Material do acervo do pesquisador Antonio Corrêa Sobrinho
“Passado
mais de um século e meio da execução desse salteador baiano, resta dela os 104
versos das 26 estrofes com o título de “ABC de Lucas da Feira”, composição
atribuída ao oficial de justiça da mesma Feira de Santana, Souza Velho, que
escreveu este trabalho, em 1849, por ocasião do enforcamento do dito celerado:
ABC
DE LUCAS
Adeus,
Saco do Limão,
Lugar aonde eu nasci,
Eu vou preso para baixo,
Levo saudades de ti.
Bem
me diziam meus sócios
Que eu mudasse de condição,
Que Cazumbá por dinheiro,
Fazia a pintura do cão.
Cuidava
que esta vida
Nunca havia de ter fim;
Porque contava na Feira
Muitos amigos por mim.
Desenganado
fiquei
Quando me vi prisioneiro,
Só com a minha prisão
Ganharam tanto dinheiro.
Entusiasmado
carreguei,
Muitas pompas e grandeza,
Pois em meu rancho eu tinha
Botes de rapé Princesa.
Fui
preso para a Bahia,
Fizeram grande função,
Mas eu desci a cavalo
E os guardas de pés no chão.
Gostaram
de eu estar preso
Com tanta rigorosidade,
Eu vou para a Bahia
Dos sócios levo saudade.
Homens
pobres não roubei,
Que não tinham o que roubar,
Mas os ricos de carteiras
Nenhum deixei escapar.
Integra-te,
negro Lucas,
Que hoje chegou teu dia,
Assegura tuas armas,
Que [que é] de tua valentia?
Já
estou entregue, gente,
Me mostrem o delegado,
Na mão direita a cravina,
Na esquerda o meu terçado.
Kalumbi
e Sobradinho,
Tapera e São João
Aonde eu tinha meu rancho
Lá me fizeram a traição.
Lá
na Oliveira tinha
Manoel Nunes confiado [atrevido],
Um dia preguei-lhe o berço
Em um pau bem apregado.
Mulata
de bom cabelo,
Cabrinhas de boa cor,
Crioulinhas por debique,
Brancas não me escapou.
Não
digo quem são meus sócios,
Não me convém dizer,
Que eu por me ver perdido
Não deito os mais a perder.
“O”
é letra redonda
Toda aquela redondeza
Me chamava capitão,
Sou capitão com grandeza.
Perdão,
perdão, minha gente,
A todos por caridade,
A injustiça que fiz
Nesta pequena cidade.
Queriam
saber com certeza
Quem era meu grande amigo;
Se almoçava, jantava e ceava
Era somente comigo.
Roubava
também muita gente,
À fiúza do Luquinha,
Quem não rouba dinheiro,
Rouba carne e farinha.
Saltando
eu, na Bahia
Vi muita gente faceira,
Brancos e pretos chamavam:
Venham ver Lucas da Feira.
Tapera
e Santo Amaro,
Muritiba e Cachoeira,
Corriam todos pra ver
O grande Lucas da Feira.
Unicamente
o presidente e chefe
Vieram com muita alegria;
Vieram me apertar a mão,
Quando cheguei na Bahia.
Vigário
José Tavares,
Com o qual me confessei,
Só o pecado que eu disse
Foi o da moça que eu matei.
Choro
hoje arrependido
Por conselho não tomar,
Já me cortaram o braço
Inda querem me enforcar.
Pisilon
é letra do fim,
Comecei e vou findar,
A forca é pena última
Queiram, gente, perdoar.
Zombem
velhos, zombem moços
Zombem também os meninos
Que hoje chegou o meu dia
Vou cumprir meu destino.
Letras
vogais são cinco,
Que são a, e, i, o, u,
Adeus, Caldeirão de Lucas,
Adeus, Tanque do Urubu.”
Fonte:
“A Pena de Morte em Sergipe”, do historiador Pedrinho dos Santos
Fonte: facebook
http://blogdomendesemendes.blogspot.com