Autor e fotos – Rostand Medeiros
Em 1995 Natal sediou um exercício aéreo de grande importância para a FAB, mas que ficou marcado por uma terrível tragédia.
O
inconfundível Lockheed C-5 Galaxy da USAF, no apoio aos aviões estrangeiros em
Natal – CLIQUE PARA AMPLIAR AS FOTOS.
Em 1994 a USAF
(United States Air Force) fez um convite à FAB (Força Aérea Brasileira) para
participar do conceituado exercício de combate aéreo Red Flag, a mais realística
guerra aérea simulada do mundo, realizada na Base Aérea de Nellis, no deserto
da Nevada, Estados Unidos. Mas a FAB ainda não estava pronta para o desafio.
Avião de carga
Lockheed C-130 Hércules, da FAB, conhecido como “Gordo”, sobrevoando a pista da
Base Aérea de Natal
Entretanto a
nossa Força Aérea desejava ampliar este maior contato com outras Forças amigas
e conseguir um maior aprimoramento para seus pilotos. Assim a FAB, junto com a
USAF, participou em 1994 da Operação Tigre I, realizada em Porto Rico, no
Caribe. O próximo exercício ocorreu em outubro de 1995 no Brasil, mais
precisamente em Natal, cidade de tantas tradições em termos de história
aeronáutica.
F-16 do 198th
Fighter Squadron que esteve em Natal em 1995
A USAF
mobilizou para o exercício aéreo Tigre II seis caças modelo General Dynamics
F-16 A Block 15 ADF Fighting Falcon e dois modelos F-16B de treinamento. Estas
aeronaves pertenciam ao 198th Fighter Squadron (198th FS), que na época ficava
baseado na Muñiz Air National Guard Base, na cidade de Carolina, na mesma área
do Aeroporto Internacional Luiz Muñoz Marin, a 14 quilômetros de San Juan,
capital de Porto Rico.
Emblema, ou
“bolacha” como dizem os aviadores, do 198th Fighter Squadron.
A escolha de
Natal como local do exercício Tigre II se deveu a vários fatores, entre estes o
da cidade está localizada em uma região com baixo fluxo de voos comerciais.
Outros detalhes que destacaram a capital potiguar como mais favorável à
realização daquele tipo de exercício (e dos exercícios CRUZEX que viriam no
futuro) incluíam as condições meteorológicas positivas, infraestrutura
aeronáutica com alta capacidade de absorção de meios de pessoal e de material
(a Base Aérea de Natal possui três pistas de pouso), além da capacidade
hoteleira da cidade. Foi investida uma grande quantidade de recursos para
receber um exercício desse porte.
F-5 brasileiro
e suas garras.
No dia 19 de
outubro os membros do 198th Fighter Squadron, conhecidos como “Bucaneros”,
passaram a dividir os céus de Natal junto com vários aviões da FAB, como os
caças Northrop F-5E Tiger II, do 1º Grupo de Aviação de Caça (1º GAvCa), da
Base Aérea de Santa Cruz (RJ) e do 1º Esquadrão do 14º Grupo de Aviação (1º/14º
GAv), o Esquadrão Pampa, da Base Aérea de Canoas (RS).
O eterno
Mirage III BR
Outra aeronave
que esteve em Natal foi os Mirage IIIE, designados na FAB como F-103, do 1º
Grupo de Defesa Aérea (1º GDA), o Esquadrão Jaguar, de Anápolis (GO).
Outro avião do inventário da Força Aérea Brasileira presente neste exercício
foram os aviões de ataque Embraer A-1A, do 1° Esquadrão do 16° Grupo de Aviação
(1º/16º GAv), o conhecido Esquadrão Adelphi, que também era oriundo da Base
Aérea de Santa Cruz (RJ), como os F-5 do 1º GAvCa.
Embraer A-1A,
do 1° Esquadrão do 16° Grupo de Aviação (1º/16º GAv), o conhecido Esquadrão
Adelphi
Durante vários
dias a rotina de Natal ficou alterada, um tanto barulhenta com a passagem de
tantos aviões de caça sobre a cabeça dos seus habitantes. Para os natalenses
fissurados por aviação, como o autor deste texto, aqueles dias foram de
entortar o pescoço de tanto olhar para os céus.
Um avião de
carga Lockheed C-141 Starlifter, do Military Air Transport Service (MATS),
apoiando os caças norte-americanos em Natal. Ao fundo um Boeing 737 da antiga
Varig.
As informações
passadas pelos militares da Base Aérea de Natal foi que, apesar da defasagem
material do equipamento da FAB, os pilotos brasileiros mostraram garra e
competência durante o desenvolvimento do exercício aéreo Tigre II, tendo a
atuação do nosso pessoal sido elogiada pelos aviadores norte-americanos.
Grande
movimento de pessoas.
Os esquadrões
1º GAvC e 1º/16º GAv, em operações contra os F-16 tiveram uma ótima atuação,
onde os caças da USAF não lograram êxito em abater os nossos A-1, apelidando-os
de “The bees” (As abelhas). Estas aeronaves da FAB não apenas conseguiram
realizar seus ataques simulados como também venceram em combate, mais de uma
vez, caças F-16 que tentaram interceptá-los.
Fuselagem
delgada de um Mirage III da FAB.
Mas muitos dos
que tinham conhecimento sobre aviação na cidade comentaram que, apesar dos F-16
da USAF serem aparelhos magníficos, aquele esquadrão não era da “primeira
linha” de combate da aviação militar dos Estados Unidos. Mas a história do
198th Fighter Squadron parecia indicar algo bem diferente.
O grande avião
de transporte Lockheed C-5 Galaxy, da USAF, ao lado dos Embraer T-27 Tucanos da
Esquadrilha da Fumaça, no dia dos portões abertos do exercício Tigre II, em
Natal, no dia 27 de outubro de 1995.
Ele foi criado
em 1944, durante a Segunda Guerra Mundial. Era então designado 463th Fighter
Squadron, sendo sua primeira base em Peterson Field, Colorado. Durante quatro
meses os seus pilotos receberam treinamento de combate para escolta de longo
alcance em caças Republic P-47N Thunderbolt. Em junho de 1945 o esquadrão ficou
baseado em Okinawa, como parte da 507th Fighter Group e preparado para a
invasão do Japão, juntamente com os esquadrões de caça 413 e 414, também
equipados com P-47N.
As linhas da
fuselagem de um F-5 brasileiro
Em 1 de Julho
de 1945 o pessoal do 463th Fighter Squadron começou a voar a partir da base de
Ie Shima, com o objetivo de atacar navios inimigos, pontes ferroviárias,
aeroportos, fábricas e quartéis no Japão, Coréia e China. Em 8 de agosto
de 1945, alguns P-47N do 463th escoltavam bombardeiros B-29 em um ataque,
quando se envolveram em um renhido combate aéreo contra caças japoneses, abatendo
vários deles.
Um modelo
General Dynamics F-16 A Block 15 ADF Fighting Falcon
O esquadrão
permaneceu em Okinawa até o fim da Guerra, sendo desativado em maio 1946. Logo
voltou a ser ativado, passando a ser designado como 198th Fighter Squadron,
tendo como nova casa a ilha de Porto Rico e ainda operando os confiáveis P-47N
Thunderbolts.
Cabine de um
F-5 brasileiro
Com o passar
dos anos este esquadrão recebeu caças North American F-86H Sabre, Lockheed
F-104 Starfighter, Vought A-7 Corsair II e os F-16 que estiveram em Natal.
No sábado, 27
de outubro de 1995, foi realizado uma grande festividade na Base Aérea de
Natal, com os portões abertos a comunidade natalenses. Jornais da época
comentaram que cerca de 20.000 pessoas estiveram presentes. Já eu penso que o
número era bem maior.
Armas do A-1A
Ocorreram
várias passagens de aviões, rasantes sensacionais (a de um Mirage foi
incrível), até um jato comercial da TAM passou baixo sobre a pista de pouso
antes de pousar definitivamente.
Em certa hora
um F-5 brasileiro decolou. Apenas mais outro avião entre tantos que decolavam e
realizavam manobras naquele dia bem movimentado. O caça subiu, fez um giro
ainda com os trens de pouso abaixados, situação que achei interessante e
diferente das outras decolagens. Parecia que aquele piloto prometia algo interessante.
O F-5 então
subiu apontando para o firmamento, mas parou a ascensão de forma um tanto
estranha e se voltou em direção ao solo. No ponto em que eu estava perdi a
visão do caça devido à existência de hangares e o que vi na sequência foi uma
bola de fogo no horizonte, para depois escutar uma explosão que não foi tão
ensurdecedora, mas indicativa do desastre. Alguém acabava de perder a vida.
(Veja o vídeo de uma reportagem da TV Globo sobre este acidente)
Detalhes de um
F-16 “Bucanero”
Estava com a
câmera na mão acompanhando o voo, mas fiquei completamente estático diante do
que ocorria longe. Soube depois que o piloto falecido era o capitão aviador
Mauro Fernandes Naumann. O trite foi que sua esposa e três filhos estavam na
plateia assistindo as evoluções. Terrível!
Dois Embraer
T-27 Tucanos sobrevoando o evento.
Apesar desta
tragédia é inegável que aquele exercício aéreo ajudou a preparar de maneira
positiva os pilotos de caça brasileiros. Em 1998 seis A-1 do 1°/16° Grupo de
Aviação, o Esquadrão Adelphi, representaram a Força Aérea Brasileira, pela
primeira vez, na operação Red Flag. Em um ambiente repleto de caças F-15 Eagle,
F-16, F-18 Hornet, F-5 Tiger III e sistemas que simulavam presença de baterias
antiaéreas de mísseis como SA-6, SA-3 e Roland, os A-1 conseguiram sucesso nas
suas missões de ataque e sobreviver às ameaças que representavam o que havia de
mais moderno na guerra aérea no mundo.
Extraído do blog Tok de História do historiógrafo e pesquisador do cangaço Rostand Medeiros