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terça-feira, 3 de maio de 2016

CALDEIRÃO E PAU DE COLHER: A HISTÓRIA DAS LUTAS POPULARES É INDESTRUTÍVEL

Por Rogério Morais

Setecentos mortos, bombardeio aéreo com três aviões do Ministério da Guerra, incêndios e destruição de casas, espancamento de crianças, mulheres e velhos, saques; e ainda, luta corporal de populares usando facões, ferrões e cacetes contra soldados da polícia bem protegidos; mulheres enfrentando homens do Exército armados de fuzis, homens furando cerco de rajada de metralhadoras, execução de prisioneiros, fuzilamento, são mais 300 corpos de trabalhadores rurais estendidos, numa das maiores resistências das populações do campo nordestino contra os proprietários rurais latifundiários. Donos das terras, igreja, polícia e governo unidos para destruir a vontade do povo de trabalhar, criar seus filhos e vencer com liberdade.

Estamos falando das comunidades de Caldeirão e Pau de Colher, nos anos de 1930, envolvendo sertanejos principalmente do Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Bahia. O palco da luta e da resistência do povo trabalhador, duas regiões nordestinas: Serra do Araripe, Ceará, e médio São Francisco, Bahia. Duas áreas que atraíram milhares de homens — famílias — cansados da exploração, da miséria e da injustiça do latifúndio e do Estado. Foram para lá com a certeza e a consciência de dias melhores, sem saber que a classe dominante agiria sem dó ou piedade, usando todas as suas forças, tentando apagar para sempre o que seria uma sociedade justa - o início do desenvolvimento social da região e a libertação dos trabalhadores.

No museu histórico do Ceará, no centro de Fortaleza, prédio que até a década de 1970 abrigou a Assembleia Legislativa do Estado, existem apenas três peças que lembram o povo do Caldeirão: A bandeira da comunidade, três reproduções fotográficas publicadas em jornal da época e uma espingarda aparentemente não muito manuseada, ao lado de um machado. Esses objetos ocupam a sala em memória a Padre Cícero Romão Batista — fundador da cidade de Juazeiro do Norte, Ceará — onde está a batina do religioso e outras valiosas lembranças de suas ações na região do Cariri.

SUMIU...

Uma citação transcrita no livro "Cultura Brasileira", do economista e historiador cearense Aristides Braga, colhida do museu (ver boxe), não é mais encontrada. Um funcionário afirma que não existe. É o trecho do depoimento da sobrevivente do Caldeirão, Marina Gurgel. É tudo que existe de mais de 10 anos do esforço de um povo para produzir na terra seca independente dos caprichos e humilhação dos patrões, e, pelo menos mais três de acirrada luta para resistir a repressão da classe dominante que não permitia aquele desafio. A bandeira, intocada em um armário com vidro tem manchas de sangue, provando que os ideais eram fortes, e resistiu o máximo que pode, com honra, o sangue e o suor daquela gente.

No museu também não se é permitido fotografar, segundo a administradora — somente filmagem pagando-se uma taxa de R$ 2,00 — pois "o flash danifica as peças", argumenta. Em todo caso, e todos os detalhes, percebe-se a falta de vontade ou desinformação em relembrar um acontecimento dos mais marcantes da história regional. "O maior espetáculo social que o Ceará ofereceu para o Brasil", diz o jornalista Hidelbrando Espínola, repórter do então jornal "Correio do Ceará", na época do movimento, que entrevistou José Lourenço, o líder do Caldeirão.

O Jornal "Correio do Ceará", dos Diários Associados, o mais atuante durante aquele período, também fechou suas portas e com o seu fim o valioso arquivo fotográfico — inclusive registros do Caldeirão e das pessoas envolvidas no seu extermínio — foram para a calçada do prédio quando o grupo vendeu o patrimônio, em Fortaleza. Livraram-se da guarda de registros que estimulam, em qualquer época, a resistência do povo. Outros documentos importantes (relatórios e jornais da época) no arquivo público ou biblioteca central do Estado, conforme historiadores, "sumiram" não deixando rastro dos anos em que a classe dominante — latifundiários — mais temeu a queda do seu prestígio, numa tentativa de apagar da memória das novas gerações a história verdadeira da luta do oprimido contra o opressor.

"O beato organizou tudo... era eficiente, despertou a comunidade e foi perseguido pelo latifúndio...". Aos 87 anos de idade, o advogado e jornalista Hidelbrando Espínola, em sua casa, no bairro da Aldeota, mantendo nada menos do que 30 mil livros, distribuídos, em cada compartimento (sala, quartos e serviço) por área (sociologia, movimentos populares brasileiros, golpe de 64, filosofia, marxismo, Padre Cícero, Lampião, Canudos e Caldeirão, etc.) lembra com objetividade a experiência socializante encabeçada pelo beato.

José Lourenço, o Beato, como era conhecido, "foi fabuloso... fabricou máquinas, tratou a terra, plantou e colheu grãos, frutas e verduras" comenta Hidelbrando. "Todos lá tinham a sua função e a disciplina era a regra para tudo, uma organização social que não tinha igual", lembra, e acrescenta: "A verdade é o seguinte: os proprietários de terra estavam preocupados com o desenvolvimento da comunidade... eles estavam perdendo mão-de-obra porque os trabalhadores seguiam para o sítio".

O jornalista esteve como repórter no Caldeirão dias após o massacre que uniu a Polícia Militar do Ceará e o Exército. Já não era mais o símbolo da prosperidade da região. Segundo ele, José Lourenço foi autorizado a voltar ao local totalmente devasta grandes instantes do movimento de massa por uma sociedade melhor contra a exploração secular das classes dominantes no sertão nordestino". Destaca-se na apresentação do livro "De Caldeirão a Pau de Colher: A guerra dos caceteiros", do geólogo e pesquisador baiano Ruy Bruno Bacelar de Oliveira. Para o Estado elitista, que tem instrumentos e paga seus contadores de história tentando apagar da memória popular todo o vestígio desses movimentos, a ação foi fruto do "fanatismo, misticismo e religiosidade agressiva dos sertanejos".

"As elites preocupavam-se com o fato do Caldeirão vir repetir Canudos ou Contestado. Os fazendeiros do Cariri não encontravam braços para o trabalho nas fazendas. Havia um êxodo em direção ao Caldeirão", registra Ruy Bruno Barcelar no seu livro. As duas comunidades — na Bahia e no Ceará — tinham o mesmo objetivo, a mesma filosofia social de vida e de trabalho. Ambas surgiram na mesma época (veja matéria). As duas foram exterminadas numa ação do aparato do grande latifúndio, ou seja, polícia, igreja, vigarista político, imprensa e exército: "a chacina de Pau de Colher foi o mais brutal quadro da tragédia vivida no sertão baiano". Na serra houve execução sumária de prisioneiros, registra o livro.

"O Caldeirão, Chapadas do Araripe e Pau de Colher representam os três últimos grandes gritos de liberdade da gente do Nordeste contra latifúndios e burguesia que ainda hoje continuam no poder", diz Bacelar. Assim como Canudos, em 1887/l897, Caldeirão e Pau-de-Colher "devem ser vistos pelo lado sócio-econômico que também tinha sua força religiosa", opina o professor Aristides Braga. As elites e o governo quiseram contar a história desses movimentos sociais escondendo o seu lado objetivo, ou seja, a consciência de classe dos trabalhadores destituídos da terra, vítimas do sistema, e contrários a uma organização social arcaica e ineficiente, erguida nos moldes feudais.

PROSPERIDADE

Em um terreno seco do solo cearense, doado pelo Padre Cícero, José Lourenço fundou uma produtiva comunidade, que, aliás, vinha alimentando os Salesianos (arroz, farinha, feijão, carne, rapadura, frutas e legumes e outros gêneros para os frades) antes da invasão, pois o Beato acreditava que assim afastaria a ameaça de perder o local. Doze casas de moradia, uma de engenho, dois açudes, um cercado com quatro mil e 12 braças, com mais de umas mil tarefas de algodão, quatro tarefas de cana-de-açúcar, 10 cancelões de madeira, e centenas de árvores frutíferas. Além do mais, centenas de animais, vacas, cavalos, jumentos, porcos, galinhas, marrecos, patos e outros. Na época da invasão, os armazéns da propriedade estavam lotados de algodão, milho, feijão, arroz, rapadura e farinhas. Inúmeras máquinas e outros objetos importados que serviam aos trabalhadores. Este era o Sítio Caldeirão, em 1938.

A VEZ DE PAU DE COLHER

Com a destruição, Pau de Colher se tornou a irmandade mais importante depois do Caldeirão. No princípio, início dos anos de 1930, os beatos não tinham interesse no desenvolvimento agrícola da região, como no Caldeirão. Pau de Colher era o ponto de recrutamento, treinamento e doutrinamento dos trabalhadores que seguiam para Caldeirão, no Ceará. Ali aprendiam a conviver em grupo, adaptando-se às normas rígidas da irmandade. Depois da morte de Padre Cícero, as pessoas começaram a se mudar para Pau de Colher, atraídos pela água e pelos ensinamentos dos beatos. Pau de Colher passou a ser um lugar onde se reuniam necessitados, flagelados e pequenos posseiros. O lugar começou a barrar a ida de nordestinos para São Paulo, conta o livro do geólogo Ruy Bacelar. Chegou a vez de acabar com Pau de Colher. Temendo uma nova sociedade tipo Canudos e apoiado pela imprensa e os políticos, o governo da Bahia, pede ajuda aos estados do Ceará e Pernambuco para destruir a comunidade. Na época, o próprio Presidente da República, através do seu Ministro da Justiça, Francisco Campos, intimou todos os interventores a extinguir a ferro e fogo todos os movimentos revolucionários e também o cangaço, na pessoa do seu chefe, Lampião. Conforme o livro "De Caldeirão a Pau de Colher", Getúlio Vargas usou a expressão, "acabem com eles a todo preço senão serão destituídos".(...)

Para Ruy Bacelar, os três movimentos (Caldeirão, Serra do Araripe e Pau de Colher) são formas de lutas contra o tipo de estrutura social existente, onde famílias poderosas controlam os meios de produção, são donas dos recursos naturais e criam uma monstruosa organização social que, ao longo da história, sufocaram todos os gritos de liberdade das massas despossuídas. "O fanatismo que os animava era revolucionário e alimentava a esperança de mudanças para um mundo melhor. O ódio contra as classes dominantes, o entusiasmo na vida comunitária, levaram todos eles a deflagrarem um fluxo de atividade econômica, usando meios de produção revolucionários para a época", explica em seu livro.

O BEATO PEDE A PADRE CÍCERO

José Lourenço, paraibano (tem relato que seria pernambucano), depois de ser preso e solto por pregar em praça pública, recebeu de Padre Cícero a terra nua, sem nenhuma benfeitoria, no pé da serra. Com pouco tempo, já havia mais de 400 casas, erguida uma capela e uma população de três mil pessoas. Eram trabalhadores de vários estados nordestinos, que passaram a produzir, educar seus filhos e alimentá-los.

O Caldeirão ficou auto-suficiente. Sua fama crescia e já influenciava outras cidades, porque lá o progresso atingia também a área de artesanato, confecção de redes, roupas, calçados, etc. Todas as ferramentas necessárias para o trabalho eram feitas na própria comunidade. Os produtos excedentes eram vendidos em Juazeiro e no Crato. "Ninguém se considerava dono de alguma coisa. Os meios de produção eram coletivos", relatam os remanescentes.

Maria de Maio nasceu no Caldeirão, conta: "Eu vivia lá. Ia gente que o Padrim Cícero sempre mandava. Gente pra trabalhar lá. Quando chegava em Juazeiro umas pessoas, que não tinha trabalho, ia trabalhar lá". E foi assim que a comunidade criou fama no Nordeste, cresceu, recebendo gente de todos municípios. O ódio dos fazendeiros era grande, pois tinham que solicitar trabalhadores a José Lourenço. O comércio de Juazeiro estava declinando. As populações rurais de todo o Nordeste, nos anos de 1920/30, eram as que mais sofriam com a crise econômica que reinava no mundo.

A igreja e os latifúndios — dominantes — já não se entendiam e o povo trabalhador tomou a iniciativa de guiar os seus próprios destinos. Portanto, experiências como Caldeirão e Pau de Colher minavam os sertões. Várias outras iniciativas floresciam em outros estados como no Piauí, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Paraíba. Os beatos, como Severino Tavares, um dos mais influentes, depois de José Lourenço, percorriam as cidades pregando e recrutando adeptos. Reunia multidões nas praças. O Cariri já concentrava muita gente em torno de Padre Cícero. As comunidades foram se formando com o mesmo objetivo e mantendo estreito relacionamento através da comunicação dos beatos.

A DESTRUIÇÃO

Os salesianos, após a morte de Padre Cícero, requerem na Justiça a posse do Sítio Caldeirão, alegando herança feita por ele. Alguns historiadores registram que os Salesianos não gostavam do Padre Cícero. No entanto, estava decretado o fim da experiência. Os salesianos conseguem na Justiça, em Fortaleza, a desocupação da área. Antes de qualquer ação, os órgãos de segurança mandam agente para obter informações. Temiam que na comunidade houvesse muitas armas. Segundo Hidelbrando Espínola, a comunidade já esta infiltrada de informantes, e havia "uma pessoa dos órgãos de segurança que atuava como líder".

Os registros dão conta de que a ordem de destruição do Caldeirão partiu do Presidente Vargas. A ação foi coordenada pela Secretaria de Segurança Pública do Estado e pela Região Militar. No comando o Chefe de Polícia, Capitão Cordeiro Neto, e o Delegado do Dops, Tenente do Exército José Góes de Campos Barros. "Eles subiram a colina", lembra o jornalista. A força militar chega ao sítio e os moradores assistem a destruição. Casas são incendiadas e não a tempo de levar nem os pertencer pessoais. Alguns beatos transmudaram-se e olhavam com muito ódio o capitão Bezerra e seu filho, à frente das ordens. Mulheres grávidas ou ainda amamentando crianças choraram e arrumavam em carros de bois os poucos pertences, narra.

MARINA GURGEL

"Eu num sei o que foi de fizeram esta perseguição, porque agente num tava matando, num tava roubando, num tava fazendo mal. Tava trabalhando e rezando. Ai, por isso fomos perseguidos e sentenciados à morte, ninguém sabe, quem é Deus, né! O que tenho a dizer é isto... tava no Caldeirão cantando e rezando e tão feliz, trabalhando e comendo. Sem ninguém precisar pedir nada pra ninguém, porque tudo tinha, nada faltava, tudo era comum. O que era de um era de todos e ai quando dava fé uma perseguição".

Do Livro Cultura Brasileira, de José 

NA SERRA

Dias depois, acontece o segundo bombardeio aéreo sobre civis na história do Brasil. (O primeiro foi em 1912, Contestado). As tropas já estavam em Juazeiro. À frente, o mesmo comando sob as ordens do Governo Federal. No relato do jornalista e escritor Jader de Carvalho, morreram cerca de mil pessoas, entre velhos, mulheres e crianças. A imprensa, com a censura do DIP — Departamento de Imprensa e Propaganda — do Governo Vargas, quase nada publicou. Houve execução sumária de prisioneiros. Mais de cem foram executados por um cabra que "tinha um enorme chapéu à cabeça e um punhal à mão: Ele sangrava as pessoas, uma a uma, indagando, antes em tom zombeteiro: - Então você não sabe quem matou o capitão Bezerra, hein?", segundo Jader. Hidelbrando lembra que, dias depois, ainda viam-se as chamas do bombardeio.

FACÃO E CACETE


Em Pau-de-Colher, as mulheres lutaram desesperadamente. Saiam das trincheiras, seguidas dos filhos, em direção aos soldados, com cacete na mão. Eram facilmente cortadas ao meio pelos tiros de metralhadoras. Um grupo delas avançou sobre um destacamento que tinha tomado uma cacimba, e todas foram metralhadas. Conforme relato de Optado Gueiros, Tenente que comandou o atraque, de acordo com a imprensa baiana, os corpos apodreciam no chão. Foram vários dias de luta. O chão estava tomado de sangue e pedaços de órgãos humanos em toda parte. Eram mais de 400 corpos. Os soldados evitavam a luta corporal e venciam facilmente a batalha com o uso do fogo das metralhadoras.

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NOITES NA TAVERNA

*Rangel Alves da Costa

O título faz lembrar um instante áureo do romantismo brasileiro. Com efeito, há uma obra de Álvares de Azevedo (1831-1852) intitulada Noite na Taverna (publicação póstuma em 1855), mas não noites, como acima consignado. De resto, o que aproxima o presente texto do enredo daquele romance diz respeito ao mundo noturno e as solidões fingidas nas tavernas da noite, nos botecos e botequins da vida.

Noites na taverna sintetizam o saudosismo e a nostalgia. Algo muito parecido com as noites nos cabarés famosos, nas idas ao encontro de falsas francesas e louras tingidas implorando mais um gole de rum. Ambientações sempre animadas, festivas, mas sempre escondendo dores e sofrimentos, angústias e aflições, pois ali também redutos de curas de males do coração e dos sentimentos.

A realidade atual não mais permite a boemia, a vivência noturna enquanto prazer. A violência e o medo afastam das ruas os noctívagos, os poetas das noites, os apaixonados, os errantes aventureiros e todos aqueles com ânsia de balcão, de tragos, de companhias passageiras. Tornou-se impraticável caminhar debaixo da lua em direção à mesa de bar ou de ambientações cheirando a limão e mulheres de perfume barato.

A vida boêmia perdeu seu espaço social, seu fundamento de prazer e sua poesia noturna. Há de se observar, contudo, que o viver boêmio já possuiu status de grande importância. Muitos artistas, poetas, intelectuais e escritores, faziam das noites nas tavernas suas principais ambientações de convívio com pessoas de iguais talentos.

Reunidos em mesas, de gravatas afrouxadas, cigarros entre os dedos e copos sempre à boca, tornavam botecos e bares em ambientes verdadeiramente produtivos. Não somente as discussões relevantes sobre os temas mais profundos, mas também a criatividade aflorando a cada novo gole. Muitas canções famosas nasceram em mesas de bares, nas madrugadas etílicas e insones.


Horas que começavam já noite alta e avançavam pelas madrugadas. Ou mesmo após o expediente e sem hora certa para beber o último gole e cambalear pelas ruas. Ambientes escurecidos, balcões de bancos altos, mesas de bancos baixos, ora a música ora a discussão, ora a prostituta flertando mais uma dose ora o batom avermelhado sujando a gola da camisa branca. Enquanto as ruas adormeciam, silenciavam, lá dentro nada tinha hora para adormecer, para dizer que havia chegado ao fim.

Poemas existem que fazem recordar tais ambientações. A poetisa portuguesa Florbela Espanca foi mestra na descrição das tavernas, das noites apaixonadas pelos bares da vida, das paixões que afloravam após o noturno e se embebia do álcool e do fumo. Alguns poemas remetem aos cigarros nas mãos, às fumaças tomando os ambientes, aos copos cheios e vazios, aos olhos avermelhados da bebida e da lágrima. “Fumo leve que foge entre os meus dedos...”, diz Florbela.

Os retratos ainda mostram Vinícius de Moraes, Paulo Mendes Campos e tantos outros renomados escritores, sentados às mesas das tavernas de seus tempos. O cronista João do Rio, ele próprio um inveterado boêmio e homem da noite, descreve o Rio de Janeiro antigo a partir das ambientações noturnas. Considerado repórter maldito da noite carioca, trouxe ao conhecimento de todos aqueles personagens surgidos no mundo encantado e perigoso dos bares, dos prostíbulos, dos escondidos debaixo da lua.

Ao som de um bolero antigo, os olhos turvos se comprimem para não chorar. Está ali precisamente para esquecer as dores de amor. Mas dose após dose, música após música, é como se os retratos amorosos estivessem sob a mesa. Mas não vai chorar. Enquanto se serve de mais um trago, lhe chega uma loura tingida com falso perfume francês. Não quer pagar por “amor”, apenas beber e mais beber, até que o banco da praça acolha sua solidão. E defronte à janela onde seu amor impossível se entrega aos braços de outro.

Após as tavernas fecharam as portas, somente as ruas como mesas e bancos. Um vai seguindo de garrafa à mão, enquanto outro tenta se segurar numa estátua para declamar o poema do noctívago errante: “Eis a noite e seus caminhos, com suas flores e seus espinhos, uma lua que ilumina o coração, mas o desamor e a saudade que tornam tudo em escuridão...”. E assim vai a madrugada, ébria, cambaleante, procurando um lugar qualquer para repousar. Dali a instantes já será manhã. E noite quando da taverna ecoar o bolero.

Não sou do tempo das noites nas tavernas, mas sou do tempo de mesas de bares aconchegantes. O Joia, o Gosto Gostoso, o Mahalo e alguns outros. Bons amigos cultivei assim, entre tragos e palavras tortas. Um tempo bom. Uma verdadeira poesia no tempo.

Poeta e cronista
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CASA DE PEDRA ONDE MOROU O CANGACEIRO JESUÍNO BRILHANTE EM PATU-RN


Enviado em 23 de julho de 2010
Materia exibida no 60 Minutos- TV Ponta Negra /SBT-Natal/Mossoro em 03 de junho de 2010
Williams Vicente
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THEOPHANES FERRAZ TORRES

Por Geraldo Ferraz
Geraldo Ferraz no Cariri Cangaço Princesa Isabel 2015 em palestra sobre Theophanes

Nasceu na cidade de Floresta - PE, aos 27 de dezembro de 1894, filho, primogênito, de Fernandina Ferraz e Antônio Miguel Torres. Naquela oportunidade, o Brasil atravessava e adaptava-se a uma grande mudança política ocorrida aos 15 de novembro de 1889 - a Proclamação da República.

Governava o município o tenente-coronel Fausto Serafim de Souza Ferraz, bisneto do capitão Dâmaso de Souza Ferraz. Fausto era neto de Antônio de Souza Ferraz que, por sua vez, era irmão do trisavô de Theophanes, o alferes Bonifácio de Souza Ferraz. Naquela época a Vila de Floresta ainda não tinha os tamarindos. A iluminação era a candeia; nos lares, as lamparinas a querosene ou os candeeiros que funileiros faziam artesanalmente com latas vazias. Água, buscava-se no Pajeú, em potes ou latas, nas cabeças das carregadeiras.

O povo, muito religioso, frequentava as duas igrejas existentes - a igrejinha do Rosário e a nova matriz, inaugurada em 1897. Tudo guardava ares de uma grande fazenda na cidade. Abrilhantando as festividades da passagem do século, ainda criança, assistiu, maravilhado, a execução de belas canções de uma das primeiras Bandas de Músicas do Sertão, organizada e dirigida pelo maestro Nepomuceno de Barros, mais conhecido por João Paulino, que havia sido o fundador, em 3 de julho de 1898, da Sociedade Musical 3 de Julho.


Aquela banda sempre daria incontestável brilho a vida de sua ordeira terra. Cresceu no meio dos muitos primos e leais amigos. Brincou, entre outras coisas, de vaqueiro, de polícia e ladrão e nadou, muito, no velho Pajeú, mais especificamente, no Poço da Pedra. Aprendeu a ler e escrever com o grande e exigente professor Francisco Cesar de Lima, mais conhecido como Chico Cesar. Tempos difíceis para sua formação familiar, religiosa e moral, porém, de muita importância para alicerçar e solidificar o cidadão que veio a ser. 


Desde muito cedo, segundo parentes e amigos, Theophanes tinha intuições, como se aquilo fosse uma missão estabelecida para ele, uma delas é que entraria na polícia e prenderia o cangaceiro Antônio Silvino, que, por sinal, vinha a ser o ídolo de alguns moleques da sua turma.

No dia 20 de junho de 1907, através da Lei nº 867, a Vila cobria-se de enfeites e realizava grandes festividades, pois comemorava a sua elevação à categoria de cidade. Floresta podia ver crescer, tranquila, os seus tão famosos tamarindos, plantados em 1905, que muito em breve aliviariam o calor da cidade e dariam a ela, mais tarde, o apelido de "Terra dos Tamarindos". Tinha no seu querido e inesquecível avô, o tenente José Arlindo Gomes Barbosa, que era alfaiate, o seu maior e leal protetor.
  
No dia 29 de novembro de 1911, estava a cidade, mais uma vez, em festa. O jovem Theophanes participou do cortejo de mais de 300 cavaleiros que acompanharam a comitiva que havia se deslocado até a cidade de Pesqueira - PE, em 16 de novembro, sob a responsabilidade de Antônio Serafim de Souza Ferraz, Antônio Ferraz de Souza (subprefeito) e João Barbosa de Sá Gominho, experimentados boiadeiros e afeitos a grandes travessias, a fim de conduzir até sua cidade, o primeiro Bispo Diocesano de Floresta, D. Augusto Álvaro da Silva. No mês seguinte, ainda no verdor dos seus 17 anos incompletos, com o coração pesaroso e sem conseguir vislumbrar qualquer possibilidade de realizar os seus maiores sonhos, deu um até logo à Floresta e veio para a cidade grande, a cosmopolita Recife, capital do seu Estado.


Apresentou-se, voluntariamente, ao então Regimento Policial do Estado de Pernambuco, aos 15 de janeiro de 1912, com 17 anos completos, a fim de servir ao seu Estado, na forma da Lei em vigor. Por ocasião de sua apresentação no Corpo da Guarda, sucedeu um fato muito importante para ele, foi recebido pelo então sargento Elísio Virgulino de Souza, que tornar-se-ia, daquela data em diante, um dos mais leais amigos e seu dileto compadre. Devido ao interesse e espartana dedicação ao serviço militar foi logo notado pelos seus superiores e, no primeiro ano de incorporado, obteve várias promoções - anspeçada, cabo de esquadra, furriel, primeiro sargento, sargento ajudante e alferes. Deslumbrava-se com o progresso da Capital e assistia assustado, a partir daquela época, a tremenda mudança urbanística do Recife, que não respeitava, nem mesmo, os templos religiosos e os monumentos mais significativos da sua história.
  
Em fevereiro de 1913 seguiu em diligência para o interior de Pernambuco, onde teve o seu batismo de fogo contra os cangaceiros. Voltou a Capital em março e, em maio seguiu, de novo para Vila Bela onde seria nomeado delegado de polícia, pela primeira vez, aos 18 anos de idade.

Em agosto de 1914, Theophanes e seus companheiros foram informados que havia estourado, no Velho Continente, uma grande guerra, a primeira entre várias nações, que muito transformaria o panorama mundial. No segundo trimestre daquele mesmo ano, com 19 anos, foi nomeado, novamente, delegado de polícia de Vila Bela, onde teve a oportunidade de impor a lei e promoveu a prisão de alguns bandoleiros que já possuíam uma certa fama. Em setembro daquele mesmo ano, quando da sua nomeação como delegado de Taquaritinga, estava para acontecer a realização de um dos seus sonhos - a captura do mais famoso cangaceiro daquela época, o temível Antônio Silvino, também conhecido como "Rifle de Ouro" ou "Governador do Sertão". Com aquela formidável prisão, conseguiu pôr fim a uma carreira de mais de 15 anos de terror no Sertão. Por conta daquele ato de bravura foi promovido ao posto de tenente e nomeado delegado de Limoeiro.

Em maio de 1915, teve que seguir em diligência para Vila Bela, comandado pelo capitão João Nunes, com a finalidade de impor a ordem pública. Na oportunidade, combateram os cangaceiros liderados por Né Pereira e seus capangas. Em julho daquele mesmo ano, foi homenageado em Floresta e teve o prazer de melhor conhecer aquela que viria a ser a sua futura esposa, a Srta. Amélia Leite Leal. Foi paixão fulminante, e, em 25 de novembro, casaram-se em Floresta. A festa só não foi melhor porque Theophanes encontrava-se de luto, por falecimento da sua querida e inesquecível mãe Fernandina Ferraz, aos 18 de outubro daquele mesmo ano.
  
Em fevereiro de 1916, foi nomeado delegado de Polícia, assumindo a delegacia de Salgueiro e o comando da 6ª Região Policial. Em abril, assumiu como delegado de São José do Egito. 

Com o crescimento da violência em nossos Sertões, promoveu um desarmamento geral nas cidades em que era nomeado delegado. Nada escapava ao seu rigoroso controle. Em maio, foi aceito como sócio pela Sociedade "3 de julho" que, apesar de estar completando 18 anos de fundação, atravessava uma grave crise e encontrava-se na iminência de fechar as suas portas. Em setembro, escoltou até a cidade de Olinda o cangaceiro Antônio Silvino, que participaria, como réu, do que foi chamado "o júri do século". Em outubro foi nomeado delegado de Bom Conselho de Papacaça.

Em janeiro de 1917, devido a morte do deputado estadual Júlio Brasileiro, no Recife, foi incumbido de garantir a ordem na cidade de Garanhuns, ao chegar naquela cidade encontrou terrível carnificina na cadeia pública, episódio que passou para a história como a hecatombe de Garanhuns. 

Tratou de impor a ordem com muito sacrifício, pois o seu contingente era pequeno e a cidade estava tomada por cangaceiros. Graças ao bom Deus realizou com sucesso aquela duríssima missão e, por conta deste seu trabalho, foi promovido ao posto de capitão e nomeado comandante do Esquadrão de Cavalaria. Durante aquele ano realizou serviços de grande importância naquela Arma e participou, pessoalmente, da compra de cavalos, fardamentos e de diversas comemorações, entre elas, a abertura dos trabalhos do Congresso Estadual e a que festejou o 1º Centenário da Revolução de 1817. 
  

Com a sua enérgica ação, conseguiu, em março, proteger a vida do ex-governador de Pernambuco, o General Dantas Barreto e da sua comitiva, por ocasião dos tumultos ocorridos nas imediações do Teatro do Parque, no Recife. Em junho, cangaceiros liderados por Sinhô Pereira e Luiz Padre atacaram propriedades em Vila Bela e teve que deixar, temporariamente, o comando da Cavalaria a fim de seguir como delegado daquele município e, mais uma vez, impor a Lei. Além da delegacia, assumiu o comando das 2ª e 3ª Regiões Policiais. Voltou para o Recife em outubro e assumiu as funções de comandante da Cavalaria. 

No início do mês de novembro, talvez motivado pela declaração de guerra contra a Alemanha, alguns maus brasileiros acharam que poderiam derrotar aquele país, destruindo suas propriedades no Recife. Theophanes, com a sua bem treinada Cavalaria, teve que agir com muita energia para colocar ordem e fazer respeitar a nossa Constituição Federal.

Em janeiro de 1918, junto com outros comandantes da Força, regulamentaram a formalização do Cassino da Força, que, mais tarde, possibilitaria o desenvolvimento de atividades recreativas da oficialidade e de seus familiares. Durante o governo do eminente Dr. Manoel Borba, foram realizados intensos investimentos no aparelhamento e na modernização da nossa Força Pública. Em maio, iniciou o patrulhamento noturno nos subúrbios do Recife e, em julho, foram brindados com um novo e moderno Quartel de Cavalaria, na Avenida João de Barros. Em agosto teve que deixar, mais uma vez, o comando da Cavalaria e seguiu, com toda a urgência, para Vila bela a fim de assumir as 7ª, 8ª, 9ª e 10ª Regiões Policiais. Além do comando das mencionadas Regiões foi nomeado delegado de polícia daquele município.

Em janeiro de 1919, após os sucessos dos combates contra os cangaceiros, foi nomeado comandante da 2ª Companhia do 1º Batalhão e, no mês seguinte foi transferido para o comando da 3ª Companhia do mesmo Batalhão, ainda em fevereiro, motivado por problemas políticos na Capital, teve que comandar numerosa força de Cavalaria para impor a ordem na cidade. O cangaço tomava grande impulso naquela época e não dava trégua ao Governo, forçando-o a dar um maior combate aos fora da lei que apavoravam em Vila Bela (Sinhô Pereira), Cabrobó (Mororós); Paraíba (Cícero Costa); e Alagoas (Porcinos, tendo como cabras os irmãos Ferreira). Em trabalho conjunto com Forças cearenses e paraibanas, adotaram medidas mais enérgicas para combater o banditismo. 


No final daquele ano, após longos meses de intenso trabalho e graças a ação efetiva e conjunta, conseguimos cumprir a nossa missão, limpando a área da ação dos bandoleiros. O governador Manoel Borba, notando o crescimento assustador da bandidagem, sentindo a necessidade de manter tropas regulares mais próximas do teatro de operações e motivado pelas dificuldades de promover deslocamentos de tropas da capital para o Sertão, transferiu o 3º Batalhão para a cidade de Triunfo. 

A partir daí, a resposta seria mais rápida e mais eficaz. Em dezembro daquele mesmo ano, foi enviado para a cidade de Palmares, com o objetivo de evitar que acontecesse o que havia ocorrido em Garanhuns no ano de 1917. O ex-prefeito daquela cidade, Dr. Fausto Figueiredo, havia sido morto no Recife e o corpo seguiu com Theophanes para Palmares.
Em 1920, viveríamos dias agitados por movimentos paredistas, crise econômica e aumento do banditismo nos nossos Sertões. Conspirava-se contra tudo. Em novembro teve que seguir em diligência para o Sertão, com ponto de apoio na sua cidade natal, a fim de combater cangaceiros que aterrorizavam a Serra do Umã. Pela primeira vez um contingente militar entrava naquelas terras. Na ocasião foi gravemente ferido e só não foi morto graças a coragem dos seus leais soldados. O que ocorreu com Theophanes forçou reuniões de tropas em Salgueiro.

No mês de abril de 1921, ainda se recuperando do ferimento sofrido, seguiu em diligência de Floresta para Vila de Betânia e Riacho do Navio, em companhia de Optato, José Caetano e o tenente Carneiro, para encontro em Jatobá de Tacaratú. Naquela cidade, encontrar-se-iam com as Forças de Alagoas, chefiadas por José Lucena. Na oportunidade, tiveram vários encontros com os Porcinos e com os irmãos Ferreira. Em dezembro foi recolhido de Floresta, assumiu o posto de ajudante do estado maior da Força e foi elogiado pelo comandante José Novaes, que estava deixando o cargo.


Em março de 1922, mais uma vez teve que seguir para Floresta e Vila Bela, motivado pela ação dos cangaceiros. Foi recolhido em maio. Naquele mesmo mês foi nomeado delegado de Taquaritinga, vindo recolhido em junho. Em julho foi nomeado delegado de Vertentes e em agosto, com 27 anos, foi promovido ao posto de major. Em setembro assumiu, pela segunda vez, o então Regimento de Cavalaria. Em outubro participou da posse do novo governador de Pernambuco, o Dr. Sérgio Teixeira. Problemas de insubordinação civil, levaram-no a cidade de Vitória de Santo Antão, a fim de promover inquérito policial. 
  
No início de 1923, tiveram que agir com rigor para conter uma grande greve na Pernambuco Tramways. Em maio, motivado pelo assassinato do coronel Joaquim Leão, prefeito de Correntes, foi nomeado delegado daquela cidade. Em outubro, foi nomeado delegado de Jatobá de Tacaratú e comandante do destacamento local. Naquela oportunidade Lampião estava sendo perseguido por forças da Paraíba e de Pernambuco.
   
No início de 1924, seguiu em diligência para o município de Boa Vista, fronteira com a Bahia, a fim de dar combate ao cangaceiro Dom Vila Bela - vulgo Dativo. Lampião atacava o Distrito de Santa Cruz, município de Triunfo e não dava mais sossego no Sertão. Em março foi nomeado, pela primeira vez, Comandante Geral das Forças em Operações na Zona Sertaneja, com sede em Vila Bela.

Naquela época agiam os seguintes bandos: Lampião, Meia-Noite, Antônio Rosa, Cícero Costa, Sabino Gomes, Beneditos, Cipaúbas, e Gabriel Alecrim. Theophanes promoveu, de imediato, ajustes e mudanças no trajar e na forma de combater os cangaceiros. Agora a formação da sua tropa contava com grande contingente de soldados locais, afora o auxílio de agregados, que eram chamados de cachimbos.

Logo no final do mês de março, ocasião que organizava uma super volante, teve a felicidade de encontrar Lampião e feri-lo no combate na Lagoa Vieira, município de Vila Bela. A vida daquele cangaceiro esteve por um fio. No início do mês de abril, mais uma vez destroçou o bando de Lampião na Serra da Panela. 

No início de julho suas forças combateram o cangaceiro Antônio Rosa e no final daquele mesmo mês, combateu, pessoalmente, o cangaceiro Sabino Gomes na fazenda Abóboras, município de Vila Bela, na fronteira com a Paraíba. Naquela oportunidade, Lampião autorizou o ataque a cidade de Souza, na Paraíba, provocando o ódio do coronel José Pereira e o início, para valer, de uma grande perseguição. Com aquela atitude Theophanes ficou muito contente, pois sabia que os esconderijos dos cangaceiros ficavam naquela região de Princesa e, agora, o combate era sério. O temível bandido Meia-Noite seria morto em combate em Tataíra, fronteira da Paraíba com Pernambuco. Em setembro seguiu em diligências para observar de perto a movimentação das tropas. 

Em Jatobá ocorreria um conflito que terminaria envolvendo seus soldados, resultando na morte de um coletor estadual e de sua mulher. Após aquele conflito, Theophanes adquiriu inimigos gratuitos naquela cidade, sem que ele tivesse nada a haver com o fato. Diligenciou e descobriu que os Ferreiras andaram por Vila Bela, que sabiam de todos os movimentos da sua tropa e tudo que acontecia naquela cidade. Em novembro, foi nomeado Delegado de Petrolina e passou o comando das Forças para o tenente Higino Belarmino.

O ano de 1925 transcorreu sem grandes novidades. Impunha a Lei em Petrolina e era muito estimado por todos. Daquela cidade, Theophanes informava ao governador de Pernambuco e ao comando da Força Pública sobre as andanças das Colunas de Revoltosos. Lampião e seu bando campeavam pelos Sertões e impunham o reinado do terror.

No início de 1926, seguiu com alguns soldados para Ouricuri a fim de juntarem-se ao comandante João Nunes com a finalidade única de defenderem o nosso território contra a Coluna de Revoltosos. Nossas forças conseguiram brilhante vitória em Valença, no Piauí. Retornou para Petrolina, a pedido do governador, e centrou sua preocupação com a efetiva invasão que se aproximava. Em fevereiro, os revoltos invadiram Pernambuco e emboscaram o coronel João Nunes, provocando baixas em nossas forças. Em julho, de regresso, os revoltosos passam, mais uma vez, pelo nosso território e foram perseguidos tenazmente pelas nossas forças até a sua saída definitiva para o Piauí. 


Neste meio tempo, Lampião aterrorizava o Sertão Pernambucano e descarregava sua ira contra o povo ordeiro de Nazaré. Agindo assim, Lampião provocou o clamor público e a sociedade cobrava do governador de Pernambuco uma atitude mais enérgica no combate ao cangaceirismo. Em setembro foi nomeado comandante das forças contra o banditismo reinante no Alto Sertão, tendo Salgueiro como sede. Em novembro, foi, pela segunda vez, nomeado comandante geral das forças volantes, recebendo, para tal missão, carta branca do governador Júlio Mello. 

Naquele mesmo mês, em Vila Bela - sede das volantes, efetuou prisões de soldados da força que forneciam munição para Lampião e denunciou o apoio dado àquele bandoleiro por pessoas de representação daquela cidade. Em novembro, por pura pressa dos comandantes das suas forças volantes, sofreram baixas no ataque a Serra Grande. Theophanes considerava aquele ataque como um dos maiores combates que foi travado contra Lampião. Sabedor do ocorrido providenciou, de imediato, a reorganização das tropas e a perseguição foi tenaz ao bando de cangaceiros.

No início de janeiro de 1927, já reinava a tranquilidade nos Sertões de Pernambuco. O antigo grupo de Lampião estava reduzido à metade. Em fevereiro, com a prisão do cangaceiro Beija-Flor, Lampião iniciou uma série de boatos com o intuito de desmoralizar Theophanes perante seus superiores e subordinados, divulgando que recebia munição do próprio comandante das forças volantes. De imediato, Theophanes solicitou seu afastamento e abertura de rigoroso inquérito. O clamor da população sertaneja foi sentido e verificado a mentira levantada, assim, o grande comandante foi autorizado a permanecer no comando das Forças. Durante aquele ano não foi dado trégua aos bandidos, todos os coiteiros mais famosos foram tirados de ação e muitos vieram ao Recife para dar explicações ao chefe de Polícia. Sem a ajuda dos coiteiros Lampião viu que agora ele estaria irremediavelmente perdido. Dia a dia Lampião via o seu grupo diminuir cada vez mais.

No final do mês de janeiro de 1928, como prova do saneamento moral dos nossos Sertões, o chefe de Polícia, Dr. Eurico de Souza Leão, pôde realizar, com a presença de Theophanes, seu antigo sonho de viajar pelos nossos Sertões. Graças ao imenso prestigio junto ao governador, Theophanes conseguiu a compra do prédio em Floresta que serviria de Quartel para o 3º Batalhão e a construção de estradas importantes entre Vila Bela e algumas cidades do Sertão, sendo a mais importante a que liga a Floresta. 

Com a construção dessas estradas ficaria fácil os deslocamentos das tropas e encurtavam-se as distâncias. Atendendo convite do chefe de Polícia, e sabedor do saneamento realizado, assumiu interinamente o comando do 2º Batalhão, em 30 de abril, no Recife, deixando o comando das forças volantes aos cuidados do tenente Arlindo Rocha. Aquele bravo militar, em agosto daquele ano, escorraçaria o minúsculo grupo de Lampião para a Bahia. No dia 30 de maio foi promovido ao posto de tenente-coronel, contando apenas 33 anos, e passou a comandar o 1º Batalhão no Quartel do Derby.

No ano de 1930 recebeu, com preocupação, as notícias dos movimentos que vinham acontecendo em Princesa, na Paraíba, envolvendo a figura do seu amigo coronel José Pereira. Em maio, com os seus auxiliares, receberam o Graf Zeppelin, quando da sua primeira viagem à América do Sul. Em julho, abafaram uma revolta comunista de sargentos da Força Pública. Em 03 de outubro, lutando por um governo legalmente constituído e pela honra militar, enfrentou os Revoltosos de 30, conseguindo algumas vitórias, só não encontrou o mesmo entusiasmo no seu comandante o Coronel Wolmer, que insistia em se entregar. Desiludido e com alguns soldados leais formou uma coluna independente e deixou o Quartel do Derby. De lá, tentou alcançar o 3º Batalhão em Floresta, que estava comandada pelo seu amigo o major Nelson Leobaldo.

Só em Pesqueira é que foi sabedor da desgraceira que havia acontecido em Floresta e se refugiou na Serra da Cangalha, município de Custódia. Foi convencido pela sua esposa a se apresentar no Recife e buscar tratamento médico. Foi feito prisioneiro e jogado em uma cela da Casa de Detenção, sem as mínimas condições de higiene e humanidade, sendo posto em liberdade vigiada no dia 21 de outubro. Vencido, desiludido e doente acabou assim a sua vida. Deixou o plano terrestre e passou para o celeste, carregado de tristezas, em 11 de setembro de 1933, na cidade de Vila Bela.

Geraldo Ferraz, pesquisador, escritor - Conselheiro Cariri Cangaço
Fonte:http://lampiaoaceso.blogspot.com.br/2010/03/theophanes-ferraz-torres.html

NOTA CARIRI CANGAÇO: Thephanes Ferraz Torres é um dos principais personagens do Cariri Cangaço Floresta 2016, com conferencia de Geraldo Ferraz na noite do dia 28 de Maio na Câmara Municipal de Floresta.

http://cariricangaco.blogspot.com.br/2016/05/theophanes-ferraz-torres-porgeraldo.html

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"O ESTADO DE S. PAULO" - 10/10/1993 DIÁLOGO COM O HOMEM QUE MATOU CORISCO

Por Ruy Guerra
Imagem de Rufino por mim extraída na internet Antonio Corrêa Sobrinho

O sol do meio dia fazia da Praça de Jeremoabo um imenso deserto.

Lembro-me que tudo se passou nesse ano triste de 1961, ano da morte do Miguel Torres, no acidente desse mesmo jipe ali estacionado, coberto de poeira, junto da única loja aberta naquele vazio do mundo. Só não me lembro como foi que o coronel Rufino surgiu, ali sentado, esfíngico, vestido de uma camisa e calça caqui, certamente sem atinar muito bem o que queríamos dele. Nós, igualmente calados, sem outro projeto que o de trocar umas palavras com o homem que matou Corisco.

Mas daqui para a frente, tudo ficou marcado em mim com uma nitidez que chega a assustar. Cada gesto, cada palavra, cada silêncio, foi ficando através do tempo mais depurado, mais definido, mais exato. Não há um detalhe, uma palavra, um sentimento, de que eu não tenha a convicção serena que foi assim, rigorosamente, que tudo se passou. Pedi uma cerveja, que chegou morna. O coronel Rufino, não sei porque isso me devia surpreender, pediu um sorvete de morango. O Miguel Torres, por uma dessas crueldades da memória, deixou de estar presente. Houve um silêncio largo, desses silêncios de quando estranhos se medem e se perguntam a si mesmos como começar essa aventura que é ade se conhecer.

Do coronel Rufino eu sabia tudo o que me parecia importante saber: que era o maior caçador de cangaceiros ainda vivo, que há muito estava aposentado, que era de ali mesmo, daquele Sertão. De nós, imagino, ele sabia apenas que fazíamos cinema e pensávamos filmar por aquelas bandas. E não parecia particularmente interessado em saber mais. Aceitava o encontro como a inevitável curiosidade que desperta quem traz o estigma de ter matado o bandoleiro mais mítico de toda a história do cangaço. Com movimentos pausados, de quem tem toda a velhice diante de si para gastar, ia sorvendo o seu sorvete de morango.

O que mais me marcou nesse encontro, para já, foi isso mesmo: o sorvete de morango. A cor desmaiada do sorvete barato, a colherzinha vagabunda na mão grossa, seca, veienta, com o dedo mindinho ridiculamente afastado dos outros dedos. Por que um sorvete e ainda mais de morango?

Por causa desse insólito sorvete, me custou a lançar a conversa. Comecei com perguntas banais de que já conhecia as respostas, e que não justificavam o desvio que havíamos feito por aquelas poeiras calorentas do Sertão para este eventual encontro. Se ele, coronel Rufino, havia comandado muitas volantes atrás de cangaceiros? Se toda a sua vida se havia dedicado a essa caça? Se havia dado voz de sangrar a muito bandido? A cada pergunta, Rufino ia monossilabicamente confirmando, pausado, aparentemente mais atento ao sorvete de morango que ao óbvio questionário.

- E Corisco? O senhor matou Corisco?

- Matei.

O coronel Rufino não era um homem alto, nem tinha nada que à primeira vista pudesse impressionar alguém que não soubesse do seu passado. Nos seus 60 e tantos nãos, imagino, não se lhe sentia um grama de gordura. Tinha um rosto marcadamente nordestino, sem emoções visíveis, os olhos fendidos preparados para os exageros da luz da caatinga e uma voz surpreendentemente jovem.

Parecia desinteressado, embora cortês. Senti-o, não ansioso, mas decidido a terminar o encontro com o final do seu, para mim já irritante sorvete de morango. Foi essa certeza, e o sentimento da idiotice das minhas perguntas, que me fizeram perguntar de supetão, gratuitamente.

- O senhor, coronel, torturou muita gente?

O coronel Rufino parou de comer o seu sorvete, a mão pesada, suspensa no ar, a meio caminho. Pela primeira vez o senti pensar rápido, embora o tempo durasse. Depois, delicadamente, pousou a colher. Até então ele nunca me havia encarado, e ainda aí não o fez. Limitou-se a olhar a imensa praça vazia, assustadoramente amarelada pela crueldade do sol.

- Seu João!

A sua voz continuava controlada e, embora o tom da voz não tivesse aparentemente subido, atravessou a distância. Foi então que eu notei que um camponês desgarrado estava passando. O homem entrou no bar, as alpercatas de couro sem ruído, o chapéu de palha agora respeitosamente na mão. Um olhar rápido para os forasteiros, o tom respeitoso.

- Sim, coronel?

O coronel falou num tom macio, quase afetuoso.

- Seu João, o senhor me conhece há muito tempo, não é verdade?

- Conheço sim, coronel.

- Quem sou eu?

Uma leve estranheza na voz do camponês.

- O senhor? ... O senhor é o coronel José Rufino.

- Eu persegui muito cangaceiro, não persegui?

- Perseguiu, coronel.

- Eu matei muito cangaceiro, não matei?

- Matou, coronel.

A voz do coronel Rufino continuou, inalterada.

- Eu torturei muito cangaceiro, não torturei?

O camponês pareceu não entender.

- Como, coronel?

A voz do coronel Rufino parecia ainda mais mansa, mais paciente.

- Eu torturei muito cangaceiro, não torturei?

Os olhos do camponês correram por nós, intrigados.

- Não, coronel... Não senhor.

Obrigado, seu João. Pode dispor!

Como um leve aceno de cabeça para todos, o camponês, afastou-se. O coronel Rufino esperou que o homem desaparecesse no sol da praça e só então me encarou, pela primeira vez. Os olhos fendidos sem expressão, talvez por isso mais inquietantes, aprisionando os meus. A voz sempre serena, igual, mas onde se podia sentir agora, nítida uma intensa paixão.

- Toda a minha vida eu persegui cangaceiro. Prendi muitos, também dei fuga a muito pobre diabo que se meteu nessa vida por injustiça que sofreu. Mas matei muitos, muitos mesmo. De bala, de faca, de todo o jeito. Era a minha profissão.

Levantou a mão, espalmada à altura do seu rosto. Essa mesma mão, que até então tinha servido para comer aquele irritante sorvete de morango. Foi uma pausa curta, mas esses breves instantes, guardo como os de uma indefinível angústia.

- Mas esta mão, esta mão que o senhor está vendo aqui, nunca tocou o rosto de um homem, fosse que homem fosse, nem do pior bandido. Porque homem a gente mata, sangra.

Passou a mão suavemente pelo próprio rosto.

- Mas tocar o rosto de um homem, só a mulher e o barbeiro têm o direito de tocar.

O coronel Rufino retomou a colher e continuou a comer o interminável sorvete de morango. Lembro-me, que no momento, senti um imenso alívio, como se tivesse vindo de muito longe. E tinha, como compreendi mais tarde.

Daí para diante, nada mais consigo evocar. Não sei como nos separamos, se trocamos mais algumas palavras – o que duvido – além de alguma banal despedida. Mas ao longo dos anos – e muitos anos depois – comecei a relembrar e a contar, obsessivamente, este encontro. Não com o sentimento de ter escapado a algum perigo – embora ainda hoje não esteja muito certo disso – mas com a desconfortável convicção de ter ido tão fundo nesse Sertão, para ingenuamente insultar um homem na sua hospitalidade, na sua memória, no seu mundo.

Fonte: facebook
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CANGACEIRA LAURA


Uma grande quantidade de mulheres adentrou às fileiras do Cangaço depois da entrada de Maria Bonita. Algumas foram forçadas a levar essa vida, outras vieram de forma espontânea. Algumas se tornaram bastante conhecidas, outras ainda permanecem de certa forma no anonimato. Hoje iremos conhecer um pouco mais da cangaceira Laura. 

Laura Alves está à esquerda da foto

Natural de Alagoas, Laura Alves era baixa, clara, de cabelos escuros. Antes de entrar para o Cangaço Laura passou por grande decepção amorosa, pois foi abandonada pelo namorado com quem iria se casar. A jovem Laura havia se entregado ao mesmo, fato esse que não demorou muito tempo para ser descoberto por sua família. 

O pai de Laura então achando que a jovem estava desmoralizada e como forma de punição a manteve reclusa dentro da própria residência. A jovem não tinha permissão para sair. Tempos depois, a família de Laura foi visitada pelos cangaceiros, e a jovem que vivia uma vida de reclusão resolveu acompanhá-los. Se informou com outras mulheres cangaceiras sobre as dificuldades da vida no Cangaço, mesmo ouvindo sobre a fome, perseguições e dificuldades, não desistiu. E disse que se as outras mulheres conseguiam aguentar. ela também aguentaria. 

A jovem estava realmente disposta a sair da vida de reclusão e monotonia. Escolheu como companheiro Moita Brava, mas de forma decepcionante, foi rejeitada pelo mesmo. Porém, Laura não desistiu e em seguida conversou com outro cangaceiro solteiro, Manoel dos Santos que tinha como apelido Boa Vista. 

No Cangaço Laura recebeu o apelido de Doninha. Tinha como principais características sempre estar quieta e calada. Fez parte das entregas juntamente com seu companheiro. Após as entregas, houve notícias que estava morando no Sul da Bahia. Na foto abaixo, vemos Sebastiana, Moita Brava, Boa Vista e Laura durante as entregas em Dezembro de 1938.

Fonte de pesquisa: Lampião As Mulheres e o Cangaço
Antônio Amaury
Foto: Google

Fonte: facebook
Página:  Noádia Costa
Grupo: Ofício das Espingardas
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HOJE TEM FESTA EM MACEIÓ NAS ALAGOAS - DONA MARIZA MATOS VIÚVA DO CANGACEIRO VINTE E CINCO ESTÁ ANIVERSARIANDO HOJE


HOJE TEM FESTA EM MACEIÓ NAS ALAGOAS.

Hoje quem está de parabéns é a dona Mariza Matos esposa do senhor José Alves de matos (Vinte e Cinco), antigo cangaceiro do bando de Lampião.

Em nome do "Blog do Mendes e Mendes" -  http://blogdomendesemendes.blogspot.com, e do grupo e comunidade "O Cangaço", e de todos (as) os (as) membros, desejamos-lhe um feliz aniversário e muitos anos de vida com saúde e paz.

Parabéns, dona Mariza Matos.

"Grupo O Cangaço"
Blog do Mendes e Mendes 

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