Maria Bonita havia se separado do
marido Zé Neném e voltado a morar com os pais na Malhada da Caiçara, na zona
rural de Paulo Afonso, na Bahia. Ali, ouvia a todo instante histórias sobre um
tal de Rei do Cangaço. Era uma figura fascinante para ela. Pessoas da
família relataram que, desde cedo, a jovem nutria um sentimento forte por
Lampião.
Não tardou para que os dois se
encontrassem. Um tio de Maria, Odilon Café, coiteiro de Lampião, levou o
“capitão” até a casa simples da família dela, conta o historiador João de Souza
Lima, de Paulo Afonso. “Foi assim que eles se conheceram. E parece que Lampião
gostou dela logo de cara”, diz. João confirma que já havia um certo
encantamento de Maria pelas histórias de Lampião. Era como se já houvesse, por
parte dela, um encantamento antes dos dois se conhecerem.
“Lampião perguntou se Maria sabia
bordar. Como ela disse que sim, ele deixou com ela lenços para que fossem
bordados. Garantiu que voltaria em 15 dias. Só retornou em 30 dias”, detalha o
historiador. Ele fala ainda que foi a partir do momento que Lampião voltou e
pegou os lenços que os dois iniciaram a paquera.
“Dizem que a mãe dela até
intermediou o romance. O pai não queria, tanto que chegou a mandar um primo
levá-la pro outro lado do rio, pra casa de um familiar. Mas Lampião deu um
aperto e o pai mandou buscar a filha de volta”, revela o historiador.
O chamego durou cerca de um ano.
Foi então que Maria, agora Maria Bonita, tomou uma decisão. “Ela colocou a
roupa em dois bornais e seguiu com Lampião para o cangaço”, explica a
pesquisadora Semira Adler Vainsencher. Na época, a jovem tinha entre 18 e 19
anos. “Ela entrou nessa vida por um grande amor”, diz Vera Ferreira, neta de
Maria Bonita e Lampião.
O amor era recíproco, garantem
pessoas que conviveram com o casal. “Tanto que meu avô aceitou que minha avó
entrasse no cangaço. Até então só havia homens nos bandos. Ela foi a primeira
cangaceira”, diz, orgulhosa, Vera. Assista neste vídeo como era a relação de
amor e também de brigas entre Maria Bonita e Lampião.
O casal ficou junto durante nove
anos. Maria Bonita e Lampião levavam um cotidiano sem rotina. Todo dia era uma
surpresa. Levavam uma vida entre caminhadas quase intermináveis pelas veredas
sertanejas, fugas constantes da perseguição da polícia da época, acampamentos
em localidades de difícil acesso, mas também de festas em casas de coiteiros
onde sempre dançavam juntos à vista do povo. Um amor que parecia não caber nos
limites do cangaço, que tornava mais suave a rudeza da caatinga. Um amor que só
foi vencido pela morte.
A maior dor de uma mulher
Da relação dos dois, surgiram
frutos. Mas apenas um vingou. Depois de alguns abortos, Maria Bonita teve
Expedita, única filha viva até hoje do casal de cangaceiros. A menina veio ao
mundo pelas mãos do próprio pai. “Lampião foi o parteiro. Ele era parteiro,
costureiro, fazia suas próprias roupas, era enfermeiro, era um homem
extremamente inteligente”, resume a historiadora Semira.
A felicidade da jovem mãe, então
com 21 anos, de finalmente poder ter um filho, não durou muito. A lei do
cangaço era clara e dura. Não eram permitidas crianças nos bandos. Logo cedo,
os bebês tinham de ser dados. Cerca de 20 dias depois de dar luz à criança,
Maria foi obrigada a se separar do bebê. “As crianças eram dadas aos políticos,
coronéis e padres: os homens fortes da época”, detalha João de Souza Lima.
A proibição não ficou restrita a
Maria. Todas as mulheres que passaram pelo cangaço também não tiveram o direito
de criar seus filhos. Isso porque os bandos viviam em condições muito precárias
em meio à caatinga e estavam a todo instante fugindo das volantes, das forças
policiais. Os cangaceiros temiam ainda que o choro dos bebês despertasse a
atenção dos inimigos. Assim, as mulheres abriam mão dos filhos em nome da
sobrevivência.
http://www2.uol.com.br/JC/sites/asmarias/mariabonita_lampiao.html
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