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Hoje o Mundo
celebra os 70 anos do fim da Segunda Guerra Mundial na Europa. Sem dúvida esta
é uma data significativa e importante para todos. Já para mim essas
comemorações trazem as lembranças do meu amigo Emil Anthony Petr.
O grande amigo
Augusto Maranhão discursando no lançamento do nosso livro “Eu não sou herói-A
História de Emil Petr”.
Emil nasceu em
1919, na pequena comunidade de Deweese, no estado americano de Nebraska, era
católico, descendente de tchecos e durante a Segunda Guerra Mundial serviu na
USAAF.
No grande
conflito mundial foi primeiramente designado para o 57th Fighter Group (57º
Grupo de Caça), na área de Boston. Quando estava para seguir com a sua unidade
para o deserto do norte da África, ele conseguiu a aprovação para cursar a
escola de formação de navegadores, em San Marco, no Texas. Em 1943, após
conseguir a patente de segundo tenente, foi designado para atuar em
bombardeiros B-24. Mas não era o fim de sua preparação. O tenente Petr seguiu
para a base aérea de Langley, Virginia, onde se especializou na tarefa de
bombardeio por radar.
Emil Anthony
Petr, segundo tenente da USAAF, honra por ter escrito sua biografia.
Em abril de
1944 chegou a sua transferência para a 15ª Air Force (15ª Força Aérea), no sul
da Itália, para atuar no esquadrão 139, do 454th Bomb Group (454 Grupo de
Bombardeiros), que ficava baseado no campo de San Giovanni, próximo a cidade de
Cerignola, no sul da Itália.
Durante o
trajeto para a Europa o tenente Emil esteve no Brasil, mas não em Natal. Passou
pelas cidades de Belém e Fortaleza, onde guardou boas lembranças. “-Não era
para ter conhecido Natal na época da guerra, mas foi para cá que optei por
viver e me casar”.
Material de
jornais antigos foram utilizados na feitura deste livro
No 454th Bomb
Group havia uma seção específica de pessoas que trabalham com sistemas de
radar. Quando Emil foi escolhido para uma missão de bombardeio, ele me disse
que era extremamente focado em seu trabalho. Porque ele sabia que qualquer erro
poderia comprometer todo o grupo de aeronaves e suas tripulações.
De abril a
setembro de 1944, Emil participou de 38 missões sobre a Europa ocupada e
alcançou o posto de segundo tenente. Em uma delas, ao atacarem a fábrica da
Messerschmitt, em Bad Voslau, na Áustria. O bombardeamento desta estratégica
unidade fabril rendeu ao 454th Bomb Group uma citação do presidente dos Estados
Unidos e o tenente Emil estava lá.
Mas no dia 13
de setembro de 1944, quando na sua 39º missão, a de número 117 do 454th Bomb
Group, cujo objetivo era uma refinaria na cidade alemã de Odertal, seu B-24 foi
atingido pela artilharia antiaérea alemã. Ninguém da sua tripulação morreu, mas
a maioria foi capturada, entre estes o tenente Emil.
Feito
prisioneiro, Emil foi levado para o campo de prisioneiros Stag Luft III, em
Sagan (atual Zagan, na Polônia) e o sofrimento foi grande.
Meses depois
as tropas russas estavam avançando a partir do leste e começaram a se aproximar
do campo. Segundo os livros relativos à Segunda Guerra Mundial, Adolf Hitler
mandou evacuar Stalag Luft III, pois além de não querer que estes aviadores
aliados fossem libertados pelos russos, havia a intenção de utilizá-los como
reféns.
Em 31 de
Janeiro os homens seguiram para o Stalag Luft VIIA, em Moosburg. Durante dois
dias de viagem, os aviadores foram levados em vagões de transportar gado. As
necessidades fisiológicas eram feitas ali mesmo, em pé e para dormir só
escorados uns nos outros e a viagem durou dois dias. Moosburg era uma
verdadeira pocilga, onde os alemães amontoaram mais de 140.000 prisioneiros
aliados, entre estes alguns brasileiros. Finalmente os prisioneiros foram
libertados pelos soldados da 14ª Divisão Blindada, do 3º Exército da U.S. Army,
comandados pelo general George Patton.
Discursando
junto com o meu amigo Augusto Maranhão, no lançamento do meu livro “Eu não sou
herói-A história de Emil Petr”
Depois de
retornar aos Estados Unidos, Emil tentou a universidade de Lincoln, sem sucesso
e foi trabalhar em uma empresa de construção da família. Mas este americano de
origem eslava, de profunda devoção católica, decidiu trabalhar como um
voluntário em obras assistenciais na América Latina, através de um programa
criado pelo Papa João XVIII.
O destino o
trouxe a Natal em 1963, onde conheceu Dom Eugênio de Araújo Sales (na
época Bispo da capital potiguar) e se incorporou no programa SAR – Serviço de
Assistência Rural. Através deste trabalho manteve contatos e participou de
ações em Recife junto com Dom Helder Câmara e teve oportunidade de estar ao
lado da irmã Dulce, de Salvador.
Emil teve
oportunidade de conhecer o sertão potiguar, os aspectos ligados aos
trabalhadores rurais nordestinos e veio a ser casar com a assistente social
Célia Vale Xavier, assistente social com curso de especialização na Costa Rica
e Colômbia, nascida em Caicó, que havia sido indicada pelo Monsenhor Walfredo
Gurgel, seu antigo mestre, para trabalhar no SAR junto com Dom Eugênio, na
elaboração do pioneiro projeto de educação radiofônica através da Emissora de
Educação Rural, mais conhecida como Rádio Rural de Natal.
Eu tive a
honra de escrever sua história e concluir o livro “Eu não sou herói – A
história de Emil Petr”, lançado em 2012 pela editora potiguar Jovens Escribas.
Na época do
lançamento deste trabalho, o meu grande amigoAugusto Maranhão, que produzia o
interessante programa televisivo “Conversando com Augusto Maranhão” e
gentilmente realizou uma entrevista comigo e com Emil Petr. É esta entrevista
que trago agora a todos, para marcar os 70 anos do fim da guerra na Europa e
lembrar meu amigo Emil.
No dia 31 de
outubro de 2012, em meio a muitos convidados (inclusive com a presença de
parentes de Emil que vieram dos Estados unidos), estivemos no Iate Clube de
Natal para o lançamento deste nosso trabalho. Ali, em meio a muitas emoções, o
nosso grande amigo Augusto Maranhão proferiu um belo discurso sobre o nosso
trabalho.
Infelizmente
Emil Petr faleceu em 2013.
Por isso
valorizo tanto os momentos que estive ao seu lado. Foram momentos muito
agradáveis e que não deixam minha memória, pois Emil era uma pessoa
maravilhosa, grande figura humana, que deixou uma marca difícil de ser apagada
na memória de muita gente no Rio Grande do Norte.
Meus
agradecimentos mais do que especiais a grande figura humana de Augusto Maranhão
e ao amigo Leonardo Dantas pela cessão deste material.
Corria o ano
de l.924. Inverno tenebroso, aguaceiro em todos os rincões nordestinos. Não
houvera legumes*. Nos baixios tudo era um amarelo desbotado. Nas croas do Rio
Piranhas, apenas o limbo coberto com areia fina, onde começara a germinação de
beldroegas. Nada de safra e as criações amorrinhadas. Finzinho de Santana,
reúne-se uma trupe de matutos comboieiros: Caboclo Antônio, Domingos Leite,
Doro da fala fina, Quincas Salvino, Dubelo e o embaixador Chico Eloi*.
Tinham como objetivo, buscar farinha e rapadura no Crato, nos Cariris Novos*.
Consertados os
surrões*, pois, pretendiam levar carne seca* desses sertões do Seridó, pra
venderem nas feiras livres de Missão Velha, Crato, Barbalha, enfim, naquele
entorno do Araripe. Viagem lenta, estradas descarnadas, alimárias esqueléticas,
puxadas a milho mochilado. Parecia uma empreitada tranquila. Parecia..., pois,
ao chegarem nos arredores de Souza, escutaram um toque de concertina. Num
piscar de olhos, estavam todos cercados por cangaceiros a pedirem dinheiro e cigarro.
Tratava-se de cabras do Grupo de Lampião, comandados pelo seu irmão Antônio
Ferreira da Silva, de alcunha “Esperança”, Pois, naquele momento, Virgulino
Ferreira (Lampião), curava-se de ferimento grave, nas ombreiras da Serra do
Diamante, Missão Velha, atendido por dois médicos de Recife, levados por
Marcolino Diniz, filho do Cel. Marçal Diniz.
A presença
desses bandoleiros Lampiônicos, tinha finalidade de surrarem o político Otávio
Mariz, um ancestral de José Agripino Maia, atendendo solicitação de Chico
Pereira, o cangaceiro do Vale do Rio do Peixe, que tivera seu pai assassinado,
e a justiça fizera vistas grossas. Por isso que o cangaceiro paizinho, andara
montado no Juiz de Direito daquela urbe paraibana, também, para reparar desonra
por ter tido também o pai morto sem qualquer intervenção da Justiça.
Ao cerco e peditório dos facínoras, o líder Caboclo Antônio, disse-lhes que
levavam carne seca dos sertões do Caicó, no que caíram como abutres sobre os
surrões, surrupiando toda a carne daqueles matutos almocreves, que nada puderam
fazer, a não ser, se contentarem com a franquia de poder continuar a viagem
ilesos.
Fragmento da
obra: "Um velho matuto comboieiro contador de histórias".
Jair Eloi de Souza.
*A carne seca
dos Sertões do Seridó potiguar, além de ter especial sabor, naquele dia,
salvara os matutos comboieiros da Ribeira meã do Rio Piancó- Piranhas-Açu.
Recebi, em um
comentário neste blog, a menção de Delmiro Gouveia. Todos devem ter ouvido
falar da cidade, que é o único município de Alagoas que faz divisa com a Bahia,
Sergipe e Pernambuco. Uma outra característica desta cidade, que fica à beira
do Rio São Francisco, é o fato de ter sido construída, neste município, a
primeira usina hidrelétrica do nordeste. Mas porque este município adotou este
nome?
Origem de
Delmiro
Delmiro
Gouveia se chamava Pedra. Seu nome deveu-se a um empresário que nem alagoano
era. Refiro-me a Delmiro Augusto da Cruz Gouveia, filho ilegítimo que
nasceu a 5 de junho de 1863, no interior do Ceará. Seu pai morreu na guerra do
Paraguai e sua mãe transferiu-se para Recife e, aos 15 anos, viu-se órfão de
pai e mãe. Um de seus primeiros trabalhos foi o de bilheteiro na estação
ferroviária de Olinda. Aos 18 anos, empregou-se na Alfândega, mas os despachos
burocráticos nunca o seduziram. Antes que morresse de tédio, Delmiro foi
trabalhar no comércio de “courinhos”, artigos de pele de bode e carneiro
popularíssimos no Nordeste da época. Interessado na compra e venda de
couro e peles de cabras e ovelhas vai para o interior de Pernambuco, onde
casou-se (1883) com Anunciada Cândida de Melo Falcão, na cidade de Pesqueira.
Trabalhou inicialmente como intermediário entre os produtores de peles de
cabra, carneiro e couros de boi espalhados por todo o sertão nordestino e os
comerciantes estrangeiros sediados no Recife. Trabalhou depois para a Keen
Sutterly & Co., da Filadélfia, e tornou-se gerente de sua filial (1892). No
ano seguinte, quando a matriz faliu, ele comprou seus escritórios no Recife e
fundou a Casa Delmiro Gouveia & Cia (1896). Ligou-se à firma L. H. Rossbch,
Brothers de Nova York e, com seu apoio financeiro e com postos de compra espalhados
por todo o Nordeste, enriqueceu e tornou-se conhecido como o Rei das peles.
Seu defeito –
Mulherengo
Delmiro era
mulherengo mas excelente negociante. Construiu um enorme mercado onde se
pudesse encontrar de tudo. O Mercado do Derby não demorou a ficar pronto. Era o
primeiro estabelecimento comercial da capital pernambucana com energia
elétrica, vendia produtos pela metade do preço e funcionava 24 por dia. Também
contava com hotel, parque de diversões e restaurante. Podemos dizer que foi o
primeiro shopping center do Brasil. E ficava em Pernambuco. E tudo isto em
1899. Construiu uma refinaria de açúcar que chegou a ser a maior da
América do Sul. Autoritário e de temperamento difícil, à medida que enriquecia
criava mais inimigos, especialmente entre os políticos pernambucanos entre
eles o prefeito, que iniciou, nos jornais, uma campanha difamatória. Seu
negócio foi incendiado e ele acumulou uma enorme dívida o que o levou a se
separar da esposa (1901) e a refugiar-se durante um ano na Europa.
Nova aventura
amorosa – recomeço
Coronel Delmiro Gouveia
Voltou para o
comércio de “courinhos” e o negócio prosperava quando, aos 40 anos, se
apaixonou por Carmélia Eulina Amaral Gusmão, filha de uma senhora chamada
Ana Gusmão, amiga íntima de Segismundo Gonçalves, presidente do Estado, de
partido político adversário do partido de Delmiro Gouveia. Ele raptou a criança
e a levou para o interior do estado, tendo com ela o primeiro de três filhos.
Segismundo, que, segundo a voz do povo, era pai da moça de apenas 16
anos, entregou o caso à polícia com a ordem de liquidar com Delmiro, agora
foragido da justiça. E foi assim que foi parar em Alagoas – fugindo da polícia.
Alagoas – seu
maior empreendimento
Em alagoas
retornou ao comércio de “courinhos” e associou-se a dois sócios italianos,
Lionelo Iona e Guido Ferrário, fundando a firma Iona e Cia. De novo o negócio
prosperou. Sua produção era exportada para os Estados Unidos para onde viajou e
teve a oportunidade de conhecer usinas hidrelétricas. Ao ver as cachoeiras
nas gargantas do “canyon” formado pelo Rio São Francisco na região, teve a ideia de montar uma usina siderúrgica. Foi a primeira hidrelétrica do Rio São
Francisco e de todo o nordeste. Montou também um grande açude na cidade.
Organizou a
Cia. Agro-Fabril Mercantil e com turbinas e geradores alemães e suíços, instalou,
num dos saltos da cachoeira de Paulo Afonso, o de Angiquinho, no lado alagoano
do rio, uma usina hidrelétrica que gerava 1.500 HP, com uma voltagem de 3 KV.
Pessoalmente, escolheu, na Inglaterra, máquinas da indústria Dobson &
Barlow, para uma fábrica, a Cia Agro-Fabril, que iniciou (1914), a produção de
linhas de coser, para rendas e bordados, fios e cordões de algodão cru em
novelos, fios encerados e fitas gomadas para embrulhos.
Essa indústria
tinha características revolucionárias, no campo social, com uma vila operária,
assistência médica, escola e cinema. Este empreendimento, porém, passou a
prejudicar o monopólio dos ingleses no setor, pois com o início da Primeira
Guerra Mundial, seus produtos escassearam no mercado e a produção da Pedra, a marca
Estrela, logo se tornou conhecida por sua qualidade e resistência e obteve
aceitação imediata. Produzindo mais de 20 mil carretéis por dia as linhas
Estrela ganharam o Brasil e entraram nos mercados da Argentina, Chile, Peru e
outros países andinos. A inglesa Machine Cotton, produtora das Linhas Corrente,
reagiu registrando (1916) no Chile e Argentina a marca Estrela e, em seguida
passou a pressionar Delmiro para vender a fábrica.
O assassinato
Coronel Delmiro Gouveia
Ele resistiu à
venda. “Cabra macho” não se intimidou. Só que, em 1917 foi assassinado
misteriosamente. Na noite de 10 de outubro de 1.917, como era seu costume,
Delmiro Gouveia sentara-se na sua cadeira de vime, no alpendre do chalé,
debaixo de uma lâmpada elétrica forte que iluminava sua figura vestida de
branco. Abriu os jornais para ler as notícias. Eram 21 horas. Por entre as
plantas do jardim se esgueiraram três “cabras” armados de rifle. Apontaram: um
tiro pegou num braço, um se perdeu, o outro feriu Delmiro no coração. Toda a
cidade de Pedra acordou. Cem armas de fogo foram passadas às mãos dos
trabalhadores que partiram em todas as direções, chorando pelas estradas. Os
pistoleiros José Inácio Pio, João Roseo de Morais e Antônio Felix foram
apresentados como culpados e a confissão foi arrancada debaixo de tortura e não
tem a menor garantia da verdade. Quem mandou matar? Surgiram várias hipóteses,
mas o processo, falho, jamais convenceu a qualquer jurista que o tenha
estudado. E não convenceu também ao povo, que sabe perguntar a quem interessa?
E a resposta é uma só: ao truste da Machine Cotton, encabeçado por J. P. Coats
& Company e tendo como subsidiárias a Clark & Company, a Ross &
Duncan e a Companhia Brasileira de linhas para coser, sediada em São Paulo.
O
reconhecimento
Delmiro deixou
saudades no povo, pois os trabalhadores tinham direito à creche e aprendiam a
ler e a escrever à noite, depois do expediente. Teriam direito à aposentadoria
mediante uma pequena contribuição voluntária que lhes garantiria uma velhice
digna. Tudo isto muito antes de existir direitos trabalhistas, o que só viria a
acontecer com Getúlio Vargas mais de vinte anos depois. Em 1915 Delmiro provou
que o nordeste é viável. Sem indústria da seca, com garantias trabalhistas.
Tudo isto irritava os “empresários” cariocas e paulistas acostumados às
benesses do governo corrupto de então. E ainda deve irritar. Tanto é assim que
depois de sua morte, sob a complacência do governo Washington Luis,
a Machine Cotton exerceu um dumping criminoso vendendo suas linhas pela
metade do preço de produção durante tempo suficiente para serem liquidadas as
fábricas instaladas no país. E o complexo fabril de Pedra acabou sendo vendido
(1929) em Paislay, Escócia, na sede da Machine Cotton, por 27 mil libras,
seguindo-se sua destruição a marretadas por uma equipe de demolidores
especialmente contratados (1930) e os destroços das máquinas inglesas ali
instaladas, transportados em carretas puxadas por juntas de boi e jogados
penhasco abaixo do São Francisco, cerca de 20 km de distância de Pedra.
Ele tinha seus
defeitos mas o exemplo deixado deveria ser seguido por todo empresário –
responsabilidade social em um tempo que isto era considerado um absurdo.
* Belém do São
Francisco, PE (25/04/1915) - + Salvador, BA
(07/02/1994)
Sérgia Ribeiro
da Silva, mais conhecida como Dadá, foi uma cangaceira, a única mulher a
pegar em armas no bando de Lampião.
Nasceu em
Belém do São Francisco, PE, em 1915, onde viveu seus primeiros anos de
vida e teve algum contato com índios, e uma das filhas do casal Vicente R.
da Silva e Maria R. S. da Silva. A família mudou-se para a Bahia
onde, aos treze anos, foi raptada por Cristino
Gomes da Silva Cleto, o cangaceiro Corisco,
de quem seria prima.
Numa entrevista que concedeu em 1977, ela contou que Lampião chegou
na sua casa, "onde fez uma baderna danada". Na época, Dadá morava
na Fazenda Macucuré, entre os municípios de Glória e Paulo Afonso, no interior
do estado da Bahia.
De repente, disse Dadá, Lampião chamou Corisco e,
em tom de brincadeira, disse para ele: "Como é? Você não
quer desmamar esta menina?". Corisco deu
uma gargalhada, me pegou no colo, me colocou na sela do seu cavalo e saiu
a galope. Depois, lembrou, "foram 12 anos de luta, correndo ou
enfrentando a Polícia por toda parte". Dadá tinha, apenas 13
anos.
Cabocla bonita, esbelta, conheceu o homem da sua vida de forma violenta, em
meio a caatinga árida por onde vivia errante o bando de cangaceiros. Consta que
seu defloramento lhe provocara tanta hemorragia que por pouco não faleceu.
A relação, que
começou instintiva, transformou-se com o tempo. A vida nômade, seguindo o
companheiro, que era o segundo homem, na hierarquia do bando, a chegada dos
filhos, fez com que mais que uma amante Dadá se tornasse a
companheira de Corisco,
com quem, ainda no meio das lutas veio a se casar.
Apesar da
violência do contato inicial, Dadá sempre falou de Corisco com
muita ternura, afirmando: "Nos amamos muito".
Dadá teve sete filhos com Corisco,
que eram ocultamente deixados em casas de parentes para serem criados.
Destes, apenas três sobreviveram, Maria do Carmo, Maria Celeste e Sílvio
Hermano, todos vivos. Também elogiava Lampião,
dizendo que ele era um homem bom.
"Um homem
de palavra, que só falava uma vez e não contava vantagens. Fico triste
quando vejo escreverem coisas que Lampião nunca
fez. Os livros que têm saído sobre o cangaço só apresentam vantagens
da Polícia e coisas terríveis que nunca aconteceram."
O bando de Lampião dividia-se, como forma de defesa, em partes
menores, e a mais importante delas era justamente a chefiada por Corisco.
A esposa tinha uma pistola, que ele dera, para sua defesa pessoal, e
também lhe ensinou a ler, escrever e contar. Ela era a única cangaceira que
carregava um revólver calibre 38 e contribuía na defesa e ataque do grupo.
Algumas outras, segundo ela, possuíam uma "pistolinha de
brincadeira" apenas.
Num dos
ataques feitos pelas volantes, em outubro de 1939, na Fazenda Lagoa da Serra em
Sergipe, o Diabo Louro foi ferido em ambas as mãos, perdendo a
capacidade para atirar. Dadá, então, tornou-se a primeira e única mulher a
tomar parte ativa, e não meramente defensiva, nas lutas do cangaço.
Se o marido
era temido como um dos mais violentos bandoleiros, consta que muitas pessoas
tiveram sua vida poupada graças à intervenção de sua companheira. Dadá também
era chamado "Suçuarana do Cangaço".
Trágico Final
Tendo Lampião sido
executado em 1938, Corisco,
que estava em Alagoas com parte do bando, empreendeu feroz vingança.
Como seus companheiros tiveram as cabeças decepadas, e expostas no Museu
Nina Rodrigues de criminologia, na capital baiana, Corisco também
cortou a cabeça de muitas vítimas, então.
O cangaço
definhava, sobretudo pela disparidade de armamentos: os volantes tinham uma
arma que os cangaceiros nunca conseguiram obter: a metralhadora. A própria
justiça passou a oferecer vantagens para os bandoleiros que se rendessem.
Em
25/05/1940, Corisco e
seu bando foi cercado em Brotas de Macaúbas, pela volante do tenente Zé Rufino.
Dissolveram o bando, e abandonaram as vestes típicas, procurando se passar por
simples retirantes.
Uma rajada da
metralhadora rompeu os intestinos de Corisco. Dadá foi
ferida na perna direita.
O último líder
do cangaço morreu dez horas depois do ataque, sendo enterrado em Miguel Calmon,
no Estado da Bahia, dez dias após, exumado e a cabeça decepada é enviada
ao Museu Nina Rodrigues, junto às demais do bando.
Dadá, colocada
em condições infectas, teve seu ferimento agravado para uma gangrena, que lhe
restou, na prisão, à amputação quase total da perna. Por essa situação, o
célebre rábula baiano Cosme de Farias, representou Dadá na
Justiça, pleiteando sua libertação, em 1942.
Luta Por
Direitos
Dadá passou
a viver em Salvador, lutando para ver a legislação que assegura o respeito aos
mortos fosse cumprida - e a tétrica exposição do Museu Antropológico
Estácio de Lima, localizado no prédio do Instituto Médico Legal Nina
Rodrigues tivesse fim.
Só a 06/02/1969, no governo Luiz Viana Filho, foi que os restos mortais
dos cangaceiros puderam ser inumados definitivamente - tendo, porém, o museu
feito moldes para expor, em substituição.
Por sua luta e representatividade feminina, Dadá foi, na década de
80, homenageada pela Câmara Municipal de Salvador. Na Bahia, que tivera Gláuber Rocha e tantos outros a retratar o cangaço nas
artes, Dadá era a última prova viva a testemunhar o cotidiano de
lutas, dificuldades e, também, de alegrias e divertimentos. Deu muitas
entrevistas, demonstrando sua inteligência e desenvoltura.
Teve sua vida retratada em muitos filmes, sendo que em um deles trabalhou na
Supervisão Histórica e Costumes assegurando a melhor reprodução possível de sua
época e história.
Morte
Sob muitas lágrimas das duas filhas, dos três que teve com Corisco,
dezenas de netos e bisnetos, todos chorando convulsivamente, e aplausos de um
bom número de admiradores, que acorreram ao Cemitério Jardim da Saudade,
foi sepultada, às 18:10 hs, de 07/02/1994, o corpo de Sérgia Silva Chagas,
a Dadá, que morreu, em Salvador, BA, aos 78 anos, na madrugada de
07/02/1994, no Hospital São Rafael, vitimada por um câncer generalizado,
de acordo com a informação do historiador Carlos Cleber.
O corpo de Dadá foi velado na capela do Cemitério Jardim da
Saudade, onde o capelão do cemitério, padre Afonso Gomes, celebrou missa
de corpo presente. O filho Sílvio Hermano, que mora em Alagoas, não chegou
a tempo de assistir ao sepultamento de sua mãe. Entre os admiradores, estiveram
no cemitério o jornalista e juiz classista Oleone Coelho Fontes, autor de
um livro sobre o cangaço, e a ex–vereadora Geracina Aguiar.
Dadá casou-se novamente com um velho pintor de paredes, já falecido, com
quem não teve filhos. Criou, no entanto, muitos meninos e meninas, que
considerava como seus filhos. Mesmo com uma perna só, Dadá costurava
muito, chegando a aposentar-se como costureira. Com sua morte, fecha-se uma das
últimas páginas do cangaço no sertão nordestino.
Dadá Na
Cultura
2005 -
"Dadá, a Mulher de Corisco" (Savaget, Luciana - Ed. DCL)
1996 -
"Corisco & Dadá" (Filme de Rosemberg Cariry)
1982 -
"Gente de Lampião: Dadá e Corisco" (Araújo, Antônio Amaury Corrêa de)
1976 - "A
Mulher no Cangaço" (Curta-metragem de Hermano Penna)
Por Clerisvaldo B.
Chagas, 8 de maio de 2015 - Crônica Nº
1.426
Nos tempos das
vacas gordas, fizemos ao contrário dos que buscam as praias. Fomos conhecer
algumas cidades do alto sertão alagoano, iniciando por Canapi (fundação em
1962). Rua principal formada por estrada de rodagem, bem ensolarada, plana e
simpática, estivemos em um modesto, mas acolhedor hotel e visitamos algumas
casas comerciais. Sua quietude era um ótimo convite ao descanso.
Em
busca do alto sertão. Foto: (blogdobernardino-sertão24horas.
Passamos rumo
a Inhapi, outra cidade sertaneja que nos surpreendeu pela extensão. Fomos
conhecer ali uma fábrica de carros de bois que teimava em resistir ao progresso
da cidade fundada em 1962. Coloquei a fábrica no meu romance (inédito) Fazenda
Lajeado, quando um dos personagens descreve todas as peças do carro e os tipos
de madeiras usadas.
Subimos a
ladeira de terra que leva a Mata Grande. Chegamos pela frente e fomos conhecer
suas ruas estreitas e calçadas, o comércio, o cinema, a cadeia velha, a igreja
e os lugares que botaram Lampião para correr em 1925. Elevada à cidade em 1902,
Mata Grande é bastante ladeirosa. Subimos por uma rua larga onde paramos para
experimentar torreiro (que torresmo!!) feito na hora, em certa residência. Dali
esticamos para o cimo da colina, no final da rua onde havia um engenho
rapadureiro. Para nós santanenses, aquilo era grande novidade. A altitude
sempre deu condições para o fabrico do mel de engenho e rapadura tornando Mata
Grande exportadora desses produtos, primeiramente em lombo de burro. Que
tradição gostosa!
Depois de nos
deliciarmos com pudim em uma casa de lanche bem cuidada, no centro, fomos
conhecer Água Branca, numa das maiores altitudes do estado. Cidade emancipada
em 1875 oferecia uma bela paisagem dos arredores onde deslumbramos terras da
Bahia e Pernambuco. Conhecemos a igreja de altar folheado a ouro, o casarão da
baronesa e gozamos do clima serrano.
Descendo para
Delmiro Gouveia, emancipado em 1952, fizemos uma visita à antiga vila operária,
ao açude e outros pontos considerados históricos.
Após essa
maravilhosa incursão em nosso estado, satisfeitíssimos, retornamos às bases.
Nota: (Talvez
entremos em recesso de uns dez dias a partir de segunda, 11).