Por Kiko Monteiro
Este cearense é atualmente o maior videomaker do cangaço. Frutos da sua produtora a Laser Vídeo seus inúmeros documentários se espalharam pelo mundo afora e são itens indispensáveis na coleções de nós cangaceirólogos.
E parece ainda há muita coisa por vir visse? É o que ele promete na entrevista que nos concedeu na ocasião do ultimo dia do Cariri Cangaço e que veremos a seguir.A sua introdução no cangaço é semelhante à de muitos. Desde os tempos de menino. O avô era da RVC - rede de viação cearense; sempre lhe contava histórias sobre Lampião. Ele inclusive foi testemunha ocular do episódio ocorrido com o Cel. Isaías Arruda, em Aurora no Ceará.
Na infância adorava filmes de bang-bang e não imaginava aquelas histórias de tiroteios acontecendo ali na sua terra... Quando soube de Lampião... "O Faroeste Brazuca" Já viu né? Nunca mais deixou o tema.
Lia tudo que encontrava. Começou a viajar e gravar entrevistas apartir de 1984 e em 1997 conheceu aquele que viria à ser o seu grande parceiro de viagens... o estimado Paulo Gastão.
Messier Paulo e Aderbal, durante o Cariri Cangaço 2010. |
Á esquerda Dezinho Magalhães, Aderbal (com um punhal que foi do cangaceiro Sabino) e o chanceler Paulo na residência do colecionador em Serra Talhada, PE.
Estes dois cavalheiros juntos já fizeram incontáveis viagens em busca dos mais diversos depoimentos. Só para se ter uma ideia, a primeira vez que realizaram rumo à Angico foi em 1996 e, de lá pra cá, só para àquela região somam umas quarenta incursões, no mínimo. E de tudo que é jeito visse? Sozinho, com o grupo da SBEC, com jipeiros, com colegas que fazem trilha a pé, com grupo de ciclistas de Fortaleza, de caiaque, desceram desde a Cachoeira de Paulo Afonso até a forquilha do começo da trilha de Angico, na beira do Rio São Francisco remando com oito companheiros de Fortaleza. Levaram dois dias para ir de Paulo Afonso até a Grota.
Duvidam? Mai rapaz o "homi" é atleta! E é evidente que ele prova todas essas façanhas em vídeo.
Equipe da Laser Vídeo em Angico, 1996. |
Sila e Candeeiro na Missa do Cangaço em Angico |
Gravando com Sila em Angico. |
No Raso da Catarina, em 1997, entrevistou entre os índios Pankararés pessoas que eram amigas de cangaceiros; inclusive, encontrou entre estes um parente do cangaceiro Gato, oriundo desta tribo.
"Foi interessante porque no começo da entrevista um senhor que estava sentado e era cego, ouvindo a história, começou a chorar. Foi quando sua esposa disse: - Ele é primo de Gato. Essas entrevistas ainda hoje não foram usadas".
Vislumbrando o Raso da Catarina. |
Na tribo com os curumins Pankararés |
Então, apresente suas crias!
- Nós temos em torno de sete documentários acerca do cangaço.
1 - FATOS; 2 - S I L A – Esse vídeo também apresenta uma entrevista com a ex cangaceira ADÍLIA companheira de Canário; 3 - A VIOLÊNCIA OFICIALIZADA NO TEMPO DO CANGAÇO; 4- CANDEEIRO depoimento do ex-cangaceiro Manuel Dantas Loiola; 5- MENTIRAS E MISTÉRIOS DE ANGICO e a série de dvd´s do 6 - CARIRI CANGAÇO 2009. E mais um trabalho ainda inédito “VINTE E CINCO, UM CANGACEIRO DE LAMPIÃO”. Nos comprometemos com o mesmo a apresentá-lo somente após sua partida, espero que tão cedo eu não realize este lançamento.
E o livro?
Qual é o primeiro título recomendado para um calouro?
Qual destes contatos foi, ou foram, os mais difíceis?
Isso foi gravado há vários anos, mas ainda não a utilizei em nenhum trabalho. Em um futuro próximo espero, assim como inúmeras entrevistas que temos e nunca sequer assisti, pois o material é muito vasto e só produzimos esses vídeos quando nos sobra um tempinho na produtora para edição etc; e para quem trabalha em produção de documentários empresariais sabe que tempo é coisa rara.
Já teve que pagar para obter alguma entrevista?
- Nunca, pelo contrario, eu que sai recompensado com uma amizade sincera de todos esses personagens, por exemplo, o Candeeiro, reservado caseiro, não se ausenta de casa passou uma semana hospedado em nossa casa em Fortaleza. A Eliza filha dele ficou admirada com o pedido do velho que gostaria que eu fosse pegá-lo em Buíque/PE e eu fui prontamente.
Qual o contato que não foi possível e lhe deixou de certo modo frustrado?
- Foi com o velho Antônio da Piçarra. Pra se ter uma ideia da ironia do destino eu viajaria num sábado com este intuito e ele vem há falecer dois dias antes.
Com quem gostaria de ter conversado?
E filmado?
- Se eu pudesse estar presente, gostaria de ter registrado a invasão de Mossoró. Evidente que a resistência de Mossoró não é única, mas pense bem no pandemônio que foi em uma cidade daquele porte em total alvoroço com a chegada dos cangaceiros? Tiveram outras, como a pequenina Nazaré do Pico em Floresta, PE. Mesmo assim, eu imagino os fatos de Mossoró lendo o diário do Antônio Gurgel. Suas linhas nos relatam aquele final de tarde, chuva fina, o sino a repicar, a correria das pessoas, muitas embarcando no trem para se refugiar no litoral e a cidade fica praticamente deserta... Enfim, o restante da história quem pesquisa já sabe. Por isso eu, evidentemente, gostaria de estar presente.
Eu viajava em companhia de Sila (ex-cangaceira, companheira de Zé Sereno) pelo interior da Bahia, cinco e meia da tarde, o sol se pondo, a seca predominava na paisagem, não pude deixar de perceber que ela estava chorando... (Pausa na entrevista - Aderbal viaja em pensamento e as lágrimas correm no seu rosto)
- Aderbal, essa é a hora mais triste da minha vida... Porque no mato eu começava a pensar: Meu Deus, onde eu ia dormir? Pensava se estaria viva ao amanhecer, se voltaria a ver meu pai, minha mãe e meus irmãos novamente. E nem ao menos se eu voltaria a comer arroz e feijão algum dia na minha vida.
Fico triste quando vejo algumas pessoas falarem tão mal de Sila. Pessoas que privaram de sua amizade e souberam utilizá-la. Mas que depois agiram de uma forma injusta. Não entendo... Tudo bem, se ela falou o que era mais conveniente para ela, – coisa que muitos outros ex cangaceiros fizeram, pra não dizer quase todos (tenha certeza disso) – Porém nós, como pesquisadores, é que temos que filtrar e colocar só o mais plausível.Eu, particularmente, só tenho a agradecer a todos com quem estive, pois todos me receberam muito bem e me ajudaram na hora em que precisei, então seria uma grande desfeita de minha parte hoje desdenhar de algum destes.
As meninas Sila e Adília depõem para o documentário |
- Conhecendo alguns cangaceiros como eu tive a oportunidade eu elejo o Candeeiro! Principalmente pela irreverência.
Uma personagem secundária?
Eu cito inclusive outro o soldado Bertoldo que também se declarou o samurai de Angico.
- Eis aí mais um mistério!
Geralmente todo pesquisador é colecionador qual é o foco de sua coleção?
- Sou contra as coleções de relíquias tipo: tijolo, telha pedaço de madeira da casa de Lampião ou de qualquer outra personagem. Nêgo visita e resolve levar um souvenir diferente ai outros agem da mesma forma e amanhã? Minha neta e a de vocês não vai ver nada disso porque da história não vai restar nem os cacos. Enquanto outros estão guardando tudo em suas casas para o seu bel prazer, sem um mínimo de utilidade, é o que vai acontecer, quando estes se forem? A família que não vê qualquer importância vai jogar aqueles "cacarecos" no mato, e aí?... Não me levem a mal, é apenas o meu insignificante pensamento.
Portanto só coleciono imagens e vozes dos remanescentes e testemunhas desta história.
junto com Luiz de Cazuza.
Nós que gostaríamos de ver um filme que retratasse um cangaço autêntico, fiel aos fatos, sem licença poética, erro primário enfim sem exagero da ficção lamentamos a eterna necessidade de se ter finalmente uma produção digna da saga, de preferência um épico ou uma trilogia, enquanto isto não foi possível qual a película mais lhe agradou?
Eleja a pérola mais absurda que já leu sobre Lampião?
Diante de tantas polêmicas surgidas posteriormente a tragédia em Angico alguma chegou a fazer sentido, levando-o a dar atenção especial ex.: “Ezequiel não morreu e reaparece anos mais tarde”, “João Peitudo, filho de Lampião”, “O Lampião de Buritis” e “a paternidade de Ananias”?
Pois bem, Estávamos eu (Luiz de Cazuza), Lampião, você e mais um cangaceiro (cujo nome seu Luiz não recorda) Tu lembras?
- Lembro sim!
- Quando vocês retornavam de Mossoró não foi?
- isso mesmo!
- Você há de lembrar que Lampião pede que eu vá buscar umas alpercatas que ele tinha encomendado... Pois bem, qual foi a reação daquele cangaceiro ao receber as alpercatas?
E na lata o suposto Ezequiel responde:
- Ele calçou e saiu pulando por cima de umas rochas gritando olha os macacos! Olha os macacos!
- Aderbal foi daquele jeito mesmo.
Não posso concordar com a calmaria de Angico! Eu explico: Conheço muitos dos cenários visitados por Lampião, já cruzei a pé o Raso da Catarina. Sabe, eu gosto de sentir a atmosfera dos locais, então imagine a situação... Madrugada em Angico a aproximação de uma tropa de 40 e tantos soldados em sua maioria embriagados na escuridão para ninguém quebrar um galho, ninguém pisar numa pedra em falso... enfim ninguém produzir qualquer barulho que denotasse suas presenças? Acho improvável!
Em que assunto ou personagem está trabalhando ou qual gostaria de estudar para a publicação desta pesquisa. Enfim qual a próxima novidade que teremos em nossas estantes?
- Meu próximo trabalho não é um vídeo, mas um livro. Um trabalho que tem como foco as minúcias do cangaço. Relatos que nunca foram escritos. Posso até antecipar um trecho: Gravando um depoimento do Sr. Chiquinho Rodrigues sobre o dia do ataque do cangaceiro Gato a Piranhas, na tentativa de libertar Inacinha, aquele tiroteio terrível, em certo momento ele diz: “– Olhe, foi a primeira vez que vi um homem sem chapéu!” Se não me engano, ele se refere ao Juiz da cidade que passa correndo por ele sem o chapéu. Avalie a importância que o chapéu tinha para o sertanejo? Ouvi relato também do Ten. Pompeu Aristides de Moura justamente sobre o uso do chapéu.
E além destes, são mais três relatos falando sobre este detalhe próprio da nossa gente. São assuntos deste tipo que vou colocar em folha.
do cangaceiro Virgínio, cunhado de Lampião.