Partilhado do Padre Guimarães, amigo de Emery desde a infância:
"E Deus chamou o nosso querido Emery Jussier Costa. Desde criança que o conheço. Ele morando na esquina da Rua Almeida Castro com o beco de Charcenay, por trás do Cine Teatro Cid, hoje Teatro Lauro Monte Filho. Eu na Av. Dix-Sept Rosado, mesma rua da sua amada Maysa Almeida Costa. Porque ali no Centro da cidade todo mundo se conhecia. Aliás, na nossa infância, adolescência e juventude, Mossoró ainda era muito pequena e todos se conheciam. Hoje não mais.
Pinta de galã, vi muitas moças suspirarem por ele. Maysa venceu todas elas. Uma voz maravilhosa de locutor, um timbre inconfundível, dicção perfeita, logo foi aproveitado pelo Mons. Américo Simonetti para trabalhar na Rádio Rural, onde ficou por muitos anos. A sua história se confunde um pouco com a da Rádio.
Sisudo, de pouco riso e isso talvez fizesse algumas pessoas pensarem que ele era antipático. Não era. Como D. José Freire ele era tímido. Só isso.
Era uma das únicas pessoas a me chamar pelo meu nome: Manoel. E eu gostava... Tínhamos um relacionamento bom. Sentia que ele gostava de mim como eu dele.
Eu brincava com ele dizendo que quando ele morresse eu ia encabeçar um movimento para colocar uma estátua dele ali no lugar que ele sempre ficava todas as tardes: num banco da Praça Vigário Antonio Joaquim, mesmo em frente à Catderal. Era ali que ele ficava conversando com os amigos, a maioria contemporâneo dele de juventude.
Vai fazer falta. Pra Maysa, Maíria e Emery Jr o meu abraço solidário e minhas preces." Pe. Manoel Vieira Guimarães.
O pesquisador Antonio José de Oliveira lá da cidade de Serrinha, no Estado da Bahia, em um dos seus comentários, na página do http://blogdomendesemendes.blogspot.com, datado em 28 de julho de 2014, disse o seguinte:
Até hoje Paulo George, não sabemos porque Lampião cedo parou a perseguição ao seu inimigo número um. Não acredito que Zé Saturnino andava tão protegido em termos de segurança, ao ponto de não ter se encontrado com Lampião. É MAIS UM DOS MISTÉRIOS DO CANGAÇO.
Antonio Oliveira - Serrinha-BA.
Lampião e o cangaceiro Jurity
Na minha simples e humilde opinião e que não tem nenhum valor literário para o estudo do cangaço, quando Lampião sentiu que era fácil adquirir as coisas através de assaltos, desistiu por completo a ideia de assassinar o seu inimigo nº 1, que era o fazendeiro Zé Saturnino.
Tenente Zé Lucena
Lampião já que não iria mais perseguir Zé Saturnino também desistiu de perseguir o assassino do seu pai José Ferreira da Silva (isto é, responsável por quem pôs fim a vida do patriarca da família Ferreira) o Zé Lucena.
Com alegria e gratidão, recebo nesta data, o livro "O Sertão Anárquico de Lampião - Cangaço, canudos, padre Cícero, Coluna Prestes, coronelismo e Estado Novo - O Nordeste no início do século XX" do estimado escritor Luiz Serra. A obra é bem construída, repleta de informações, fotografias e registros da época. Um resgate histórico!
Muitas cidades mineiras orgulham-se dos seus ciclos históricos e conservam entre outras coisas, o calçamento bruto dos tempos de vila. Algumas nem permitem mais circulação de veículos por esses patrimônios compostos por edifícios e pedras antigas. Em Santana do Ipanema, Alagoas, a vila também ganhou calçamento bruto em toda a área do comércio, inclusive a Avenida principal Coronel Lucena. Era sim um orgulho santanense para uma vila que agia como cidade e ganhara pavimento moderno para a época. Mais alguém de fora sempre comparava a ignorância de “A” ou de “B” com o calçamento bruto de Santana do Ipanema. No governo municipal do senhor Ulisses Silva, foram demolidos os prédios antigos do comércio e arrancado o calçamento bruto da cidade. As pedras foram substituídas por paralelepípedos, pedras quadriculadas de granito apontadas como mais modernas.
Extração de areia e rodas de pneus, ontem de 40 anos e hoje. (Foto: B. Chagas).
Daí em diante as centenas de carros de boi de roda com aro de ferro, ficaram proibidos de circularem no calçamento novo. As cargas que o carro de boi pegava no próprio armazém e levava para a zona rural, ficaram então sendo transportadas de outra maneira dos armazéns para as areias do rio Ipanema, ponto de estacionamento dos carros de pau. O transporte de areia do rio em carro de boi também teve que ser adaptado. (toda Santana foi construída com areia do Panema). Diante disso, surgiu a nova moda para o carro de boi urbano. As rodas de madeira com aro de ferro, foram trocadas por pneus e seus acessórios no eixo. Assim o carreiro pode continuar seu trabalho rua acima, rua abaixo sobre o calçamento novo do prefeito Ulisses.
Aproveitando a transformação, os carroceiros passaram a imitar os carreiros. As carroças puxadas por burras, também foram adaptadas e as rodas que eram de outra modalidade, passaram a se apresentar com pneus de automóveis. Com pneus ou sem pneus não parou a extração mineral no rio Ipanema. Mesmo agora em 2020 o seu leito é tremendamente explorado sem nenhuma restrição. Teve gente até que já se apoderou da imensa fatia do rio, extrai e vende o que é de todos os santanenses.
A estrada da vida é entremeada de chão florido e terreno espinhento. Caminhar por ela significa vencer os obstáculos para completar o ciclo da existência. Contudo, dependendo da situação de cada pessoa, a estrada se torna menos difícil pelos acompanhantes que se juntam ao passo, pela ajuda a cada necessidade, pelo que lhe é colocado à disposição para que prossiga sem maiores problemas.
As pessoas ricas, influentes, poderosas e possuidoras de status político e social, nunca estão sozinhas na estrada nem caminham próximo aos buracos, espinhos e armadilhas. O sol não as aflige porque sempre haverá alguém com um guarda-sol para proteger, e assim também com a chuva. Não sentem sede nem fome, quando o cansaço chega logo surge um bom lugar para descanso.
Tais pessoas, praticamente conduzidas por outras pessoas, sempre estarão próximas à sombra e água fresca, ao que de menos pesaroso possa existir na estrada. Muitas delas sequer caminham ou fazem qualquer esforço, pois não faltarão aqueles que lhes arrastem nos ombros. Os outros cansam, suam, sofrem e se estropiam para que os seus endeusados prossigam sorridentes e cheios de felicidade.
A sorte da estrada é uma só: poder, dinheiro, influência. Eis as chaves da caminhada. Quem conta com a dádiva econômica, política ou de status, certamente nem perceberá se está caminhando sobre flores ou pontas de pedras, pois praticamente flutua. Nada lhe aflige, nada lhe ameaça, nada lhe causa perigo ou temor. O próprio poder é protetor, mas quem lhe serve de escudo e proteção é sempre aquele que lhe deve submissão ou que espera qualquer tipo de reconhecimento.
Mas nem sempre ocorre assim, nem sempre a pessoa consegue trilhar toda a estrada da vida à sombra do que possui. O mundo dá muitas voltas, e basta que o afortunado perca prestígio e poder, se veja sem a riqueza de antes ou ameaçado de viver como um ser comum, então se torna muito diferente. A estrada de flores dará lugar ao chão de terra batida, e mais adiante os espinhos poderão surpreender a cada curva.
Sem poder, sem dinheiro, sem influência, sem status, caminhando apenas como um ser comum, dificilmente chegará alguém para lhe matar a sede, saciar sua fome ou oferecer uma cadeira para descansar. Na lei dos comuns, cada um deverá vencer segundo suas próprias forças. E que não se imagine que o prestígio de outrora possa servir para qualquer coisa, pois o momento exige mostrar o que tem e não o que teve.
Então surge a imagem daquela pessoa poderosa que sempre caminhou acompanhada por um verdadeiro séquito de aduladores. Quanto mais poder mais pessoas ao redor, e todas servindo, acarinhando, numa bajulação de envergonhar os outros caminhantes. Mas bastou que o poder fraquejasse, que sua influência diminuísse e já não pudesse mais ser tido como mandachuva, para que a procissão fosse ficando esvaziada cada vez mais. E com a dissipação total do poder surge apenas a solidão como companhia.
Acaso continuasse poderoso, certamente que a procissão de bajuladores pisaria em brasas e espinhos, seguiria aonde ele fosse. Mas a situação agora é muito diferente. Não tem mais nada nem a ser desejado nem a oferecer, não é senão uma pessoa que caminha sem olhar para trás para não recordar o passado faustoso. E solitário vai seguindo porque ninguém se arrisca a acompanhar quem nada tem a oferecer como reconhecimento.
Assim ocorre na vida inteira e em diversas situações. A perda de prestígio e de poder tende a ser acompanhada de uma terrível solidão. Todos parecem sumir de repente. E no instante mais difícil, quando após a jornada chega o instante de pisar no deserto, então é que se sente quanto dói a areia ardente do abandono. Noutros tempos, tudo um oásis, mas agora somente a poeira, a tempestade, a solidão.
Quem quiser se manter no sombreado, sempre acompanhado e bajulado, que cuide de se manter no poder, na riqueza, com influência. É assim que funciona perante muitos. Não há solidão materialista, não há desprezo capitalista. Tudo é uma questão de impor ao outro uma condição de subserviência tal que nuvens sejam estendidas aos pés.
Do contrário, quando o tanto ter se transforma em pouco ou nada ter, a voracidade da solidão e do desprezo se revelará de forma assustadora. Mas não adianta relembrar os tempos de fartura para que os amigos apareçam. Estes não existirão mais. Contudo, aqueles outros, aqueles mesmos que sempre foram sinceros e fiéis a vida inteira, mas foram relegados pela cegueira da bonança, jamais estarão distantes.
Estes, além de não deixar que o amigo pise sozinho em espinhos, se manterão na postura de fiéis companheiros ainda que mais tarde, acaso a ilusão da fartura ressurja, sejam novamente esquecidos.
Por volta de 1761, Cabeleira aos seus nove anos de idade foi separado de sua
mãe e retirado de casa por seu pai, uma alma desgraçada, perversa e maligna,
que o levou para morar consigo nas brenhas da caatinga, numa vida errante e
marginal, lhe passando a pior e mais hedionda educação, em que ensinou a seu
filho ser o pior da personalidade humana.
Antes de partir, o menino José Gomes se despediu de sua companheira de infância, Luisinha, a quem jurou voltar um
dia para buscá-la e viverem juntos. Quinze anos depois, por volta de 1776,
tendo o menino virado o famigerado assassino dos sertões, o Cabeleira, o pior
dos bandidos daquele tempo, este avistou uma moça na beira de um rio apanhando
água, a quem atacou agarrando-a a força para saciar suas sevícias imundas,
tentando arrastá-la para um local mais afastado para a prática abusiva de suas
más intenções.
A mãe da moça apareceu e tentou salvá-la, mas foi abatida
violentamente na cabeça pela coronha de seu bacamarte, sendo após, reconhecido
pela moça, que na verdade era Luisinha, a quem o marginal jurou seu amor. Com
isto o Cabeleira surpreso se evadiu prometendo voltar em breve para buscá-la.
Lusinha levou sua mãe arquejando pela vida até à única casa que havia naquelas
imediações, de uma família amiga. Ao chegar à esta casa, só se encontravam as
mulheres, pois os homens, pai, filhos e genros, tinham saído à procura do bando
de bandidos para combatê-los, mas foram emboscados pelos mesmos que mataram a
todos do grupo familiar e se dirigiram à sua casa para desgraçar o resto da
família e seus bens.
Ao chegarem à casa o bando deparou-se com as mulheres
trancadas em desesperos e postas a rezar e, como não abriram a porta, tocaram
fogo na humilde residência de taipa, com a mulheres dentro. Após longa
incineração, já tendo convalescidas praticamente todas as mulheres por asfixia
e sufocamento, a porta se abriu com a saída desesperada de Lusinha que
segurava em seus braços sua mãe já em seus suspiros finais de vida. Luisinha inalada pela fumaça, sem forças, asfixiada e com queimaduras, quase desmaiada,
começou a ser disputada pelos bandoleiros a fim de se apossarem dela e dela
abusarem, inclusive pelo pai de Cabeleira, enquanto ela chorava a morte de sua
mãe.
O Cabeleira consegue impor seu domínio sobre os demais e sobre aquela
pobre mulher a quem sequestrou e levou consigo em fuga. Logo em seguida, o
bando foi atacado pela volante policial que matou a maioria dos bandidos e
prendeu Joaquim, o pai de cabeleira e Teodósio, seu “braço direito”, tendo
Cabeleira fugido sertão à dentro com Luisinha, totalmente abatida e que não
suportando as queimaduras, a asfixia, a fome e a sede, faleceu em meio ao
sertão inóspito, sendo seu corpo inerte abandonado por seu algoz que continuou
em fuga, sendo preso poucos dias depois e levado à Recife onde foi enforcado
junto com seu maldito pai e seu outro companheiro de crimes, num enforcamento
triplo e público, estando entre os espectadores a mãe de José Gomes, impotente
e aos prantos de choro.
João Filho de Paula Pessoa, Fortaleza/Ce. 20/04/2020.
Gitirana era um cangaceiro com dons artísticos, era seresteiro, repentista,
fazia poemas, tocava, cantava e dançava. Entrou no cangaço em 1937, no grupo de
Corisco, para vingar a morte de seu pai, morto por um volante. Em 1938
encantou-se e envolveu-se, clandestinamente, com Cristina, mulher do Cangaceiro
Português, chefe de outro sub grupo. A Traição foi descoberta e discutida no
bando, a regra para traição era a morte, sendo que, desta vez, o amante da
história era cabra de Corisco e Português era conhecido como covarde.
Corisco
sabia que ele não trataria a coisa de “homem para homem”, pois percebeu seu
conluio com Catingueira para que este matasse Gitirana em seu lugar, e sabia
que seria pelas costas como já fizeram antes com um cabra de seu grupo e, como
isso, intercedeu dizendo que Português cuidasse de sua mulher, que de seu cabra
cuidava ele.
O clima ficou tenso entre os bandos, Cristina pediu a Corisco para
ficar em seu grupo, pois gostava de Gitirana, mas este negou dizendo que isso
só pioraria a situação entre os grupos.
Maria Bonita se manifestou pela punição
de Cristina para não desmoralizar Português, Lampião apoiou Corisco, e
Português ficou encarregado de aplicar sua lei e limpar sua honra por conta
própria.
Diante da tensão do caso, Corisco mudou-se de coito com seu grupo,
dentre estes Gitirana. Cristina permaneceu no acampamento e alguns dias depois
Lampião mandou um coiteiro conduzi-la de volta à sua casa.
No caminho, foram
emboscados por três cangaceiros e Cristina foi morta à facadas e enterrada em
cova rasa, por encomenda de Português que não se fez presente no ataque. Uma
semana após à morte de Cristina houve a emboscada de Angico que matou Lampião, Maria Bonita e mais nove cangaceiros.
Gitirana continuou no Cangaço com
Corisco e em 1939 conheceu a jovem Maria de Jesus, com quem se afastou do
bando. Em 1940 foi preso em Salgueiro/Pe e levado para Salvador/BA, onde cumpriu
pena e foi anistiado pelo Governo. Morreu tempos depois de tuberculose.
João
Filho de Paula Pessoa, Fortaleza/Ce. 13/01/2020.
Há aproximadamente 5000 mil anos, os antigos habitantes do Ingá registravam a sua história. Registros que atravessou séculos de história e encantam quem os conhece, enchendo de orgulho os seus herdeiros, os cidadãos paraibanos e, porque não, todos os nordestinos.
O estranho monólito que compõe a Pedra do Ingá é conhecido praticamente desde a descoberta do Brasil, pois se sabe que o mesmo foi citado pela primeira vez em 1618, no livro Diálogos da Grandeza do Brasil, atribuído ao português Ambrósio Fernandes Brandão. É provável que este monumento tenha seu lugar reservado entre os mais intrigantes enigmas arqueológicos já descobertos em nosso planeta.
É sabido que se trata do maior, mais complexo e mais misterioso conjunto rupestre que reporta a um passado desconhecido e carrega consigo uma grande quantidade de caracteres e signos ainda por serem decifrados. Esta colossal pedra cifrada está localizada no Estado da Paraíba, na Serra da Borborema, município de Ingá, às margens do rio de mesmo nome, antigo Bacamarte, a 85 km de João Pessoa e a 35 km de Campina Grande. Estes registros tornaram esta pequena cidade grandiosa no debate sobre Patrimônio Histórico.
Na época das chuvas este grande monólito fica parcialmente encoberto pela água e no tempo seco pode ser visto em sua totalidade, além de que o leito do rio fica completamente seco, com apenas algumas poças d’água espalhadas em quase toda a sua extensão.
Que registros são esses? Sobre o que eles falam? As Itacoatiaras do Ingá formam um paredão de 15 metros de extensão por 2,30. São inúmeras inscrições na pedra, compondo um sistema de signos/símbolos com inúmeras probabilidades de entendimento. Por isso, podemos afirmar que a arte rupestre das Itacoatiaras do Ingá representam um dos vestígios mais importantes dos primeiros habitantes da Paraíba.
Este conjunto de inscrições rupestres possui uma excepcionalidade, tanto em relação à sua forma e métodos utilizados, quanto à sua complexidade e execução de sua vasta petrografia. Além disto, suas insculturas parecem ter sido rigorosamente planejadas, traçadas e executadas, criando assim certa dificuldade junto aos estudiosos.
Recentemente dois pesquisadores voltaram-se para estudar a chamada “Pedra do Ingá”, o arqueólogo Juvandi Santos (2007) cuja preocupação maior está voltada para a comprovação da existência de sítios arqueológicos em cada mesorregião da Paraíba, como também para a sistematização das gravuras ou produção cultural encontrada em cada um.
Já o historiador Vanderley Brito (2008) teve por motivação maior conseguir desfazer as “impressões fantasiosas”, de que seres extraterrestres teriam feito as marcações na Pedra do Ingá, e provar que as inscrições são obras de paleoíndios (os primeiros nativos que ocuparam o Brasil). Em sua pesquisa Brito desenvolveu uma metodologia de estudos sobre gravuras que vem se destacando quando o assunto é arte rupestre.
Estes dois trabalhos são importantíssimos na redescoberta da pré-história da Paraíba, uma linha de pesquisa pouco desenvolvida e, portanto, pouco valorizada. Talvez resulte dessa ausência de valorização com Patrimônio histórico o esquecimento e o abandono por parte não só das autoridades, como da própria sociedade.
Assim, ao conhecer as riquezas arqueológicas da fabulosa “Pedra do Ingá” aprendemos a valorizar, a cuidar e preservar este nosso tesouro. A Paraíba e o Nordeste agradecem!
Fotos – Professor e fotógrafo Arnaldo Vitorino da Silva, de Santa Cruz do Capibaribe, Pernambuco
Qual a Razão Para a Construção desses Campos de Pouso? Como Se Deu Esses Eventos? Quem Pilotou o Avião e Que Aeronave Era Essa?
Rostand Medeiros – Escritor e Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte
Eram nove e meia da manhã de uma quarta-feira ensolarada e em uma cidade do sertão potiguar uma multidão não parava de observar o céu. Estavam todos atentos ao surgimento de algo diferente daquilo que normalmente divisavam no horizonte, as desejadas nuvens de chuva.
Estamos no dia 16 de agosto de 1928, na centenária cidade de Acari, região do Seridó, onde a maioria dos seus habitantes se concentrava em uma área a alguma distância do centro da pequena urbe. Um local que até recentemente era apenas mato. Logo circulava de boca em boca no meio da multidão, que na cidade o dedicado telegrafista Mário Gonçalves de Medeiros havia recebido uma mensagem dando conta que o governador potiguar Juvenal Lamartine de Faria estava a caminho.
E os acarienses continuavam olhando para o alto, pois dessa vez aquela autoridade não chegaria de automóvel, vindo pela Rodagem, mas estaria entre seus amigos desembarcando de um moderno avião. A primeira aeronave a voar pelo interior do Rio Grande do Norte.
Aquele era o momento da inauguração do campo de pouso de Acari, um acontecimento que era visto com extremo orgulho por todos na cidade e apontava para interessantes possibilidades de progresso.
Acari era a primeira cidade potiguar a ter esse tipo de benfeitoria inaugurada pelo governador Lamartine. Sendo uma obra construída pela comunidade, com assessoria do governo do estado, tendo a frente dos trabalhos os fazendeiros Cipriano Bezerra Galvão Santa Rosa e Cipriano Pereira de Araújo. Além de Acari, ainda naquele dia 16 de agosto o governador Lamartine seguiria para Caicó, a maior e mais importante cidade da região, para inaugurar o campo de pouso local. Uma grande e detalhada reportagem do jornal natalense A República (18/08/1928), foi publicada em sua primeira página sobre a construção desses campos e como ocorreram esses eventos.
Circulavam pela pista de terra dos mais abastados aos mais humildes acarienses e seridoenses. Veio gente das povoações de Carnaúba, Cruzeta, São José e outros das vizinhas cidades de Currais Novos, Jardim do Seridó, Parelhas e até de mais distante. Homens, mulheres, crianças e idosos com seus cabelos prateados se misturavam aos vaqueiros com chapéus de couros, que orgulhosamente passeavam em seus cavalos. Estes últimos circulavam ao lado dos automóveis dos coronéis, que traziam seus familiares para ver o progresso vindo dos céus.
Em meio à agonia da espera, alguns comentaram Mário Gonçalves de Medeiros havia recebido novas informações da passagem do avião sobre as cidades de Macaíba, Santa Cruz e Currais Novos.
O Avião Está Chegando
Realmente para os potiguares da época, todo aquele movimento aviatório era um assombro. Nem fazia tanto tempo assim, quase seis anos, quando o hidroavião com Euclides Pinto Martins e alguns norte-americanos, conhecido em Natal como “Libélula de Aço”, tinham sido a primeira aeronave a sobrevoar o Rio Grande do Norte e a visitar a capital. Logo vieram outras aeronaves, como um hidroavião branco que sobrevoou Natal e depois baixou no Rio Curimataú, perto de Canguaretama, sendo pilotado por um argentino chamado Ollivieri. Na sequência a capital potiguar recebeu os hidroaviões do italiano De Pinedo, do português Sarmento de Beires e a esquadrilha de três aeronaves da aviação do exército dos Estados Unidos.
Mas o que verdadeiramente encheu os potiguares de orgulho e enlouqueceu a capital foi à chegada do hidroavião brasileiro Jahú, pintado de vermelho e pilotado pelo paulista João Ribeiro de Barros. Mesmo com todos os problemas ligados a esse “Raid”, os potiguares quase explodiram de satisfação ao saber que eram os primeiros brasileiros a receber aquele hidroavião em nosso território continental.
Não demorou a circular a notícia que os franceses estavam construindo um campo de pouso em um lugar chamado Parnamirim, não muito distante de Natal. E em outubro de 1927 aquele local foi palco de um verdadeiro prodígio – Um avião francês atravessou o Atlântico com o piloto Dieudonné Costes e seu companheiro Joseph Le Brix e aterrissou em Parnamirim, depois de terem partido de Paris apenas dois dias antes. No mês anterior ao da inauguração dos campos no Seridó, os italianos Arturo Ferrarin e Carlo Del Prete tinham descido em uma praia perto de Touros, depois partirem de Roma e voar sem escalas entre a Europa e a América do Sul.
Aquelas notícias corriam por todo Rio Grande do Norte. Mesmo com muitos sertanejos sem compreender totalmente seu significado, só o fato de saber que modernas aeronaves vindas do outro lado do mundo tinham como destino a sua terra, o seu estado, era algo que criava um clima diferente, positivo e intenso.
No caso de Acari, quando chegaram os homens do governo para elaborar a construção da pista do campo de pouso, tendo a frente o capitão-tenente aviador naval Djalma Fontes Cordovil Petit, o falatório e a curiosidade foram gerais. Agora, naquela ensolarada manhã de quarta-feira, ali no campo de pouso, todos aguardavam o governador Juvenal Lamartine para inaugurar aquela obra.
Quando faltavam cerca de dez minutos para as dez, alguém viu ao longe um avião pintado de branco e o frêmito da multidão foi geral. Primeiramente a máquina sobrevoou algumas vezes Acari e logo, com extrema maestria e para assombro de todos os presentes no campo de pouso, o “bicho” passou baixo e roncando forte. Deu para ver o piloto acenando e umas letras pintadas de preto na lateral da máquina voadora. Aí o avião deu uma volta e passou de novo sobre a pista, como querendo observar o lugar para ter segurança para pousar. Não demorou e o piloto aterrissou seu avião com perfeição, mas levantou uma poeira danada.
A máquina rodou pela pista que tinha 500 metros de extensão, por 150 de largura. Foi aos poucos desacelerando e parou. Quando o governador Lamartine surgiu com um gorro de piloto, a multidão estourou em aplausos.
Juvenal e a Aviação
Mesmo tendo nascido na cidade potiguar de Serra Negra do Norte, mais precisamente na fazenda Rolinha, Juvenal Lamartine cultivou uma relação muito próxima com Acari, terra de sua mulher Silvina Bezerra de Araújo Galvão. Ali foi juiz de direito por sete anos, tinha muitos amigos e a região era seu principal reduto eleitoral.
Homem inteligente, culto e vivaz, Lamartine certamente foi um dos primeiros potiguares a perceber as vantagens positivas que a localização do Rio Grande do Norte trazia para a incipiente indústria da aviação. Quando assumiu o governo potiguar em janeiro de 1928, Lamartine propagava um forte discurso desenvolvimentista, utilizando como exemplo a aviação em terras potiguares. Imaginava Lamartine que em pouco tempo o Rio Grande do Norte, bastante carente de ligações rodoviárias e ferroviárias, poderia ter na aviação uma maneira de ligar mais rapidamente seus extremos.
Entre seus feitos nessa área podemos listar o total apoio às empresas aéreas estrangeiras que aqui se instalaram, a criação de um aeroclube e de uma escola de aviação em Natal e a construção de campos de pouso em cidades do interior.
Mesmo com toda sua inteligência e capacidade, Juvenal era um homem do seu tempo e do seu lugar. Não foi surpresa ele apoiar e incentivar fortemente a criação nas cidades de Acari e Caicó dos primeiros campos de pouso no sertão. No futuro aqueles locais poderiam até nem receber mais aeronaves, mas realizar aquelas inaugurações, diante de sua gente e chegando dos céus em uma aeronave estrangeira, era algo que não tinha preço.
De Cavalo de Batalha na Primeira Guerra, Para o Sucesso no Uso Civil
Já o avião biplano que transportou o governador era de fabricação francesa, chamado Breguet XIV AV2, desenvolvido inicialmente como avião militar na Primeira Guerra Mundial.
Seu idealizador foi o engenheiro Louis Charles Breguet, que no início de 1916 propôs as forças armadas francesas o desenvolvimento de um grande biplano monomotor de dois lugares, chamado Breguet AV. O protótipo AV1 voou pela primeira vez em 21 de novembro de 1916, com um motor de 250 hp e se mostrou extremamente bem sucedido. Essa aeronave podia levar uma carga de 730 kg, se elevando aos 6.500 metros de altitude em alguns minutos e atingindo a velocidade máxima de 175 km/h, feito que poucos aviões de caça da época poderiam alcançar. Breguet então decide ampliar a capacidade de motorização de sua nova aeronave para 275 hp e nasce o protótipo AV2, que incorpora dois tanques de combustível de 130 litros e um tanque de óleo (20 litros) no lado direito do motor.
Assim que os testes oficiais do AV2 foram concluídos em janeiro de 1917, ele é batizado de Breguet XIV e 508 unidades foram encomendados pelos franceses. O resultado geral é bastante positivo e a nova aeronave se torna um verdadeiro “Cavalo de batalha” da aviação francesa nos últimos anos da Primeira Guerra. Logo surge uma versão de bombardeio de dois lugares, equipada com motor V12 Renault, de 300 cv. Mais de 1.500 aeronaves são encomendadas a Louis Breguet, que também foi vendida para a aviação militar belga e para a Força Expedicionária Americana. Em abril desse ano Louis Breguet consegue entregar aos seus clientes quatro unidades dessa aeronave por dia e 2.000 aviões estão em serviço no final da guerra, com versões que incluem aviões de treinamento, bombardeiro de longo alcance, transporte de feridos e uma versão equipada com flutuadores.
Em fevereiro de 1919, Louis Breguet e outros sócios fundam a Compagnie des Messageries Aériennes (CMA), cuja linha principal liga Paris a Londres. Essa empresa aérea civil opera entre 1919 e 1923 e os aviões militares Breguet XIV A2 são usados com tanques adicionais e recipientes colocados sob as asas para transportar malas postais entre Paris, Bruxelas e Londres. O uso pela CMA desses aviões mostram suas vantagens e qualidades para a aviação civil. Logo outra empresa aérea francesa vai utilizar o mesmo avião com esse fim, principalmente do outro lado do Oceano Atlântico.
Durante a Primeira Guerra Mundial o visionário Pierre Georges Latécoère, decidiu transformar sua fábrica de vagões em um centro de produção aeronáutica. Em 1918, com a paz restaurada e percebendo a urgência de acelerar a comunicação entre os países, Latécoère cria em 1º de setembro de 1919 uma linha aérea regular para transportar o correio entre a França e o Marrocos, cujo voo inicial foi realizado pelo piloto Didier Daurat, diretor das linhas Latécoère, em um Breguet XIV A2. Depois a linha, ou “La Ligne”, como os franceses a denominavam, chegou a Dacar, na antiga África Ocidental Francesa e hoje capital do Senegal. Na sequência Daurat recrutou pilotos como Jean Mermoz, Henri Guillaumet, Antoine Saint-Exupéry e André Depecker.
Em abril de 1927 Pierre Georges Latécoère cedeu a linha aérea à Marcel Bouillioux-Lafont, investidor francês radicado na América do Sul. A razão social da empresa passou a ser Compagnie Générale Aéropostale (CGA).
Lafont tinha planos ambiciosos, com a ideia de criar uma grande linha aérea postal de Toulouse, Casablanca, Dacar e daí para Natal, Rio de Janeiro, Buenos Aires e Santiago do Chile. Nesta ideia empreendedora, ainda em julho de 1927, vindo do Rio de Janeiro, chega a capital potiguar um avião Breguet pilotado pelo francês Paul Vachet e mais dois companheiros. Eles vêm para implantar em um descampado conhecido como Parnamirim, o primeiro aeródromo do Rio Grande do Norte. Fato que comentamos anteriormente.
Em 1 de março de 1928 foi inaugurado o primeiro serviço aeropostal entre a França e a América do Sul. Nesta operação os aviões partiam de Paris até Dacar, onde os malotes com correspondências eram então embarcados em navios pequenos e bastante velozes conhecidos como “Avisos Postais”, ou “Avisos Rápidos”, que atravessavam da África até Natal. Depois eram embarcados em aviões para o sul do país.
Como no Brasil basicamente as rotas aéreas dos franceses percorriam o litoral, certamente eles jamais pousariam com alguma regularidade em Acari, Caicó ou algum outro campo de pouso que viessem a ser criado no interior do Rio Grande do Norte. Mas não era nenhum prejuízo para esses estrangeiros realizar aquele voo e satisfazer o governador Lamartine naquela viagem ao Seridó. Contanto que este continuasse colaborando com seus interesses em terras potiguares. Percebi que a Compagnie Générale Aéropostale deu muita importância no apoio àqueles eventos, pois além do piloto e Juvenal Lamartine, seguia no avião George Piron, diretor da empresa francesa em Natal.
O Primeiro Piloto a Sobrevoar o Sertão Potiguar
E para ocasião festiva em Acari e Caicó foi convocado para pilotar o Breguet XIV A2, matricula F-AGBV, número 306, o experiente aviador André Depecker, um dos melhores da Aéropostale, com anos de atuação no transporte de correio aéreo e de passageiros na Europa, África Ocidental e América do Sul. Além de tudo isso, Depecker era um dos pilotos franceses mais populares e conhecidos em Natal.
Realmente aquela missão tinha de contar com um piloto como Depecker. Até aquela data nenhuma aeronave havia sobrevoado o sertão do Seridó e nem aterrissado nas cidades de Acari e Caicó. Ele tinha experiência suficiente para voar com mapas simples e poucas referências, seguindo adiante basicamente no visual. É possível que Juvenal Lamartine tenha ajudado Depecker na orientação do caminho a seguir para Acari, pois no passado já havia realizado várias viagens no lombo de burros entre o Seridó e Natal, conhecia bem as referências do caminho por terra e falava fluentemente francês.
André Depecker nasceu em 1904, na cidade de Hautmont, extremo norte da França, não muito distante da fronteira com a Bélgica. Ele tinha apenas dez anos de idade quando estourou a Primeira Guerra Mundial. Não sabemos se sua família foi atingida diretamente pelo conflito, mas sabemos que sua cidade esteva na zona ocupada pelas tropas alemãs e só foi libertada pelos ingleses em novembro de 1918.
Sobre aspectos de sua vida e sua entrada na aviação, nada conseguimos apurar. Mas nos antigos jornais sempre encontramos várias notas elogiosas sobre seu trabalho, atuação e caráter.
O conceituado crítico de arte Antônio Bento de Araújo Lima, que se criou na fazenda Bom Jardim, em Goianinha, Rio Grande do Norte, registrou no Diário Carioca (12/11/1935-P.6) como havia sido seu primeiro voo, seguindo a rota entre Natal e o Rio de Janeiro, cujo piloto foi André Depecker. Para Bento o voo foi fenomenal, onde ele teve a oportunidade de sobrevoar o Rio durante a noite, “fantasticamente iluminado”, em condições atmosféricas perfeitas. O passageiro classificou o piloto francês como “Forte, calmo, corajoso e ao mesmo tempo de uma prudência incomparável”. Segundo o periódico recifense Jornal Pequeno (14/04/1930-P.1) Depecker foi condecorado em abril de 1930 pela Societé Aeronautique de France, em decorrência do apoio prestado aos aviadores italianos Ferrarin e Del Prete em Touros.
O francês parece que gostou muito do Brasil, tendo um carinho muito especial pelo Rio Grande do Norte. Em 2007 eu realizei uma entrevista com o escritor Oswaldo Lamartine de Faria, filho do governador Juvenal Lamartine e que na juventude conheceu vários pilotos franceses que estiveram em Natal, pois sua casa no bairro de Petrópolis era próxima do local que alojava esses aviadores. Oswaldo Lamartine me disse que André Depecker havia se apaixonado ardorosamente por uma jovem da cidade de São José de Mipibu. Meu entrevistado não sabia a situação anterior dessa mulher, mas sabe que o francês montou uma casa para ela, onde se encontravam quando ele aqui escalava. O fato chamou tanta atenção na provinciana e pequena cidade, que essa mulher foi apelidada de “Maria de Depecker” e até uma música de carnaval foi para ela criada.
Anos depois, em 5 de novembro de 1935, vamos encontrar André Depecker pilotando um avião Latécoère 28, prefixo F-AJIQ. Segundo o Diário Carioca (06/11/1935-P.1) junto com ele seguiam os franceses Joseph Le Duigou, operador de rádio, Auguste Morel, engenheiro de voo, e Fernand Clavere, navegador. A aeronave procedia de Buenos Aires, Argentina, com escala em Montevideo, Uruguai, pousando nos principais aeródromos ao longo da costa brasileira e tendo como destino Natal. O Latécoère 28 transportava quilos de correspondências destinadas a Europa. Após a partida de Salvador a equipe confirmou pelo rádio que tudo estava indo bem a bordo. Algum tempo depois, no que se acredita ser o litoral do atual município baiano de Conde, o avião caiu no mar em circunstâncias até hoje desconhecidas. Os destroços da aeronave e os quatro corpos foram encontrados, bem como algumas malas postais.
Juvenal Lamartine em Acari
Segundo a reportagem de A República (18/08/1928), após Juvenal Lamartine, George Piron e André Depecker desembarcarem do Breguet XIV A2 no campo de pouso de Acari, foram recebidos por várias autoridades. Entre estes se encontravam o Coronel Felinto Elísio (de Jardim do Seridó e presidente da Assembleia Legislativa), o Padre Bianor Aranha e o Dr. Eurico Montenegro (juiz de direito de Acari). Logo se sucederam vários discursos.
Na sequência foi formado um grande corso de automóveis e todos seguiram para a residência de Cipriano Pereira de Araújo, onde foi oferecido um almoço aos presentes. No final do banquete Juvenal Lamartine levantou um brinde para Terezinha, filha do seu amigo Cipriano.
Após esse almoço o grupo seguiu para a sede da Presidência da Intendência, onde foi realizada uma cerimônia de incentivo ao sufrágio feminino no Rio Grande do Norte, que contou com a presença da cientista paulista Betha Maria Julia Lutz, ativista feminina, grande incentivadora do voto feminino. Sobre esse interessante evento eu comentarei em uma futura postagem do nosso TOK DE HISTÓRIA.
Entre os seridoenses que vieram testemunhar o fato estava Marta Maria de Medeiros, professora formada na Escola Doméstica de Natal e filha do fazendeiro Joaquim Paulino de Medeiros, conhecido por todos em sua região como Coronel Quincó da Ramada, e de Maria Florentina de Jesus. Marta vivia com os pais na Fazenda Rajada, que ficava próximo da grande e bela serra homônima e do povoado de Carnaúba, atual município de Carnaúba dos Dantas. A professora era uma admiradora do governador Lamartine, com quem sua família tinha ótimas relações. Marta havia seguido o chamamento do governador quando ele pediu que jovens senhoritas potiguares, que possuíam determinado nível de instrução, se inscrevessem para a concessão de títulos eleitorais, os primeiros da América do Sul. Ela se inscreveu oficialmente em Acari no dia 10 de dezembro de 1927, tornando-a a quarta eleitora do Rio Grande do Norte e a primeira da região do Seridó. Inclusive foi Marta Medeiros quem recebeu Bertha Lutz em Acari, conforme comentarei futuramente.
O autor dessas linhas, quando ainda era um simples estudante, teve o privilégio e a honra de ouvir Marta Maria de Medeiros, minha tia-avó, narrar a sua visão da inesquecível chegada desse avião em Acari.
Chegada em Caicó
Somente às três da tarde os tripulantes retornaram ao avião Breguet, em meio a muitos aplausos dos presentes, e partiram de Acari para Caicó,.
Após 30 minutos de voo a aeronave francesa sobrevoou Caicó e depois seu campo de pouso. A aterrissagem, segundo o jornal A República, foi dificultada pelas pequenas dimensões do campo de pouso, que teve a frente dos trabalhos de construção o Coronel Celso Dantas. Mas o pássaro de aço francês aterrissou em segurança. Segundo Antônio Luís de Medeiros, competente genealogista potiguar e membro do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, as dimensões desse antigo campo de pouso em Caicó eram reduzidas e ficava localizado próximo da estrada que segue para Jardim do Seridó, numa área conhecida como Baixa do Arroz, não muito longe da área onde se localiza atualmente o Açude Itans.
Após deixarem a aeronave, tal como em Acari, começaram os discursos e aplausos. Segundo A República o empresário caicoense Renato Dantas realizou um elogio a André Depecker, comentando que o francês havia realizado uma pilotagem competente, por uma região “nunca dantes navegada”.
Eles ficaram hospedados na casa de Celso Dantas e a noite todos participaram de um evento em homenagem ao governador e a ativista Betha Lutz, que chegou a Caicó de automóvel.
Segundo o jornal natalense A República (18/08/1928), no outro dia pela manhã o Breguet decolou e pousou novamente em Acari, onde esteve na Escola Tomaz de Araújo, onde foi recebido pela professora Iracema Lopes Brandão, que pronunciou um discurso. À tarde o Breguet retornou a Natal.