Por Sálvio Siqueira
Para
entender-se melhor o que ocorreu naqueles idos dias, se faz necessário
retroceder mais um pouco no tempo.
José Ferreira
casa-se com Maria Lopes, Maria Vieira da Soledade. Segundo alguns autores, dona
Maria casou grávida e o pai da criança não era José Ferreira. Dona Maria
trabalhava em uma fazenda e o dono dessa, tendo relações sexuais com ela, a
engravida. Não podendo mais continuar trabalhando e morando naquela fazenda,
devido à família do latifundiário morar na propriedade, dona Maria recebe uma
propriedade, sítio Passagem das Pedras, que se situa na margem direita do
riacho São Domingos, no município de Vila Bela, hoje Serra Talhada, PE, como
bônus do fazendeiro. José Ferreira, homem de respeito, gostava de dona Maria
Lopes. O fazendeiro vai até ele, no sítio Baixa Verde, no município de Triunfo,
PE, de sua propriedade e faz-lhe a seguinte proposta: dele casar com dona
Maria, eles receberiam a propriedade, ele registraria o criança como sua e
iriam viver suas vidas. José Ferreira aceitou. Dessa gravidez nasceu, em meados
de 1895, Antônio Ferreira, primogênito de dona Maria Lopes.
Na sequência das suas vidas, nasce em finais de 1896, Levino Ferreira, segundo
filho de dona Maria Lopes e primogênito de José Ferreira. Pouco tempo depois,
em meados de 1897, no registro civil, certidão de Nascimento e 1898 na certidão
do batistério, vem ao mundo Virgolino Ferreira. Consequentemente, por casais
daquela época levar a risca o que está escrito no livro Sagrado, “crescei e
multiplicai-vos”, esse não fora exceção, pois foram pais d’uma prole de nove
filhos, sendo cinco homens e quatro mulheres, fora, não sabemos dizer, se houve
algum nascimento de feto morto ou mesmo abortado.
Pois bem, os
filhos do casal José e Maria brincaram, divertiram-se, igual qualquer outra
criança naqueles idos dias nas quebradas do Sertão nordestino, mais
precisamente no vale do Pajeú das Flores.
Na escola,
além de destacar-se sobre os irmãos no aprendizado mesmo sendo o mais novo dos
três, Virgolino (Ferreira), nos intervalos entre as aulas, segundo a
escritora Marilourdes Ferraz, em seu livro “O Canto do
Acauã”, já liderava seus coleguinhas nas travadas lutas imaginárias entre
bandido e soldado. Vindo mostrar que era um líder nato, apesar de ter escolhido
o lado negro da vida.
Por volta de
1915, por motivos de roubos de animais, criações, na fazenda dos ‘Ferreira’,
depois de muito procurarem, é encontrada várias peles dessas criações
enterradas dentro dos limites da fazenda Pedreira, propriedade do Sr. Saturnino
Alves de Barros, que, além dessa, era proprietário de outro imóvel rural, a
fazenda Maniçobas, as quais passam a ser administradas, depois do falecimento
do pai, pelo seu filho José Alves de Barros, alcunhado de Zé Saturnino, um dos
seis herdeiros.
Zé Saturnino e os filhos de José Ferreira, Antônio, Livino e Virgolino,
perambularam pelas caatingas, tomaram banho nas águas dos poços dos rios e
fizeram tudo que os adolescentes praticaram na época. Saturnino e Virgolino
destacam-se em pegar boi dentro da mata fechada. Eram vaqueiros que cuidavam
das reses de suas propriedades.
Os irmãos
Ferreira, segundo João Gomes de Lira, em seu livro “Lampião – Memórias de um
Soldado de Volante”, eram amansadores de burros brabos, selvagem, vindo muita
gente de lugares distantes e distintos para verem essa proeza dos rapazes.
As peles das criações que foram encontradas estavam enterradas próximas à casa
de um ‘morador’ da fazenda Pedreira. Esse morador, Zé Caboclo, é levado preso
por um representante da lei da cidade de Vila Bela, que era familiar dos
Ferreira. Zé Saturnino não gosta, nem aprova aquele procedimento e, com a
influência que tinha, ordena que soltem seu empregado, destitui a pessoa do
cargo, coloca outra no lugar, de sua confiança, inclusive seu parente, e tem-se
início uma das maiores desavenças já vistas no Pajeú das Flores.
Certo dia os
irmãos Ferreira são emboscados nas terras da fazenda Pedreira, no sopé da Serra
Vermelha, quando estavam a procura de animais extraviados, por Zé Saturnino e
seus homens. Dessa emboscada sai ferido Antônio Ferreira, na altura dos quadris
e sua montaria. Antônio é levado para a casa de um tio paterno, Antônio
Matilde, e convalesce por vários dias. Saturnino tem conhecimento dessa ação
que fizera o tio ao sobrinho ferido, então vai até sua casa, leva-o preso para
sede do município e, durante os dias em que Matilde esteve preso, levava uma
sova, surra, diária.
Os Ferreira iniciam então uma série de ataques e emboscadas ao inimigo e seus
homens.
A coisa começa
a engrossar quando, os apaziguadores, aconselham ao Sr. José Ferreira mudar de
moradia. O velho Ferreira, homem honrado e pacato, aceita os conselhos, vende
sua propriedade por um valor muito abaixo do que valia e, comprando outra
propriedade, Poço do Negro, distante dos limites da fazenda Pedreira, vai criar
sua família, ou pelo menos tentar, em terras próximas ao Distrito de Nazaré do
Pico, município de Floresta, PE. Sobre a venda da propriedade Passagem das
Pedras, é sabido que fora dada uma entrada do valor e não fora feito o
pagamento do restante. Segundo Metódio de Godoy, em entrevista, “...a fazenda
(Passagem das Pedras) foi torrada de graça. Além do sinal, nada mais o velho
José Ferreira recebeu!”. Fazia parte do acordo, os irmãos Ferreira não irem a
feira livre de Vila Bela, nem Zé Saturnino ir a do Distrito de Nazaré. Os
Ferreira levaram desvantagem até nessa parte do acordo por serem, também,
almocreves e o comércio de Vila Bela ser muitas vezes maior do que a do povoado
de Nazaré.
Zé Saturnino
quebra o acordo feito e, junto a um cunhado, José Cipriano, ‘armados até os
dentes’, vai ao povoado de Nazaré, segundo ele mesmo, receber um pagamento de
um animal que vendera a Agripa Euzébio, que era por todos conhecido pela
alcunha de “Agripe de Manoela”. Na ocasião Virgolino (Ferreira) encontrava-se
no povoado, viu e não gostou da presença dos inimigos. O escritor José Bezerra Lima Irmão, em seu livro
“Lampião, A Raposa das Caatingas”, refere que Virgolino, havia deixado suas
armas em casa de uma pessoa conhecida, “(...) como de costume, deixou a pistola
e a faca peixeira na casa do professor Domingos Soriano, na entrada do arraial
(Nazaré). Quando viu os inimigos na feira, correu para apanhar as armas, mas o
professor Domingos disse que só as entregaria se Virgulino prometesse ir para
casa. Virgulino prometeu (...).”
Bufando de
raiva, Virgolino retorna para o sítio Poço do Negro e, lá chegando, relata para
um tio materno, Manoel Lopes, o que acabara de acontecer. Virgolino e seu tio
pegam as armas e seguem estrada afora rumo a Nazaré. Em determinado local, no
Serrote das Umburanas, se escondem e botam uma emboscada em Zé Saturnino e seu
cunhado. Debaixo de fogo cerrado, Zé Saturnino e o cunhado tacam as esporas em
suas montarias e dão no pé. Ninguém saiu ferido.
‘Soltando
fumaça pelas venta’, Zé Saturnino chega à fazenda Pedreira , relata da
emboscada que sofrera a outro cunhado, José Nogueira. Após alguns instantes,
ordena que quinze homens preparem-se, armem-se, para irem atacar os Ferreira,
no sítio Poço do Negro. Saturnino mantinha vários homens da espingarda sob sua
proteção. Entre, ou dentre, os cabras que ‘trabalhavam’ sob suas ordens,
destacamos os irmãos Zé e Antônio Guedes, esse último sendo conhecido na saga
cangaceira pela alcunha de Batoque, Zé Cipriano, seu cunhado, Tibúrcio, os
irmãos Beneditos e Zé Caboclo, aquele do roubo das criações. Por mais que
sangrassem as barrigas das montarias com suas esporas, viajaram durante toda a
noite nos lombos dos animais, só chegando ao sítio Poço do Negro, ao alvorecer
do dia seguinte. Cercam a casa e atacam os que lá estavam.
De dentro da
casa, tendo se levantado cedinho, Virgolino nota a manobra dos emboscadores
desde a sua chegada. Estava com ele na casa, sua mãe, dona Maria Lopes, seu
tio, Manoel Lopes e uma ‘reca’ de crianças. Ele ordena que a mãe proteja as
crianças, seus irmãos e os afilhados dela que no momento encontravam-se lá,
dentro de um quarto. Assim que Saturnino e seus homens iniciam o ataque, são
repelidos com uma saraivada de balas, mesmo só estando dois homens em condições
de lutar dentro da moradia.
A velocidade
que Virgolino atirava era impressionante, e foi o que lhe salvou da morte por
várias vezes. O combate se prolonga por boa parte da manhã. Os atacantes sofrem
uma baixa importante, Zé Guedes é ferido nas pernas. Vendo a quantidade de
disparos que vinha na direção em que estavam, Saturnino, sem saber da
quantidade de inimigos que tinha dentro da casa, recua e vai embora. Dona Maria
Lopes começa a sentir-se mal. Desde há alguns dias que ela vinha sentindo algum
problema, com certeza, pelas agonias que vinha passando sua família.
Daí para
frente a coisa pega fogo entre as duas famílias. Na sequência, iniciam-se as
desavenças com os moradores de Nazaré. Livino é ferido em Nazaré e preso, é
levado para cadeia em Floresta, PE. Em fim, a estada dos Ferreira naquelas
paragens fica inaceitável. Não podendo mais ficarem naquela região, José
Ferreira resolve mudar-se com sua família, novamente. Dessa vez ele procura
refúgio numa região mais distante, em outro território, no vizinho Estado das
Alagoas, devido lá morarem familiares da sua esposa. Não podendo ir todos de
uma vez, partem primeiro os irmãos Antônio, Virgolino, Virtuosa e seu esposo,
Luis Marinho. Os demais ficaram e iriam depois.
Com parte da
sua família seguindo em rumo a outras paragens, José Ferreira, segue com os
cuidados necessários para deixar sua ‘terra’, propriedade, com alguém. Dona
Jacoza, sua sogra, migra da Passagem das Pedras e vem morar no Poço do Negro.
Seu cunhado, Manoel Lopes, fica encarregado de cuidar do sítio, enquanto outras
pessoas iriam cuidar da propriedade próxima a Baixa Verde. Nesse meio tempo, já
em liberdade, Livino segue se recuperando do ferimento à bala sofrido em
Nazaré. Escolhem para partida uma hora fria e, não há mais fria do que a
madrugada, nos sovacos das serras do sertão nordestino.
A viagem foi
longa e muito desgastante, principalmente para dona Maria que já vinha tendo
problemas de saúde. Chegam alguns dias depois ao destino, na fazenda Olho
D’água de Fora, imóvel rural pertencente ao Sr. Manoel Francelino, que era
cunhado de Antônio Porcino, chefe de um pequeno grupo de cangaceiros que agiam
nas Alagoas. Estando em casa de Francelino, José Ferreira procura o Padre
Firmino e lhe narra tudo que estavam passando. O sacerdote faz uma missiva de
recomendação e o envia ao coronel Gervásio Luna, que tinha a alcunha de
‘Capitão Sinhô’. Esse, porém, não pode, ou não quis dar guarida e trabalho para
ele. Mandou-o procurar o coronel Zezé Abílio, em Bom Conselho de Papacaça, no
Pernambuco. O coronel foi solícito com toda a família de José Ferreira. Com sua
ajuda eles voltaram a almocrevar, na tentativa de recuperar o que perderam.
Segundo José
Bezerra Lima Irmão, em sua obra literária citada, Zé Saturnino, ao saber que os
Ferreira encontravam-se na fazenda Olho D’água de Fora, escreve as autoridades
de Água Branca narrando que aquela família tratava-se de bandidos: “(...) Zé
Saturnino soube da mudança de seus desafetos para Olho D’água de Fora, escreveu
várias cartas para as autoridades e pessoas importantes de Água Branca,
denunciando os irmãos Ferreira e Antônio Matilde como bandidos perigosos,
assassinos e ladrões. Pelo menos quatro pessoas receberam tais cartas: o
coronel Ulisses Luna e seu irmão Sinhô, a Baronesa de Água Branca(Joana Vieira
Siqueira Torres), e o comissário de polícia de Água Branca, Amarílio Batista
Vilar (...).”
Logicamente
que, naquela época, já estando o banditismo solto pelos sertões, aquelas
pessoas que foram ‘avisadas’ ficaram em alerta. José Ferreira corre em busca de
uma e de outra autoridade para dizer que sua família não era nada daquilo que
disseram. Não adianta. Certo dia, o coronel Ulisses Luna, chama o irmão de José
Ferreira, Antônio Matilde e o manda procurar outro patrão. Matilde arriba
daquele lugar mais irado ainda com seu inimigo Zé Saturnino. Reuniu-se com os
filhos mais velhos de seu irmão, José Ferreira, com planos para formarem um
grupo, voltarem ao Leão do Norte e castigarem o seu inimigo em comum, Zé
Saturnino. Terminando por formarem o bando, que, segundo Lima Irmão, assim
ficou composto: Antônio Matilde, Higino e Luis Marinho, os irmãos Olímpio, José
e Manoel Benedito, antigos ‘cabras’ de Saturnino, mais Chico de Salvador, Chico
Chililim, Antônio, Livino e Virgolino Ferreira, formando um grupo de onze
homens.
Esse grupo
pintou e bordaram no município de Vila Bela, PE, e região. No entanto, nada
daquilo que planejavam para matar Zé Saturnino, deu certo. Atingiu então, o
patrimônio dele, suas fazendas, seu gado e, por aí as coisas seguiram.
Retornando para as Alagoas, Antônio Matilde se esconde e os outros prosseguiram
suas vidas. Notícias desencontradas chegam às autoridades de Água Branca, sem
conseguir apurar nada o comissário encerra as investigações.
A partir
desses movimentos, isso por volta do ano de 1918/19, os irmãos Ferreira,
Antônio, Livino e Virgolino passam a fazerem parte do bando de cangaceiros
denominado os “Porcino”, que atuava na região serrana do Estado das Alagoas.
Esse bando destacou-se devido às crueldades praticadas em suas vítimas. Segundo
o pesquisador/historiador Clerisvaldo Chagas, “Em Alagoas, o cangaço teve
início em seus movimentos no extremo oeste, principalmente nas regiões de Mata
Grande e, então, Matinha de Água Branca. A maioria das ações cangaceiras no
estado aconteceu nessa região serrana, fronteira com Pernambuco, onde
oficialmente Virgulino Ferreira da Silva tornou-se cangaceiro. Entre o homem
trabalhador e ações violentas, vindo do estado vizinho, Virgulino começou a
conjugar suas arruaças ao bando dos Porcino que atuava na área descrita.” Daí
pra frente, a vida dos irmãos Ferreira resumira-se a fugas e pequenos ataques a
fazendas, povoados e grupos de almocreves pelas estradas. As perseguições
iniciam-se com bastante afinco, principalmente pela atuação dos “Porcinos”. Os
irmãos Ferreira tiverem uma escola perversa e sangrenta junto a esse bando.
Nesse ínterim,
João Ferreira, irmão de Virgolino, por ter ido comprar remédio em Água Branca
para sua irmãzinha Lica, Maria Ferreira, que estava com uma otite, ao chegar à
cidade, é preso pelo comissário Amarílio Batista. Alguém vai até a fazenda onde
estão seus pais contar da prisão. A mãe, dona Maria Lopes, desespera-se ao
saber da prisão de João, pois ele nada tinha haver com o que seus filhos mais
velhos faziam, praticado alguma coisa fora da lei.
Os seus
irmãos, Antônio, Livino e Virgolino, seu tio Antônio Matilde, e outros do
grupo, são informados da prisão de João. Resolvem vir soltar o irmão na marra.
Arranca-lo das mãos do comissário de Água Branca. O comissário desconfiou dos
planos dos irmãos Ferreira, ou mesmo fez a prisão para que eles tentassem agir,
já que suas buscas dentro da mata foram em vão, reuniu uma tropa de soldados e
foi montar uma emboscada na estrada que levava a cidade. O grupo de resgate é
surpreendido pelos disparos dos soldados. Saltam todos das montarias e dá-se
início a uma troca de tiros acirrada. O fogo toma rumo diferente daquele
imaginado pelo comandante e esse é obrigado a deixar o local onde se encontrava
e sair numa desesperada carreira, sendo seguido pelos seus homens. Alguns
autores citam que o comissário defecou, nas calças, por isso, antes de entrar
na cidade, manda que um de seus homens vá até sua casa e traga uma calça limpa.
Voltando a
entrar na cidade, retira o prisioneiro-mirim do quartel e transporta-o para o
prédio da prefeitura, onde o acorrenta em cima de uma mesa. Assim passa-se o
restante do dia e a noite inteira. No dia seguinte alguns moradores da cidade
vão falar com José Ferreira a fim de evitarem uma luta nas ruas de Água Branca.
Os três irmãos mandam um recado para o comissário para que ele solte João. Por
fim, Amarílio termina por soltar o menino, pois João, nessa época não passava
de uma criança. João retorna para sua família.
Após esse ocorrido, José Ferreira tem que arrumar suas tralhas e procurar outro
lugar para descansar seu corpo. O velho José Ferreira, dona Maria, sua esposa e
seu filho João Ferreira, iriam à frente para ver se encontravam um local para
ficarem. Os três irmãos mais velhos, Antônio, Livino e Virgolino, foram
incumbidos de levarem o restante da família, inclusive as meninas, para algum
lugar seguro até receberem a notícia de que poderiam ir para onde estariam seus
pais.
O proprietário da fazenda em que estavam, Manoel Francelino, diz para José
Ferreira ir para a fazenda Engenho, propriedade de seu pai, que ficava no
município de Mata Grande.
No início da
nova caminhada, dona Maria desmaia novamente, e, só após alguns instantes,
reanimada, colocam os pés no caminho. Chegando à fazenda Engenho, são bem
recebidos pelo sinhô Fragoso e sua esposa, dona Totonha. Na fazenda existiam
três casas. Numa delas, morava o velho Fragoso, em outra, morava um filho dele
que era assassino, pois tinha matado uma pessoa e era procurado por isso, e, na
outra, estando vazia, Fragoso a oferece ao velho José Ferreira. Instalados,
José Ferreira vai até a cidade, Mata Grande, fazer compras e manda João ir
amarrar os animais onde tivesse pasto. Dona Maria vai à casa do proprietário
para prosear um pouco com a esposa dele. Lá estando, sentiu-se mal novamente e
voltou a desmaiar. Gritos dali, chamados de cá, alguém fala para João correr e
acudir sua mãe. João saiu numa carreira só, porém, ao chegar a casa, sua mãe,
dona Maria Lopes, contando 47 anos de idade, estava morta. Alguém parte para
informar seu esposo, o velho José Ferreira, da morte de sua esposa. Rapidamente
José retorna para a fazenda Engenho, onde, meio desnorteado, envia recados aos
outros filhos para que viessem para o sepultamento da mãe. O corpo de dona
Maria, no dia seguinte é transportado em uma rede, levado pelos filhos, até o
cemitério do povoado de Santa Cruz do Deserto.
Ocorrem fatos
em nossas vidas que, por mais duros que possam parecer, conseguimos supera-los.
No entanto, há aqueles em que não tem como haver uma superação, principalmente
se ocorre com algo, ou alguém, a quem buscamos forças para superar as outras.
Assim aconteceu com o velho José Ferreira. Aguentou tudo, ou quase tudo, que
aconteceu com sua família de cabeça erguida para ir mais adiante, em busca de
uma solução, menos quando da perda da esposa. A ‘partida’ prematura da companheira
abateu muito, o moral e o ânimo do pai dos irmãos Ferreira.
Mas, a vida continua. E aquele pai tinha muitos filhos pequenos para proteger,
dá moradia e alimentá-los todos os dias.
Após a morte
de dona Maria Lopes, chega à cidade de Água Branca, AL, uma volante comandada
pelo então sargento José Lucena Albuquerque Maranhão. Essa volante vinha com a
ordem de irem à procura de criminosos, assassinos, bandoleiros e cangaceiros
que estavam a infestar aquelas redondezas, principalmente o grupo dos “Porcinos”.
O comandante da volante, em uma de suas andanças pela zona rural daquele
município, vem, a saber, para onde os Ferreira teriam ido. Após essa
informação, e tendo como guia o comissário Amarílio, o sargento José Lucena
parte rumo à cidade de Mata Grande.
A volante
chega à fazenda Engenho, onde se encontrava no alpendre da casa, o velho José
Ferreira a debulhar milho. Os soldados da volante nada disseram, também nada
perguntaram, apenas abriram fogo contra José Ferreira. O velho ainda tenta
proteger-se pulando para dentro de casa. Segundo o pesquisador/historiador José
Bezerra Lima Irmão, no livro “Lampião – A Raposa das Caatingas”, na página 100,
diz: “Foi então que a polícia chegou. Não houve nenhum diálogo, não foi feita
nenhuma pergunta – os soldados simplesmente cercaram a casa onde José Ferreira
se encontrava e abriram fogo. José Ferreira ainda conseguiu entrar na casa,
para proteger-se, mas os soldados entraram atrás, ele foi agarrado e executado
sumariamente”. Já os pesquisadores/historiadores Antônio Amaury e Vera
Ferreira, em seu “De Virgolino a Lampião”, 2ª Edição, na página 81, dizem:
“Tudo aconteceu de repente, como costumam ser as grandes tragédias. Ouviram-se
tiros, a porta da casa foi arrombada, a filha do velho Fragoso viu-se ferida e
José Ferreira foi arrastado para um dos quartos, sendo sumariamente executado.”
Quando de seu assassinato, José Ferreira contava com 48 anos de idade.
O corpo de
José Ferreira, segundo alguns autores, fora enterrado no oitão direito da
capela do arraial Santa Cruz do Deserto, ao lado da cova de dona Maria Lopes,
sua esposa.
Alguns autores
trazem nas entrelinhas de suas obras literárias, escritos que dizem que as
mortes dos pais de Virgolino, dona Maria Lopes ocorreu aos 21 dias do mês de
maio de 1920 e do velho José Ferreira, aos 29 dias de junho de 1920, um mês e
oito dias de uma para a outra... já outros, referem que as mesmas ocorreram em,
a de dona Maria, 30 de abril de 1921 e a de José Ferreira em 18 de maio de
1921, dezoito dias entre uma e outra morte... Antônio, Livino e Virgolino, já
faziam parte de grupos de cangaceiros, porém, se existia alguma chance de um
deles sair da vida de bandidos, essa fora extinta com o assassinato do velho
seu pai. Virgolino, já como Lampião, andou colocando emboscadas para ver se
matava, vingando, José Lucena, porém, foi abatido em 28 de julho de 1938,
depois de uma longa vida como chefe de bando cangaceiro, vinte anos, e nunca
conseguiu matar seus piores inimigos, José Alves de Barros, o Zé Saturnino e
José Lucena Albuquerque Maranhão, comandante da volante que matou José
Ferreira, seu pai... nas quebradas do Sertão alagoano.