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quarta-feira, 5 de outubro de 2022

CHICO PEREIRA: ESTUDIOSOS PESQUISAM HISTÓRIA DO CANGACEIRO CHICO PEREIRA EM CURRAIS NOVOS

 Por William Felix de Andrade

Cangaceiro Chico Pereira

Trata-se do cangaceiro Chico Pereira, que se aliou a lampião para saquear a cidade de Sousa, na Paraíba e foi morto, em 1928, pela polícia potiguar na margem direita do riacho maniçoba, na zona rural de Currais Novos, onde familiares ergueram um memorial, que é um lugar de visitação de turistas e interessados no resgate histórico do fenômeno do cangaço. 

Vanderli Patrício e Epitácio Andrade no Fórum de Currais Novos/RN

Os estudiosos realizaram uma visita ao tabelião substituto do primeiro cartório de notas, senhor Wendel Javas e localizaram a certidão de óbito do cangaceiro. No dia 27 de agosto de 2014, os pesquisadores Vanderli da Silva Patrício e Epitácio Andrade iniciaram no município de Currais Novos, no Seridó oriental do Rio Grande do Norte, uma busca de dados e o reconhecimento de lugares de memória da história de um personagem ainda pouco conhecido na história do fenômeno do cangaço.
  
Estudiosos em visita ao tabelião Wendel Javas

No fórum da comarca de Currais Novos, os estudiosos do cangaço tiveram acesso ao processo judicial referente à morte de Chico Pereira. 

Lápide do memorial de Chico Pereira

O trabalho tem o objetivo de subsidiar a formulação de uma ação parlamentar do futuro deputado estadual Carlos Augusto Maia, que proporá uma audiência pública sobre a temática do cangaço e suas perspectivas para o desenvolvimento sustentável do Rio Grande do Norte.

Epitácio Andrade e Carlos Augusto Maia 
Epitácio Andrade e Wiliam Pinheiro

Com uma história repleta de fatos controversos, a pesquisa de Vanderli e Epitácio, que recebe o incentivo e a orientação do experiente pesquisador currais-novense William Pinheiro intenciona elucidá-los, como também produzir conhecimento histórico-científico sobre o personagem, que é o protagonista do livro ¨Vingança, não”, de F. Pereira da Nóbrega, e é prefaciado pela escritora cearense Raquel de Queiroz, além de rastrear os lugares de memória de Chico Pereira, espalhados pelo interior do Rio Grande do Norte, contribuindo com a caracterização do legado de Chico Pereira para o patrimônio histórico-cultural potiguar.

Capa do livro Vingança Não

Texto e fotos Epitácio de Andrade Filho, Médico Psiquiatra e Pesquisador Social.

http://sargentoandrade.blogspot.com.br/2014/08/chico-pereira-estudiosos-pesquisam.html

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O LIVRO DO FILHO DE CHICO PEREIRA

 Por Francisco Frassales Cartaxo


Primeiro, chegou o padre. Depois, pouco tempo depois, apareceu o livro “Vingança, não”. Muito antes, o povo do sertão já sabia quase tudo sobre o cangaceiro Chico Pereira. O trabalho, as brigas, o amor, as andanças, a aliança com Lampião, os malfeitos protagonizados por ele, a morte envolta em mistério e insinuada traição política. Cresci ouvindo minha mãe contar, em gotas homeopáticas, episódios cheios de violência, ternura e dúvidas que corriam na boca do povo.

Dona Isabel, minha mãe, cearense de Várzea Alegre, carregava no coração o sentimento despedaçado por lembranças de perseguição política, de injustiças, sua família escorraçada do Cariri pelas improvisadas milícias dos partidários do padre Cícero e Floro Bartolomeu. Terminou por esbarrar em Cajazeiras. Com apenas dez anos de idade, ela colara à poeira da fuga marcas fortes de vingança. Mais fortes do que a perda dos bens que seu pai, Zuza da Inácia, vendera a preço de ocasião, ao sair de São José de Lavras, contrariado, carregando no bolso um salvo-conduto assinado pelo patriarca do Juazeiro.

O cangaceiro Chico Pereira

Dona Isabel leu o livro “Vingança, não”, de Francisco Pereira Nóbrega, como quem repassa a vida, a lembrar do próprio pai, escondido nas matas, dormindo fora de casa com receio de ser preso, agredido ou morto em pleno desenrolar da “guerra entre Crato e Juazeiro”, em 1914. Parece até que agora revejo minha mãe deitada na rede, a claridade da manhã surpreendendo seus olhos pregados nas últimas páginas do livro-depoimento de padre Pereira. 

Relembro a cena, ocorrida há mais de 50 anos, ao reler o mesmo exemplar que as mãos de minha mãe viraram página por página (Livraria Freitas Bastos, 2ª edição, 1961), o coração acelerado, a memória avivada, a forte sensação de que os mortos estão vivos. Os mortos do padre Pereira. E os meus.

Primeiro, chegou o padre. Jovem, preparado, inteligente, fala mansa, ar de alheamento, a querer, quem sabe, decifrar no interlocutor a intenção de descobrir nele um gesto, uma ponta de fio que conduzisse à herança do pai cangaceiro. Padre Pereira chegou a Cajazeiras carregado de novidades. Formou a Juventude Estudantil Católica (JEC) e a Juventude Independente Católica (JIC). Não guardo lembrança da JOC. A JUC, certamente não, pois no meado do século vinte só havia ginásio e escola normal na minha cidade. Trouxe métodos de evangelização até então estranhos à Igreja local. Reuniões em sítios, debaixo de árvores, quebrando a distância entre orientador e orientado, abrindo debates francos, retirando de todos nós, jovens católicos, o ranço de que tudo é pecado. E labareda, fogo do inferno a queimar os pecadores. Padre Pereira mal falava no inferno...


O estigma de filho de cangaceiro ia se esvaindo, sob o manto e a suave presença de sua mãe, dona Jarda. A gente olhava para Jarda e enxergava Maria, a mãe de Jesus. Nem todos, porém, viam assim. Outros alimentavam receios de serem contestados. Algumas novidades introduzidas na prática religiosa pelo jovem sacerdote desagradaram aos poderosos. O prefeito de Cajazeiras, o médico Otacílio Jurema, por exemplo, ao ouvi-lo explicar, do púlpito, o porquê de um gesto considerado afrontoso aos donos do poder, teria dito: não ouvi o padre, ali falou o filho do cangaceiro. 

Primeiro, chegou o padre. Mobilizou a juventude e a sociedade em torno de um assunto tabu — o cabaré de Cajazeiras. Conto como foi. Jornal de João Pessoa publicou uma carta assinado por um desconhecido caixeiro-viajante, Duarte Resende, lamentando a presença do meretrício em local inadequado. Cajazeiras crescera e o cabaré permanecia, bem ali, atrás do cemitério Coração de Jesus, pertinho do Colégio Dom Moisés Coelho. Uma afronta às famílias da terra do padre Rolim. Antes de ser publicada a carta, já estávamos nós, os rapazes da JEC, de posse de sua reprodução em forma de panfleto para distribuir de casa em casa, numa operação, absolutamente, sigilosa. Exigência do padre Pereira para, entre outros objetivos, seduzir os meninos da JEC... Divididos em grupos de duas pessoas, cada dupla foi destacada para agir em um bairro, alta hora da noite, colocando o papel por baixo da porta ou da janela. Neném Moésia (Deus o guarde) e eu enfrentamos um imprevisto. Mal começada nossa tarefa - na atual Rua Engenheiro Carlos Pires de Sá -, alguém pensando que se tratava de ladrões, abriu a janela e meteu bala... Corremos sem olhar para trás... E sem cumprir a missão, claro, pois quem espera por tempo ruim é lajeiro... 

Chico Pereira

Corri até minha casa, o coração saindo pela boca, as pernas feito vara verde, garganta seca, voz entrecortada de angústia e medo. Meus pais, que estavam à minha espera na calçada, riram à beça. Vivi minha primeira experiência de ação clandestina. Uma luta inglória, talvez de pouco sentido social. Porém, isso não conta. Importa realçar a liderança do padre Pereira. Ele era assim, corajoso, inovador, carismático, ousado, cheio de novidades. E mistérios.

E o livro? Não deu tempo. Primeiro o padre, depois o livro.   

Esta crônica, publicada no jornal Gazeta do Alto Piranhas, Cajazeiras, nº 324, de 25/02 a 03/03/2005, foi revisada e ampliada para divulgação no www.cariricangaco.blospot.com.br

Francisco Frassales Cartaxo 
Recife, Pernambuco

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PAULO MEDEIROS GASTÃO, UM CANGACEIRO ACADÊMICO VESTIDO DE NORDESTINIDADE

 Por Coluna Perfil da revista Nordeste21, edição de Maio 2011.

Paulo Medeiros Gastão é uma dessas personalidades cujos pensar e fazer estão impregnados de nordestinidade. Tem um olhar poético todo voltado para a estética do povo e da terra do Nordeste brasileiro. Sua mente está em constante movimento, criando e maturando ideias para tornar cada vez maior e mais bela a nação nordestina. Nascido no dia 14 de novembro de 1938, na cidade de Triunfo da Baixa Verde, PE, região serrana das mais bonitas do Nordeste, na fronteira com o estado da Paraíba, Paulo Gastão é, em outras palavras, um homem vestido da sabedoria genuinamente sertaneja e nordestina. Homem de invulgar espírito empreendedor, desde cedo demonstrou especial atenção e zelo às coisas da história e cultura do Nordeste.

Ainda nos tempos de estudante destacou- se como um dos mais aplicados e inteligentes alunos, até encontrar uma de suas mais ardentes paixões: A história do Cangaço.

Paulo Gastão, com dedicação extrema e paciência beneditina, própria de pesquisadores da melhor estirpe, adentra a largueza do mundo habitado pelas personagens do cangaço, desvenda os mistérios do fenômeno do cangaceirismo no Nordeste e se notabiliza como um dos mais ativos e determinados pesquisadores do Brasil sobre essa seara onde os eventos tempestuosos são protagonizados por homens e mulheres rudes. Ao enveredar pela temática do Cangaço, inexoravelmente, Gastão acabou deparando- se e se apaixonando por outras temáticas intrinsecamente interligadas, por exemplo: o messianismo, beatos e coronelismo etc.

Daí, mergulhado nesse caudalosorio, Gastão nadou a curtas braçadas na investigação de vidas extraordinárias como as de Antônio Conselheiro, Delmiro Gouveia e o Beato Zé Lourenço, tornando- se também um profundo pesquisador sobre Canudos, Pau de Colher e Caldeirão da Santa Cruz. Detentor de uma cultura vasta e plural, intelectual de bom calibre, Paulo Gastão foi o idealizador e primeiro presidente da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço – SBEC, entidade que reúne pesquisadores de todo o território nacional e que tem sua sede na cidade potiguar de Mossoró.

Também foi membro fundador da Fundação Vingt- un Rosado, de reconhecido trabalho em prol da perpetuação da memória e cultura nordestina, bem como da Academia Mossoroense de Letras. É sócio do Instituto Cultural do Oeste Potiguar (ICOP), ex- professor da Universidade Regional do Rio Grande do Norte e da Escola de Agricultura de Mossoró (RN). Paulo Gastão, respeitado e admirado por quantos têm o prazer de conhecê- lo, ouvir suas conferências e sábias intervenções, tem participado, com assiduidade, fóruns acadêmicos e populares em todo o Brasil, de seminários, congressos e encontros sobre cinema e cangaço, sobre o Nordeste e seu universo. Entre os livros por ele escritos destacam- se “Viagem a Triunfo da Baixa Verde” – 2a edição (1995); e “Contribuição a uma bibliografia
do cangaço” – 1845/1996 (1996).

"Homem de invulgar espírito empreendedor, desde cedo demonstrou especial atenção e zelo às coisas da história e cultura do Nordeste".

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NO MEIO DO TEMPO

 Clerisvaldo B. Chagas, 5 de setembro de 2022

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.779

Ainda no início de outubro, os dias atingem temperaturas com mais de 30 e amenizam às noites com diferença de até 10 graus. Noites estas que os profissionais do Clima chamam de noites frescas e, nós os sertanejos friorentos, as denominamos de frieza. Estamos nos referindo ao solo sertanejo quando observamos o fenômeno citado, na primavera. De qualquer maneira o nosso sertão alagoano bem chovido, continua engordando o gado nas pastagens naturais e matando a sede com seus reservatórios preparados com antecedência: barreiros, barragens, lagoas e açudes. Por falar nisso, não existe diferença entre barragem e açude, mas quando o sertanejo fala em açude, parece se referir a um volume muito maior de água em relação às barragens da área.

CANDIDATOS ALAGOAS SEGUNDO TURNO. (FOTOS: DIVULGAÇÃO).

Com água e pasto à vontade, vamos caminhando para a Festa de São Cristóvão, um dos maiores eventos católicos do nosso semiárido. Acontecimento de muita fé e euforia na população em geral e que torna o Bairro Camoxinga, em Santana do Ipanema, no foco polarizador do momento. É lá onde estar situada a Paróquia acima com o seu padroeiro de fé dos motoristas e condutores. É verdade, porém, que a política mexeu um pouco com o sertão, mas logos passará essa festa democrática.  Entretanto, apesar dos bons tempos da Natureza, a dona-de-casa continua reclamando com razão, os preços absurdos das feiras livres e do Comércio em geral. Talvez a alegria de festas próximas, vá quebrando o impacto dos preços da gangorra de um lado só.

Por outro lado, a agitação política pareceu sentar na moda de governadores do interior, coisa raríssima de acontecer antigamente. O estado parte, então para o segundo turno entre candidatos, um do Agreste e outro do Sertão. Sai o de Murici (zona da Mata) e entra um de Batalha (Bacia Leiteira) ou de Arapiraca (terra do fumo). Isso é a força do desenvolvimento também no interior que fortalece novas lideranças políticas para demonstrar que a inteligência para este segmento não está restrita à capital. Será a vez definitiva do interior? Só o futuro dirá, porém, a ansiedade da população é por um ótimo administrador geral no estado, não importa a região das suas origens. Aguardemos o desenrolar do mês que já causou muitas surpresas até agora, boas para uns, péssimas para outros, mas outubro continua outubro sem tirar e nem por.

http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2022/10/nomeio-do-tempo-clerisvaldob.html

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PADRE CÍCERO...

 Acervo do Beto Rueda.

Padre Cícero entre amigos e a beata Mocinha, a última em pé, à direita.

Fonte:
PERINI, João Carlos. Padre Cícero e Lampião. Juazeiro do Norte. Nobre, 2004.

https://www.facebook.com/photo/?fbid=5932717253405756&set=gm.3265561727066664&idorvanity=1995309800758536

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A VIDA DO CANGACEIRO BARRA NOVA

 Por Aderbal Nogueira

Vídeo na íntegra sobre a vida do cangaceiro Barra Nova, narrado por seu filho José Maurício. Esse vídeo já havia sido postado em 4 partes. Acervo João de Sousa Lima Seja membro deste canal e ganhe benefícios: 

https://www.youtube.com/channel/UCG8-... Link desse 

vídeo: https://youtu.be/6hZnau60hcw

https://www.youtube.com/watch?v=6hZnau60hcw&ab_channel=AderbalNogueira-Canga%C3%A7o

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CANUDOS E PAU DE COLHER - O Sertão e a Força do Messianismo

 Por Cariri Cangaço

https://www.youtube.com/watch?v=i8-auqET7NU&ab_channel=CaririCanga%C3%A7o

O Cariri Cangaço é um evento de cunho turístico-cultural e histórico-científico que reúne alguns dos mais destacados pesquisadores e historiadores das temáticas; cangaço, coronelismo, misticismo, messianismo e correlatos ao sertão e ao nordeste, do Brasil, configurando-se em seu décimo ano de realização, como um dos maiores e mais respeitados eventos do gênero no país. 

Nosso desejo é trazer até você um pouco desse conjunto do "Universo Cariri Cangaço"; os principais temas discutidos, os cenários onde tudo aconteceu, as cidades protagonistas desta saga, os personagens marcantes e tudo o mais que fazem da memória e da história de nosso sertão nordestino um capítulo todo especial. Dessa forma o Canal do YouTube do Cariri Cangaço se une às nossas plataformas digitais: Blog, Facebook e Instagram, num grande movimento de fortalecimento de nossa história, cultura e tradições.

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1938 20 DE JANEIRO COMUNIDADE DE PAU DE COLHER É EXTERMINADA

Em pé: João Baraúna, um dos líderes, preso na Serra de Monte Alegre em companhia de José Camillo. No alto, os principais dirigentes do movimento de Pau de Colher, José Camillo, José da Clara e Theodoro. Abaixo, grupo de camponeses. "O Estado da Bahia", 17 de fevereiro de 1938

Polícia de três Estados e Exército massacram povoado religioso no sertão baiano

O povoado baiano de Pau de Colher, na fronteira com Pernambuco e Piauí, é dizimado por forças policiais dos três Estados. O ataque à localidade, pertencente ao município de Casa Nova, teve apoio do Exército.

A comunidade era formada por sertanejos pobres, seguidores do padre Cícero e de outros místicos que percorriam a região. Acusados de serem fanáticos religiosos violentos e comunistas, os lavradores viviam num rígido regime determinado por beatos, entre os quais José Senhorinho e Joaquim Bezerra — o “Quinzeiro”. Não bebiam nem fumavam, não comiam carne nem gordura, passavam o dia rezando pela salvação de suas almas, usavam luto pela morte do padre Cícero e tratavam uns aos outros como irmãos. Os homens do grupo eram conhecidos como caceteiros, pois portavam um porrete com uma cruz.

A origem de Pau de Colher remonta à fartura da comunidade do Caldeirão de Santa Cruz do Deserto, no Ceará, massacrada em maio de 1937. A fama do lugar onde os sertanejos viveriam num sistema de mutirão, dividindo o que produziam de acordo com a necessidade da cada um, corria pelo semiárido nordestino e incomodava os poderosos da região. Pau de Colher foi o ponto de aglutinação de todos aqueles que moravam próximos daquela tríplice fronteira e sonhavam em se mudar para Caldeirão de Santa Cruz.

A notícia de que o Caldeirão fora exterminado por policiais e jagunços, com o apoio de aviões do exército, acabou com o sonho da vida farta e levou os moradores a se preparar para o que achavam ser o fim das eras. A situação em Pau de Colher se deteriorou. Há relatos de mortes entre os que tentaram deixar a comunidade.

As elites rurais nordestinas ficaram alarmadas com o que acontecera no Caldeirão e não deixariam florescer no Nordeste mais uma comunidade que afrontasse o poder dos latifundiários e da igreja católica.

O discurso anticomunista divulgado pelos rádios e jornais para dar sustentação ao Estado Novo deu-lhes uma nova arma. O jornal “Diario de Pernambuco” chegou a citar o nome do “extremista Sodré Viana”, que viveria na comunidade. Já o jornal “A Noite”, do Rio de Janeiro, mencionou a presença de um jornalista carioca e do médico Demóstenes Guanais.

Relatos de ataques dos caceteiros circularam pela região, dando força à versão de que ali vivia não uma comunidade religiosa, mas um bando de mais de 800 cangaceiros se preparando para atacar as cidades vizinhas, destruir os poderes constituídos e implantar o comunismo.

O “fim das eras” começou com a chegada da polícia militar baiana, apoiada por jagunços a serviço dos coronéis, em 10 de janeiro. Os caceteiros reagiram, e houve mortes dos dois lados. Em seguida, foi a vez da polícia piauiense, também rechaçada pelos caceteiros.

Mas a guerra havia apenas começado. O tenente-coronel Maynard, comandante das forças em operação no Vale do São Francisco, deslocou para o local batalhões do exército locados em Aracaju e Salvador. O coronel Dantas, interventor baiano, mandou um esquadrão motorizado e uma companhia de fuzileiros. Do Piauí, seguiu um novo grupo de policiais militares. Pernambuco enviou 90 homens, liderados pelo capitão Optato Gueiros, temível comandante das forças volantes de combate ao cangaço.

Armados de metralhadoras, os policiais pernambucanos abriram fogo, matando centenas de homens, mulheres e crianças. Depois de 42 horas de batalha, os sobreviventes foram caçados como animais e degolados. Há relatos de mais de 400 mortos. Outros foram presos. Os pais perderam o direito pátrio sobre os filhos, que foram entregues como escravos a famílias da região e da capital baiana.

Encerrados os combates, as forças pernambucanas foram saudadas pela população de Casa Nova, por terem comandado a destruição de Pau de Colher. O prefeito do município chegou a oferecer um banquete em homenagem ao líder das tropas, na sede da prefeitura.

Segundo o “Diário de Pernambuco”, um avião de bombardeio do Exército com duas metralhadoras partiu em 24 de janeiro para a região, com o intuito de “cooperar na perseguição dos fanáticos”. Nele, seguiu o capitão Cordeiro Neto, secretário de segurança do Ceará. Na volta a Fortaleza, ele declarou à imprensa que tinha ido “verificar a guerra das fronteiras cearenses contra as incursões de fanáticos” e que “o reduto Pau de Colher” era constituído de elementos heterogêneos e fomentadores de perturbações sociais, que se tinham imiscuído entre os sertanejos a fim de produzir discórdias”.

No dia 29, Getúlio enviaria um telegrama ao interventor Dantas, felicitando-o pelo extermínio de Pau de Colher.

No sertão, restaria a história de duas comunidades lideradas por fanáticos e, segundo os boatos, organizadas pelo Partido Comunista. A seca, o latifúndio, os coronéis e seus jagunços continuariam dando as ordens na região. 

 http://memorialdademocracia.com.br/card/mais-uma-comunidade-e-massacrada-no-sertao-nordestino

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MEMÓRIA - "RAIZ E SEMENTE DA HISTÓRIA": MASSACRE DE PAU DE COLHER COMPLETA 80 ANOS

 Juliana Magalhães - Brasil de Fato | Petrolina (PE) |

Povoado montado com bases comunitárias e religiosas tinha muitas semelhanças com Canudos e Caldeirão

Sempre no mês de dezembro, uma romaria relembra o massacre que aconteceu na década de 30 - Thomas Bauer

Na sombra lateral de sua casa, em meio ao sertão nordestino, Seu Militão Rodrigues da Silva pega a bengala improvisada e desenha um círculo no chão de terra. Ao lado da esfera, sinaliza com algumas batidas que ali era o local onde estava a metralhadora, amarrada a uma árvore e apontada para o acampamento. O episódio ao qual se refere, com memórias tão vivas, mesmo próximo de completar 90 anos de idade, é o massacre de cerca de mil pessoas da comunidade de Pau de Colher, ocorrido em janeiro de 1938.

Sobrevivente, Seu Militão é testemunha de um capítulo de horror da história brasileira, marcado pela violência brutal do Estado, na época sob a Ditadura Vargas, e que até hoje reverbera em traumas e preconceitos.

Há 80 anos, o arraial, localizado a 98 km da sede do município Casa Nova (BA), na divisa com os estados de Piauí e Pernambuco, chegou a reunir aproximadamente quatro mil pessoas, população maior do que a própria sede do município e cidades vizinhas, a exemplo de Petrolina (PE) e Remanso (BA). No local, debaixo de um frondoso pé de juazeiro existia uma feira e importante ponto de encontro, bastante movimentado, mas os motivos dessa grande aglomeração foram religiosos e sociais.

A comunidade se tornou uma espécie de extensão de Caldeirão, comunidade cearense liderada pelo beato Zé Lourenço. O escritor piauiense Marcos Damasceno, autor do livro “Guerra de Pau de Colher: Massacre à sombra da ditadura Vargas”, explica que, no início, a ideia era que Pau de Colher fosse um local que selecionasse as pessoas que iriam para Caldeirão, mas, com a destruição deste em 1936, as pessoas permaneceram e os sobreviventes que seguiam Zé Lourenço se juntaram a eles.

“Então Pau de Colher se formou como uma terra sagrada, como uma terra prometida. E daqui as pessoas iam buscar alcançar as coisas do céu porque aqui faltava tudo”, comenta o escritor.  Era uma época em que imperava a injustiça social, desigualdades e opressões, marcada sobretudo pelo coronelismo. A região era esquecida pelo Estado e grande parte da população vivia em situação de extrema pobreza. A escolha de seguir o José Senhorinho, líder religioso de Pau de Colher, representava uma luta por melhores condições de vida. Pau de Colher foi um movimento camponês religioso, mas também social e político.

“Igual a melancia na pedra”

Em 1934, as pessoas começaram a chegar ao local, primeiro para participar das rezas com o Senhorinho, depois, para morar. Em 1937, o arraial atingiu sua maior população. Foi um “dilúvio de gente”, lembra Dona Helena Nogueira, sobrevivente da guerra. Homens, mulheres e crianças viviam em “latadas”, uma espécie de barraca feita com palha e varas, e faziam refeições coletivas. Comia “tudo na mão, não era colher não”, conta Seu Militão ao falar da alimentação no acampamento, que, segundo ele, era “um feijão véio mal cozinhado, sem tempero”.

Nem toda a população da vizinhança quis integrar o movimento religioso, o que gerou disputas, motivadas, principalmente, de acordo com Damasceno, pela postura do Joaquim Bezerra. O Quinzeiro, como era conhecido, assumiu a liderança de Pau de Colher após a morte do Senhorinho. Para o escritor, a história do movimento pode ser dividida em dois momentos, uma sob a liderança de Senhorinho, marcada pela vida em comunhão, partilha e rituais religiosos; e outro com o Quinzeiro, época de violência e brigas entre os que estavam dentro e fora do arraial. Essa distinção também é relatada em depoimentos dos moradores do local.

Para além das disputas internas, a multidão em Pau de Colher incomodou as forças políticas regionais. O período era de Ditadura Vargas, perseguição ao cangaço, e movimentos semelhantes como o próprio Caldeirão e Canudos haviam sido dizimados.
Quatro volantes policiais foram a Pau de Colher. A primeira, de São Raimundo Nonato (PI); a segunda, de Casa Nova, que matou o Senhorinho; a terceira, do Pernambuco, comanda pelo capitão Optato Gueiros e responsável pelo massacre da comunidade; e a última, do estado Piauí.

O ataque da polícia de Pernambuco ocorreu entre os dias 19 e 21 de janeiro de 1938. A população reagiu, lutou contra a força policial com as armas que tinham (cacetes feito de árvores), alguns conseguiram se esconder e fugir, mas a maioria não sobreviveu. Mais de 400 pessoas estão enterradas em uma sepultura coletiva localizada onde funcionava o acampamento. Estima-se que cerca de mil tenham morrido no massacre, atingidos pelas armas e também de fome e sede na caatinga.


“Diz minha mãe que ficou lá o campo igual melancia na pedra”, relata o lavrador Francisco do Nascimento, nascido em Pau de Colher. Ele conta que sua mãe, Dona Ângela, 92, sobrinha do Senhorinho, enquanto fugia do ataque policial com a família, viu sua irmã mais nova morrer em seus braços com um tiro na cabeça. A brutalidade da ofensiva policial foi tamanha, que Dona Gildete Justiniano, nascida no ano do massacre, e que perdeu avó e tios na guerra, diz que “até tem hora que pensa que [a guerra] é um sonho”.

Para o lavrador Gregório Manoel Rodrigues, 73, nascido na comunidade, “eles morreram tudo de injusto. A polícia não era pra ter matado aquele povo. Era pra ter pegado e ver o que eles queriam”.

Invisibilidade da luta popular

Quem chega na comunidade formada por cerca de 40 famílias, se depara com aqueles que têm orgulho de dizer que são “raiz e semente da história” e outros que evitam ao máximo tocar no assunto. A história da luta do povo por dignidade e pela sobrevivência diante da negação e violência do Estado foi ocultada. Prevaleceu a versão de um povo sem propósito, violento e fanático.

“Ainda hoje tem gente que tem preconceito com isso aqui, tem umas pessoas que não quer nem que falem das pessoas daquele tempo”, comenta Gregório Manoel. Por muito tempo as pessoas utilizavam o nome da comunidade no sentido pejorativo, para adjetivar negativamente outras situações. “Lá vai virar um Pau de Colher”, conta Francisco do Nascimento. “Usavam o nome daqui pra poder chocar os outros”, complementa.

O historiador e professor da Universidade de Pernambuco (UPE) Moisés de Almeida afirma que em quase todos os eventos em que ocorrem massacres há a tentativa de apagamento, de esquecimento da memória. Almeida desenvolve pesquisa sobre a narrativa dos jornais de Pernambuco sobre os movimentos sociais, entre os anos de 1896 a 1938. Segundo o historiador, a imprensa do período trata as lutas de Pau de Colher, Canudos e Caldeirão como atentados ao regime.

Para a imprensa “é uma população que se rebela contra o governo, contra o Estado e o Estado precisa neste caso agir, agir fortemente contra a população”, destaca o professor que acrescenta que “a imprensa, inclusive, vai dizer que para fera não existe outra solução que não a bala ou a faca”.

Resgate da memória

Após 80 anos da Guerra do Pau de Colher ainda encontramos objetos da época no local do acampamento, a exemplo de balas. Não existe museu ou memorial na comunidade. A memória e a história são preservadas pelos próprios moradores, que são os responsáveis por capinar o acampamento, manter conservadas as sepulturas e guardar os objeto antigos.

À espera da construção de um museu, a família do Seu Gregório guarda como se fosse um tesouro as balas, talheres, pedaços de vidro, moedas e cachimbos encontrados. “O poder público acabou, matou o povo, eles tinham o direito de construir e entregar propovo”, afirma Gregório ao falar sobre o desejo da construção de uma estrutura física.

O Estado, que despreza a história, continua a negar o local, mas a população permanece resistindo. Desde 2003, a comunidade realiza, todos os anos, uma romaria. “É de muita importância, porque se não o lugar tava acabado. Todo mundo fala na romaria, se não tivesse a romaria ninguém falava”, diz Gregório.

Realizada junto com a Paróquia São José Operário e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Romaria de Pau de Colher acontece sempre dezembro, no dia de Santa Luzia. “Até o ano de 2003 o pessoal tinha um trauma daqui, mas agora o pessoal tá atentando pravalorizar a história do Pau de Colher”, aponta Francisco. É também a partir desse período que tecnologias sociais chegaram, a exemplo das cisternas de captação de água de chuva para consumo humano e produção, e algumas instituições passaram a atuar na comunidade, possibilitando melhores condições de vida para população.

Entre os moradores do município de Casa Nova é comum encontrar pessoas que desconhecem a história de Pau de Colher ou que a associam apenas a uma visão negativa da comunidade. Com o objetivo de mostrar uma nova visão do movimento religioso e social, uma turma de estudantes do Colégio Antônio Honorato desenvolveu um projeto sobre a história local. Eles realizaram uma pesquisa com a comunidade escolar e descobriram que apenas 4% dos estudantes, professores e servidores do Colégio tinham conhecimento sobre a Guerra de Pau de Colher.

A partir desse dado, os estudantes foram até a comunidade, conversaram com os moradores e produziram uma série de materiais, como um álbum de fotografias, perfis de redes sociais online e um documentário. “Foi muito importante para trazer a história de Pau de Colher para que se torne patrimônio da escola, para ela ser mais conhecida, porque é uma história muito desconhecida e tem sua versão muito distorcida pela população casa-novense”, avalia a estudante do 1º ano do ensino médio Jailane Braga.

Para Átila Ramon Gomes, também estudante e integrante do projeto, os materiais que eles produziram “estão sendo usados como meio para contar uma nova versão da história e mostrar realmente como que aconteceu, que não foi só o que eles pensam, mas que tem um outro lado da história”.

*Produzido pela Comissão Pastoral da Terra

Edição: Vanessa Gonzaga - 57

https://www.brasildefatope.com.br/2018/12/27/raiz-e-semente-da-historia-massacre-de-pau-de-colher-completa-80-anos

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