Por Rostand Medeiros
No próximo
sábado, dia 27 de agosto de 2016, ás 15:30 será celebrada no local histórico
dos acontecimentos uma missa na propriedade Tapera dos Gilo, Na zona rural do
município de Floresta, Pernambuco.
Cemitério
onde descansam eternamente os membros da família Gilo massacrados por Lampião
em 1926.
É antes de
tudo uma missa para honrar os que tombaram diante dos cangaceiros de Lampião no
maior massacre da história do Cangaço.
Mas como
ocorreu este episódio?
Próximo a
cidade pernambucana de Floresta existe uma antiga propriedade rural conhecida
como Tapera dos Gilo. Uma fazenda normal, até mesmo comum diante das muitas
existentes na região sertaneja nordestina. Mas coube ao destino que neste local
ocorresse em 1926 um dos mais cruéis ataques de cangaceiros a famílias na
história deste movimento.
Jornal da
época comentado o episódio
Segundo nós
conta o nobre escritor João de Souza Lima, em dezembro de 1925 o senhor Gilo
Donato do Nascimento descobriu que doze burros de sua propriedade tinham
desaparecido. Então Manoel Gilo, filho mais velho de Gilo Donato, junto com
outras pessoas, seguiu a pista dos animais até encontrá-los a quase 400
quilômetros de distância, em Lavras de Mangabeira, no Ceará.
Os animais,
valiosos nas propriedades rurais do sertão do passado, estavam na posse do
coronel Raimundo Augusto, que havia comprado as alimárias de Horácio Grande.
Lampião o Rei
do Cangaço.
Horácio Grande
foi processado e preso por esse roubo e em consequência disso jurou matar Gilo
Donato e seu filho.
E não ficou só
na promessa. Tempos depois Horácio realizou um frustrado ataque a residência de
Gilo, onde saiu baleado e perdeu o comparsa apelidado de Brasa
Viva. Diante da situação, do poder de fogo e valentia da família Gilo,
Horácio Grande entrou no bando de Lampião desejoso de perpetrar sua vingança.
O escritor
Marcos Antonio de Sá explica como se deu o ataque da Tapera dos Gilo.
Através de sua
irmã e de sua esposa, Horácio as orientou para que produzissem cartas falsas,
aparentemente escritas por Gilo Donato, afrontando severamente o “Rei do
Cangaço”. Quem já leu qualquer texto sobre a vida de Lampião sabe que ele era
muito rancoroso com aqueles que lhe traiam e lhe difamavam. Onde sempre o
castigo para estes faltosos era a morte, normalmente das formas mais cruéis.
No dia 26 de
agosto de 1926, uma quinta feira, às quatro horas da manhã, Lampião com um
grupo em torno de 120 cangaceiros, atacou a fazenda Tapera.
Marcos Antonio
de Sá mostra uma antigas estaca de uma das casas atacadas e destruídas pelos
cangaceiros no ataque a Tapera dos Gilo.
Um longo
tiroteio rompeu o silêncio do local. Por horas as pessoas da vizinha Floresta
ouviram os tiros ecoando. O capitão Antônio Muniz de Farias, comandante
das forças volantes que estavam na cidade, não mostrou coragem pra ir lutar
contra os cangaceiros e defender a desesperada família Gilo.
Quando a casa
da sede se encontrava quase totalmente destruída devido aos milhares de balaços
recebidos e vários mortos banhavam de sangue seus compartimentos, Lampião
comandou a invasão da residência.
Região da
Tapera dos Gilo.
Manoel Gilo
foi capturado ainda vivo, estando morto seu pai Gilo Donato, o irmão Evaristo,
o cunhado Joaquim Damião e Ângelo de Rufina. Na estrada ficaram mortos Permino,
Henrique (casado com uma irmã de Gilo), Zé Pedro, Ernesto (da fazenda São
Pedro), Janjão, Alexandre Ciríaco (morto quando tentava defender os Gilos e que
tinha vindo da fazenda São Pedro), Pedro Alexandre (na Barra do Silva).
A volante do
sargento Manoel Neto, um dos mais ferozes perseguidores de Lampião, foi tentar
salvar a família Gilo daquele massacre. Mesmo este militar estando baleado
e com poucos homens sob seu comando, Neto contrariou as ordens do capitão Muniz
e foi se bater com os cangaceiros de Lampião no Campo da Honra.
Djanilson
Pedro, neto de Cassimiro Gilo, no local onde tombou o soldado João Ferreira de
Paula, da volante de Manoel Neto (A quixabeira do soldado).
Como resultado
a volante perdeu o soldado João Ferreira de Paula, que tombou morto embaixo de
uma quixabeira, hoje conhecida como “Quixabeira do soldado”. Já tendo perdido
um dos seus comandados e como a quantidade de cangaceiros era muito superior ao
grupo de policiais, o valente e famoso “Mané Neto” não teve alternativa se não
comandar uma retirada.
Ao final do
tiroteio, Lampião então extremamente enfurecido, pegou o sobrevivente Manoel
Gilo e perguntou o porquê dos seus familiares enviarem as cartas ofensivas e
este então respondeu que eles eram analfabetos e não sabiam escrever. Neste
momento, diante da surpresa geral, Horácio Grande pegou a sua pistola e atirou
na cabeça do inimigo, matando Manoel Gilo. Só ai Lampião percebeu a trama que
Horácio o havia colocado.
Percorrendo as
trilhas do combate.
Daquele cruel
morticínio pereceram entre familiares dos Gilo e seus amigos, além do soldado
da volante de Manoel Neto, um total de treze pessoas. Consta que os cangaceiros
perderam quatro de seus homens.
Da família só
escapou o jovem Cassimiro Gilo, então com 15 anos de idade, que havia ido
comprar açúcar e rapadura no Ceará.
Em Floresta
estivemos juntos dos maravilhosos amigos (da esq. para dir.) Cristiano Luiz
Feitosa Ferraz, Djanilson Pedro e Marcos Antonio de Sá, o conhecido como
“Marcos De Carmelita”.
Recentemente,
junto com o artista plástico Sérgio Azol, e através do bondoso acolhimento na
cidade de Floresta dos amigos escritores Marcos Antonio de Sá, conhecido como
“Marcos De Carmelita”, e Cristiano Luiz Feitosa Ferraz, tive a grata
oportunidade de conhecer a propriedade Tapera dos Gilo. Além de percorrer os
locais do combate, tive a oportunidade de apertar a mão da Senhora Djalmira
Maria de Sá, a Dona Dejinha, e seu filho Djanilson Pedro, o “Pané”. Em nossos
diálogos fiquei impressionado como eles narram com extrema clareza e emoção os
fatos transmitidos por Cassimiro Gilo, mantendo viva a memória daquele dia
extremamente cruel para sua família.
Os autores do
interessante livro “As cruzes do Cangaço – Os fatos e personagens de Floresta –
PE”, entregando um exemplar do seu trabalho aos descendentes da família Gilo,
na fazenda Tapera dos Gilo, local do maior massacre da história do cangaço,
fato extensamente narrado no livro.
Marcos Antonio
de Sá e Cristiano Luiz Feitosa Ferraz lançaram recentemente o interessante
livro “As cruzes do Cangaço – Os fatos e personagens de Floresta – PE”, onde
esta trágica história é narrada com extrema grande riqueza de detalhes. Marcos
e Cristiano são dois dos organizadores desta missa.
É inegável que
a História do cangaço é uma das grandes referências da identidade dos
nordestinos e constitui um elemento formador das formas de representação
cultural da região, sendo atualmente extensamente utilizado como verdadeira
marca do Nordeste.
Apesar de toda
importância histórica deste movimento, alguns dos seus principais episódios se
encontram praticamente esquecidos. Neste sentido eu acredito que este evento é
uma maravilhosa ferramenta que muito vai ajudar a difundir em âmbito local,
regional e nacional a verdadeira dimensão do Massacre da Tapera dos Gilo.
Além de
homenagear e destacar os membros desta família que tombaram neste combate, esta
missa certamente vai estimular a população da região a conhecer com maior
profundidade os episódios envolvendo os fatos históricos ocorridos No dia 26 de
agosto de 1926.
Extraído do blog Tok de História do historiógrafo e pesquisador do cangaço Rostand Medeiros.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com