*Rangel Alves da Costa
Ao longe já se avista as mudanças na estação. Os jardins secretos começam a se alvoroçar, as flores do bem e do mal começam a exalar seus aromas, os canteiros são tomados de ervas daninhas. Por que assim, alguém perguntaria. Ora, chegando a estação mais triste, mais vergonhosa, mais aviltante, mais mentirosa, mais tudo que há de o impensável acontecer, que é a temporada política, das disputas eleitorais, dos confrontos.
Uma temporada tão surpreendente quanto assustadora que faz o já desacreditado se transformar em indecisão ou, num termo mais conveniente, fazendo o espantoso se tornar em absurdo. Sim, eis que nesta temporada tudo acontece e tudo pode acontecer. Há um nó, um desenlace do nó, um aperto e um desaperto, uma soltura na corda, e cai se mantenha de pé quem estiver mais força e resistência. E mais: paixões que passam a se odiar, amores que se acenam em adeus, despedidas e retornos, afagos e sangramentos.
Nada mais medonhamente instigante que a temporada política que se aproxima. Ainda se aproxima e já produz resultados que seriam surpreendentes senão esperados. Sempre acontece assim. Quando, no passado, amigos, grupos e forças se reuniram para semear os frutos de uma possível vitória, e de mãos dadas, beijos e carinhos, prometeram eterna união, somente os desajuizados sabiam que tudo não passava de uma encenação. Tudo para o momento, apenas. Na política é assim: as amizades, os acertos e os conchavos, sempre têm hora para acontecer e para perdurar. E quanto tempo dura? Somente até o próximo pleito.
Buscando um nome apropriado para tal temporada, outro não é possível encontrar senão a conveniência. Considerando que conveniência significa utilidade, valor, proveito, lucro, vantagem e interesse, logo se tem o retrato emoldurado da estação política. Tudo passa a ocorrer segundo os interesses, as vantagens e os lucros que podem advir. E para tal não há limites morais para a ação. Não cabe ética nem integridade de caráter, não cabe honestidade nem compromisso, não cabe honradez nem a palavra dada, pois no jogo de interesses e espertezas tudo passa a valer a pena.
Neste jogo, ou nos ventos que sopram nesta acintosa estação, o que menos importa é o eleitor, aquele votante que no passado acreditou no compromisso firmado. Na verdade, o eleitor, enquanto pessoa, nunca vale absolutamente nada para o político. Seu único valor é o eleitoral, o de votante. No restante é visto apenas como um fardo que cobra, que quer, que faz o político ser forçado a tirar dinheiro do bolso. Por isso mesmo que sua contagem é sempre feita pelo número de votos, pois o político sempre diz que ali tem tantos votos e nunca que ali possui tantos e tantos amigos que podem votar.
Mas sempre foi assim. Sergipe mesmo é recheado de escabrosos exemplos. Político que acusa o outro de ter matado um familiar e depois ser avistado de mãos dadas com o acusado. Político que achincalha o outro até a raiz mais profunda e depois aparece ao lado deste espalhando sorrisos, apertando mãos e pedindo votos. Político que até processa civil e criminalmente o outro, mas na eleição seguinte já parecem dois apaixonados. Namoram, noivam, casam, juram eterno amor. Mas não há mais divórcios do que na política, e por meio de um processo tão vil como vergonhoso. São esculhambações de parte a parte, são baixarias tamanhas que somente de um desamor político se pode esperar.
Os ventos de agora, antes que cheguem os turbilhões e os vendavais, já mostram os queixumes, os lamentos. É uma seara política onde surgem as reclamações, onde começam a serem mostradas as ingratidões e até as raivas. Os ódios e os arroubos ferinos virão mais tarde, assim que as alianças forem definidas e os antigos enamorados estiverem de mãos separadas, soltas ao próprio destino, e cada mão agora segurando uma pedra para jogar no outro. Não só pedras, mas palavras virulentas, gritos exacerbados, acusações saídas de esgotos e ataques e contra-ataques de toda ordem. Um festim de mentiras, aleivosias, hipocrisias, leviandades, pois tudo farinha do mesmo saco, como dizia Totonho da Lagoinha. Aliás, foi o Velho Totonho que esboçou a mais perfeita definição de casamento político: É a união que já nasce para a traição.
Agora mesmo, em Sergipe, os laços matrimonias da política já estão, na maioria, sendo desfeitos. Os processos estão em andamento e as brigas e as queixas de parte a parte se acirram. Mas a expectativa é tamanha que tem gente já namorando com outras siglas e políticos antes mesmo que os vínculos se quebrem de vez. As conveniências mandam que o melhor agora seja apenas se vitimizar, dizer que está sendo traído e assim passar para a opinião pública a ideia de coerência. Contudo, todos sabem que nesse metiê não há vítimas nem culpados, mas apenas espertos tentando atrair atenções.
E logo novos namoros começarão, novas juras serão feitas e os afagos se darão de parte a parte. E de mãos dadas se mostrarão junto aos eleitores. Mas tudo com prazo de validade. Até somente os próximos pleitos ou mesmo antes. Quando o vencedor renega o apoiador, então o romance está desfeito.
Escritor
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