Por Guilherme Machado
Guilherme Machado e Vera Ferreira
Vera Ferreira
- Neta de Lampião e Maria Bonita
Vera Ferreira construiu sua própria história, independente de ser neta de Lampião
e Maria Bonita. Foi a primeira cinegrafista mulher a empunhar uma câmera no
Brasil, criou reboliço no Senado Nacional...
Vera Ferreira construiu sua própria história, independente de ser neta de
Lampião e Maria Bonita. Foi a primeira cinegrafista mulher a empunhar uma
câmera no Brasil, criou reboliço no Senado Nacional e hoje leva, no peito e na
raça, o projeto de manter vivo esse momento tão importante da história do
Brasil que foi o cangaço. Mas também o que se poderia esperar dessa que é da "raça
de Lampião" e tem como avó uma mulher que é exemplo da força feminina...
RAÇA DE LAMPIÃO! Quando éramos crianças, ninguém chegava perto da gente. Só
brincavamos com os nossos primos... Para as pessoas nós éramos "raça de
Lampião" e vivíamos assim. Minha mãe teve quatro filhos, Dejair, Vera,
Gleuse Meire e Iza Cristina, além de três bisnetas que são karla que faz
faculdade em São Paulo, Cleudi que faz Arquitetura na Unit e Luana que é campeã
brasileira de natação. Muita gente acreditava, ou acredita, que descendente de
cangaceiro viria a ser bandido; e não se tem nenhuma informação que algum
descendente de pessoas que estiveram no cangaço tenham tido problema com a
justiça. EXPEDITA AOS 21 DIAS Minha mãe, aos 21 dias de nascida, foi dada para
ser criada por um casal, porque todas as crianças que nasciam no cangaço eram
dadas, visto que não se tinha a menor condição de se ter crianças no bando. E
foi assim que, até os oito anos de idade, minha mãe foi criada por Severo, que
era vaqueiro, e sua esposa, Aurora. Depois ela foi para Propriá, para ser
criada por João Ferreira, que foi o único irmão do meu avô que, por
determinação dele, não entrou para o cangaço para tomar conta das irmãs e do
irmão mais novo, que era Ezequiel. Aos dezesseis anos, minha mãe veio trabalhar
em Aracaju e aos dezoito anos se casou. VERA AOS TREZE ANOS Aos treze anos de
idade eu fui para São Paulo, junto com minha mãe, pela primeira vez, para um
encontro de cangaceiros. Até então, eu não sabia nada da vida de meu avô, só
sabia que éramos "raça de Lampião", e que as pessoas não gostavam
disso. Nesse encontro, em São Paulo, organizado pela autora do livro
"Táticas de Guerra de um Cangaceiro", Cristina da Mata Machado, que
conheci Dadá, Balão, Criança, Sila, Zé Sereno, Labareda e outros; eu fiquei
impressionada como tratavam com respeito minha mãe e eu. Era como se meu avô
estivesse presente. Foi então que eu prometi, pra mim mesma, que iria pesquisar
e cuidar da memória dos meus avós. DADÁ, MULHER DE CURISCO Era uma mulher
fantástica! Foi quem me esclareceu muita coisa sobre meus avós e o cangaço, ela
tinha uma memória fantástica e muito detalhista, além de contar realmente os
fatos, sem fantasiar, porque hoje em dia, ainda existem cangaceiros que
fantasiam. MULHER CINEGRAFISTA Aos dezenove anos, casei e fui morar em São
Paulo. Separei, fui para Brasília e comecei a fotografar.
Daí para câmera foi
um pulo, fui a primeira mulher, no Brasil, a empunhar uma câmera. Trabalhei na
Rede Globo, Manchete, Bandeirantes, TV Sergipe e depois em produções independentes.
Tenho muito orgulho de ter sido a primeira jornalista cinegrafista. SAIAS,
CALÇAS E SENADO Eu fui designada pela Globo para trabalhar como repórter
cinegrafista no Senado e lá mulher só podia entrar de saia. E como eu, com uma
câmera de quase dez quilos no ombro, tendo que subir em mesa, nos ombros do meu
assistente, poderia usar uma saia? Muitas vezes peguei o paletó do meu
assistente, outra vez tranquei uma fotógrafa enorme dentro do banheiro para
pegar a saia dela e fazer as imagens que eu não podia perder, até que o Moacir
Dala me liberou para entrar no Plenário de calça. MUSEU DO CANGAÇO... Em 88 foi
comemorado os cinqüenta anos de morte de Lampião e Maria Bonita, além de outros
cangaceiros que estavam no momento da tocaia no coito. Então resolvemos criar
um museu que seria uma homenagem aos meus avós e ao cangaço em geral. Montamos
ele onde fica o Centro de Turismo de Sergipe, e esse museu tinha tudo para dar
certo, porque em agosto daquele ano, que não é um mês forte para o turismo, tivemos
3.327 visitantes, que é mais do que tiveram os três museus daqui em três anos.
Recebemos a visita de jornalistas da Bélgica, da Romênia e de outros lugares do
mundo... Pena que o museu só funcionou 4 meses, em novembro caiu uma chuva
forte e choveu através do teto e perdemos muitas coisas. Perdemos documentos
históricos, fotos, armas... O NOVO MUSEU! Nós temos propostas de alguns lugares
para fazer o museu, Alagoas, Bahia, o Shopping Rio Mar... Aqui a Emsetur nos
ofereceu um lugar na Orla, mas já nos tirou, inclusive o Arquiteto Eduardo
Carlos Magno, que projetou a planta do museu, disse que se o museu não for na
orla, quem sairá perdendo é a própria Orla e, claro, Sergipe... Enfim eu sei
que eu vou montar esse museu não sei aonde, gostaria muito que fosse aqui, mas
acredito que seja preciso que as pessoas que estão a frente do governo percebam
o quanto é preciso valorizar os acontecimentos históricos da sua terra.
ENQUANTO ISSO... Uma parte do acervo está no Memorial da UNIT que fica na Av.
13 de julho, e pode ser visitado... MAS NÃO DURA MUITO TEMPO! Nós queremos
muito montar esse museu aqui, mas não vou ficar muito tempo esperando que
políticos percebam o quanto isso seria importante para o nosso estado. A minha
familia não ganha nada com isso, muito pelo contrário, perde, porque temos que
botar do próprio bolso para viajar, pesquisar e manter essa passagem histórica
do Brasil que foi o cangaço... paciência tem limite. AS QUATROS OPÇÕES DE
LAMPIÃO! Ele poderia calar, virar jagunço de um coronel rico, volante (polícia)
ou cangaceiro... ele optou pela última, mas só quando o pai foi morto, que era
um homem muito pacato e que se mudou quatro vezes para não brigar e foi morto
assim mesmo. MARIA BONITA! A revista Desfile Internacional colocou as cem
mulheres do século, minha avó estava presente, um encarte da Folha de São Paulo
colocou as maiores mulheres brasileiras, minha avó estava presente, saiu agora
na revista Cláudia as mulheres mais importantes, minha avó estava presente.
Então acho que só isso basta para dizer qual a importância dessa mulher como
referencial para as mulheres brasileiras e do resto do mundo. DE VIRGOLINO A
LAMPIÃO... Quem escreveu o livro foi eu e Antônio Amaury, que é o maior
pesquisador sobre cangaço que existe atualmente, com um trabalho de cinquenta
anos dedicado a esse tema. A Dana Corporation foi quem patrocinou o nosso livro
juntamente com o Ministério da Cultura, Através da Fundação Augusto Franco. e o
que me deixou muito feliz foi que, durante dois meses, ele foi o mais vendido na
Livraria Escariz e a saída continua muito boa. Lançamos agora em Porto Alegre,
e estaremos fazendo outros lançamentos durante o ano todo... O FILME? Nós já
fomos procurados por alguns diretores para comprar os direitos de filmagem do
" Virgolino a Lampião" e estamos estudando a melhor proposta, porque
chega de filme mentiroso sobre o cangaço... o único trabalho que é um pouco
fiel foi um Globo Repórter Especial que se chamou " O último dia de
Lampião’’... LAMPIÃO, MENTIRAS E VERDADES... Eu e o Antônio Amaury já estamos
trabalhando em outro livro que vai revelar as mentiras que se falam sobre o
cangaço... existem coisas absurdas do tipo que meu avô só usava perfume francês
e que só escrevia os bilhetes em máquina de escrever, imagina em pleno sertão
fazendo bilhetes em máquina de escrever, a pessoa que escreve um negocio desse
é um irresponsável.
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