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sábado, 9 de janeiro de 2016

O MAIS NOVO LIVRO DO POETA E ESCRITOR JOSÉ EDILSON DE ALBUQUERQUE GUIMARÃES SEGUNDO


O livro "NAS TRILHAS DE MEU AVÔ" pode ser adquirido: Em Mossoró na Livraria Independência. Em Natal na Livraria Nobel, da Avenida Salgado Filho.
O valor do livro é 30,00 reais.

Um grande abraço,
Edilson Segundo

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MATANDO A SAUDADE

Por Rangel Alves da Costa*

De vez em quando é bom matar a saudade. Como dizia o mestre ao pé da montanha: Eis-me aqui na recordação do quanto lá de cima pude avistar a mundo. Mas não preciso mais subir novamente para tudo enxergar. O quanto já avistei é suficiente para fazer da saudade o que adiante preciso ter sem necessidade de retornar e caminhar pelos mesmos caminhos do passado.

Depois seguiu adiante sem olhar para trás, para o alto da montanha. Estava cheio de saudade, mas com toda recordação que precisava guardada no alforje da memória. Toda vez que precisasse relembrar era só chamar ao pensamento o que desejasse. E assim ocorre com muita gente que faz da saudade uma forma de não perder ou se distanciar demais daquilo que lhe foi tão importante na vida. Enquanto uns tudo fazem para apagar o passado, outros cuidam de mantê-lo como chama viva.

Tia Zulmira tinha um jeito estranho de sentir saudade. Quem a conhecia apenas ficava imaginando porque agia daquele modo, mas quem não fosse do seio familiar certamente imaginava seu pouco juízo pela idade. Mas a verdade é que ela tinha hora certa para sentir saudade. Não só para a nostalgia de todo dia, sempre ao entardecer, mas também para conversar sozinha (sempre afirmava dialogar com pessoas) e chorar feito um rio cheio.

Todo entardecer e a Tia Zulmira mandava um neto colocar sua cadeira de balanço debaixo do sombreado de uma mangueira. Acaso o menino se demorasse, logo ela gritava que já estava na hora de sentir sua saudade, de chorar e sorrir relembrando o passado e também de conversar com aqueles que foram tão importantes na sua vida. E se o menino se demorasse ainda mais então ela gritava a todo pulmão: Menino de Deus, num tá vendo que a saudade tá me matando?!

Depois que a cadeira era devidamente colocada debaixo do sombreado, então ela seguia levando um lenço e uma velha caixinha de madeira. Ao sentar, mirava o horizonte acima do varal e assim permanecia por muito tempo. Só se mexia quando levava o lenço ao canto do olho para enxugar a primeira lágrima. Daí em diante era um chorar de não acabar mais. E também um converseiro danado: Ainda hoje me recordo quando a senhora escondeu minha boneca de pano. Chorei três dias sem parar e a senhora nem aí. Mas hoje reconheço sua razão. Eu queria ser menina demais e sem pensar em crescer.


De vez em quando abria a caixinha de madeira e fazia surgir uma carta amarelada, um pingente antigo, um retrato em preto e branco, um velho rosário de contas brilhosas e bonitas. Levava as antiguidades até diante do olhar e depois as apertava entre as mãos. Em instantes assim, principalmente quando juntava tudo pertinho do coração, então seus olhos se fechavam e os lábios enrugados chegavam a estremecer. A dor da saudade ali manifesta na boca trêmula e nas lágrimas que irrompiam entre os cílios e escorriam pela pele enrugada.

Morreu assim, numa tarde quase noite de saudade maior. No dia anterior já parecia se despedir. Seu neto, que brincava de ponta de vaca logo atrás, a tudo ouviu mas fez de conta que era mais uma daquelas conversas sem pé nem cabeça. Mas conversando com os seus fiéis visitantes nas horas saudosas, ela afirmou: Meu tempo aqui já chegou ao fim e amanhã partirei. Tia Cotinha vai fazer um doce de leite e mamãe um bordado bem bonito pra minha chegada. Não sei como é sentir saudade por aí nem se tem uma mangueira dessas com cadeira de balanço, mas sei que vou sentir muita saudade desse meu netinho que toda tarde me ajuda a reviver o passado.

Hoje quem sente saudade da Tia Zulmira é o neto. Saudade, aliás, que por várias razões e motivos se espalha por todo lugar. Os adeuses forçosamente dados, os retratos nas paredes, as palavras ditas ou ouvidas um dia, os encontros e permanências do passado, os amores vividos e distanciados, os baús sempre repletos de alegrias e sofrimentos, as pequenas coisas que tanto lembram instantes importantes na vida, tudo vai se transformando em saudade, e muitas vezes em saudade sem fim. Como a daquela mocinha que abre a janela para reencontrar seu amor distante numa folha ao vento ou num pássaro que voa.

Não só Tia Zulmira, pois muita gente busca a ambientação ideal para sentir saudade. O quarto escurecido, a chuva caindo, o vento soprando, as cores do sol poente, o brilho romântico da lua, a flor ao desalento de um canteiro, uma vela acesa ou uma velha canção, tudo chama a saudade. E quando ela chega sempre traz numa mão um lindo buquê e no outro um lenço enxuto. Tudo entrega ao instante de solidão e depois retorna deixando para trás a dolorosa missão de não esquecê-la. Daí sua eternidade em quem tem razão em senti-la.

Como disse o lacrimoso ante a janela aberta, quanto mais se deseja esquecer mais a saudade faz recordar. Aqueles que amamos e que se foram continuam presentes no coração. E este expressa na saudade todo o amor sentido. E este sempre nos faz relembrar aquilo que somos perante o ausente que também nos amou.

Poeta e cronista
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VOLTA SECA (ANTÔNIO DOS SANTOS)

Obs: Na imagem acima podemos ver Antônio dos Santos (Volta Seca) ladeado por um grupo de personalidades baianas. Sentado ao centro de óculos está o Professor Arthur Ramos que estudou o perfil antropológico do antigo Cabra de Lampião.

“Recebido como raro animal de circo em todas as localidades a que chegava, acabei em Salvador, depois de uma longa viagem de mãos amarradas. E não me fizeram, durante todo o percurso, nenhuma maldade.

Na capital da Bahia, a minha chegada constituiu um verdadeiro carnaval, principalmente por parte dos repórteres, que não me deixavam em paz. Procuravam-me todos os dias para entrevistar-me, mas, como eu nada dizia, eles imaginavam tudo.

Redigiam sozinhos as “minhas” entrevistas. Eu era, de fato, um bicho raro, e até fui examinado por médicos que se detinham cuidadosamente no meu crânio, medindo-o e tentando descobrir o que havia lá dentro... 

Eu era um monstro que precisava ser bem estudado. E como o fui...”

Fonte Texto: Jornal O GLOBO de 26 de novembro de 1958.
Foto: Jornal A NOITE (Rio de Janeiro/RJ)

Geraldo Antônio de Souza Júnior (Administrador)

Fonte: facebook
Página: Geraldo Júnior

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UM POUQUINHO DA VIDA E MORTE DE LAMPIÃO


1898 – Virgulino Ferreira da Silva nasce em 4 de junho, na comarca de Vila Bela, atual Serra Talhada, Pernambuco. É o terceiro dos nove filhos de José Ferreira e Maria Lopes.

1915 – Começa a briga entre a família Ferreira e a do vizinho José Saturnino.

1920 – José Ferreira é morto. Virgulino e três irmãos (Ezequiel, Levino e Antônio) entram para o cangaço. Durante um tiroteio em Piancó (PB), ele é ferido no ombro e na virilha: são as primeiras cicatrizes de uma série que colecionará na vida.

1922 – Sinhô Pereira abandona o cangaço e Lampião assume o lugar do chefe. A primeira grande façanha é um assalto à casa da baronesa Joana Vieira de Siqueira Torres, em Alagoas.

1924 – Toma um tiro no pé direito, em Serra do Catolé, município de Belmonte (PE).

1925 – Fica cego do olho direito e passa a usar óculos para disfarçar o problema.

1926 – Visita Padre Cícero no Ceará e recebe a patente de capitão do “batalhão patriótico”, encarregado de combater a Coluna Prestes. Em Itacuruba (PE) é ferido à bala na omoplata.

1927 – Ataque do bando a Mossoró (RN). A cidade resiste. É uma das maiores derrotas de sua carreira.

1928 – A ação da polícia de Pernambuco faz com que atravesse o rio São Francisco e passe a agir preferencialmente na Bahia e em Sergipe.

1929 – Primeiro encontro com Maria Bonita, na fazenda do pai dela, em Malhada do Caiçara (BA).

1930 – Maria Bonita torna-se sua mulher e ingressa no bando. O governo da Bahia oferece uma recompensa de 50 contos de réis para quem o entregar vivo ou morto. Em Sergipe, é baleado no quadril.

1932 – Nasce Expedita, sua filha com Maria Bonita.

1934 – Eronildes Carvalho, capitão do Exército e coiteiro de Lampião, é nomeado governador de Sergipe.

1936 – O libanês Benjamin Abraão, ex-secretário de Padre Cícero, convence Virgulino a se deixar filmar no documentário Lampeão. O filme é recolhido pelo Estado Novo.

1938 – Em 28 de julho, o bando é cercado em Angico (SE). Lampião, Maria Bonita e nove cangaceiros são assassinados.


Fonte: facebook
Página: Betu Maia

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LIVROS DO GERALDO MAIA DO NASCIMENTO


ATENÇÃO: Novo livro do cangaço publicado: 

AMANTES GUERREIRAS: A Presença da Mulher no Cangaço, de Geraldo Maia do Nascimento, Natal-RN: Editora do Sebo Vermelho, 2015, 132 páginas. O pesquisador do cangaço, Geraldo Maia do Nascimento, também conhecido por GMaia, nascido em Natal e radicado em Mossoró, relança o Livro: AMANTES GUERREIRAS:..., agora em 2ª Edição, com o conteúdo ampliado, ou seja, com 132 páginas. O Autor faz uma compilação de quase 100 nomes de cangaceiras. O livro pode ser adquirido com o Professor Francisco Pereira Lima, em Cajazeiras-PB ou no Sebo Vermelho, em Natal-RN. - Carlos Alberto

No dia 17 de Agosto o professor Pereira estará  com esse excelente livro à disposição dos amigos, ao preço de R$35,00 
com frete incluso. 

Pedido: franpelima@bol.com.br


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MOSSORÓ NA TRILHA DA HISTÓRIA

ANOTAÇÕES


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REVENDO O CANGACEIRO ANTÔNIO SILVINO


Fotografia tirada pouco tempo após ter se entregado à polícia em novembro de 1914 quando na ocasião já trajava o uniforme de presidiário.

Antônio Silvino se tornou o prisioneiro número 1122, da cela 35, do Raio Leste. Por vários processos, pelos vinte anos de opção pela vida no cangaço, foi condenado a 239 anos e 8 meses de prisão.

Na cadeia, teve um comportamento exemplar e decidiu aprender a ler e escrever, aproveitando as horas do dia para fazer algo útil. Nos intervalos das aulas, fabricava abotoaduras, brincos e pequenos artefatos de crina de cavalo, ganhando algum dinheiro com a venda desses produtos.

Passou a ser objeto de estudos e pesquisas, principalmente de alunos da Faculdade de Direito do Recife. Entretanto, não gostava de recordar o seu passado.

Em certa ocasião, recebeu a visita de José Lins do Rego, um jovem advogado cujo desejo era o de se tornar um romancista. Outras vezes, foi procurado por Luís da Câmara Cascudo, Nilo Pereira, José Américo de Almeida, entre várias personalidades importantes. Quanto aos jornalistas, o ex-cangaceiro se recusou, sistematicamente, a recebê-los.
Antônio Silvino passou vinte e três anos, 2 meses e 18 dias recluso. Mas, após esse período, recebeu um indulto do Presidente Getúlio Vargas. Na época, ele declarou:

Minha vida todo mundo conhece. Vinte e três anos de reclusão alteraram o meu destino. Mas, diga lá fora, que eu nunca roubei, nem desonrei ninguém, e, se matei alguma pessoa, foi em defesa própria, evitando cair nas mãos de inimigos.

Saiu feliz da vida da prisão, como um passarinho que escapou da gaiola. Tinha 62 anos de idade.

Liberto, ele decidiu andar pela rua Nova, olhar as vitrines, ir até à Sorveteria Pilar, conhecer a praia de Boa Viagem, admirar Recife e Olinda. Chegou, inclusive, a conhecer o Rio de Janeiro e o Presidente Vargas.

Desejando se estabelecer no interior do Estado, Antônio Silvino resolveu mandar uma carta para José Américo de Almeida, um político de renome na Paraíba, solicitando-lhe um emprego, por conta dos "seus serviços prestados ao Nordeste". Mas, o escritor e político jamais lhe respondeu a carta.

O ex-detento viaja para o sertão da Paraíba. Ficou vagando de cidade em cidade, se hospedando nas casas de alguns amigos antigos, porém jamais obteve recursos financeiros para comprar a tão sonhada pequena propriedade e dedicar-se de corpo e alma à agricultura.

Terminou indo viver com uma prima, Teodulina Alves Cavalcanti, que morava com o seu esposo em uma casa modesta na rua Arrojado Lisboa, em Campina Grande, na Paraíba.

Considerando-se que Antônio Silvino permaneceu vinte anos arriscando a vida e enfrentando o perigo no cotidiano, é possível afirmar que o ex-cangaceiro teve uma vida longa. Lampião, por exemplo, foi morto em Sergipe no ano de 1938, aos 41 anos de idade. Na ocasião de sua morte, Antônio Silvino estava cumprindo a sua pena e, quando indagado acerca do ocorrido, ele declarou:

Não me causou admiração porque a vida é incerta, mas a morte é certa. Não me interessam mais esses assuntos de cangaço, pois sou um homem regenerado. Só quero, agora, descanso na minha velhice.

Do perigoso cangaceiro que fora no passado, ele era hoje um homem idoso, mas que possuía uma mente esclarecida e respondia bem à todas as perguntas que lhe faziam. Dele, foi esse depoimento:

Nunca tive medo de morrer em pé, quando campeava pelo Nordeste, mas, agora, deitado, não quero morrer, se bem que não tenha medo do inferno, pois se para lá for, disputarei um lugar de chefe, um posto de comando qualquer. Pro céu é que eu não quero ir, pois, ao que me consta, lá não há campo pra luta, nem lugar para Capitão de mato como sempre fui. Quero viver mais um pouco, mesmo com esta agonia que estou sentindo, com esta falta de ar, com esta falta de conforto.

E acrescentou:

A justiça dos homens me condenou. A justiça da Revolução de 30 me absolveu, dando-me liberdade. A doença agora me prende e eu tenho que aguardar o pronunciamento da justiça de Deus. É ela maior de que todas as justiças da terra.

Antônio Silvino teve oito filhos: José, Manoel, José Batista, José Morais, Severino, Severina, Isaura e Damiana. Ele morreu na casa de sua prima Teodulina, no dia 30 de julho de 1944. Ao lado de uma multidão de curiosos, procurando vê-lo pela última vez, o ex-cangaceiro foi enterrado no Cemitério de Campina Grande. Uma senhora idosa depositou uma coroa de flores sobre a sua sepultura e, uma jovem, um cacho de angélicas e cravos.

Passados dois anos e meio do seu falecimento, nenhum familiar apareceu para a retirada dos ossos de Antônio Silvino. Sem alternativa, os coveiros enterram os restos mortais em um outro lugar do cemitério. Hoje, não se sabe mais aonde.

O que sobrou do Capitão Antônio Silvino, do célebre Rifle de Ouro, se perdeu, em meio a tantas outras ossadas que nunca foram reclamadas. A sua fama, no entanto, registrada pelos poetas populares em literatura de cordel e, por muitos intelectuais, em vários livros e periódicos, permanece viva e intacta em todo o Brasil.

Fonte Texto: VAINSENCHER, Semira Adler. Antônio Silvino. Pesquisa Escolar Online, Fundação Joaquim Nabuco, Recife.
Foto: O MALHO
Geraldo Antônio de Souza Júnior (Administrador)

Fonte: facebook
Página: Geraldo Júnior

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CASARÃO QUE PERTENCEU AO CORONEL IZAIAS ARRUDA LOCALIZADA NA CIDADE DE MILAGRES/CEARÁ.


CASARÃO QUE PERTENCEU AO CORONEL IZAIAS ARRUDA LOCALIZADA NA CIDADE DE MILAGRES/CEARÁ.

Izaias Arruda foi um dos principais coiteiros de Lampião no estado do Ceará.

A relação de “amizade” e negócios entre ambos findou após a tentativa de envenenamento de Lampião e seu bando, por parte do Coronel/Coiteiro em julho de 1927.

Fotografia: Sousa Neto (Barro/CE)

Geraldo Antônio de Souza Júnior (Administrador)


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O ataque de Lampião a Uiraúna: uma vitória da inteligência sobre a força


Há meses Lampião sumira dos noticiários dos jornais. O ano de 1926 encerra-se sem grandes novidades sobre a horda do famoso cangaceiro de Vila Bela. Bem instalado e seguro no ‘coito’ da Serra do Diamante, do poderoso Coronel Isaías Arruda, Lampião sai da aparente inatividade apenas em fins de abril de 1927. Naquele fim de mês, o bandoleiro deixa o refúgio e pratica assaltos em pequenos vilarejos situados na região noroeste da Paraíba, entre os municípios de Cajazeiras e São José de Piranhas. São ataques rápidos, com vistas apenas ao saque. A proximidade desta parte da Paraíba com o valhacouto do ‘dono’ de Missão Velha facilita sobremaneira a ação do bando.

De fato, no dia 15 de maio daquele ano, liderando uma falange de cerca de trinta e cinco homens, Lampião se prepara para tomar de assalto a Vila de Belém do Arrojado – atual cidade paraibana de Uiraúna. Há dias que ‘olheiros’ residentes em sítios da fronteira já haviam sondado o vilarejo e o cangaceiro – decerto bem ciente das condições do lugar – crê que tem plena chance de sucesso na empreitada que pretende levar avante.

o Arruado de Belém situa-se junto à fronteira do Rio Grande do Norte e é então inexpressivo. Ali não há mais que cento e trinta casas e uma igreja singela. Comércio pobre ou quase inexistente. Também ali não está destacado sequer um contingente policial para manutenção da ordem ou para oferecimento de uma defesa – mesmo que acanhada – no caso de um eventual ataque de cangaceiros. A ‘ordem’ no povoado é garantida somente por um Subdelegado civil, o potiguar Nelson Leite. Apesar de reiteradas notícias sobre incursões de cangaceiros naquela parte da Paraíba nos últimos dias, o Governo do Estado parece ignorar os eventos propalados pelos jornais e pela boca do povo. Apesar de vários reclamos por parte de proeminentes de Belém, o Estado não enviara tropa regular para a localidade.

o início da tarde daquele dia 15 de maio, no entanto, o sertanejo Leonardo Pinheiro percebe a marcha de cangaceiros em direção a Belém. Sem demora, espora o cavalo e entra no povoado em sonoro alarde:

-“Vem cangaceiro por aí! Vem cangaceiro por aí! Parece que é Lampião e não está a mais que umas duas léguas!”

Enquanto a horda marcha em busca do vilarejo, Nelson Leite se apressa em organizar uma defesa. Sangue quente, cioso de suas obrigações, Leite parece disposto a sacrificar a própria vida na defesa da comunidade que lhe fora confiada.

Abandonados à própria sorte, os habitantes de Belém – incentivados por Nelson Leite – tratam de se armar e garantir a resistência do lugar. Civis são convocados e há mesmo os que comparecem voluntariamente para pegar em armas. Ao final do rápido recrutamento, chega-se à desanimadora soma de onze homens apenas. Um contingente ínfimo que tentará rechaçar um bando com cerca de trinta e cinco cangaceiros. Uma luta desigual – se considerarmos a proporção de três bandoleiros para cada defensor e a falta de experiência de guerrilha dos citadinos. Por volta das dezessete horas, finalmente, Lampião avizinha-se da Vila. O frágil agrupamento de casas lhe parece excessivamente frágil e torna-se ainda mais amiudado pela sombra da serra de Luís Gomes, não muito distante dali. “Um alvo fácil”, provavelmente terá pensado o poderoso cangaceiro. O desenrolar dos fatos, porém, lhe revelará um grave erro de prognóstico.

Em que pese a correria desenfreada que se seguiu ao alarma dado por Leonardo Pinheiro, os homens de Nelson Leite aprestam munição e armas. Tudo é feito com rapidez e disciplina.Ao mesmo tempo, mulheres, velhos e crianças – a seguir igualmente os apelos do Subdelegado – buscam refúgio na caatinga ou em sítios de familiares fincados nos arredores de Belém. Pequenos “tesouros” são previamente enterrados em lugares seguros. Potes de barro, caixas de papelão, latas de querosene: qualquer coisa serve como invólucro para as ‘economias’ adquiridas ao longo de anos de trabalho.

Em pouco tempo, os defensores se organizam e estão posicionados em lugares previamente definidos pelo Subdelegado. Dedos nervosos aguardam o desfecho do ataque. Uma testemunha registra os momentos iniciais do entrave:

“O ‘delegado’ Nelson Leite distribuiu uns homens nos pontos mais altos da rua principal, dois outros guarnecendo as laterais e três instalados no teto da Igreja. Quando Lampião entrou com o bando, pela ‘rua velha’, começou a fuzilaria”. (Sinforosa Claudina de Galiza, entrevista).

Nelson Leite, de fato, engendrara bom plano. Distribuíra os poucos rifles e fuzis disponíveis com os onze defensores. Repartiu com irrepreensível parcimônia a rala munição que tinha ao seu dispor. Os melhores atiradores foram destacados para pontos estratégicos. Na teto da igreja – prédio mais alto e com abrangente visão dos arredores – posicionaram-se Luís Rodrigues, Moisés Lauriano, José Teotônio e Joaquim Estevão. O tempo corre lento. Não há novidades. Até perto das oito horas nem sinal da sinistra patuléia de chapéu de couro. A espera alongada transforma as trincheiras em ninhos de ansiedade.

De súbito, Luís Rodrigues dá o alarma. Alguém se aproxima. O luar denuncia vultos sorrateiros. Homens armados aproximam-se do povoado pela ‘rua da Proa’. É o início da invasão. De pronto, grande incêndio ilumina a noite na pequena Belém. Grossas labaredas passam a consumir a casa de um agricultor e espalham-se rapidamente para um antigo curral e plantação de milho já há dias quebrado. O incêndio. Método infalível para incutir terror aos sitiados.

Josefa Augusta Fernandes, bem jovem à época do evento, anota a origem do fogaréu:

“Lampião começou destruindo a propriedade do finado João Gabriel, tendo em seguida tocado fogo nos currais e nas plantações de feijão e milho. O fogo serviu para alertar os homens da cidade, sendo que eles já estavam em posição nos principais pontos daqui”. (Maria do Socorro Fernandes, entrevista).

Não havia mais o que esperar. Ao primeiro grito de comando de Nelson Leite, trava-se pesado tiroteio. Lampião, decerto, não esperava semelhante reação. A fantástica fuzilaria oriunda da Vila lhe faz recuar. De efeito, os tiros vindos da rua da Proa tornam inviável uma entrada por aqueles lados.

Sem sucesso na primeira investida, o chefe de cangaço tenta confundir os defensores entrincheirados. Sob sua batuta, os bandoleiros passam a gritar, urrar como animais e a praguejar insultos e xingamentos aos defensores e suas famílias. A permear a gritaria, grossas baterias de tiros.

O rei-do-cangaço deseja tomar Belém. Tentará de todas as maneiras penetrar no vilarejo para vilipendiar suas casas e lhes extrair até o último ‘cobre’. Sem demora, ordena aos comandados a ‘abertura’ de uma linha de fogo pela lateral, com o fito de invadir a Vila pelo flanco oposto.

Nada, entretanto, parece gerar resultado prático. A posição privilegiada dos atiradores locados no telhado da igreja permite que tiros sejam disparados em todas as direções. A resistência agiganta-se com estrondos de repercussão fantástica e de curiosa origem. Nelson Leite improvisara – no pouco tempo que dispôs antes da consecução do ataque – algumas “ronqueiras” e logo começou a fazer uso dos artefatos. Os estrondos causados pelas bombas caseiras são assustadores e surpreendentemente surtem efeito. Um simples improviso que, ao que tudo faz crer, parece realmente ser a chave para uma vitória. (1)

Em pouco, qualquer objeto metálico em formato cilíndrico – e vazado pelo menos em um dos lados – torna-se invólucro para manufatura dos pesados rojões. Joel Vieira, com dezoito anos à época do fato, registrou em depoimento:

“Os que estavam no alto da Igreja, começaram a atirar de ponto e também para dentro da igreja, causando um eco que parecia canhão. O Subdelegado também tinha improvisado umas ‘ronqueiras’, feitas com pólvora socada dentro de latas, e de quando em quando estourava uma. Já estava escuro, e aqueles tiros davam a impressão que havia um canhão com a gente”.

No alto da igreja, Luis Rodrigues – artilheiro mais aguerrido – resolve acrescentar estrondos adicionais aos estampidos das ‘ronqueiras’ improvisadas pelo Subdelegado. Dessa forma, com o intuito de causar impacto ainda maior, começa a atirar quase em paralelo à lateral da nave do prédio sagrado. Estrondos fantásticos, causados pelo eco do salão quase vazio, dão ainda mais ânimo aos outros defensores entrincheirados no teto da igreja. Decide-se que alguns deles, alternadamente, passarão a atirar também para dentro da nave.

A estratégia funciona. Os estrondos se multiplicam. De fato, para quem está do lado de fora, resta a impressão de que algum tipo de canhão está sendo utilizado. Os cangaceiros, atarantados, mantém posição de cautela e não avançam. O escuro da noite enevoada pela fumaça dos disparos os impedem de enxergar, na verdade, o tipo de “arma” adicional que ora se usa na defesa do arruado. O engodo paulatinamente funciona.

No calor da peleja, porém, passos apressados denunciam silhueta humana esgueirando-se próximo à igreja. A escuridão da noite não permite distingui-la com precisão. Da torre principal um defensor atira. O civil Antônio Correia é atingido. Confundiram-no com um cangaceiro. Correia morre pouco tempo depois em razão do profundo ferimento à altura do pulmão. É a única baixa durante o combate.

Os cangaceiros não desistem e tornam a investir contra o território inimigo por uma ruela lateral à igreja. Lampião brada ordens aos seus homens. Todos, contudo, parecem hesitar em razão dos estrondos que continuam a reverberar entre as casas da pequena Belém.

Do lado dos defensores, um voluntário prontifica-se para preparar novas ronqueiras, de forma ininterrupta, servindo-se como espécie de municiador.

Dominado pela ira, Lampião manda reacender o fogo que arde tênue na propriedade de João Gabriel. O vento rapidamente espalha as labaredas em espantosa velocidade. As chamas consomem vacas e bezerros cativos no cercado contíguo a casa. Urros de dor de animais engolidos pelas chamas desenham dantesco suplício. Poucos escapam ao bizarro holocausto.

A derradeira tentativa de conquista do povoado fracassa. Com pesar, os cangaceiros reconhecem que não conseguirão penetrar em Belém.

O desconhecimento dos pontos de defesa, o espocar das “ronqueiras”, o ribombar de tiros reverberados pelo salão da igreja, a configuração física da vila, o cansaço da longa marcha até ali. Tudo parece sugerir uma retirada. Lampião não demora em perceber o malogro da empreitada:

– Vamos sair para economizar munição! – grita furioso.

Ainda se ouvem tiros por mais um quarto de hora. Aos poucos os cangaceiros se retiram do campo de luta. Disparos tornam-se esparsos. Ao compasso da retirada, a fuzilaria regride até reinar o mais absoluto silêncio. Lampião e seus homens deixam Belém em definitivo. É ainda Joel Vieira quem destaca:

“Eles tentaram muito, mas não conseguiram entrar. Antes das sete horas da noite, já tinham ido embora. No dia seguinte, o festejo foi grande, pois todos pensavam que ia morrer muita gente, mas não. Apenas um rapaz morreu vítima de uma ‘bala doida’ e caiu ali perto da Igreja. Tirando o incêndio na propriedade de João Gabriel, o prejuízo aqui foi pouco. Com pouco recurso, a gente botou Lampião prá correr!”.

E Lampião, de fato, jamais voltou a Uiraúna. Nos dias seguintes, um telegrama é enviado para as principais cidades do sertão do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. Anunciava-se a vitória de um povo contra o poderoso rei do cangaço. O Intendente local assinou o comunicado:

“Fomos atacados dia 15 famigerado Lampião. Resistimos cerrado fogo, bandoleiros recuaram. Vítima tiroteio Antônio”. (a) José Caboclo.

É a vitória inconteste de um sumário grupo de cidadãos contra quase quarenta cangaceiros. Uma vitória nascida da confiança de homens do povo; sertanejos comuns. Não houve – como aconteceu em Mossoró – um grande lapso de tempo para a preparação de uma defesa. Não houve reuniões; não se teve tempo para comprar armas modernas. Não havia sequer uma torre na igrejinha da cidade. Existia, apenas, a vontade de preservar os próprios lares.

Uiraúna se defendeu heroicamente, a exemplo da resistência mostrada pela pequena Nazaré, em Pernambuco, quatro anos antes. Uiraúna impediu a entrada dos cangaceiros de Lampião como faria a população sergipana de Capela, liderada pelo destemido Mano Rocha, três anos mais tarde.
A vitória do povo de Uiraúna foi obtida sem recursos, sem alarde e sem exploração midiática posterior. Vitória conseguida sem um ‘notável planejamento prévio’ e sem colóquios barulhentos. Vitória de um pequeno grupo de homens pegos de surpresa pelo maioral do cangaço. Vitória, porém, recheada de atos do mais real e verdadeiro heroísmo. Vitória, enfim, da inteligência sobre a força.

Sérgio Dantas
Sérgio Augusto S. Dantas é autor dos livros “Lampião no Rio Grande do Norte – A História da Grande Jornada” (2005), “Antônio Silvino – O Cangaceiro, o Homem, o Mito” (2006) e “Lampião: Entre a Espada e a Lei” (2008).
NOTA:
(1) s.f. – Ronqueira: “Cano de ferro, preso a uma tora de madeira e cheio de pólvora, o qual produz grande detonação quando se lhe inflama a escorva”. (Aurélio). As ronqueiras já haviam sido largamente usadas em revoltas populares, como na guerra de Canudos. N do A.
FONTES UTILIZADAS:
A União, edições de 17 e 18 de maio de 1927.
DANTAS, Sérgio Augusto de Souza. LAMPIÃO NO RIO GRANDE DO NORTE – A HISTÓRIA DA GRANDE JORNADA. Editora Cartgraf, Natal/RN. 2005. 452 pgs.
SOUZA, Tânia Maria de. UIRAÚNA NO ROTEIRO DE LAMPIÃO, in Revista Polígono, 1997, 158 pgs.

Entrevistas concedidas ao autor por Maria do Socorro Fernandes (2003), Joel Vieira da Silva (2001), Josefa Augusta Fernandes (2000) e Sinforoza Claudina de Galiza (2000).

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