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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

LAMPIÃO O FILME - EM MOSSORÓ

Por: Kydelmir Dantas(*)

Desde que saiu a notícia sobre as filmagens d’uma ficção baseada em fatos reais, cujo tema é o Cangaço e a personagem principal é Lampião e que as primeiras cenas serão filmadas em Mossoró, sobre a invasão de 1927, que somos questionados nas ruas e no trabalho: “Você está por trás disto?” “E aí, já conheces o roteiro?” “Fostes contactado pela produção?” A resposta é sempre, não!

Sei que as perguntas são devido ao nosso conhecimento do tema – modéstia a parte - principalmente sobre a resistência, e a nossa participação, como consultor histórico no espetáculo ‘Chuva de bala no País de Mossoró’.

Neste domingo (07/10/2012) encontro nas páginas do ‘Universo’, caderno cultural d’O Mossoroense, uma matéria sobre o filme... Que começa assim: “Vem aí mais uma produção sobre o cangaceiro Lampião”. E logo no segundo parágrafo me aparece o que denominam de ‘licença poética’, o que sempre é de praxe, principalmente em se tratando de cangaço, para muitos não passa da falta de compromisso com a História. Nas palavras do diretor Bruno Azevedo isto fica claro: “A intenção não é glorificar a imagem de Lampião, mas mostrar um lado pouco conhecido dele.”


Qual será? Porque, ultimamente, até sobre o rei do cangaço ter sido gay um juiz de Sergipe escreveu ter ‘encontrado evidências’– não comprovadas – e publicou num livro, que ora está sub-júdice em ação impetrada pela família Ferreira.

Depois de tantos livros sobre a personalidade, a figura, o homem, o cangaceiro... Ainda teremos novidades? Pra se ver o quanto o mito Lampião é forte!

Noutro parágrafo, o diretor disse: “Vamos registrar a retirada dos cangaceiros da cidade de Mossoró, não como derrotados, mas como estratégia de guerra, em que eles perceberam a desvantagem e decidiram sair.”

Pronto! Eis uma novidade! A derrota como estratégia de guerra.

Que não é tão nova, pois ainda é lembrada a ‘fuga como forma heroica de resistir’, defendida por um neo-historiador nos 80 anos da Resistência, quando criou uma trincheira de Jerônimo Rosado, composta por alguns que não estavam em Mossoró naquela tarde do dia 13 de junho de 1927.

Depois vem uma série de ‘novidades’ no parágrafo ‘protagonista real’... Dentre elas, que Lampião trabalhava como artesão até os 21 anos e usava óculos para a leitura. Outra, que começou aos 21 anos no cangaço, devido a morte do pai em confronto com a polícia e que seu bando ‘nunca’ ultrapassou de 50 homens.

Vamos a estas últimas novidades: O motivo da entrada de Virgolino no cangaço não foi a morte do pai, ocorrida em 1921, já que ele estava envolvido em pequenos grupos de cangaceiros desde 1917; a morte do pai foi apenas um escudo ético usado por Lampião para justificar-se, diante da opinião pública, como um homem que fez do cangaço o seu meio de vida durante 20 anos. (Ler a entrevista dada por Lampião em Juazeiro do Norte 
– CE, a 6 de março de 1926).

O uso dos óculos veio após ferimento no olho, durante um combate. (O Espinho do Quipá – Antonio Amaury & Vera Ferreira).

Se no ataque a Mossoró o grupo de bandoleiros tinha mais de 50 homens, como é que ‘seu grupo NUNCA ultrapassou este número’? Ora, é sabido que Lampião chegou a comandar diretamente mais de 100 cangaceiros e indiretamente mais de 200! Não foi à toa que ele dividiu seu bando em subgrupos, que a ele rendiam obediência e prestavam-lhe contas; por exemplo, temos depoimentos dos cangaceiros, ainda vivos, Candeeiro (PE) e Vinte e Cinco (AL), corroborando nossas pesquisas.

Portanto, continuamos na mesma, com relação ao cinema cangaço... A maioria não passa de licença poética que não respeita a História como ela aconteceu. É só esperar pra ver.

(*) Pesquisador e escritor pertencente ao quadro de sócios do ICOP; de Nova Floresta – PB, radicado em Mossoró - RN.

Enviado pelo autor

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FOLCLORE MOSSOROENSE:


FOLCLORE MOSSOROENSE:

Tico Balduino, caboclo afeito a agricultura, vivia cuidando da roça, e era daqueles que "acreditando nas nuvens", plantava com antecedência, isto é, "no seco". Tico nem esperava pelo dia de São José. Certa tarde, ao voltar do roçado, onde não havia caído "nem uma gota d'água", apesar do dia do santo das chuvas estar de véspera, Balduino notou que, a distância de dois quilômetros, chovera - e ainda chovia - a manhã toda. 

Bastante cético, rabugento e chateado, comentou: "Óia", como São José é babão. Aqui nas terras dos Mendes, é água de fazer lama. No meu roçado, nem pingou!". 

Instantes depois, a chuva engrossou, e a descarga de um raio derrubou Balduino de cima do jumento, lançando-o num lamaçal. O sertanejo bronco levantou-se, olhou para cima, e berrou: "Eu disse e tá dito: Babão, babão, babão!".

Enviado pelo escritor, poeta e pesquisador do cangaço:


Kydelmir Dantas

MOSSORÓ - RN
Fone: (0xx - 84) - 3323 2307

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Convite lançamento livro - O REI E O BAIÃO



Enviado pelo poeta, escritor e pesquisador do cangaço: 
Kydelmir Dantas

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O JAGUNÇO, O CORONEL E A HORA DA VERDADE (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)
Rangel Alves da Costa

O JAGUNÇO, O CORONEL E A HORA DA VERDADE

Quando o jagunço entrou na sala encontrou o coronel de costas, de mãos entrelaçadas atrás, talvez mirando as distâncias infinitas de suas terras. Continuou na mesma posição, enquanto o seu pistoleiro, nervoso, não sabia nem segurar com firmeza o chapéu que havia tirado da cabeça em reverência.

Estava nervoso sim, mas não com medo. Não era cabra pra ter medo de nada, principalmente de outro homem, ainda que coronel poderoso e afamado de todo tipo de brabeza da vida. O nervosismo era motivado pelo que tinha a dizer ao patrão, disposto que estava a dar um fim de vez na sua vida de matador de mando.

“Fez o trabalho que mandei Jesuíno?”. Disse o coronel, ainda virado para a janela, enquanto livrava as mãos para se servir de uma bebida disposta numa mesinha ao lado. Despejou o uísque, porém o copo despencou da mão assim que ouviu a resposta do jagunço.


“Num matei nem hei de matá mai ninguém. Doje diante num conte mai comigo pá dá cabo dos seus inimigo não. Só quero qui o sinhô me pague os atrasado e pode arrumá outo pá fazê suas mardade”.

Só mesmo quem estivesse do outro lado da janela para presenciar a terrível feição do coronel ao ouvir tais palavras. Homem de pele clara, rosto rechonchudo, bigode cheio queimado de fumo, de repente se transformou como numa bola de fogo derramando labareda pelas ventas. Os olhos pareciam soltar faíscas, o bigode espesso tremulava, a boca se retorceu tomada de ódio.

Contudo, o que Jesuíno ouviu nem parecia ter saído de uma pessoa em tempo de explodir, prestes a dar um bote infernal a qualquer momento. Só ouvindo a voz sem ver a feição, apenas procurou cuidadosamente escutar o que veio de lá.
“Depois de tudo se acovardou, se bandeou pro lado dos covardes, dos fracos. E olhe que você não tem escolha não, me deve obediência, tem apenas de fazer o que lhe pago pra ser feito. Um matador, um jagunço, um pistoleiro de sua laia, vai continuar sempre assim, a não ser que...”.

Nem terminou de falar e ouviu o jagunço dando passos à frente, já com voz diferenciada: “A num ser qui eu continuasse um pau mandado de vosmicê, um assassino qui mata traveiz das mão dos outo. Quem é mai bandido de nóis dois coroné? Diga. Quem é mais matadô, o qui só puxa o gatio ou quem paga pá vará as tripa? Diga coroné, diga...”.

Foi quando o coronel se virou feito fera pronta para atacar, trazendo arma na boca e chumbo no olhar tenebroso. “Mas quem é você pra tá falando assim comigo seu verme, seu matador de emboscada e tocaia. E se abrir essa boca nojenta de novo vou encher todinha de bala...”.

“Mai quem tá armado aqui é eu coroné. E sô matadô, cuma o sinhô bem sabe. E quem mata um home, faiz ele istribuchá no chão inté morrê, tomem mata um cachorro sarnento cuma o sinhô...”.

O coronel quis avançar, partir pra cima do homem, mas teve de recuar quando avistou duas armas na cintura do outro, e uma mão já na direção da cinta. Os olhos esbugalharam de vez quando viu o jagunço puxar uma arma e apontar na sua direção. Desarmado, sem poder reagir, só conseguiu atinar um jeito de sair vivo dessa. E o instinto lhe veio à voz trêmula, medrosa:

“Quanto você quer Jesuíno? Pago quanto quiser pra guardar essa arma e sair por essa porta como um homem decente e rico. Diga quanto quer Jesuíno”. Mas ouviu do jagunço: “Se assente naquela cadeira ali, é só isso qui quero agora. Se avexe...”.

O coronel sentou na cadeira de balanço já de fundilhos sujos. As mãos e as pernas tremiam como vara verde; sentia pontadas e mais pontadas na carcaça inteira; o coração queria explodir, sair pela boca. Quis colocar o chapéu encobrindo a mijada no linho branco, mas o jagunço não deixou.

Mandou que colocasse o chapéu na cabeça, acendesse um charuto e virasse uma golada de uísque. Ora, era coronel e tinha de ser tratado assim. Disse, mas falou mais:



“Quis abocanhá o mundo e abocanhô. Quis toda terra daqui e conseguiu. Quis qui todo inimigo desaparecesse de veiz e acabô mandano um a um pá debaxo da terra. Mandô matá o vigaro qui sabia demai e eu matei, mandô matá o seu porpio fio gastadô e eu matei. Todo mundo qui mandô matá eu matei, e num sei nem das conta. Se alembra do finado Mineuvino, aquele do terrenim lá de riba qui o coroné cismô de se apossar? Mineuvino era meu irmão, e o qui fiz cum ele pru causa do sinhô? Agora eu pregunto, quem farta mai morrê? Será qui num tá na hora de quem mandô matá tanta gente inocente morrê tomem não? Responda coroné!”.

“Responda coroné, responda coroné!”. Mas o coronel não respondia. Estava morto. Não suportou a verdade e morreu. Mas ao achar estranho o silêncio do patrão, o jagunço se apressou até a cadeira, balançou o homem, fez tudo para que desse sinal de vida. Mas nada. Certificou-se que estava morto.

E chorando, pedindo perdão por tudo, abraçou o patrão, parecia completamente desesperado com o acontecido. “Eu gostava tanto do sinhô, patrãozinho. O que vai sê deu agora sem as sua ordem, sem dizê quem devo matá?”. E ajoelhou-se em pranto descomunal.
Depois levantou decidido a vingar a morte do coronel, a tirar a vida do responsável por aquela tragédia. Então colocou o cano da arma no próprio ouvido e atirou. Caiu bem ao lado do patrão.
  
(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos eguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Bulamarqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.

Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com