Dadá esposa do cangaceiro Corisco
Maio de 1968.
Jeremoabo, Nordeste da Bahia. Uma rua lamacenta, uma casa humilde. Aqui vive
José Osório de Faria, Zé Rufino, de cama, meio paralítico por causa dos cinco
enfartes que já sofreu. Ele sabe que Sérgia da Silva Chagas, a Dadá, vem vê-lo,
como toda a cidade também sabe, pois as notícias correm de boca em boca, com a
rapidez do telégrafo. Também deve saber o que Dadá quer dizer-lhe: que ele na
matou Corisco em batalha, mas numa emboscada, traição.
No entanto, o que deveria ser um encontro feroz, de ódio, de palavras duras,
acaba sendo uma troca de abraços comovidos, um pouco de alívio para um homem
acabado, perto do fim. No quarto do doente, entra um moreno alto, forte,
fardado:
- É você mesmo, Dadá?
Os dois se abraçam, Zé Rufino sorri. O homem fardado é Zé Rochão, soldado que
participou da morte de Corisco. Chega mais gente que quer conhecer Dadá, a
mulher de Corisco. Zé Rufino enxuga lágrimas com um lenço branco, os olhos
estão baços da velhice.
- Eu não queria matar...
- Mas por que o senhor entrou para a volante?
- Com medo de morrer. Tinha medo dos cangaceiros e tinha medo da Polícia. A Fôrça me batia porque meus parentes acoitavam cangaceiros. Se eu ajudasse os
cangaceiros, apanhava; se não ajudava, morria. Lampião chegou a me chamar para
ir junto com ele. Não, não podia ir, era preciso ter coragem, não apreciava
aquela vida, não. Não sabia o que fazer, acabei entrando para as volantes.
Zé Rufino, embora tranquilo, assusta-se quando a fotógrafa abre a maleta de
couro para retirar um filme. Nesses trinta anos, a ideia de que algum filho de
Corisco viesse vingar a morte do pai nunca lhe saiu da cabeça. Maria de
Lourdes, a mulher de Rufino, conta que muitas vezes ele acordava sobressaltado de
madrugada, revólver na mão, atirando.
Há três anos, discutiu com um soldado e teve o primeiro enfarte. De lá para cá,
teve mais quatro. Nos últimos meses, tem piorado. Hoje, tem título de coronel.
Ele olha para Dadá, sem uma perna que perdeu ferida pela mesma metralhadora que
matou Corisco:
- Dadá, você nasceu errado, devia ser homem. Em muito lugar do sertão você
tinha mais nome que Lampião. E seu filho Dadá, é um homem. Sílvio é um homem,
mesmo.
Pega no lenço outra vez, diz baixinho: EU NÃO QUERIA MATAR CORISCO.
Manhã de sol,
4 de maio de 1930. Um domingo quase igual aos outros na Fazenda Baixo do
Ribeiro, no sertão Norte da Bahia. Dadá, menina de doze ou treze anos, bate
roupa na fonte , sonhando com o dia em que vestirá vestido de noiva e irá à
capela, montada no burrico, ao lado de Cazuza. Em casa, Dadá ajuda a cuidar de
oito irmãos menores, e ainda cozinha. A família vive de plantar e de algumas
criações. O futuro de Dadá, moreninha e bonita, parece tranquilo. Ela bate e
bate a roupa, que vai estendendo ao sol, nas pedras.
Então, de repente, aparece um sombra. Dadá olha para cima. É um homem com
roupas diferentes, todo armado, chapéu de aba quebrada, muita firmeza no olhar.
Diz simplesmente:
- Venho mais tarde para te levar comigo.
- Não. Eu não vou.
O homem alto e loiro vira as costas e se vai. Dadá está assustada. Sente um
frio, medo, corre para casa, longe dali. O pai a recebe:
- Cazuza foi baleado por Corisco.
Um homem alto e loiro, cheio de armas. Era ele mesmo: o cangaceiro que a queria
levar acabava de matar seu namorado. E instantes depois aparece, a cavalo, e
ordena ao pai de Dadá:
- É esta mesmo, coloque na garupa, ande, vamos logo!
Dadá apenas chora. O cavalo parte a galope.
Nasce um cangaceiro
Cristino Gomes da Silva Cleto, Corisco, o “Diabo Loiro”, nasceu em Matinha de
Água Branca, na serra da Jurema, Alagoas. Cedo aprendeu a lei fundamental do
sertão: lavar com sangue qualquer desonra sofrida. E desonra pode ser uma
simples ofensa, como pode ser o defloramento de uma irmã, uma calúnia contra
algum parente. Corisco se forma assim: sertanejo humilde, mas pronto a cobrar
uma dívida de honra com a ponta do punhal.
Foi essa lei
que Corisco teve que enfrentar bem cedo. Coisa à toa. Uma festa de fazenda,
cachaça para todos, música e dança para animar. De repente há uma briga.
Corisco, com dezesseis anos, ou menos, é ofendido, e mata. Mata um homem que é
protegido do coronel mais da região. Precisa fugir, pois mais dia menos dia, o
coronel mandará matá-lo. Corisco pensa: se conseguir embrenhar-se na caatinga e
encontrar o banco de Lampião, está salvo. Assim tinha feito tantos outros, como
Labareda, cangaceiro famoso que aos 17 anos assassinou o soldado que violentara
sua irmã. Lampião aceitava homens assim, valentes, destemidos. Só não aceitava
quem estava sendo perseguido pela polícia por roubo ou defloramento. Era uma
lei também.
Foram meses de andanças para Corisco, roubando para comer, fugindo, a pé, a
cavalo, como podia. Até encontrar o bando de Lampião, que descansava à beira do
rio São Francisco, bem perto da Fazenda Baixa do Ribeiro. Então Corisco
conheceu Dadá.
Um revólver inútil
Na Fazenda Baixa do Ribeiro viviam algumas famílias. A de Cazuza, namorado de
Dadá, tinha muito gado, e andavam sumindo algumas cabeças. Certamente seriam os
“bandidos” que viviam ali por perto. Alguém avisou a polícia, possivelmente
Maria Quileta, tia de Corisco e mãe de um dos rapazes que se tinham juntado ao
bando de cangaceiros. No entanto, ela mesma urdiu toda uma intriga, dando a
entender que quem tinha feito a denúncia fora Cazuza, mais o pai de Dadá. E
Corisco em pessoa veio para vingar-se. Ao pai de Dadá, perdoou, mas não perdoou
à família de Cazuza.
Gregório Silveira Nascimento, irmão de Cazuza, hoje com 58 anos, chapéu largo,
alpercatas nos pés, roupa de brim, óculos, pele morena e rude, chega a chorar
quando lembra aquele dia. Enquanto fala, acaricia o revólver, agora inútil, não
tem em quem vingar-se pela morte do irmão, há 38 anos. Gregório conta:
- Cazuza tinha dezoito anos. Estava de joelhos, tirando leite da vaca. Feliciano,
meu irmão mais velho, viu quando Corisco chegou e destravou o mosquetão. Pensou
em correr, mas resolveu ir em defesa de Cazuza. Não deu tempo. Quando Cazuza
levantou, Corisco atirou, de pouca distância. O tiro pegou no ouvido direito,
ele caiu com a cara dentro do leite. Quando Feliciano se aproximava, outro
cangaceiro, Beija-flor, atirou nele, mas errou. Feliciano se atracou com
Beija-flor. Corisco atacou, com um punhal. Feliciano se afastou, mas a arma
entrou no pescoço e varou até a boca. Feliciano também é vivo ainda hoje.
Deixando os dois corpos estirados no chão, Corisco foi conversar com a mãe de
Cazuza, que, segundo Maria Quileta, também tinha denunciado os cangaceiros.
- Me mandaram aqui para dar uma surra na senhora e lhe cortar os cabelos, mas
eu não sou homem de maltratar mulher, então matei seu filho.
- Você matou meu filho, mas foi injusto, porque ele não tem intriga com
ninguém. Cazuza é irmão de leite de Rafael de Silvestre, e Rafael de Silvestre
é seu primo, Corisco.
Os parentescos e amizades são muito respeitados no sertão. Ante a revelação da
mulher, Corisco chegou a chorar arrependido. E, antes de partir para raptar
Dadá, ouviu a mulher dizer:
- Nossa Senhora que cubra com seu divino manto. De mim o senhor é perdoado.
Matou meu filho, mas foi injusto.
Chega o amor
Jovemzinha de treze anos, Dadá foi levada para longe dali. Corisco a violentou,
ela quase morreu.
- Eu não podia mais ver meus pais. Era “mulher de cangaceiro” e, se fosse à
casa deles, eles seriam considerados coiteiros pela Polícia.
Coiteiro era qualquer pessoa que ajudasse os cangaceiros.
- Mesmo assim, meus pais apanharam da volante, minhas irmãs de cinco e nove
anos passaram frio e fome na cadeia, meus irmãos tiveram as unhas arrancadas.
Minha mãe quase morreu de tanto desgosto.
Três anos ficou Dadá nessa vida angustiada, na casa de uns tios de Corisco,
odiando-o, vendo-o uma vez ou outra, até que um dia ele disse:
- Agora você pode ir com a gente, já tem mulher no grupo.
E Dadá, a sertaneja calma, serena, de pouco falar, colocou suas muambas nas
costas e saiu para enfrentar uma vida de tiros, correrias, a luta contra a
polícia na caatinga, dormindo ao relento sobressaltada, comendo quando houvesse
comida.
- Às vezes dormíamos em travesseiros recheados de dinheiro e não havia o que
comer. Mas, quando a polícia dava folga, tudo de bom se tinha, perfume,
cavalos. Vivíamos como as mulheres da sociedade, ao pé do marido, como dona de
casa... como estou vivendo hoje em minha casa.
Em 1932, a perseguição policial apertou. O grupo se dividiu em dois, um com
Lampião, outro com Corisco. Foram para o Raso da Catarina, vasta região ao
norte da Bahia. Agora não podiam mais andar a cavalo, pois os animais chamavam
a atenção. Então, encantada com a delicadeza e o carinho de Corisco, Dadá
começa a gostar dele.
- Quem não ama o homem que carrega a gente no colo pra gente dormir?
Corisco resolve casar com Dadá, e a cerimônia é realizada pelo Padre José Nunes
da Rocha, hoje pároco em Feira de Santana-BA.
O primeiro filho de Dadá, Josafá, nasceu a 1º de maio de 1933, época dura para
os cangaceiros, cercados por todos os lados, perseguidos, andanças sem descanso
de um canto para outro.
- Fiquei com esse menino três meses. Por todo canto era tiro. O pobrezinho
estava assadinho, chorava, eu não sabia o que fazer. Deixei com umas pessoas
conhecidas, mas ele morreu.
Dadá compreendeu que não era possível criar os filhos:
- Foi horrível
ter meus filhos e não poder carregar. Sabe levar os meninos seria morte certa,
aquilo não era vida para anjo. Tive sete. Três estão vivos: Celeste, casada,
com dez filhos; Maria do Carmo, com três filhos e Silvio Bulhões, que é
economista e tem seis filhos. Todos eles foram criados por amigos. Mas nasciam
na caatinga, onde eu estivesse. Celeste nasceu durante uma perseguição.
Onde está Lampião ?
Para o homem comum do Nordeste, ainda hoje, cangaceiros eram heróis, homens
fortes que lutavam por justiça e liberdade. Eram quase sempre sertanejos,
altivos, orgulhosos. Do outro lado, as volantes, a polícia que os caçava em
nome da lei. Entre dois, estavam os sertanejos, numa posição delicada: se não
tinham armas em casa, eram acusados de “coiteiros”, se tinham armas e repeliam
os cangaceiros, acabavam sendo assassinados por eles.
Dadá conta que seu bando entrava em fazendas ou povoados e primeiro pedia
dinheiro, ou comida. Se não recebesse, tomava à força.
- A gente respeitava as famílias, senão ninguém queria ser amigo da gente.
Nossos bandos não faziam as misérias que vi no sertão. Por onde andei encontrei
muita coisa ruim das volantes. Antônio Marcionílio, cortaram a barriga dele,
perguntando: “onde está Lampião? Você vai dar conta”. Isso foi na fazenda
Gravatá, Estado de Alagoas. Quando achavam que o homem era amigo nosso, aí era
horrível. Às vezes penduravam de cabeça para baixo numa árvore e jogavam pedra.
Quando pegavam um cangaceiro vivo, primeiro perguntavam se tinha medo de
morrer. Geralmente, o “cabra” dizia que não. Então mandavam cavar um buraco,
matavam e enterravam.
O grande cerco
Foi em 1931 que Dadá conheceu Lampião.
- Tinha traquejo desde menino. Às vezes a gente estava sossegada, na fazenda de
algum coiteiro, quando ele olhava para um lado, concentrado, e dizia: “Vamos
embora que aí vem a polícia”. Um dia, o dono da casa disse: “Que polícia, que
nada, compadre. Vamos estourar umas pipocas”. E Lampião respondeu: Estourar
pipoca, não. Em dez minutos vai estourar é tiro”. Saímos imediatamente, e no
outro dia soubemos que a polícia chegara ali minutos depois.
De outra vez, a volante suspeitou que um vaqueiro fosse “coiteiro” de Lampião.
Os homens da Polícia chegaram e o ameaçaram:
- Você sabe onde Lampião está? Vai dizer, senão morre.
O vaqueiro sabia, mas respondeu que não passava de um simples peão. No entanto,
se a volante quisesse, ele iria dar uma espiada por ali, enquanto recolhia o
gado. O rapaz foi, encontrou-se com Lampião e explicou tudo. Pediu a Lampião
que achasse uma solução, pois se voltasse para casa sem dar notícias dos
cangaceiros, a volante saberia mais tarde que eles tinham estado ali e o matariam.
Dadá não se cansa de elogiar a inteligência de Lampião:
- Ele pegou os chocalhos dos bois, colocou nos pescoços dos seus homens, e
tocaram para a casa da fazenda, onde a volante esperava o vaqueiro. Os soldados
foram apanhados todos desprevenidos, foi aquele inferno. Não sobrou um. Lampião
tinha muito traquejo.
Um homem assim teria que morrer como morreu, traído por um “coiteiro”? Lampião
e seu bando, uns 35 homens, estavam acampados numa espécie de caverna, de
frente para o rio São Francisco, na Fazenda Angicos, em Sergipe. A volante os
cercou pela frente, alguns soldados ficaram por trás, sobre os altos da
caverna. Quando perceberam o cerco, muitos se lançaram correndo para a frente,
e foram mortos por trás, como Maria Bonita, mulher de Lampião, baleada nas
costas. Lampião e mais dez morreram. Quinze conseguiram fugir. Soldados daquela
volante, vivos ainda hoje, se espantam com a coragem dos homens de Lampião. E
confessam que tinham medo deles. Alguns estudiosos explicam a derrota de
Lampião por uma questão muito simples: ele e seus homens não haviam atualizado
os armamentos. Enquanto as volantes recebiam já metralhadoras e outras armas
mais eficientes, Lampião continuava com seus fuzis, revólveres e até punhais
tradicionais.
O tiroteio em que Lampião foi morto, ouviu-se da outra margem do rio São
Francisco, do lado de Alagoas, onde estavam Corisco e seu bando. Porém ele não
podia atravessar as águas para socorrer o companheiro.
As cabeças dos cangaceiros mortos naquele dia, 11 de junho de 1938 , inclusive as
de Lampião e Maria Bonita, foram cortadas e enviadas ao Museu Nina Rodrigues,
em Salvador.
Diga que matei
A morte do líder, Lampião, pôs em pânico o resto do bando. Mas logo o pânico se
transformou em ódio, vontade de vingar. O vaqueiro Domingos, o “coiteiro” que
acreditavam haver traído Lampião, estava com os dias contados.
Corisco esperou uma boa oportunidade, e dias depois dirigiu-se com seus homens
à casa do vaqueiro, onde matou o mesmo número de pessoas que a volante tinha
matado. Dadá lembra as cenas horríveis:
- Vi cabeças decepadas, enquanto os cães uivavam na noite escura. Num canto,
escondida, vi uma moça gorda protegendo duas crianças, que de tanto medo nem
conseguiam mexer-se. Fiquei com pena. Disse à moça: “Vão embora daqui, fujam
por trás, pela porta dos fundos”.
Foram as únicas que escaparam. Uma criança salvas ainda vive, trabalha em Paulo
Afonso. Todos os outros da família do vaqueiro Domingos foram assassinados.
Corisco arrancou-lhes a cabeça, colocou numa rede e mandou um velho de nome
João Crispim de Morais levar ao Tenente Bezerra, que tinha comandado a matança
do bando de Lampião. Dadá não esquece o recado que Corisco mandou o velho dar
ao tenente.
- Diga a ele que faça uma fritada com as cabeças. Diga que matei também duas
mulheres para vingar as duas que foram assassinadas em Angicos.
Corisco não imaginava a injustiça que tinha cometido. O vaqueiro Domingos era
grande amigo de Lampião e jamais o trairia. Tempos depois, soube-se que o
delator de Lampião era outro vaqueiro, chamado Pedro, que vivia perto dali.
O último encontro
Depois disso, Corisco pensou em dissolver o bando. Não conseguiam mais dormir
tranquilos. Chegavam a ter dois encontros por dia com os homens da polícia. As
volantes agora estavam usando muitos sertanejos, até mesmo ex-cangaceiros, como
rastejadores. Eram homens que conheciam a caatinga, corajosos, hábeis, os
únicos capazes de enfrentar os cangaceiros em condições de igualdade. Num dos
encontros, Corisco é ferido.
- Foi em Lagoa da Serra, Sergipe. Estávamos num rancho, esperando que viesse o
almoço. Como demorasse, fomos para a casa da fazenda. Chegando lá, estava a
Fôrça nos esperando, tinham descoberto nosso esconderijo. Estavam emboscados,
metralhadoras todas no chão. Vínhamos eu e Roxinho na frente, Roxinho caiu
logo, Corisco foi metralhado nos braços. Logo que percebi os tiros, tomei o
fuzil de Corisco, enrolei os braços dele, carreguei-o para fora do cerco e
assumi o comando.
Foi este o último encontro de Corisco com a volante, antes de morrer.
Se entrega Corisco... o fim triste !
1940. O sertão à tranquilidade. Os cangaceiros estão desarvorados. Por ordem do
Governo da Bahia, aqueles que deixassem as armas podiam entregar-se ou seguir
viagem para outro Estado. Não seriam punidos. Nem cortariam mais cabeças.
Dadá e Corisco, escondidos ainda, na casa de um sertanejo, já estão decididos,
Corisco cortou os longos cabelos, guardou as armas numa mala, vão desaparecer
no mundo, mudar de vida, trabalhar.
Acabaram de almoçar. No terreiro um cavalo encilhado os espera. Eles saem com
as malas. A lenda diz que alguém gritou: “Se entrega Corisco!” E que ele
respondeu: “Eu não me entrego, não!” Mas foi diferente. Corisco e Dadá estavam
botando as malas sobre o cavalo, quando se ouviu uma rajada de metralhadora.
Dadá saltou, pulou uma cerca, já atingida por um tiro no tornozelo. Ao levantar
o rosto, viu vários soldados à sua frente.
- Estava certa de que ia ser sangrada ali, na hora.
Um soldado berrou:
- Vamos matar logo essa...
- Não toquem nela! – gritou a voz de comando. Era Zé Rufino.
Dadá encarou-o:
- Podem me matar, mas não deixe me judiar, Zé Rufino.
- Não vai pegar em arma nenhuma.
- Então corte você mesmo...., respondeu Dadá.
Mas ninguém teve coragem de cortar.
A viagem de carro de boi durou dez horas. Corisco pedia água e dizia,
inconsciente, o nome da companheira. Morreu antes de chegar ao hospital.
(Zé Rufino não permitiu que cortassem a cabeça de Corisco, como acontecera a
Lampião e Maria Bonita. Mandou enterrá-lo. Mas, cinco dias depois, as
autoridades o desenterraram, cortaram a cabeça e o braço direito do cangaceiro
e os enviaram também ao Museu Nina Rodrigues, em Salvador. Silvio, um dos
filhos de Dadá e Corisco, luta, ainda hoje, para retirar do museu a cabeça do
pai.)
Fonte: REALIDADE – EDITORA ABRIL – ANO III – NÚMERO 31 – OUTUBRO 1968
Entrevista e fotos de Christina Matta Machado
Fonte: facebook
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