Seguidores

domingo, 15 de dezembro de 2013

Lampião e outras histórias - O ceguinho de Custódia

Por Doizinho Quental


Lampião entrou na Vila de Custódia, em 30 de janeiro de 1925. Nesse tempo a vila pertencia à Lagoa de Baixo, hoje Sertânia, Pernambuco. 

O Bando chegou pacífico. Lampião e seus cabras se dividiram pelas bodegas, fazendo compras e bebendo.

Na ocasião, tomou conhecimento que dias atrás, o tenente Optato Gueiros tinha passado por lá com uma volante no encalço dos bandidos.

Tenente Optato Guiros - acervo do pesquisador e colecionador do cangaço 

Nessa passagem, o tenente gostou muito dos repentes de um ceguinho que cantava acompanhado de uma viola. O cego, depois de remunerado, terminou fazendo versos, elogiando a figura do tenente.
 
custodia-pe.blogspot.com

Ao saber desta história, Lampião, com muita raiva, mandou chamar o cego. Ele veio acompanhado do seu guia, e nem mostrou nenhum constrangimento, ao contrário do seu guia, que quase cai de trêmulo.

Lampião chamou todo pessoal para mostrar como se dava uma lição num cego bajulador de macaco. Então foi logo gritando para o cantador:

- Cego sem vergonha, cego safado, agora voismicê deu pra bajular macaco?!... Conte a históra dereito!!!

- Capitão, disse sem temor o cego, o homem me deu umas nota e eu cantei assim:

Ô que home bom,
Ô que home mais decente,
Vou rezá pra armentar,
Os galão desse tenente!

Lampião enraivecido continuou:

- Cego, voismicê só se sarva de uma boa sova se desfizer esses verso besta!

O Ceguinho não contou conversa, repinicou a viola e cantou:

Num se zangue Lampião,
Cum qui eu dixe ao macaco,
O qui eu quiria mermo,
Era inchê o meu bisaco.
O galão qui  maginei,
Pra botar no tá tenente,
Foi um pau com duas lata,
Uma atrais, outra na frente!

Os cangaceiros caíram na gargalhada e Lampião falou, rindo:

- Tem quem possa com a peste desse cego?

O ceguinho foi salvo e ainda ganhou 50 mil contos reis de Lampião.

www.kantabrasil.com.br/Lampiao.../Lampião%20e%20outras%20Históri... 

http://blogdomendesemendes.blogspot.com‎

Lampião e outras histórias - Zé Favela, o homem sem medo

Sabino Gomes de Góis


Sabino Gomes de Góis ou Sabino das Abóboras foi considerado por muitos historiadores do cangaço, como o cangaceiro mais cruel que existia no bando de Lampião. Malvado e de uma extrema periculosidade, sentia prazer em retalhar a vítima antes de matá-la. Era mesmo um sádico e daqueles que se vangloriavam de estripar o inimigo, parecendo sentir volúpia em sua crueldade. 

Este monstro da perversidade tinha dois irmãos, Gregório e Elói que, ao contrário dele, eram homens pacatos e, por ironia do destino, morreram assassinados antes de Sabino. Elói foi morto por uma volante em Afogados de Ingazeira no ano de 1926. Quem matou Gregório foi um tal de Zé Favela. Quando Sabino Gomes tomou conhecimento do acontecido, empreendeu diversas buscas ao assassino, sem, contudo lograr êxito no intento.

Certa feita, numa diligência, acompanhado a cavalo, de dezesseis cangaceiros fortemente armados, encontrou Zé Favela displicentemente sentado num banco, conversando com amigos. De um salto, agarrou-lhe nas aberturas, puxou o punhal, o encostou no umbigo do matador do seu irmão e vociferou:

- Agora filho de uma puta, você vai me pagar o que fez com Gregório! 

Neste ínterim, veio uma senhora com um crucifixo na mão, implorando alto e em bom som:

 - Seu Sabino, por amor de Deus, não mate o Zé, ele é nosso amigo! Seu Sabino, por amor de Nossa Senhora, não faça uma desgraça dessas...

E continuou com este peditório, até que Zé Favela olhou calmamente para ela e disse: 

- Minha senhora deixe disso, o homem só morre quando chega a hora!

E com a calma do mundo todo, falou:

- Seu Sabino, o sinhô pode me estraçalhar, mas eu matei o Gregório enganado!

- Enganado o quê, cabra safado, você ainda me vem com essa conversa mole!

- Eu lhe juro por tudo quanto é mais sagrado que eu não queria matar o Gregório! Matei-o enganado!

 - Enganado como, seu peste! Perguntou-lhe Sabino.

 - É por que vocês eram muito parecidos, mas eu queria matar mesmo era o sinhô!

 - A mim!? Falou espantado o ferrabrás. - Como!?  Se eu nunca lhe fiz mal nenhum!?

 - É porque Joaquim Manduca ia me dá duzentos mil réis e um rifle cruzeta para eu lhe matar, e esse dinheiro não ganho durante um ano inteiro. e eu bem que precisava de uma arma.

- Vamos botar esta estória a limpo,disse Sabino.

E partiram para a casa de Joaquim. Sabino e os dezesseis comparsas montados e o Zé, a pé, acompanhando o cortejo.

Depois de percorrido uns seis quilômetros, Sabino parou à sombra de uma árvore e sentado numa pedra, resolveu fumar um cigarro lasca-peito para clarear as ideias. Pegou o rolo de fumo, cortou um pedaço com o seu canivete afiado, colocou o fumo na mão esquerda e, com a paciência de um chinês, migou-o demoradamente. Depois, espalhando o fumo na palhinha de milho, apertou com os dois dedos polegares, passou a língua na extremidade da palha para colar, colocou o cigarro no canto da boca, riscou o tabaqueiro e acendeu o lasca-peito, dando em seguida boas baforadas, imaginando como resolver esta questão.

A casa do mandante do crime estava logo ali. Mas, a despeito disto, o sanguinário cangaceiro estava matutando uma resolução. Zé Favela, não aguentando mais a demora, disse:

- Seu Sabino me dê logo este rifle aí, que eu vou matar Manduca! Porque ele me enganou. Não me deu  nem um tostão, disse que eu não fiz o serviço direito.

Ele respondeu resoluto:

- Nada, quem vai sangrar este filho da peste sou eu! E você, seu infeliz, corra logo, desapareça da minha vista, se não quiser que eu faça com você como eu costumo fazer com meus inimigos!

Zé Favela, tranquilamente sumiu no caminho.

Os cangaceiros ficaram sem acreditar no que tinham visto. Como pode Sabino não pinicar de faca o matador do seu próprio irmão? Então, um dos que lhe tinham mais admiração, perguntou?

– Seu Sabino, o que lhe fez deixar este desgraçado ir embora?

 - Home, está com mais de cinco anos que vivo no cangaço. Já degolei cabra, já cortei as unhas, dedos, braços, já tirei a pele de muita gente, todavia eu nunca tinha visto um moleque tão valente como este. Nunca vi um homem dizer nas minhas fuças, sem tremer os beiços, que queria mesmo era me matar. Este tem mesmo sangue de procotó, é valente e briga prás moças vê!  Nosso Sertão tá mesmo precisando de gente assim, por isto eu deixei ele pra tirar raça! 

Zé Favela tinha razão, o homem somente morre quando é chegada a hora!

www.kantabrasil.com.br/Lampiao.../Lampião%20e%20outras%20Históri...‎


 http://blogdomendesemendes.blogspot.com