Por José Ribamar Alves
Amigo
leitor, acabo de chegar de uma viagem imaginária,
Trazendo na
bagagem da memória, uma história mais pegajosa do que visgo, mais linda do que
um rio transbordando e, mais triste do que uma mulher nos três primeiros dias
de viuvez.
Desta feita,
descrevo a história de uma jovem chamada Divilene,
Filha de um
casal conhecido por Andrelito e Sofia Bonabela.
Diz a história
que a jovem donzela, por falta de melhores graus de escolaridade, fora para uma
cidade grande, chamada Monte das Flores, no intuito de fazer faculdade, pois
onde residia não teria como realizar esse sonho.
Então, da
cidade Trilha dos Ventos, onde morava, distanciou-se essa sonhadora, à procura
do seu objetivo, mas acabou sendo vítima dum dilúvio de contradições, tormentos
e infelicidades.
Chegando
então, Divilene, a Monte das Flores, um lugar estranho,
e movimentado,
conseguiu amparo na casa de Susileia, irmã de seu pai Andrelito.
E como todos
os princípios são flores, ela nos primeiros meses,
Sentiu-se bem
acolhida, que até parecia estar em sua própria casa.
Mas, o que é
bom dura pouco e, logo veio-lhe a decepção e, todo àquele afeto efêmero
transformou-se em humilhação e cara feia.
Então, para
livrar-se dos cochichos e piadas, obrigou-se a procurar um outro abrigo, porque
já não suportava mais tanto sofrimento.
E apesar de
meio confusa, lembrou-se de uma amiga que chamava-se Gracilene, que residia
sozinha, em um simples apartamento, daquela floresta de tijolo, de ferro, de
cimento e luzes artificiais.
Decidida e
confiante Divilene, deixa àquele refúgio de dissabores e constrangimentos e vai
ao encontro da amiga de quem lembrara.
E, Gracilene a
dita moça, a quem Divilene, resolvera recorrer...
não hesitou em
dar uma forcinha à sua amiga que encontrava-se suprida de problemas.
Então, como
caridade, só é caridade, se for completa, Gracilene conseguiu um emprego para
Divilene, que passara a trabalhar durante o dia e estudar durante a noite.
E, satisfeita,
fazia faculdade na intenção de concretizar seu sonho de tornar-se pediatra. Mas
durante o curso de medicina, se deixou envolver com um jovem que viria em pouco
tempo, trazer-lhe transtornos e dores.
Divilene,
completamente iludida e apaixonada, deixou-se, por inexperiência, talvez, pegar
uma gravidez indesejada, que seria a coisa mais impensada de sua vida.
Mas, para os
pais, no interior, Divilene não mandava dizer, nas correspondências, que estava
grávida, muito menos para o povo da casa de sua tia Susileia.
Com a
gravidez, a pobre moça, impressionada, abandona os estudos,
Ao sentir-se
desprezada pelo príncipe dos seus desejos e, por pouco não perdera seu emprego.
Mas no dia em
que teve de ir para maternidade, para dar a luz à criança, já fora cheia da
maldade, pois não queria que a criança viesse a viver, porque não teria como
trabalhar, estudar e cuidar do próprio filho.
E dez dias
após o parto, Divilene conduzindo o filho, pega um táxi,
Dizendo que
iria para favela, passar o dia na casa de uma conhecida, dela.
E atormentada
pelo desespero e o descontrole, ao chegar ao fim da rua,
Avista uma um
senhor sentado riscando o chão, então pergunta?
Senhor,
saberia me informar onde posso encontrar um lixão?
Responde o
velho, completamente inocente, apontando com o dedo, àquela vereda, esbarra num
lixão e não é tão longe.
Então, havendo
àquela pobre mãe, já mandado o taxista voltar,
Sem demora
pegou a vereda, sem deixar que o velho que riscava o chão, percebesse que o
pacote que levava era uma criança.
E ela, ao
chegar ao lixão, procurou uma migalha de sobra, agasalhou o seu filho,
despediu-se banhada de lágrimas e voltou chicoteada pelo remorso, arrastando a
cruz da tristeza, chagada pela incerteza de que seu filho se salvaria.
E voltando
pela mesma vereda, não percebera que o mesmo velho de quem havia solicitado
informação sobre o lixão, ainda estava no mesmo local.
Mas o velho,
por baixo da sombra das suas pálpebras grisalhas, , percebera grande estranheza
no semblante daquela infeliz mulher e, tendo ela sumido do alcance dos seus
olhos, o velho ordenou que um filho fosse até o lixão, ver se
descobriria algum mistério.
E de imediato,
o rapaz foi e, ao chegar ao local, deu de cara com uma criança colocada em uma
pequena caixa de papelão e, a poucos metros, avistou um cachorro amigo, que
havia puxado a caixa com a criança dentro, para debaixo da sombra novamente,
pois aquela migalha de sombra já havia sido devorada pelo sol da manhã.
E, percebendo
o cão, que a criança estava a salvo, retira-se talvez, consciente do bem que
havia feito.
Então, aquele
jovem, pega o menino e leva-o até seu velho pai,
Que diante de
tão grande falta de humanidade, resolve fazer ciente
o conselho
tutelar, daquela cidade, que em poucos minutos aparece e,
Toma o menino
para sua custódia, encaminhando-o para o orfanato.
Desse
momento em diante, o destino começa a mover-se em seu favor daquela criança,
permitindo-lhe que as coisas benévolas intercedessem pelo seu
futuro.
Enquanto isso,
a mãe descabelava-se no apartamento onde vivia,
Acorrentada
pelo remorso descomunal, que, sem piedade alguma,
Martelava sua
sofrida consciência.
E chorando se
perguntava entre a loucura e a dor, será que meu filho ainda vive, meu Deus? Ou
será que um animal predador tirou-lhe a vida. Mas as respostas não chegavam até
as abas dos seus ouvidos.
Mas, às onze
horas do dia seguinte, quando ainda via-se ferida pelo distúrbio, laçada pela
corda do alvoroço e tocada pelos açoites pungentes das aflições, chega
Gracilene, do trabalho e a interroga:
O que houve,
filha de Deus? Responde Divilene, entre a cruz e a espada...
Doei meu filho
amado para uma mulher desconhecida e agora estou morta por dentro como um feto
que morre no ventre de sua amada mãe.
Ainda confessa
a Divilene: Cometi este ato impensado, para evitar que meus pais, em Trilha dos
Ventos, soubessem que sepultei meus estudos, meu único futuro.
Nessa hora
Gracilene, dá-lhe um calmante, na esperança de que ela
Volte ao seu
estado normal e consiga raciocinar como antes.
No dia
seguinte, sai no jornal mais badalado da cidade;
Um bebê
saudável é deixado no lixão da cidade e, graças a Deus, foi encontrado vivo.
Porém, um
cidadão residente na favela Toca do Desprezo, afirma ter sido interrogado,
ontem, por uma senhora que conduzia um pacote e desejava saber onde poderia
encontrar um lixão, confessando ter dito onde ficaria...
Ainda afirmar
ter mandado um filho verificar, depois de ter visto a mulher voltar sem o
pacote.
O cidadão
falou também, que seu filho teria encontrado a criança e trazido para sua casa
e que ele teria entregue o menino ao conselho tutelar desta cidade.
Depois,
Divilene vendo a foto do filho no jornal, sentiu-se na obrigação de culpar-se
ainda mais pelo ocorrido e, dez dias após o noticiário, Divilene empurrada pelo
arrependimento impiedoso, destina-se até o orfanato, disfarçada de anjo da
guarda dos desfavorecidos, na esperança de, pelo menos, poder ver seu filho.
Mas outra vez
é ferida pelo sabre da tristeza, ao descobrir que seu filho havia sido adotado
por uma senhora há poucos dias.
A chefe do
orfanato ainda lhe dissera: Ela o batizou com o nome de Aparecido de Deus!
Divilene,
memoriza o nome do menino e volta para casa, calada como uma pedra retirada do
caminho, além de desconsolada e cabisbaixa, parecendo uma senhora casada,
grávida de outro homem.
E ficou
Divilene morando em Monte das Flores, alimentando suas esperanças com pequenos
grãos de fé que lhe restaram.
E o tempo
continuou passando, passando, como uma fileira de vagões arrastados por um
trem, até que um certo dia, ela leu uma matéria de revista, que dizia assim: O
hospital regional de Monte das Flores, contrata o grande cardiologista
Aparecido de Deus.
Mas, o
remorso, o medo, a insegurança e a sentença da culpa, não permitiram que ela
tomasse coragem de se aproximar do seu amado filho.
E, já com
cinquenta e três anos de idade, sem formatura, sem marido e sem um bom emprego,
volta Divilene para Trilha dos Ventos, depois que seu pai e sua mãe mudaram-se
para a cidade dos descarnados e mortos.
Mesmo assim,
Divilene ainda volta cheia daquela felicidade que só quem é mãe, pode tê-la,
por ter tido a plena certeza de que seu filho não enveredara pelo caminho do
descaminho!
Que destino
irônico, que mulher sofredora, que filho abençoado pelo destino que judiara de
sua própria mãe. FIM
José Ribamar
Alves: 15/03/2018
Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso
http://blogdomendesemendes.blogspot.com