Do autor: Cabo Francisco Carlos
Nordeste brasileiro Estado de Sergipe,
barrancas do Rio São Francisco Fazenda
Angicos 27 de julho de 1938. Depois de uma longa e cansativa jornada, ainda
úmidos pelas últimas chuvas de inverno, homens exaustos chegam até a um coito naquele longínquo
sertão, é um bando de cangaceiros composto por mais de trinta asseclas
liderados por Lampião o Rei do Cangaço. O lugar é seguro? Talvez sim! Mas logo
que o acampamento fora montado, eles se abrigam em suas barracas, alguns
cangaceiros foram procurar madeira seca para
acender um pequeno fogo e cozer alguns alimentos, outros para se
aquecerem da baixa temperatura enquanto jogavam um carteado tomando muita
aguardente genebra, e os que se encontra bem mais esgotados pela árdua caminhada, deitaram-se e ferram no sono vencidos pelo cansaço.
O cangaceiro Borboleta está nesta foto, mas não marcaram cada um com o seu nome - Zé
Sereno, Criança, Balão, Jurity, Novo
Tempo, Pernambucano, Laranjeira, Candeeiro, Ponto Fino
II, Quina-quina, Marinheiro, Cacheado II, Beija-Flor,
Devoção, Borboleta, Chá Preto, Penedinho, Cuidado, Azulão.
Já
bem na boca da noite, o jovem cangaceiro Borboleta se afasta do acampamento
para defecar perto de uma moita de xiquexiques, e de repente Lampião passa por
ali junto de Luiz Pedro, e parando acendem um cigarro e começam a prosear, sem
perceber que o cangaceiro Borboleta esta próximo ouvindo tudo.
Lampião
E assim Lampião
diz ao seu comparsa:
- Luiz Pedro amanhã cedo despois du café, vamu só isperá us
outrus cabras chegá pra nóis vê cumu é
qui nóis vai fazê cum u nosso distino daqui pra frente, e ocê aspois viaja lá
pru Raso da Catarina i leva as jóias, u ouru i u resto daquele dinheiro, i
escondi bem lá na “toca du mocó” junto com nossos pertences, leva dois cabras
di sua confiança, mais pelo amor Du meu Padrim Ciço, não deixa eles nem sonha
im sabe u qui tu vai fazê lá, nem mostri u luga di nossu isconderijo. Certu?
O cangaceiro
- Deixa cumigo! Respondeu Luiz Pedro. E
em silêncio seguiram rumo ao acampamento.
Ah! Borboleta sabia onde se localizava o
tal esconderijo, pois conhecia muito bem aquela região como a palma de sua mão,
pois era em uma pequena gruta de passagem bem estreita que ficava entre arbustos espinhosos no alto
de uma elevação rochosa de difícil acesso, era em um velho coito no Raso da Catarina, onde um dia
ali bem próximo a um barreiro,
O cangaceiro Gato
o cangaceiro Gato assassinou seu próprio cunhado
Mourão e outro cangaceiro chamado Mormaço, isto após receber uma represaria do
Capitão Virgulino em virtude de os supracitados asseclas terem acabado a tiros
com uma festa lá pras bandas do Brejo do Burgo, promovendo grande confusão,
tumulto e pânico entre o povo que encontrava-se divertindo naquele evento.
De
pé: Ezequiel, Calais, Fortaleza, Mourão e o menino Volta Seca. Sentados:
Lampião, Moderno, Zé Baiano e Arvoredo.*Mariano foi omitido.
Borboleta ficou quietinho, manteve o segredo e não contou nada a ninguém, pois
tinha medo que o rei do cangaço descobrisse e mandasse eliminá-lo pra manter o
sigilo e a segurança da grande fortuna. Então meio ressabiado, foi também
deitar-se como todo o resto do bando.
Lampião e Maria Bonita
O rei do cangaço fez o mesmo, e adentrando
em sua barraca, ele tirou seus equipamentos armamentos e aprestos, em seguida
deitou-se ao lado de sua rainha e mesmo excitado não buliu com ela, pois estava fazendo muito
frio, e optando pelo descanso ele apenas a beijou e fazendo-lhes umas carícias,
aconchegou-se junto a ela; e abraçando o seu corpo cálido adormeceu aquecido
sob as cobertas. E assim a noite em um
tom roxo cor de mortalha, cai lentamente
sobre as caatingas cobrindo-as como se fosse o manto negro da morte, que vai se
transformando e ficando cada vez mais
retinto.
A densa neblina cinzenta que margeia as barrancas do Velho
Chico, além de agasalhar seu corpo igual a um imenso cobertor, ainda cobre seu
leito frio de águas caudalosas e perenes.
As nuvens escuras como breu obumbram
o brilho da lua, deixando o espaço enlutado num céu de constelação de extinta, e
no anoitecer lúgubre daquele dia, nem nos sertões se ouvia o cantar soturno do
urutau. As aves de hábitos noturnos e crepusculares também emudeceram, assim
como os inúmeros batráquios e anuros de várias espécimes, que calados ajudavam
a manter o silêncio que ali se tornava sepulcral, e na mesma noite fatídica,
paira a morte sobre aquele recanto funesto e sombrio. E assim negreja a Grota
de Angicos, como se fosse um grande sarcófago de rochas perpétuas, que naquele
lugar escuso e remoto encontrava-se aberto, pronto para receber e abrigar para
sempre em seu âmago, seus inquilinos da eternidade.
Na gélida madrugada daquela trágica
quinta-feira do dia 28 de julho de 1938, o orvalho que caía sereno
homogeneizava-se com as águas serenas do majestoso Rio São Francisco, e juntos
caminhavam morosamente para se chocarem com as pancadas do mar, levando consigo
também, a lembrança das últimas horas de vida de homens que posteriormente
despertariam para a morte. E bem antes
do alvorecer, que o parélio surgia ainda sonolento e começava a tingir de
púrpuro o horizonte, quando os caititus grunhindo despertavam os bandos de
arribação que ali repousavam nos galhos das aroeiras, soldados fortemente
armados e já bem posicionados, só aguardam a ordem do subalterno oficial
volante para dar início ao prélio mortal.
Lampião já acordado chama Luiz Pedro,
Balão, Quinta Feira e o cangaceiro Elétrico para ajudá-lo na oração corriqueira
o “Ofício a Nosso Senhor”, e no momento que Maria Bonita e Enedina estão
preparando o café para o desjejum, o cangaceiro Moeda sai de sua tenda e após
caminhar algumas braças, começa a urinar; e se assusta ao ver que está mijando
em cima de um soldado volante, que no átimo e sem hesitar; dispara um tiro de
mosquetão a queima roupa, cujo projétil transfixa seu tórax assassinando ali
mesmo o infeliz. Então os volantes abrem fogo contra os cangaceiros sem
dar-lhes chance de defesa, os projéteis das metralhadoras hotkiss, parecia
exame de vespas vindo de todas as direções, Lampião é alvejado e tomba ferido
mortalmente, em seguida sua companheira Maria ao socorrê-lo; é também atingida
e cai sobre sua carcaça já sem vida.
Primeiro à esquerda é o soldado Adrião pedro
A cabroeira foge sem ter tempo de reagir,
o valente soldado Adrião, num ato de extrema coragem corre perseguindo os asseclas, manobrando e
disparando seu fuzil, mas ao pular um caldeirão é abatido por uma bala perdida
que o derruba debruço entre as pedras, deixando os cascalhos tingidos de
púrpuro com seu sangue de herói. A refrega dura uns dez minutos, e também se
acaba com o fim do Rei do Cangaço.
Por alguns instantes dura o silêncio,
que é rompido quando se dissipa a fumaça e o cheiro de pólvora queimada que
pairava nos ares, então; sorrateiramente os soldados se aproximam cautelosos
dos corpos sem vida espalhados pelo solo, e ao constatarem a vitória os
volantes eufóricos com atitudes animalescas, começam a desferir golpes
violentos e brutais nos cadáveres, ainda mutilando os cangaceiros mortos,
decapitando-os com seus facões, e alguns ainda com vida. As armas, o dinheiro,
o ouro, e as joias junto a outros objetos de valor, são todos confiscados pelos
soldados e levados para o oficial comandante da força volante.
No lado Militar só houve uma baixa,
já no lado dos cangaceiros foram onze vítimas que tiveram as suas cabeças
decepadas, e todas colocadas dentro de recipientes com álcool e transportadas
para serem orgulhosamente exibidas como troféus de guerra pelas cidades e em
todos os lugares por onde passavam os militares. Os corpos mutilados foram
abandonados e deixados expostos ao relento, fazendo dali um panorama macabro e
horrendo onde as carcaças ao se decomporem, servirão de alimento aos vermes
necrófagos, pássaros, insetos e outros animais que compõe a rica fauna do bioma
nordestino. E nos galhos de um velho jacarandá espreita o quadro um triste
abutre, enquanto o sol que surge abrasador em suas negras penas lustre.
O cangaceiro Corisco
Depois de algum tempo, quando o
alagoano Cristino Gomes da Silva Cleto o “Corisco” ou Diabo Louro, o último
remanescente do subgrupo do Rei do Cangaço Lampião, foi morto a tiros de
metralhadora, em uma emboscada preparada pelo
O tenente Zé Rufino
Tenente Zé Rufino e os comandos
de sua intrépida volante no dia 25 de maio de 1940, na Barra do Mendes na
Bahia. Os outros asseclas vendo o fim do cangaço; resolvem a se entregar. Assim
como fizeram Borboleta
O cangaceiro Juriti
e Juriti,
seguindo o conselho de sua companheira Maria e do seu cunhado Rosalvo de Pedra
D’água, que os convence a seguirem para
Geremoabo e se entregar ao Capitão Aníbal Ferreira que já os libera em seguida,
deixando-os livres para seguirem seus destinos.
Foto do capitão Aníbal Ferreira gentilmente cedida para o nosso blog pelo professor e pesquisador do cangaço Rubens Antonio.
Só que Juriti ficou
perambulando pelo nordeste, mas Borboleta como tinha outros planos, se ausentou
daquela região por um bom tempo, até que todos esquecessem um pouco dos
cangaceiros e do cangaço, depois voltou já com nova identidade e outros
documentos, e assim foi em busca de um
objetivo que lhe garantiria um futuro
bem promissor que era, “O Tesouro de Lampião.”
OFERECIMENTO
Caro amigo Zé Mendes, hoje dia 28 de julho
de 2015, que completa 77 anos da morte do Rei do Cangaço, eu Cabo Francisco
Carlos Jorge de Oliveira PMPR-RR, ofereço estas primeiras páginas do livro “O
Tesouro de Lampião” que estou terminando de escrever sobre o fantástico mundo
do cangaço, e que com sua ajuda será lançado em meados de 2016, exclusivamente
a Vossa Senhoria Ilustríssimo Professor José Mendes, como prova de estima,
apreço e reconhecimento aos trabalhos de um cidadão que sem medir esforços leva
até aos lugares mais longínquos e remotos do planeta e deste país de dimensões
continentais, o conhecimento de nossa história. Mostrando o que fomos, o que
somos, e o que seremos. Obrigado Grande Mestre.
Cabo Francisco Carlos
Jorge de Oliveira PMPR-RR “Saudações
Militares”.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com