(Texto de Maura Estáquia de Oliveira) - Material do acervo do pesquisador do cangaço Antonio Corrêa Sobrinho
O único cangaceiro que comandou Lampião - Sinhô Pereira
ELE FOI MESTRE DE LAMPIÃO
BELO HORIZONTE (O GLOBO) – De Serra Talhada, no sertão pernambucano, até Lagoa Grande, no sertão de Minas Gerais, há mais de mil quilômetros de distância. Mas uma distância muito maior separa o cangaceiro Sebastião Pereira, que Serra Talhada temeu em torno de 1916, do farmacêutico Chico Maranhão, que Lagoa Grande respeita e venera desde 1923. Sebastião Pereira, ou Sinhô Pereira, como era conhecido no Cangaço, é sobrinho do Barão de Pajeú, um dos mais influentes políticos pernambucanos do início do século. Aderiu ao cangaço para vingar a morte de um irmão na luta entre as famílias do sertão e “para levar justiça a um povo que só conhecia a lei da força”. Um dia recebeu entre seus homens o jovem Virgulino Ferreira – que mais tarde seria o temido Lampião – a quem ensinou todos os segredos da guerrilha da caatinga e depois fez dele seu lugar-tenente. Quando resolveu abandonar a vida de cangaceiro convidou seu compadre para sair junto. Mas Lampião preferiu a caatinga.
Andrelino Pereira da Silva (Barão do Pajeú). Ele era tio-avô do Sinhô Pereira
Em 1916, no interior de Pernambuco, a luta pelo poder político não tinha limites. Para dominar “era mais fácil contratar uns jagunços e eliminar o adversário”. Foi assim que, em Serra Talhada, começou a disputa entre as famílias Pereira, do barão de Pajeú, e Carvalho, pelo controle da política local. As desavenças entre as duas famílias já vinham de longe, por questões de disputa de terras.
Um dia, bandoleiros a serviço dos Carvalho emboscaram e mataram Manuel Pereira Jacobino, pai de Sebastião. Deste dia em diante toda a família Pereira jurou vingança e começou a “guerra”. Manuel Pereira da Silva Filho, irmão mais velho de Sebastião, tomou a si a responsabilidade de vingar a morte de seu pai. Mas também foi morto logo depois, à traição.
As mortes sucediam-se e crescia o ódio entre as famílias. O Governo do Estado enviou para a região um contingente de cem homens, fortemente armados, para pôr fim à matança. Cada vez mais a lei que mandava era a lei das armas.
VINGANÇA
Por esta época Sebastião Pereira tinha 19 anos e trabalhava em Mata Grande, no estado de Alagoas. Ao receber a notícia da morte de seu irmão, Sebastião entendeu que havia chegado a sua vez de lutar pela vingança de seus parentes e para punir os que exploravam os sertanejos.
Sinhô Pereira e Luiz Padre
Junto com seu primo Luiz Padre voltou às terras do barão de Pajeú e ali planejaram a investida contra os Carvalho. Em pouco tempo dominavam todos os segredos da caatinga, das serras e das furnas e tornaram-se conhecidos dos sertanejos de Vila Bela, Serra Vermelha, Queixada e São Francisco, de quem recebiam ajuda, munição, informações e alimentos.
Formaram um grupo de sete cangaceiros com a acolhida de João Simão, o Sabiá, Domingos, Meia Noite, Antônio Paixão e Joaquim Moreno (Moreno, anos depois, foi morto por Lampião). Em janeiro de 1917, armaram a primeira emboscada para João Piranha, filho de Lucas das Piranhas, um dos Carvalho. Os atacados resistiram e a escaramuça não deu em nada. Mas Sebastião ficou satisfeito:
- Senti que naquele momento começava a cumprir meu juramento. Sabia que seria uma vida difícil e perigosa, mas aqueles não eram tempos de procurar tranquilidade.
Sinhô Pereira
HISTÓRIAS
Quarenta e cinco anos depois, sentado calmamente no quintal de sua casa em Lagoa Grande, no alto Paranaíba, Sebastião vai contando suas façanhas, no tempo em que a caatinga se encheu de sangue. Fala com tristeza da seca, do gado magro, dos fanáticos sacrifícios para que a chuva viesse, de sua casa cheia de gente nos dias de festa e de seu primeiro combate importante:
- Foi em São Francisco. Luis Padre, eu e nossos cinco companheiros entramos na cidade para comprar alimentos. Receberam-nos a bala. Corremos para as esquinas e tomamos posição. O tiroteio levou uma hora e, dessa vez, matamos Cornélio Pedro de Chico Eduardo, defensores da cidade. Nenhum de nós teve um arranhão ao menos.
Sinhô Pereira
Algum tempo depois, já então com 23 homens decididos, Sebastião planejou o ataque à Fazenda das Piranhas, onde morava Lucas Alves de Carvalho, o Lucas das Piranhas, que mandara matar seu pai. Depois de longa caminhada pela caatinga, pelas grotas dos serrotes, lutando contra os espinhos, contra animais venenosos e contra a sede, os cangaceiros de Sinhô Pereira cercaram a casa-grande da fazenda. Mas Lucas das Piranhas fora avisado e preparara uma recepção violenta. Um cangaceiro morreu e cinco ficaram feridos.
POLÍCIA ATRÁS
Assustados com a onda de violência no sertão, as autoridades aumentaram mais ainda as forças de repressão, na região de Serra Talhada. Volantes percorriam todos os lugares em contínua perseguição. O grupo de Sebastião Pereira era dos mais caçados. Sinhô Pereira e Luiz Padre foram para Matinha de Água Branca, onde ficaram mais de um mês sem serem incomodados.
O coronel Delmiro Gouveia
Foi quando souberam do assassinato de Delmiro Augusto Cruz Gouveia, grande amigo do Barão de Pajeú, morto enquanto dormia, sentado na varanda de sua casa. Ficaram muito abalados com o caso.
Sinhô Pereira
Quando a caçada diminuiu, Sebastião e Luiz Padre se uniram aos outros e cercaram Queixada, hoje Mirandinha. A população tentou reagir ao cerco e, no tiroteio, foi morto Antônio Alves de Carvalho. Os cangaceiros usavam rifles de cruzeta e tinham bastante munição. Sebastião Pereira, o Chico Maranhão do sertão de Minas Gerais, conta:
- Conseguir munição era fácil. A gente comprava, tomava dos volantes ou saqueava as casas de armas.
No fim do combate de Queixada, Sebastião ficou satisfeito: “Era um Carvalho a menos no mundo.”
Sargento Optato Gueiros - fonte: http://lampiaoaceso.blogspot.com
SARGENTO OPTATO
Por volta de 1918, Sebastião Pereira encontrou-se frente a frente com o sargento Optato Gueiros, destacado para comandar uns volantes em Vila Bela. Mais tarde, o então tenente Optato contaria este encontro em um livro que escreveu sobre o cangaço. Disse no livro que Lampião estava junto. Sebastião Pereira contesta esta informação:
- Ele se enganou. Nesta época Lampião ainda não estava comigo. Chegamos eu e mais quatro companheiros, na casa de uma tia minha e, logo na entrada, vi que havia estranhos. Eram o sargento e sua mulher, que não devia ter mais de 14 anos. Conversamos e ele me disse para onde ia.
Sebastião, com um sorriso nos lábios, continua a falar de Optato Gueiros:
- Esse sargento Optato esqueceu de contar em seu livro que, um dia, eu e meus homens botamos os dele para correr, sem termos dado um tiro sequer. Foi engraçado. Ele e sua tropa estavam arranchados perto de um engenho, quando apareci no alto da serra com 12 cabras do meu grupo. Assim que eles nos viram, saíram a correr que nem malucos pela caatinga afora. Acho que pensaram que nós éramos mais. Eles eram mais de vinte. Minha turma morreu de rir quando viu a correria da tropa do sargento.
CIDADE EM CHAMAS
São Francisco, cidade perto da Serra Vermelha, no sertão de Pernambuco, era o ponto de referência dos ataques do bando. A história da cidade está ligada às lutas entre os Pereiras e os Carvalho. Cercada de serras e serrotes, São Francisco oferecia os melhores esconderijos. Sebastião fez dela o seu quartel.
Em 1919, seu grupo foi perseguido pelos volantes do capitão Holanda. Os cangaceiros entrincheiraram-se nas casas da cidade e puseram as tropas em retirada, após liquidar nove soldados e ferir mais de trinta.
Sebastião Pereira, o Sinhô Pereira temido no cangaço, o Chico Maranhão, respeitado no sertão mineiro, sentado entre suas netas, fala serenamente do acontecimento:
- Foi uma briga feia. Correu muito sangue. Gente minha não foi ferida, mas, dias depois, por vingança, o capitão José Nunes invadiu a cidade e tocou fogo nas casas todas. Era um tempo ruim. Tinha sossego não. Era só desgraça, seca e miséria.
CONTINUA...
Fonte: facebook
Página: Antônio Corrêa
Sobrinho O cangaço
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