Por: Túlio Ratto
Para que todos
conheçam um pouquinho mais da história de Oséas, João e Hermelinda, reproduzo
aqui uma entrevista dada à Revista Papangu em junho de 2009. Com vocês, o Trio
Mossoró!
Início de uma
tarde “quente que só”, de um sábado no Sêbado, do destemido Marcos Almeida, em
Mossoró, tive o prazer de encontrar os três filhos, de uma prole de 16, do
comerciante Messias Lopes de Macedo e da senhora Joana Almeida Lopes: Oséas
Lopes, Hermelinda e João Batista.
A história
desses jovens forrozeiros começou na década de 1950, quando Oséas Lopes deixou
para trás um bom salário na rádio Tapuyo de Mossoró, onde trabalhava, e partiu
em busca do seu sonho no Rio de Janeiro. Um sonho que, para ser realizado,
contou com muita perseverança, além da ajuda financeira do pai.
Depois de
ralar muito na Cidade Maravilhosa, com os seus projetos muito bem encaminhados,
Oséas convidou os irmãos João Batista e Hermelinda para ingressarem na carreira
artística efetivando assim o trio forrozeiro que, além de muito talentoso,
levaria o nome da cidade de Mossoró aos quatro cantos do País.
Em 1962,
lançaram o primeiro disco intitulado “Rua do Namoro”. Pronto. Abriam-se as
cortinas para conquistas importantíssimas no cenário musical brasileiro, como o
troféu Elterpe, em 1965, pela música “Carcará”, do segundo disco do Trio, “Quem
foi vaqueiro”. Esse prêmio era o de maior importância da Música Popular
Brasileira à época. Dois anos depois, “Carcará”, de autoria de João do Valle,
seria regravado por Maria Bethânia.
João Mossoró e
Hermelinda concordam, além do próprio Oséas, que o grande culpado pela
separação do Trio, em 1972, foi Carlos André.
E quem é
Carlos André? Oséas Lopes assumiu o nome artístico de “Carlos André” no mesmo
ano da separação e atingiu o ápice do sucesso nacional em 1974 vendendo um
milhão de discos com o sucesso “Se meu amor não chegar”.
Atualmente,
Hermelinda vive entre Natal e João Pessoa, e diz que lá faz o que o peixe faz:
nada; João Mossoró é representante comercial e continua residindo no Rio de
Janeiro.
Depois de
trinta e cinco anos, para a alegria dos mossoroenses, eles realizaram um show
em nossa cidade e fizeram o anúncio do retorno do Trio até o final do ano com
um novo trabalho e que incluirá grandes nomes da MPB.
E para a
alegria dos frequentadores do Sêbado, quando de nosso bate-papo, a tarde
esquentou ainda mais com o Trio Mossoró fazendo um inesquecível show,
relembrando seus grandes sucessos. Saí de lá me sentindo um felizardo pela
oportunidade de ver aquele trio de rouxinóis do nosso legítimo forró cantar.
Revista
Papangu — Como despertou o lado musical de vocês?
Carlos André — Pode
dizer o que quiser aí?
Revista
Papangu — Claro!
Carlos André — Canindé
Alves, que era locutor da rádio Tapuyo, me ouvindo cantar, me convidou para uma
participação na rádio e a partir desse dia não teve mais como parar.
Hermelinda — Era
uma família de músicos. A nossa mãe não cantava fora de casa, mas adorava
cantar.
Carlos André — O
nosso irmão “Cocota” cantava muito também.
Cocota
Daí criou-se uma espécie de
escolinha. Já fazia um relativo sucesso no rádio. Tudo incentivado por nossa
mãe. Nessa época, ela “mandou” logo os meninos aprenderem algum instrumento.
Naquele momento existiam duas rádios, a Difusora que era controlada e comandada
por Dr. Francisco Duarte, e a Tapuyo, de Vingt Rosado.
Dr. Francisco Duarte
Genildo Miranda e Paulo
Gutemberg que era o diretor e superintendente da rádio Difusora,
respectivamente, pediram a Dr. Chico Duarte que era muito amigo, além de
compadre do meu pai, para que assinássemos contrato com a Difusora.
Vingt Rosado
Falei com
Vingt e ele ligou pra João Newton — superintendente da Tapuyo, mandando dobrar
o meu salário. À época, me ofereceram um dinheiro muito bom e acabei ficando na
Tapuyo por mais algum tempo.
João Mossoró — O
Oséas vivia com sua sanfona fazendo cantorias lá em casa. Aquilo acabou
influenciando, contagiando a todos nós.
Revista
Papangu — A família de músicos foi muito importante e muito ouvida por vocês. E,
naquele momento, quem mais vocês ouviam?
João Mossoró — Luiz
Gonzaga e Marinês.
Hermelinda — Acho
que eles foram os criadores de tudo que ainda está aí.
Carlos André — Olha,
até hoje, acredito que tudo é a força da mente, né, bicho? Quando eu morava
aqui eu tinha dois grandes amigos, o Maurino, do Horto Florestal, e o Pedrinho.
A gente ficava em cima dos muros criando projetos. O Maurino dizia que seria
jogador de futebol. O Pedrinho sonhava em seguir carreira na Aeronáutica. E eu
ficava com um “olho” de carnaúba fazendo uma espécie de sanfona. Se vocês
pegarem um olho daqueles, verão que parece um fole. Eu dizia que queria cantar.
Era o meu sonho. Maurino terminou sendo jogador do América de Natal; Pedrinho
morreu sargento da Aeronáutica, em Recife.
Revista
Papangu — Então, você, Oséas, dos três amigos, era o que queria ganhar
dinheiro?
Carlos André — (Risos)
É. Talvez…
Revista
Papangu — Carlos André, você começou a cantar primeiro. Mas quando o Trio
começou a tocar como ofício?
Carlos André — Como
disse, eu já estava bem encaminhado no rádio. Nossa mãe em um aniversário
resolveu me fazer uma homenagem. A partir daí, todos já pegaram um instrumento
e começaram a tocar e cantar juntos.
Hermelinda — O
João e o Oséas já estavam no ramo, tocando em Mossoró. Eu nem pensava em
ingressar nessa carreira. Porém, foi nesse bendito aniversário do Oséas que
tudo se encaminhou. João e nosso irmão Cocota, grande seresteiro aqui em
Mossoró, em três dias me ensinaram a tocar triângulo. Minha mãe ainda comprou um
LP de Marinês e eu fui aprendendo a cantar e tocar aquelas músicas todas
Marinês
Revista
Papangu — Qual a razão de sair de Mossoró para outro Estado?
Carlos André — Primeiro
eu fui para Fortaleza. Passei um ano lá; fiz sucesso trabalhando com “Xerôso”,
aquele que trabalhou com o Chico Anysio. O do jumentinho, lembra? Fizemos muito
sucesso cantando na Cidade da Criança. Depois fui pra Recife. Lá trabalhei com
Orlando Souza, autor de várias novelas escritas para a rádio Jornal. Voltei a
Mossoró e falei para Souza Luz, da rádio Tapuyo, que iria para o Rio de
Janeiro. Souza perguntou se eu estava maluco. Ora, eu ganhava um ótimo salário
aqui. Mas, vamos colocar os jumentinhos lá na frente: e se eu não tivesse
ido, como estaríamos hoje? Temos uma infinidade de talentos aqui, como dizem na
gíria “rodando a bolsinha” e sem apoio de nada. Se eu não tivesse ido estaria
na mesma. Em 1959, eu fui sozinho para o Rio e depois comecei a fazer vários
programas por lá. Apresentei-me na Rádio Nacional, no programa do Trio Irakitan.
Rádio Tupi e a coisa começou a andar. Aí chamei os outros para o Rio. Partimos
para a realização de um sonho, sim, mas com um diferencial, como o nosso pai
tinha uma boa condição financeira, ele mandava dinheiro todos os meses para a
nossa despesa. A gente estava indo muito bem.
Hermelinda — Quando
chegamos ao Rio, eu ia fazer 14 anos e o João tinha 12. Formamos o grupo “Oséas
Lopes e seus cangaceiros”. No nosso primeiro disco, o diretor da Copacabana
Disco, Nazareno Brito, disse que o nome do grupo era muito forte. Aí Oséas
inventou o Trio Mossoró. O povo da gravadora, depois de alguns probleminhas,
chegou dizendo que só tinha dinheiro para cobrir os gastos de uma zabumba,
sanfona e triângulo. Foi aí que Seu Messias Lopes autorizou Oséas a colocar
tudo que fosse necessário dentro do estúdio.
Revista
Papangu — Foram 12 LPs, além de seis compactos. Atualmente como é lançar um
disco novo no mercado? Antes tinha todos aqueles programas para fazer,
percorrer rádios e tal…
Carlos André — Era
muito, muito mais fácil. A mídia naquele tempo, a gente saía com um disco
embaixo do braço e todo mundo queria tocar.
Hermelinda — Era
fácil. Qualquer um que cantasse recebia uma grande divulgação. Hoje, tudo é
pago. Até pra cantar na televisão você tem que pagar.
João Mossoró — Quando
você tinha uma música boa, o sucesso vinha sozinho. Também recebíamos cachê pra
cantar nesses programas de TV. Atualmente a historinha é outra.
Hermelinda — Lembro
que no nosso primeiro disco, “Rua do Namoro”, depois de seis meses, a gravadora
nos chamou para gravar o segundo. Veio, então, o disco “Quem foi vaqueiro”,
considerado pela crítica como o melhor disco de música regional. É bom que se
diga que naquele tempo quem escolhia era a Academia de Letras, jornalistas,
críticos musicais. No recebimento do prêmio, ao entrar no Teatro Municipal, o
que víamos? Feras! Maria Bethânia, Elis Regina, Jair Rodrigues… A elite da
Música Popular Brasileira.
Revista
Papangu — No ano de 1972 vocês se separaram. Por quê?
Hermelinda — A
culpa foi de Oséas.
João Mossoró — Ele
inventou de quebrar uma mesa… (risos). Oséas Lopes era também diretor de
gravadora, o sucesso foi grande e aí se danou tudo.
Carlos André — A
culpa foi de Carlos André mesmo. Com aquela invenção de “quebrar a mesa”, em
1974. Só que foi um sucesso tão grande que não tive como retroceder.
Revista
Papangu — Vocês acham que o “Trio Mossoró” influenciou quem fazia forró por
aqui?
Hermelinda — Acho
que sim. Um desses é Marcus Lucenna, que mora no Rio. Ele próprio sempre fala
sobre isso. Mas Carlos André conhece mais. Eu só venho aqui uma vez por ano,
nas festas juninas. Faço o meu show e vou embora.
João Mossoró — Eu
é que não posso falar. Volto à minha cidade depois de trinta e cinco anos. Era
louco pra vir a Mossoró. Meu outro ofício me impede. Sou representante
comercial. O importante é que agora estou realizando esse desejo.
Revista
Papangu — Abrindo um parêntese nessa pergunta, o que você faz em Natal,
Hermelinda?
Hermelinda — Eu
faço o que o peixe faz: nada.
Revista
Papangu — Sendo assim, Carlos André, você como o mais presente do Trio na Terra
de Santa Luzia, quem destacaria no nosso cenário musical?
Carlos André — Quem
conhece Mossoró sabe que aqui é um celeiro de grandes artistas. Não dá nem pra
elencar tantos talentos. Temos muitos. Mas é aquela coisa, sem incentivos o
negócio não anda, bicho!
Revista
Papangu — Enfim, a Prefeitura de Mossoró conseguiu reunir o Trio para um show.
Carlos André —Realmente,
foi muito bonito. Mas o Trio Mossoró não foi contratado para um show. A
contratação foi individual.
Hermelinda — Eu
sempre venho. Todos os anos estou aqui.
João Mossoró — No
final do número de um desses três shows que fizemos foi que achamos que seria
interessante nos reunir e, mesmo sem ensaio, fizemos uns quatro ou cinco
números. Tudo de improviso. Pois não contrataram o Trio, contrataram os
artistas.
Revista
Papangu —Como vocês analisam a questão da tecnologia? Vocês não têm um site
oficial, por exemplo.
Carlos André — Isso
aí, essa pirataria toda, em termos de divulgação é ótimo. Não atrapalha de
forma alguma. Isso em nível de artista. Agora, as gravadoras passam por maus
bocados.
João Mossoró — É.
Mas já estamos vendo as pessoas, os fãs, pagarem uma taxa por músicas baixadas
na internet. Isso é muito interessante, também, para as gravadoras.
Hermelinda — O
que devemos acrescentar aí é que muita gente toma conhecimento de novos
artistas exatamente através da internet.
Revista
Papangu — Estão com algum projeto em andamento?
Hermelinda — Se
Deus quiser, até o final do ano estarei fazendo um novo disco.
João Mossoró — Também
lanço outro CD. Mesmo como representante de Equipamento de Proteção Individual
-EPI, ainda estou na música, gente!
Carlos André — Também,
queria dizer que até o final do ano estaremos lançando um projeto, através do
apoio do amigo Crispiniano Neto e da Fundação José Augusto, que será muito
interessante. Um disco com vários convidados, ícones da música nacional.
Revista
Papangu —Vocês poderiam adiantar algum nome?
Carlos André — Ratto,
o problema é a liberação desses artistas pelas gravadoras. São cinco: Nana
Caymmi – que vai idealizar a coisa —; Maria Bethânia, Chico Buarque, Gilberto
Gil e Fagner — que apesar de não ser da época do Trio Mossoró, gravou uma
canção minha, por isso faço questão que ele cante “Orós” comigo.
João Mossoró — Espera-se
que o lançamento seja em dezembro durante os festejos da nossa padroeira Santa
Luzia.
Revista
Papangu — Alguma dica aos leitores da Papangu que pretendem seguir a carreira
musical?
Carlos André — Rapaz,
aqui tem muita gente boa. E como já disse, a falta de apoio arrebenta qualquer
sonho.
Hermelinda — No
Sul a gente vê os poderes apoiarem muito os artistas locais. Com leis de
incentivo, com patrocínios e produções musicais. Perseverança é o mais
importante para quem está começando.
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