Por Rangel Alves
da Costa*
Com pouco mais
de um ano da partida de minha avó Emeliana, neste sábado 15 minha Tia
Mariquinha também se despediu da vida terrena. Maria Marques da Silva, ou
simplesmente Mariquinha, fazia parte da melhor estirpe de Poço Redondo, com
raízes familiares que remontam à própria história da povoação. Faleceu aos 87
anos e após um período de melhoras e pioras na saúde.
Uma mulher
sempre reconhecida e valorizada por todos, dos mais jovens aos mais velhos, e
assim porque construiu sua história com a missão de servir. E serviu a todos,
indistintamente. Uma bela senhora com seus cabelos brancos, alegre, sorridente,
com uma palavra sempre cativante, amiga do mundo. Mesmo fragilizada pelas
desditas da enfermidade, ainda assim uma flor de pétalas perfumadas.
Era uma das
nove irmãs de minha avó, cuja família vingou um filho famoso: Manoel Marques da
Silva, o cangaceiro Zabelê, sumido no meio do mundo desde a chacina da Gruta do
Angico em 38. De todas as irmãs só restavam três: Cordélia, Mãezinha e
Mariquinha. As duas primeiras, já muito idosas, sempre residiram em Poço
Redondo, mas Tia Mariquinha passou a morar em Aracaju desde que casou com
Aloísio Azevedo Silva, o Padrinho Aloísio, também já falecido.
Mesmo
residindo em Aracaju, Tia Mariquinha sempre teve Poço Redondo como seu lar
principal, principalmente pelas raízes robustas espalhadas por lá, uma
infinidade de parentes e amigos e também pela sua Santa Luzia. Uma fazenda com
nome de santa, desde muito adquirida e mantida por Padrinho Aloísio nos
arredores da cidade. Quem segue em direção a Canindé passa bem ao lado da sede
da Santa Luzia com sua vista maravilhosa.
Quando chegava
em Poço Redondo Tia Mariquinha se dividia entre a cidade e a propriedade, que
noutros tempos seguia até caminhando. De vez em quando passava temporadas
inteiras por lá, mas ultimamente quase não visitava mais seu sertão, pois desde
algum tempo acometida de enfermidades. Doenças do tempo, da idade, que vão
fragilizando tudo e depois sopra o ser ao seu lar: és pó e em pó hás de
retornar!
E o seu
retorno foi neste sábado, e exatamente quando, após uma melhora, até se
imaginava poder logo visitar seu sertão, sua Santa Luzia, sua família imensa,
pois todos do lugar. Mas eis que já havia um compromisso marcado, um segredo de
Deus para com seu destino, e depois disso o adeus e a aflição dos quatro filhos
(Railda, Aloisinho, Rose e Anselmo), netos, bisnetos e demais familiares e
amigos. E de Aracaju a Poço Redondo uma tristeza só.
E a tristeza
se justifica. Não era apenas por exercício de respeito que Poço Redondo a
tratava como tia, mas pelo reconhecimento de sua bondade perante cada um. Mas
grande parte também a tinha como uma verdadeira mãe, pois responsável, junto
com seu esposo Aloísio, pelo acolhimento, cuidado e formação de muita gente.
Ora, num tempo
que não havia estudo suficiente no sertão, muitos não encontraram outro abrigo
senão na sua em Aracaju. E não só familiares eram recebidos de braços sempre
abertos. Do mesmo modo, quando o sertanejo necessitava de cuidados médicos na
capital, a primeira porta que encontrava aberta era a do casal. E convidado a
entrar para ser cuidado com todo zelo e carinho. E todo o Poço Redondo por testemunha.
Tive o prazer
e a honra de conviver muito tempo na sua casa. E todos de minha família que ali
chegaram foram tratados não como sobrinhos, mas como verdadeiros filhos. E
antes de mim meu pai já havia sido acolhido, meus tios e outros parentes. Ao
seu lado, do esposo e filhos, morei na Rua Divina Pastora e na Marechal Horta
Barbosa, esquina com Hermes Fontes (nº 7, recordo até hoje). Como recordo
também seu imenso prazer a cada reencontro e a sua palavra doce perguntando:
Você está bem, meu filho?
São apenas
lágrimas, minha tia. São apenas lágrimas. A dor adormece no coração que
reconhece a grandeza do ser que se vai. Mas permanecendo sempre pelo amor
vivenciado na terra.
Poeta e
cronista
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