Antônio Mendes
de Sá morava na beira do rio São Francisco quando, em 1865, viu-se envolvido na
intriga que se chamou de questão do Sabiucá (v. Gomes de Sá, N 12). Acabou
sangrado, depois que foi arrancado para fora da prisão, pelos inimigos. Dos
seus filhos, Ana (Aninha “Braba”) casou-se com Cazuzinha “do Roque” (MOM, B 9)
e lhe deu a neta Maria.
Maria casou-se com Gregório Nogueira do Nascimento, conhecido por Gregório Flor
por ser filho de Florência Filismina de Sá (Flor) e de Manoel de Souza Ferraz
(Manezinho - JSF, Tn 18). O casal deixou oito filhos: Auta, Amerina e Filomena;
Alonso, Afonso, Ancilon, Arconso de Souza Ferraz e Manuel de Souza Neto.
Manuel de Souza Neto nasceu nas terras da antiga fazenda Algodões, município de
Floresta, no dia 1º de novembro de 1901. Cresceu ao lado dos parentes, os
“nazarezistas”. Ao lado deles, se engajaria numa luta ingrata, dura, heróica.
Virgulino Ferreira da Silva - o futuro Lampião - ali chegara muito cedo,
instalando-se com a família na fazenda Poço do Negro, nas imediações de Nazaré,
e logo se indispôs com os filhos da terra, fazendo uma história já conhecida e
que levou luto a muita gente da região.
Em 1921, o primeiro filho de Nazaré seguiu com destino ao Recife para ingressar
na polícia: Arconso de Souza Ferraz deixou seu emprego em loja para se tornar
militar. Outros seguiriam seus passos.
Diz
Marilourdes Ferraz (O Canto do Acauã, p. 141) que, em 1922, “Manuel de Souza
Neto partiu da casa do seu tio João Flor, ao lado do comerciante Adão Feitosa,
para Rio Branco (atual Arcoverde), a fim de comercializar peles de bode. A
viagem foi extenuante, feita a pé e parte a cavalo mas, ainda assim, por
iniciativa própria, prolongou seu itinerário até a capital para efetuar
alistamento, seguindo o exemplo do seu irmão Arconso.”
Estava
destinado a ser um dos mais valorosos combatentes do cangaço. Com 21 anos de
idade incompletos, engajava-se com coragem numa luta que duraria pelo menos 16
anos. E logo se destacaria por sua bravura.
Em janeiro de
1924, Manuel Neto foi um dos soldados que mais se fizeram notar, sob o comando
do sargento Higino José Belarmino, nas lutas travadas contra o grupo de Lampião
e em defesa de Clementino Quelé, que vira seu distrito de Santa Cruz, em
Triunfo, ser atacado violentamente. No dia 5, o jovem soldado avançou correndo
de Triunfo até aquele local, onde Virgulino procurava liquidar o antigo
companheiro Quelé. Seis dias depois (dia 11), entrava novamente em choque com o
grupo de bandidos, forçando-os a deixar o Estado de Pernambuco e fugir para a Paraíba.
Um ano depois
(fevereiro), ao lado de uma força volante composta de civis, procurava
descobrir o paradeiro de Lampião. Tomara conhecimento da presença do bando na
região de Betânia. Encontrou a força sob o comando do sargento José Leal,
seguindo todos na direção da Cachoeira dos Galdinos. Ali estavam os
cangaceiros. A força se compunha de pouco mais de vinte homens; os bandidos,
trinta e tantos. Avistados os cangaceiros, foram descobertos, iniciando-se o
tiroteio. Batalha duríssima, com resistência tenaz. No auge da luta, o sargento
José Leal e o soldado João Preto abandonaram o campo da luta. Manuel Neto
assumiu, nessa ocasião, pela primeira vez - segundo João Gomes de Lira -, um
comando na campanha contra o banditismo.
Ao seu lado,
secundando-o, os primos Euclides e Manoel Flor. A luta durou cerca de três
horas, terminando com a fuga dos bandidos que levaram um morto e três feridos.
A força nada sofreu.
Foi nesse ano
de 1925 que Manuel Neto foi promovido a anspeçada. Junto com Manoel Teotônio,
no lugar Malhada do Boi - entre Betânia e São Caetano (Navio) -, eliminara o
cangaceiro Luiz Cazuza.
Em junho ou
julho de 1925, o anspeçada, ao lado, entre outros, dos parentes David Gomes
Jurubeba, Hercílio de Souza Nogueira, Antônio Capistrano de Souza e João Domingos
Ferraz, sob o comando do tenente Higino, partiu em reforço à força paraibana
que lutava, quase sem munição, contra o grupo de Lampião no lugar Tenório. Já
se brigava havia várias horas. Com os tiros disparados pelos pernambucanos, os
bandidos correram. Diz Marilourdes Ferraz que aí tombou morto Levino Ferreira.
Frederico Maciel (Lampião, seu tempo e seu reinado, v. II, p. 171), entretanto,
diz que o irmão de Lampião morreu num tiroteio da véspera, na Baixa do Juá,
atingido por um tiro do soldado José Inácio Morais.
O COMBATE DA
CARAÍBA:
Era o dia 4 de
fevereiro de 1926. As forças sob o comando de Higino Belarmino seguiam a pista
de Lampião que, da fazenda Volta, no Navio, município de Floresta, escrevera
diversas cartas pedindo dinheiro a moradores da região.
Daí seguiu e,
na Caraíba, sabendo que a força vinha em sua perseguição, montou uma grande
emboscada com seus 35 a 40 homens. Distribuiu estrategicamente os companheiros,
conforme conta Manoel Flor (O Canto do Acauã, p. 213):
“Os
cangaceiros estavam bem apoiados em lugares seguros e distribuídos
vantajosamente, dispostos em três posições. O primeiro grupo de adversários
estava à margem esquerda do riacho, num serrote; o segundo, à frente do
primeiro, na margem oposta, apoiado na ribanceira do riacho; o terceiro, em
barrancos e valetas naturais”.
A posição
permitia que a força fosse alvejada com três frentes de fogo e os bandidos,
situados nos barrancos e ribanceiras, “apesar de estarem entre o fogo dos
companheiros e da força, não eram atingidos pois sua posição os resguardava
bem.”
A força de 34 ou 35 homens foi colhida de surpresa. Seguiu-se um dos mais
ferozes combates travados em toda história do banditismo nordestino. Os mais
traquejados, acostumados a liderar tropas, tomaram decisões individualmente.
Manuel Neto seguiu pelo lado esquerdo, em busca dos cangaceiros entrincheirados
no serrote.
Aproximou-se de tal forma que teve o braço direito varado por uma bala dos
bandidos. Escapou “quase milagrosamente com seus homens, apesar de servir como
alvo para os bandidos do primeiro e do segundo grupos”. Foi retirado para
Betânia pelos companheiros Pedro Tomás de Souza Nogueira, João Jurubeba de Sá
Nogueira, soldado Jacobina e outros.
Vendo Manuel
Neto ferido, os bandidos saltaram para fora das trincheiras dispostos a
eliminar o inimigo. Foram várias vezes bravamente repelidos.
Conta João
Gomes de Lira (Lampião: Memórias de um soldado de volante, p. 249) que, em
Betânia (então distrito de Floresta), “por não existir medicamento nem
farmacêutico, foi Manuel Neto medicado pelo curandeiro Manoel Jerônimo (v. MOM,
B 86). Contudo, Manuel Neto ainda criou bicho no ferimento. Ele mesmo puxava as
filapas (sic) de osso do ferimento.”
Dias depois,
foi transportado de Betânia para Flores, onde submeteu-se a rigoroso
tratamento.
O combate da
Caraíba durou cerca de 7 horas e a tropa enfrentou desesperada os bandidos.
Conta Lira que Higino, já baleado e vendo a falta de ânimo da força, procurou
retirar-se da linha de fogo. David Gomes Jurubeba, vendo isso, teria gritado:
- “Tenente
Higino, não abandone a tropa. Seja homem que eu sou homem e só sou comandado
por homem. Bota galão no ombro quem é homem. Não tente retirar-se da linha de
frente. Se isto fizer, atiro-lhe pelas costas!”
Higino - um
dos mais bravos oficiais que se engajaram na luta contra o banditismo -, mesmo
ferido, teria respondido:
- “David,
agora se morre até o último homem mas não se corre. Vamos agora morrer todos,
como homens, no campo da luta!”
No cair da
tarde, Lampião retirou-se. Perdera cinco homens; a força três: os soldados
Aristides Panta da Silva, Benedito Bezerra de Vasconcelos e Antônio Benedito
Mendes. Foram feridos, além do anspeçada Manuel Neto e tenente Higino, o
rastejador Antônio Joaquim dos Santos (Batoque), com a perna fraturada, Altino Gomes
de Sá (v. GS, Tn 196), João Pereira dos Santos, João Pinheiro Costa e João
Cavalcanti (mais tarde morto no combate de Maranduba/SE).
A CHACINA DA
TAPERA:
Horácio
Cavalcanti de Albuquerque, filho de Manoel Cavalcanti de Albuquerque (Dé - AFN,
Ttn 84), nasceu em 23.08.1891. Foi, na vila de Floresta, aluno do velho
professor Trindade, em 1901. Fortunato de Sá Gominho (Siato), seu colega de
escola, recordou: “tivemos a oportunidade de nos submeter por mais de uma vez
às boas sabatinas, com perguntas e respostas recíprocas e com palmatórias em
nossas mãos, nos dias de sexta-feira. Enquanto eu, felizmente, sempre consegui
sair das mesmas vitorioso, plenamente livre da palmatória indesejável, Horácio
tinha grandes e boas mãos que bem suportavam a ação da festejada palmatória”.
Membro de uma
das mais tradicionais, ilustres e honradas famílias de Floresta, Horácio foi,
entretanto, uma ovelha desgarrada.
Denunciado
como implicado em furtos de animais, foi, segundo Billy Jaynes Chandler
(Lampião, o rei dos cangaceiros, p. 92), “condenado ‘in absentia’, no meado de
1925”. Passou a integrar o grupo de Lampião.
Diz Chandler:
“Este acontecimento iria trazer terríveis conseqüências para a família Gilo, de
Floresta, pois um de seus membros, Manoel, estava entre os que tinham acusado
Horácio de roubo de cavalos. Pouco antes do seu julgamento, Horácio e 2
cangaceiros apareceram uma madrugada na fazenda Tapera, em Floresta, onde
moravam os Gilo, e, depois de acordar todos que lá estavam, procuraram por
Manoel por toda a casa, dizendo que iam matá-lo. Não o encontrando, ameaçaram
matar seu pai, Donato, mas foram embora sem o fazer.”
Horácio tramou
então uma das mais sangrentas chacinas verificadas naqueles tempos. É ainda
Billy Chandler quem diz que chegou às mãos de Lampião uma carta, feita “como se
fosse pelos Gilo, mas escrita pela mulher de Horácio”. Não só insultava como
punha em dúvida a coragem do bandido. Aquilo era demais para Virgulino.
Sentindo-se
ameaçado, Manoel de Gilo, temeroso, levou sua inquietação ao conhecimento do
capitão Muniz de Farias, comandante de uma grande força volante estacionada em
Floresta. Esclarece João Gomes de Lira (obra citada, p. 317) que o capitão
aconselhou a Manoel de Gilo, “junto a toda a família, armarem-se na fazenda
Tapera e aguardarem a vinda dos bandidos.” Assim, no momento de um ataque,
“podia ficar Manoel de Gilo despreocupado, pois a Força daria retaguarda.” E
Manoel voltou tranqüilo a sua fazenda.
Na madrugada
de um sábado, dia 28 de agosto de 1926 (alguns autores, erradamente, indicam
esse dia como sendo 26 de agosto), ainda turva a noite, “a barra ainda longe”,
Lampião iniciou a execução do seu plano para massacrar os moradores da Tapera.
Ao seu lado, Horácio Cavalcanti de Albuquerque. Batem à porta dos vizinhos de
Gilo, prendendo todos.
Amarradas as
mãos atrás das costas, foram conduzidos a uma quixabeira que ficava perto da
casa, sendo ali vigiados severamente.
CONTINUREMOS AMANHÃ...
Fonte:
facebook
http://blogdomendesemendes.blogspot.com