Por Rangel Alves
da Costa*
Já fiz a
pergunta acima em muitas ocasiões, desde minha Nossa Senhora da Conceição de
Poço Redondo à capital sergipana e outros lugares por onde passo. Não era
pesquisa, mas apenas a busca da percepção do povo perante a saga do cangaço. As
respostas já eram esperadas, principalmente se feitas as indagações no sertão
ou na capital e centros mais desenvolvidos.
Na maioria, o
sertanejo abraçaria o cangaço sem pensar duas vezes. Mas erra quem imaginar que
os citadinos optariam por ser da volante, da macacada perseguidora de
cangaceiros. Apenas uma pequena parcela afirmou que teria o prazer de empunhar
arma para ir ao encalço dos malfeitores. Ninguém se absteve de responder, mas a
maioria preferiu dizer que nem de um lado nem do outro. “Deus me livre de
entrar nesse meio!” Uma resposta como síntese.
E você, seria
cangaceiro ou volante? Não precisa responder agora. Primeiro tenho a dizer que
tenho lido e ouvido opiniões as mais diversificadas a respeito do cangaço. Por
consequência, há os que louvam a saga cangaceira, glorificam Lampião e vêem o
cangaço como uma luta justa dos oprimidos contra as forças opressoras, mas
também os que maldizem tudo que diga respeito ao Capitão e seu bando. E também
todos os grupos armados que gestaram nas caatingas nordestinas.
Estes, os
ferrenhos críticos da saga e da majestade lampiônica, talvez desejassem ser
perseguidores de cangaceiros não apenas pelo fato de que seria honroso fazer
parte de um grupo policial comandado, por exemplo, por Zé Rufino, Liberato de
Carvalho ou João Bezerra. Mas simplesmente porque internalizarem a ideia de que
cangaço era sinônimo de morte e destruição, e cangaceiro a feição da violência,
da brutalidade e da fúria sanguinária e impiedosa. Por consequência, o seu
líder maior seria o anticristo das caatingas nordestinas.
Na verdade,
acaso eu desejasse ter uma explicação maior acerca da opção por preferir ser
cangaceiro a volante, ou vice-versa, dificilmente receberia uma resposta
satisfatória, uma justificativa plausível e convincente acerca da opção. E
assim por que as pessoas geralmente opinam sem ter um conhecimento mais
aprofundado sobre o que foi o cangaço, suas causas e motivações, os modos de
atuação no sertão nordestino, o que pode ser visto como verdade ou mentira no
seu contexto.
Igualmente com
relação à volante, eis que muitos ainda acreditam que era apenas a polícia
atrás do bandido, a lei perseguindo o crime. Na concepção de muitos, um grupo
de homens ordeiros, diligentemente comandados por um estrategista das
caatingas, cujo objetivo maior era dizimar aqueles bandoleiros que
aterrorizavam os sertões e afrontavam o Estado. E pensar assim é desconhecer a
expressão “farinha do mesmo saco” que tantas vezes pode ser aplicada às ações
indistintas dos dois grupos.
Jamais
influenciei a resposta de quem quer fosse. Contudo, diante de algumas
aberrações ouvidas, via-me no direito de explanar um pouco acerca do mundo
cangaceiro, incluindo logicamente a volante. E sempre expunha que na minha
concepção o cangaço fora realmente fruto daquelas expressões tantas vezes
repetidas: Pessoas na maioria iletradas, que se sentiam injustiçadas,
maltratadas ou ignoradas pelo Estado e pela lei, oprimidas pelos poderosos de
então, e que não se viam com outra saída senão se juntar em grupo, pegar em
armas para serem sentidas e ouvidas, ainda que de maneira brutal e sangrenta.
Sobre a
volante não podia omitir a verdade. Afirmava que era o mesmo cangaço ao
inverso. Quer dizer, forças policiais que não obedeciam limites ou fronteiras
na perseguição de cangaceiros, mas cuja caçada fazia de vítima até mesmo o mais
humilde trabalhador sertanejo. Objetivavam limpar o sertão daquela praga de
malfeitores, arruaceiros e violentos, mas deixavam rastros de sangue e
desordens por onde passavam; pretendiam proteger o sertanejo daquela
sanha brutal, mas aterrorizavam mais ainda o homem da terra; enfim, queriam dar
fim à violência cangaceira, mas agiam com desmedida brutalidade nas vastidões
espinhentas.
Mas insisto na
pergunta, e você, se naqueles tempos vivesse, enveredaria pelos caminhos do
cangaço ou da volante? Faço uma pequena observação antes que responda: Dizem
que João Bezerra, o comandante da volante na Chacina do Angico, passou o
restante da vida amargurado por ter traído o amigo Lampião. Pois eram amigos,
de proseados e carteados nos escondidos da mata. Não acredito, mas dizem.
Farinha do mesmo saco ou os generais escrevem outra história às escondidas?
Quanto a mim,
não seria nem cangaceiro nem volante. Ser coiteiro me bastaria. Aliás, coiteiro
sou. Não um grandioso Mané Felix nem um Messias Caduda, mas alguém que sempre
procura preservar o Lampião para iluminar a História.
Poeta e
cronista
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