Por Rangel Alves
da Costa*
Comumente são
conhecidos quatro evangelhos bíblicos: Mateus, Marcos, Lucas e João. Existem
outros evangelhos que não constam do livro sagrado, eis que escritos
dispersamente e contendo doutrinas que vão além ou aquém da inspiração divina,
segundo o entendimento da igreja. Evangelhos são, pois, a descrição dos fatos,
palavras e ensinamentos de Jesus Cristo. Daí que nas liturgias o sacerdote
sempre faz a leitura de uma passagem do evangelho segundo Mateus, Marcos, Lucas
ou João.
Após a
proclamação do evangelho vem o instante da explicação daquela passagem bíblica,
ou homilia, e esta geralmente para sintetizar o amor de Deus sobre os homens.
Contudo, há outra passagem bíblica - e esta vagamente utilizada na primeira
leitura ou liturgia da palavra - que sintetiza toda a verdade sobre o amor, e
não somente a Deus como aos homens. Está contida no livro denominado Primeira
Epístola aos Coríntios, escrita pelo apóstolo Paulo, mais especificamente no
capítulo 13, onde se lê:
“Ainda que eu
falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse Amor, seria como o
metal que soa ou como o sino que tine. E ainda que tivesse o dom da profecia, e
conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé,
de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse Amor, nada seria. E
ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda
que entregasse o meu corpo para ser queimado, se não tivesse Amor, nada disso
me aproveitaria. O Amor é paciente, é benigno; o Amor não é invejoso, não trata
com leviandade, não se ensoberbece, não se porta com indecência, não busca os
seus interesses, não se irrita, não suspeita mal, não folga com a injustiça,
mas folga com a verdade. Tudo tolera, tudo crê, tudo espera e tudo suporta. O
Amor nunca falha. Havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas,
cessarão; havendo ciência, desaparecerá; porque, em parte conhecemos, e em
parte profetizamos; mas quando vier o que é perfeito, então o que é em parte
será aniquilado. Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino,
discorria como menino, mas, logo que cheguei a ser homem, acabei com as coisas
de menino. Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a
face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido.
Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três; mas o maior
destes é o Amor”.
Também a
magistral Legião Urbana, através de Renato Russo, transformou tal hino ao amor
na bela canção Monte Castelo, entremeada de versos camonianos: “Ainda que eu
falasse a língua dos homens e falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada
seria. É só o amor, é só o amor que conhece o que é verdade. O amor é bom, não
quer o mal, não sente inveja ou se envaidece. O amor é o fogo que arde sem se
ver, é ferida que dói e não se sente, é um contentamento descontente, é dor que
desatina sem doer. Ainda que eu falasse a língua dos homens e falasse a língua
dos anjos, sem amor eu nada seria...”.
Eis a epístola
como grandioso poema, e este dimensionado no amor, no mais puro e verdadeiro
amor. Não há que duvidar de sua importância como norteamento humano, não há
como não senti-lo senão como ensinamento aos que apenas sentem-no sem se
aprofundar na sua nobreza. No sentido prático da existência e das relações, simplesmente
mostrando que nada possui mais força que o amor, que o ato de amar, que a sua
conservação e semeadura. Na verdade, como bem citado por Paulo, sem amor nada
ganha vida ou significação.
É como
sentença cravada na pedra: sem amor, todos os poderes são apenas posses
inúteis, fragilizadas, algo como ter e nada ter, pela falta da essência maior
do sentimento pelo que se tem; sem amor, não há que se falar em dons, em
dádivas, em sabedorias, eis que o profeta maior é o próprio amor na sua
capacidade de antever a graça de amanhã, eis que o mistério maior é o próprio
amor, na sua habilidade de expressar pela ação todas as bondades do mundo e
todas as grandezas da alma. E ainda: sem amor, toda fortuna é pobreza, toda
sabedoria é mero conhecimento. Porque o amor é o que sustenta a fé, é o que
alimenta o ser das glórias do mundo.
O apóstolo
Paulo limita o amor entre o tudo e o nada. Mostra do que ele capaz dentro dos
corações humanos, mas também aponta o vazio pela sua ausência. E bem se poderia
dizer desse pássaro que livre e contente voa pelos horizontes azuis, dessa
fonte de água doce e cristalina que sacia a quem nele crê, dessa janela aberta
para as manhãs e os dias e em cujos horizontes o homem de bom coração não cansa
de se encontrar. Assim o amor lá no cume da montanha mais alta, onde os olhos
brilhosos em tudo avista a face de Deus.
Até no amor
carnal se avista este evangelho maior do sentimento, pois quando se deseja, se
deseja apenas como um simples querer, uma mera vontade, mas quando se ama, será
no amor sentido que repousará a alegria em compartilhar.
Poeta e
cronista
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