Por: José Mendes Pereira
O cangaceiro Balão
Em 1973, o cangaceiro Balão cedeu entrevista à Revista Realidade, e para mim, não sei se estou certo, Balão foi o cangaceiro que mais fantasiou as suas respostas. É claro que cada um deles queria levar a sardinha para o seu prato, mas não era necessário tanta fantasia.
Vamos apreciar o que ele falou.
“-Estávamos acampados perto do Rio São Francisco. Lampião acordou às 5 horas da manhã e mandou um dos homens reunir o grupo para fazer o ofício de Nossa Senhora. Enquanto lia a missa em voz alta, todos nós ficamos ajoelhados ao lado das barracas, respondendo amém e batendo no peito na hora do Senhor Deus".
Lampião e seu bando rezando
Continua: "-Terminado o ofício Lampião mandou Amoroso buscar água para o café. Mas quando ele se abaixou no córrego veio o primeiro tiro. Havia uma metralhadora atrás de duas pedras, a 20 metros da barraca de Lampião.
Coiteiro de Lampião Pedro de Cândido
Pedro de Cândido, um dos nossos, havia nos traído, e acho que tinha dado ao sargento Zé Procópio até a posição das camas."
"-Numa rajada de metralhadora serrou a ponta da minha barraca..."
E continua o cangaceiro Balão: "- Meu companheiro Mergulhão, levantou-se de um salto, mas caiu partido ao meio por nova rajada. Eu permaneci deitado, e com jeito coloquei o bornal de balas no ombro direito, o sobressalente no esquerdo, calcei uma alpargata. A do pé esquerdo não quis entrar, e eu a prendi também no ombro. Quando levantei, vi um soldado batendo com o fuzil na cabeça de Mergulhão. De repente ele estava com o cano de sua arma encostada na minha perna e eu apontava meu mosquetão contra sua barriga. Atiramos. Caímos os dois e fomos formar uma cruz junto ao corpo de Mergulhão. Levantei-me devagar. O soldado estava morto e minha perna não fora quebrada.
"-Então vi Lampião caído de costas, com uma bala na testa..."
Continua Balão: "- Moeda, Tempo Duro (este último não aparece na lista oficial dos abatidos, e nem tão pouco na lista de Alcino Alves Costa); Quinta-feira, todos estavam mortos. Contei os corpos dos amigos. Nove homens e duas mulheres. Maria Bonita, ferida, escondeu-se debaixo de algumas pedras. Mas foi encontrada e degolada viva. Não havia tempo para chorar. As balas batiam nas pedras soltando faíscas e lascas. Ouviam-se os gritos por toda parte. Um inferno. Luiz Pedro ainda gritou: -Vamos pegar o dinheiro e o ouro na barraca de Lampião. Não conseguiu. Caiu atingido por uma rajada".
Em minha opinião esta afirmação do cangaceiro Balão contraria o que disse Mané Veio, pois nas declarações que deu aos repórteres, o policial levou um bom tempo para assassinar Luiz Pedro.
Continua: "- Uma vez me perdi do bando e fiquei um ano nas caatingas de Bebedouro, Jeremoabo, Cipó de Leite, sem ver uma alma viva. No começo eu estava com ANJO ROQUE e sua mulher".
Continua o depoente: "- Corri até ele, peguei seu mosquetão e com Zé Sereno conseguimos furar o cerco. Tive a impressão de que a metralhadora enguiçou no momento exato. Para mim foi Deus".
Minhas inquietações:
1 - Será mesmo que depois da missa ele voltou a se deitar?
2 - Como foi que ele viu que a bala que atingiu o rei foi mesmo no meio da testa, quando ele diz que Lampião estava de costas?
3 - Como foi que no meio de um cerrado tiroteio ele teve coragem de ir pegar o mosquetão de Luiz Pedro que já estava morto?
4 - Como foi que ainda deu tempo para ele contar os mortos, pois no meio de um tiroteio, qualquer ser humano não espera por nada, muito menos para contar quem lá morreu?
5 - Como foi que ainda deu tempo para ele calçar as alpargatas?
6 - Por que Balão caiu quando ele e o policial ambos atiraram, se ele não sofreu nenhum impacto para ser derrubado?
7 - Balão disse que após o massacre ao grupo de cangaceiros passou um ano nas caatingas sem ver um pé de pessoa, comendo carne de bode. Onde ele arranjava fósforos para fazer fogo e cozinhar a carne?
O amigo Balão fantasiou algumas respostas. Muitas verdades, é claro, mas outras, fantasiadas. Gostaria muito que as suas respostas fossem verdades. Mas pelo que ele disse, não há como eu acreditar em todas.
Mesmo fantasiando as suas respostas, nos meus estudos cangaceiros, eu admiro este facínora, devido ter sido fiel ao maior bandido, que foi o capitão Lampião.
Informação aos estudiosos do cangaço:
Os meus trabalhos de forma alguma, prejudicam escritores, pesquisadores e nem tão pouco cineastas. São apenas as minhas inquietações sobre alguns depoentes que falaram o que não deviam.
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