Nascido em 16
de junho de 1927, em João Pessoa, quando a capital paraibana ainda se chamava
Nossa Senhora das Neves, Ariano Vilar Suassuna era filho de João Urbano Pessoa
de Vasconcelos Suassuna, então presidente (governador) de seu estado natal, que
exerceu seu mandato entre os anos de 1924 e 1928. Ariano inclusive nasceu no
palácio do governo paraibano.
O velho
contador de histórias do sertão tinha apenas três anos quando um fato trágico
marcou sua infância. No desenrolar da Revolução de 1930, um pistoleiro de
aluguel assassinou seu pai com um tiro pelas costas, numa rua do Rio de
Janeiro. O assassinato foi motivado por boatos que apontavam o patriarca da
família Suassuna como mandante da morte de João Pessoa Cavalcanti de
Albuquerque, seu sucessor no governo, que pertencia ao grupo político oposto e
serviu de estopim para a deflagração da revolução.
Um ambiente
assim, com dívidas de sangue e rivalidade entre famílias, cobrava dos órfãos a
vingança. Mas, um dia antes de ser assassinado, João Suassuna deixou uma carta
aos nove filhos pedindo que eles não se tornassem assassinos por sua causa.
Ariano Suassuna obedeceu. A mãe também ajudou, ao dizer que o pistoleiro
responsável pelo crime já havia morrido (era mentira).
Com a
tragédia, a família mudou-se para a pequena cidade de Taperoá, no interior da
Paraíba, onde Ariano morou de 1933 a 1937. Ele herdou a biblioteca do pai e ali
encontrou livros importantes para sua formação. Um dos mais significativos foi
“Os sertões”, de Euclides da Cunha. A obra lhe apresentou um dos personagens
que mais marcaram sua vida: Antônio Conselheiro, profeta e líder de Canudos.
Foi também em Taperoá que Ariano Suassuna assistiu pela primeira vez a uma peça
de mamulengos e a um desafio de viola, cujo caráter de “improvisação” seria uma
das marcas registradas também da sua produção teatral.
Em 1942 foi
para Recife concluir o ensino básico. Em 1946 fundou o Teatro do Estudante de
Pernambuco, junto com o amigo Hermilo Borba Filho. No ano seguinte escreveu e
encenou sua primeira peça teatral: “Uma mulher vestida de sol”. Em 1948, sua
peça Cantam as harpas de Sião (ou O desertor de Princesa) foi
montada pelo Teatro do Estudante de Pernambuco. Seguiram-se Auto de João
da Cruz, de 1950, que recebeu o Prêmio Martins Pena. Neste mesmo ano Ariano
formou-se em Direito e advogou até 1956, quando se tornou professor de Estética
na Universidade Federal de Pernambuco (onde se aposentou em 1994).
Em 1955
escreveu “Auto da Compadecida”, que conta as aventuras de dois amigos, Chicó e
João Grilo, no Nordeste brasileiro. A peça o projetou em todo o país. Em 1962,
o crítico teatral Sábato Magaldi diria que a peça é “o texto mais
popular do moderno teatro brasileiro”. Sua obra mais conhecida já foi montada
exaustivamente por grupos teatrais de todo o país e duas vezes para o cinema,
em 1969 e 2000.
Ariano
Suassuna continuou criando, escrevendo peças de teatro, romances e poesias,
entre estes podemos listar “O Santo e a Porca - Casamento Suspeitoso”, de
1957, “A Pena e a Lei”, de 1959, “A Farsa da Boa Preguiça”, de 1960,
e “A Caseira e a Catarina”, de 1961. Outra obra fundamental foi “Romance
d’a pedra do reino e o príncipe do sangue vai-e-volta”, é quando o escritor
avança em relação à literatura regionalista dos anos 1930, representada por
João Guimarães Rosa e José Lins do Rego. Mais tarde, Ariano Suassuna diria que
“A pedra do reino” era de certa forma, uma tentativa de trazer seu pai de volta
à vida.
Para
transformar o local em simbólico e universal, Ariano aliava os valores mais
arraigados de sua região a seu imenso arcabouço erudito e teórico. Com uma
escrita que une elementos do Simbolismo, do Barroco e da literatura de cordel.
Esse ficcionista, poeta, dramaturgo e pensador da cultura, transformou o sertão
no palco das questões humanas de qualquer lugar do mundo.
Ele foi o
criador do Movimento Armorial, que possuía como projeto central a ideia de
gerar uma confluência simultânea de todas as artes populares do Nordeste
brasileiro. Lançado oficialmente, no Recife, no dia 18 de outubro de 1970, com
a realização de um concerto e uma exposição de artes plásticas realizados no
Pátio de São Pedro, no centro da cidade. Surgiu sob a inspiração e direção de
Ariano Suassuna, com a colaboração de um grupo de artistas e escritores da
região Nordeste do Brasil e o apoio do Departamento de Extensão Cultural da
Pró-Reitoria para Assuntos Comunitários da Universidade Federal de Pernambuco.
Teve início no âmbito universitário, mas ganhou apoio oficial da Prefeitura do
Recife e da Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco. Seu objetivo foi o
de valorizar a cultura popular do Nordeste brasileiro, pretendendo realizar uma
arte brasileira erudita a partir das raízes populares da cultura do país.
Segundo
Suassuna, sendo “armorial” o conjunto de insígnias, brasões, estandartes e
bandeiras de um povo, a heráldica é uma arte popular. Desse modo o nome adotado
significou o desejo de ligação com essas heráldicas raízes culturais
brasileiras.
A maioria de
suas obras foi traduzida para outros idiomas, como francês, alemão, espanhol,
inglês e holandês. Em 1989, passou a ocupar a Cadeira nº 32 da Academia
Brasileira de Letras.
Ariano
Suassuna foi secretário estadual de Cultura no período 1994-1998, durante o
governo de Miguel Arraes (1916-2005) e assumiu o mesmo cargo, como secretário
especial no primeiro mandato do governo Eduardo Campos (PSB), neto de Arraes,
em 2007. Seu foco sempre foi o da valorização da cultura popular,
posicionando-se também contra qualquer estrangeirismo da língua portuguesa.
Mostrou ao povo brasileiro como ele é inventivo, engraçado, esperto e
interessante e provou que não existe nada do lado de lá das fronteiras que
possamos invejar.
Foto – Bianca
Lima
Carismático e
popular, Ariano Suassuna esbanjou simpatia por onde passou. Nos últimos anos
apresentava por todo o Brasil suas famosas e concorridas “aulas-espetáculo”,
onde ensinou formas de arte para o público e mostrou a riqueza da cultura do
país, contando histórias, “causos” e piadas.
Em 2011 foi
veemente no apoio ao veto ao patrocínio nas festas juninas das bandas de forró
estilizadas, as chamadas “bandas de plástico”, defendido pelo secretário de Cultura
do Governo da Paraíba, o cantor Chico César, que defendeu a teses que estes
grupos musicais não refletiam a música nordestina. A posição do secretário
gerou descontentamento nas prefeituras que promoviam os festejos juninos com o
patrocínio do Estado, nos empresários e músicos das bandas de forró estilizado
e gerou muita polêmica, mas Ariano esteve ao seu lado.\
Foto – Sergio
Enilton
Há uma
realista descrição de Ariano feita por seu amigo, o também dramaturgo Hermilo
Borba Filho:
“Magro e alto,
de uma coerência extremada, radical em suas opiniões, é preciso vê-lo numa
discussão com seus amigos (porque, com seus inimigos, basta ler seus artigos);
zombeteiro, argumentador, desnorteante, irreverente. Vive, com a maior
convicção, o preceito de Unamuno* de que o artista espalha contradições. É
capaz de destruir o argumento mais sério com uma piada ou sair-se de um
problema metafísico dos mais angustiantes numa conversa ligeira. Tem horror aos
aparelhos modernos enceradeira, vitrola, televisão, rádio, telefones,
considerando-os coisas do demônio. Gostaria de crer em Deus como as crianças
crêem, mas crê com angústia, fervor e perguntas. Não vai a reuniões oficiais,
coquetéis, espetáculos, mas amanhece o dia num bate-papo ou ouvindo
repentistas. Tem pavor de avião e se martiriza com uma alergia que lhe dá
comichões no nariz. Seu caráter é ouro de lei, e, embora o negue, esforça-se
para amar os inimigos, como manda o evangelho. A arte e religião são por ele
encaradas de maneira fundamental.”
*Escritor
espanhol Miguel de Unamuno (1864-1936).
Fontes
- http://oglobo.globo.com/cultura/livros/morre-aos-87-anos-escritor-ariano-suassuna-cavaleiro-do-sertao-13341934
http://blogdomendesemendes.blogspot.com