriam
buscar a madeira a força.
Com o boato de
que os Conselheiristas viriam buscar a força essa encomenda em Joazeiro, o
prefeito da cidade pediu ajuda ao Governo Central para combater os “fanáticos”,
como eram conhecidos. O Governo enviou 150 homens comandados pelo Tenente
Pires Ferreira para ajudar nesse possível ataque.
O Tenente e
seus homens ficaram por vários dias na cidade, e sem sinal dos moradores de
Canudos, Pires Ferreira decidiu ir até a cidade com seus soldados para
atacá-los. No meio do caminho foram surpreendidos e atacados pelos
Conselheiristas, que mataram 10 soldados e deixaram outros 16 feridos.
Como conta
Mário Vargas Llosa, os soldados atacados diziam que os Conselheiristas
vieram como que em uma procissão, cantando canções evangélicas e rezando, e
subitamente atacaram no meio da madrugada.
Quando o boato
desse ataque chegou na Capital, na época o Rio de Janeiro, isso foi entendido
como uma verdadeira afronta a República, já que Conselheiro e seus seguidores
eram assumidamente contra a República. Assim, uma expedição seria novamente
comandada à Canudos. Quer saber como foi? Leia a seguir!
Leia também: o que foi a República
Velha?
A Segunda
Expedição para Canudos
Após o ataque
as tropas do Tenente Pires Ferreira, o Governo decidiu responder à afronta que
os moradores de Canudos fizeram a República, como foi entendido na época. Para
isso, foi convocado o Major Febrônio de Brito.
Em Novembro de
1896, o Major Febrônio partiu para Canudos com cerca de 600 homens e dois
canhões Krupp, de fabricação alemã. As tropas chegaram nos arredores de Canudos
em janeiro de 1897 com bastante dificuldade para carregar os pesados canhões,
com fome e com sede.
Mário Vargas
Llosa conta em A Guerra do Fim do Mundo que quando Conselheiro soube
que as tropas do Major Febrônio tinham dificuldades, ele teria dito que Deus
estava o defendendo, pois já estava matando seus inimigos antes que eles
chegassem.
Na noite do
dia 17 de Janeiro, os Conselheiristas atacaram as tropas de Febrônio de Brito
matando mais de 100 homens e deixando outros diversos feridos. O Major ordenou
a retirada das tropas e fugiu, ainda sob ataque dos moradores de Canudos.
A Terceira
Expedição para Canudos
Eduardo Bueno
conta que com a chegada de mais uma notícia de derrota na capital, a elite
local e os políticos estavam bastante apreensivos. A imprensa já
vinha acusando Antônio Conselheiro de querer reviver a Monarquia no
Brasil, e Canudos era vista cada vez mais como uma ameaça para a República
recém proclamada.
Saiba
mais: o
que é monarquia?
Com essa
pressão, o Coronel Moreira César foi convocado para comandar uma
terceira expedição para Canudos. Em fevereiro de 1897 ele partiu com 1.200
homens e 6 canhões Krupp rumo à Canudos.
Em meados de
Março as tropas do Coronel chegaram nas proximidades de Canudos. Logo no
primeiro ataque ordenado por Moreira César, algumas dezenas de homens foram
mortos, enfurecendo o Coronel, que ordenou uma investida completa dentro da
cidade.
No interior de
Canudos, os moradores se esconderam e emboscaram as tropas, matando centenas de
homens, incluindo o próprio Coronel Moreira César, que levou um tiro na
barriga.
Antonio
Conselheiro e seus seguidores vinham vencendo consecutivamente as
tropas do Governo, mas sua sorte estava por acabar com a próxima expedição à
Canudos, que foi a última. Continue lendo e como acabou a Guerra de
Canudos!
A Última
Expedição para Canudos
Batalhão da
Quarta Expedição à Canudos, 1897. Foto: Acervo do Exército Brasileiro.
Com mais uma
notícia de derrota das tropas do governo, o pânico havia tomado a Capital,
levando inclusive a morte de dois editores de jornais no Rio de Janeiro, numa
tentativa do Governo de impedir a propagação das notícias sobre Canudos.
Em maio de
1897, o próprio Ministro da Guerra convocou diversos oficiais do
Exército para combater de vez Canudos, Antônio Conselheiro e seus fiéis. O
General Artur Oscar foi o responsável pelo comando da operação, convocando 5
mil homens e levando 700 toneladas de munições, vários canhões e um enorme
canhão chamado de “A Matadeira”, com cerca de três metros de altura.
As tropas
chegaram em Junho nas redondezas de Canudos. Durante todo o mês de Junho as
tropas de Artur Oscar tentaram fazer pequenas investidas em Canudos, perdendo
praticamente todos os confrontos, deixando mais de mil soldados mortos. O
General Artur Oscar pediu um reforço ao Governo, que reuniu as pressas 3
mil homens, que chegaram em Canudos em Agosto de 1897.
Com os
frequentes ataques dos Conselheiristas e derrotas nas investidas, Artur Oscar
decide autorizar o uso do canhão “A Matadeira” que começa a destruir a
cidade de Canudos lentamente, começando pela igreja do local. Com a
vantagem obtida pelos disparos de canhão, depois de um mês de combate a cidade de
Canudos estava praticamente devastada, com milhares de mortos.
Ruínas da
Igreja de Canudos, 1897. Foto: Flávio de Barros/Acervo Museu da República.
No dia 22 de
Setembro de 1897, Antônio Conselheiro morreu. Não se sabe a causa da sua
morte, mas a maioria dos historiadores defende que teria sido por problemas
intestinais. Cerca de 15 dias depois da morte Conselheiro, seus fiéis ainda
estavam abatidos com a sua morte, sofrendo com os ataques de canhão e as
investidas em massa das tropas do Governo, o que os levou a levantar uma bandeira
branca para negociar a rendição de 200 pessoas.
Dois dias
depois da rendição, o Exército avançou e tomou de vez a cidade, matando os
defensores restantes. A Guerra de Canudos tinha acabado e quase todos os seus
25 mil habitantes tinham sido mortos.
Eduardo Bueno
relata que este foi um dos mais sanguinários e ingloriosos episódios do
Brasil, que simbolizou uma luta entre duas versões de um mesmo Brasil. De um
lado, o Brasil da elite e do outro, o Brasil das mazelas, dos desvalidos e
desafortunados, a quem a nação jamais se interessou.
E aí, o que
você achou desse episódio da nossa História? Conta pra gente nos comentários!
REFERÊNCIAS
Eduardo Bueno:
Brasil: Uma História. 1ª Edição. Rio de Janeiro: Editora LeYa, Janeiro de 2013.
Eduardo Bueno: Guerra de Canudos.
Guerra de Canudos pelo
fotógrafo Flavio de Barros. Brasiliana Fotográfica, Outubro de 2015.
Mario Vargas
Llosa: A guerra do fim do mundo. São Paulo: Cia das Letras, 2008.
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Rusny Teixeira
Estudante da
Especialização em Social Media na Northwestern University e engajado em temas
históricos e políticos. Acredita que conhecimento sobre política e história são
uns dos pilares para construir um país melhor.
https://www.politize.com.br/guerra-de-canudos/
http://blogdomendesemendes.blogspot.com