Por: Honório de Medeiros
A partir de
amanhã entro de férias. E vou bater perna na Europa velha de guerra, enquanto
posso. Flanar. Viver a rotina dos cafés, das livrarias, das feiras ao ar livre,
das igrejas – como eu gosto delas, e quanto mais antigas, melhor! – dos sebos,
dos antiquários.
Editora
Flâneur
Nada
que eu não faça aqui mesmo em Natal, Mossoró, Martins, Pau dos Ferros, São
Paulo, os chãos que eu sempre piso, os lugares nos quais eu sempre ando, na
condição de vivente curioso acerca da faina humana e supostamente um pouco
acima do analfabetismo institucional que galopa Brasil adentro mais
rapidamente que a Moça Caetana no seu mister de povoar o céu, o purgatório e o
inferno.
Esqueci
Cabaceiras, na Paraíba, no Pai Mateus, Sertãozão de Meu Deus, pedras e mais
pedras, rochas e mais rochas, terra, mato rasteiro, céu de um azul sem igual,
noites estreladas de tirar o fôlego, e emas, seriemas, veados, gato-do-mato,
mocós, arapongas, jacus, toda a fauna do Sertão que a fome e descuido dos
homens praticamente extinguiu, o linguajar arrastado contando “causos”, o
chiste permanente, o cavaqueado dos meus irmãos paraibanos no centro do seu, do
nosso Paraíso sertanejo.
Pois
bem, mas na República Tcheca só me programei para fazer duas coisas: procurar a
casa onde nasceu Hans Kelsen, o mais original e profundo dos filósofos do
Direito, se é que ela ainda existe, e visitar o Cemitério Judeu. Nada mais. O
resto é andar, perambular, deambular, flanar, pensar no sentido da vida, na
origem das coisas, enquanto o tempo passa, pastorar o espírito de Vaclav Havel,
com quem gostaria de trocar dois dedos de prosa, e assim por diante.
De
lá, Hungria, onde vou segurar a vontade de fazer carreira até a Romênia para
visitar o Castelo de Vlad Drakul, o Conde Drácula. Segurada a vontade, a goles
de Tokay, pretendo vadiar pelo Danúbio, o quanto puder, escutando os magiares
falam seu idioma incompreensível, olhar atento à possibilidade de encontrar uma
cigana que leia a minha mão e me diga, em inglês macarrônico igual ao meu, que
eu vou ser feliz, ter muita saúde, e morrer bem velhinho, imensamente rico.
Então
Viena. Em Viena, os cafés, para mim, o Castelo de Sissi para minha amada. Eu
vou a Sissi, claro, com ela; e, ela, claro, vem aos cafés comigo, e vamos
celebrar a vida, e nos deleitarmos com a beleza da capital austríaca, e eu vou
lhe contar acerca do surgimento do Positivismo Lógico naquela Viena do começo
do Século XX que viveu seu apogeu intelectual antes que os nazistas chegassem.
Quem me conhece sabe que procurarei, de todas as formas possíveis, os rastros
de Karl Popper, o maior filósofo do século XX, um dos maiores de todos os
tempos, seja na política, com sua análise de Platão, Hegel e Marx, seja na
ciência com sua epistemologia, construída a partir da teoria da seleção
natural. Filósofo, músico, matemático, lógico, epistemólogo, Popper foi, com
certeza, o último dos polímatas.
Depois
Portugal. Ah, Portugal! Bom, agora vou pedir licença para somente falar em
Portugal um pouco mais à frene, se e quando os excelentes vinhos do Douro me
permitirem. Mas lá vou à procura de Eça de Queirós, paixão antiga. E, como não
poderia deixar de ser, pretendo mergulhar fundo no Sertão de Portugal. Ou
Certão, como se dizia em Português arcaico...
Até
mais ver.
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