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segunda-feira, 17 de agosto de 2020

2ª EDIÇÃO FLORO NOVAIS HERÓI OU BANDIDO?


Mais um livro na praça: FLORO NOVAIS: Herói ou Bandido? De Clerisvaldo B. Chagas & França Filho. Este livro estará disponível a partir de amanhã no Cariri Cangaço São José do Belmonte e segunda feira dia 15/10 Para todo Brasil. 

Preço a combinar com Francisco Pereira Lima - 124 páginas. 

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OS PEQUENOS

Por Cristinao Ferraz
Cristiano Ferraz  e Manoel Severo

O sertão pernambucano forneceu muitos homens para as fileiras dos grupos de cangaceiros e volantes. A região banhada pelo rio Moxotó, riacho do Navio e rio Pajeú se destacou neste sentido. Entre as figuras de destaque como cangaceiros podemos citar Antônio Silvino, Lampião e Cassimiro Honório. Como volantes podemos citar o Major Teophanes Ferraz Torres e os nazarenos.
Cassimiro Gomes da Silva, ou Cassimiro Honório (falecido em 17/11/1920 na sua fazenda Riacho do Meio), vivia em terras da fazenda Juá (ou Barra do Juá) que ficava em uma caatinga de difícil acesso entre as cidades de Floresta e Betânia (hoje emancipada) na ribeira do Navio. Honório chefiou homens conhecidos pela bravura, destacando-se os irmãos Joaquim, João e Luiz Rajado, Antônio Matilde, Izídio e Antônio Honorato, Angelo Carquejo (Anjo Novo), Marcula do Juá, Joaquim Cariri (seu genro, casado com Melania, que fora roubada por Zé de Souza) e os Pequenos, ou Caboclos do aldeamento Jacaré (às margens do riacho de mesmo nome em Floresta) e da Fazenda Saco (hoje Betânia à época pertencente a Floresta).

Serrote usado por Lampião no Fogo das Caraíbas

Faziam parte do grupo dos Pequenos o velho Firmino, seus filhos Manoel (e seu filho Antônio), José, Luiz (conhecido como Formiga) e Jesuíno Pequeno, Abílio e Quirino (presos em 21 de maio de 1921, em Mata Grande-AL), Antônio Marreca (participou do ataque à Serra Vermelha e à fazenda Tapera, ocorridos em agosto de 1926), Gregório Pequeno (comparsa do célebre José Pequeno) e Januário Sebastião Souza (O Januário Pequeno), estes dois últimos, presos em Floresta em maio de 1927.
Além de Cassimiro Honório, os Pequenos também serviram a Lampião e a Ildefonso Ferraz em algumas oportunidades. A primeira questão que se conhece enfrentada pelo grupo ocorreu em 1919 e envolveu Antônio Tomás, proprietário da fazenda Craibeiro, vizinha ao aldeamento Jacaré. Conta-se que Tomás à época tinha 40 anos e era casado com uma senhora bem mais jovem e muito simpática. O casal não tinha filhos. Certo dia, Jesuíno Pequeno, filho do velho Firmino, um dos chefes da família, encontrando a esposa de Antônio Tomas sozinha, fez-lhe uma proposta indecorosa. A mulher repeliu o insulto e contou ao marido.
Sepultura das vítimas do combate das Caraíbas

Antônio Tomás procurou o velho Firmino e o encontrou na roça, consertando uma cerca. Explicou-lhe o ocorrido, pediu-lhe que refletisse sobre o caso e pelo menos afastasse o filho dali por algum tempo. O velho Firmino não se alterou enquanto ouvia a narrativa, continuando o serviço sem sequer olhar para ele, o que já demonstrava desatenção. Terminando a narrativa, Tomás viu o interlocutor levantar-se e encará-lo dizendo:
- Antônio Tomás, o Jesuíno foi uma besta! Não soube fazer o serviço como devia ser feito!... Se tivesse sido comigo, você hoje estaria contando a história de outra forme. Porque eu teria resolvido logo o caso a meu favor, por bem ou por mal. Quero dizer, teria passado logo da palavra à ação. Está entendendo?! E levou o punho cerrado às proximidades do rosto do interlocutor, acrescentando com arrogância ameaçadora:
- E vou lhe dizer mais uma coisa, curta e certa, Antônio Tomás! Você não assinará mais bezerro no Craibeiro!... Creio que me fiz entender, e por enquanto é só!...
Antônio Tomás perplexo, sentiu fugir-lhe o sangue das veias e a terra dos pés. O fazendeiro compreendia o perigo que representava abrir luta contra tal corja de selvagens, porém com sua honra em jogo, as cartas estavam lançadas. Fazendo um esforço sobre-humano para conservar, não sua calma habitual, mas não desesperar, retrucou ao agressivo e provocador velhote:
- Na verdade, velho Firmino, eu o entendi muito bem! Agora, mais do que nunca, eu me convenci de que não assinarei mais bezerro no Craibeiro! Mas vou lhe dizer também “uma coisa curta e certa”: é que um caboclo eu assinarei!...E retirou-se desapontado. Chegando em casa, armou-se e voltou ao encontro do velho Firmino, descarregando-lhe o rifle seis vezes consecutivas.Antônio Tomás tinha muitos moradores a seu serviço e partidários, os quais, como não podia deixar de ser colocaram-se a seu lado, dispostos a partilhar da sorte que lhe coubesse.
Antônio Tomás fuzilou o velho Firmino no final da manhã, e às primeiras da tarde os Caboclos cercaram-lhe a casa em numeroso grupo e fechou-se o tempo. Travou-se, então, furioso tiroteio que prolongou-se pelo resto do dia sem intervalo. No início da noite levantaram o assédio levando quatro mortos e uma dezena de feridos. Os sitiados, em boa posição defensiva, tiveram apenas um morto e três feridos sem gravidade.
Para dirigir as hostilidades, assumiu o comando da quadrilha o velho Manoel pequeno, um dos mais conceituados daquela tribo. Em menos de dois meses o fazendeiro foi derrotado em combates encarniçados e sucessivos, com muitas baixas de parte a parte. De um dos últimos tiroteios, Antônio Tomás saiu gravemente ferido, sendo obrigado a procurar refúgio fora do alcance do inimigo. Suas propriedades ficaram abandonadas à mercê dos adversários que saquearam tudo que foi possível, incendiando ainda aquilo que não podiam carregar. A propriedade de Antônio Tomás foi completamente arrasada. O gado vacum e caprino foi arrebanhado pelos inimigos para a cidade de Mata Grande, em Alagoas, onde tudo foi apurado livremente durante semanas.
Cariri Cangaço na Fazenda Favela

Em Mata Grande, num pequeno sítio chamado Capim-Açu, vivia o casal de septuagenários Antônio Benvindo-Maria Coité. Dada a vida de recolhimento que levavam os dois velhinhos, criara-se em torno deles a lenda de possuidores de dinheiro amealhado. Vivia ali perto um indivíduo de nome Alexandre de Tal, elemento visivelmente indesejável, e portador dos piores antecedentes. Este, ouvindo falar na suposta “fortuna” do casal de anciãos premeditou assalta-lo. Para isso juntou-se a outro desclassificado de nome Miguel, cuja melhor credencial que podia apresentar era a de haver sido expulso por Sinhô Pereira, a bem da moral do bando.
Numa manhã de sábado de agosto de 1919, os dois facínoras, Alexandre e Miguel, invadiram a residência do casal de velhinhos e os subjugaram na ponta dos punhais, exigindo-lhes a entrega do dinheiro que diziam saber possuir. Os pobres velhos juraram nada possuir do que alegavam. Findaram assassinados a tiros e facadas.
Era dia de feira em Mata Grande e o fato foi imediatamente levado ao conhecimento das autoridades pelos vizinhos do casal. Na ocasião encontrava-se na cidade um grupo de quarenta e tantos caboclos, como sempre, vendendo a criação e os haveres roubados a Antônio Tomás. Um deles, Antônio Pequeno, ouviu o relato que faziam da ocorrência à polícia. Vendo que os responsáveis pela segurança faziam corpo mole, se ofereceu para seguir sozinho no encalço dos assassinos. O oferecimento foi aceito pelo substituto do tenente Agripino, atual comandante do destacamento.


Antônio Pequeno saiu por volta do meio dia. Após pegar a pista dos bandidos, andou a tarde toda, ora pela estrada, ora pelo mato rastejando. Conhecedor profundo da terra, onde anoiteceu pernoitou. Sabia que os fugitivos não agiriam diferente. Ao amanhecer, quando a claridade já lhe permitia distinguir os rastros, reiniciou a marcha. Seguia as pegadas dos bandidos já a cinco ou seis léguas, agora definitivamente embrenhados na caatinga. Tendo andado pouco mais de uma hora, encontrou o local em que os dois haviam dormido. Estavam mais perto do que esperava.
Era por volta de sete e meia e a essa altura já haviam passado além da povoação de Espírito Santo. A região continuava plana e arenosa, só que agora a vegetação mudara um pouco, tornando-se menos densa e variada. Era composta de Catingueira, Jurema-preta, Quebra-faca, rompe gibão e algumas bromeliáceas. Foi então, ao sair nessa clareira, que Antônio Pequeno surpreendeu os dois celerados. O bandido assestou o rifle nas costas de Miguel, por ser este o de maior periculosidade. Alexandre vacilou entre a fuga e a reação e ocorreu-lhe pegar o rifle do companheiro, visto estar armado de bacamarte. Mas a arma ficara presa sob o corpo deste que caíra de costas. Diante da impossibilidade de pegar a arma, disparou o bacamarte a esmo e correu caatinga adentro escapando de ser morto.
Antônio Pequeno então, aproximou-se do local onde Miguel agonizava, disparou-lhe mais quatro tiros e tirou-lhe os pertences deixando o corpo insepulto. Retornando a Mata Grande entregou um rifle papo-amarelo de doze repetições, calibre 44; dois bornais contendo 118 cartuchos do mesmo calibre; um punhal de cinquenta centímetros de lâmina com a respectiva bainha; um par de alpercatas de rabicho e um chapéu de couro ao tenente Laje (substituto de Agripino) comandante do destacamento policial. Pouco tempo após esses episódios, os irmãos Ferreira, Virgolino, Antônio e Livino se uniram aos Pequenos após o ataque a Pariconha e a morte de José Ferreira. Não permaneceram juntos por muito tempo, embora, esporadicamente se juntassem em algumas ações.
Uma dessas ações foi o ataque ao fazendeiro Marcolino Folhiço, a quem Manoel Pequeno havia enviado uma carta exigindo a quantia de cinquenta mil réis. A resposta foi que não mandaria o dinheiro porque tinha rifle e balas pra se defender. Os Folhiços residiam em duas fazendas na região: Jurema e Tabuleiro. Na fazenda Tabuleiro, os irmãos Manoel, Cícero, Constantino e Pedro Marcolino de Souza escaparam de um massacre por parte de Lampião e dos Pequenos que os atacaram com violência. Dali os cangaceiros seguiram para a fazenda Jurema onde assassinaram Marcolino Folhiço e seu filho.

Cristiano Ferraz no Cariri Cangaço Floresta

Pouco depois da morte de Marcolino ocorreu o combate das Caraíbas em quatro de fevereiro de 1926 (quinta-feira) contra as volantes de Higino José Belarmino e Optato Gueiros. Destas faziam parte diversos nazarenos entre os quais estavam Manoel Neto, Manoel Flor, Euclides Flor e Davi Jurubeba. O combate durou do início da manhã até o final da tarde.
Os cangaceiros emboscaram a volante dividindo-se em três grupos, tendo um deles, comandado por Lampião, ficado num serrote junto à margem oposta do riacho São Brás, outro grupo, do qual fazia parte Manoel Pequeno, ficou em frente a este junto às barrancas do lado oposto do riacho próximo à estrada por onde a volante passaria e outro escondido na caatinga. As forças se viram cercadas pelos cangaceiros em três frentes de fogo num ataque envolvente e minuciosamente planejado por Lampião.
Manoel Neto aproximou-se pelo lado esquerdo do riacho, na direção do serrote, onde estavam Lampião e Antônio Ferreira, e, assim que os cangaceiros o viram ficaram chamando o militar, tentando se passar por companheiros. Manoel percebeu a armação, sendo avisado também do perigo pelo soldado João Jurubeba de Sá Nogueira, o “João Gato”, da família nazarena. Mesmo sabendo da presença dos bandidos no serrote, Manoel Neto entrou em combate se expondo demais, sendo alvejado por um disparo no braço direito, colocando-o fora de combate. 
A luta tornou-se mais acirrada, com os cangaceiros entrincheirados no serrote, respondendo aos tiros da Volante. Euclides Flor gritou para seus companheiros que preferiria morrer que deixar os cangaceiros donos da situação e que iria desalojá-los. Deixou Manoel Flor com cinco soldados enfrentando os bandidos e seguiu com outros nove para a perigosa empreitada.

O grupo de Euclides adiantou-se por dentro do córrego, fez uma manobra rodeando uma elevação chegando por trás dos facínoras, atacando pela retaguarda. Com o tiroteio da Volante Lampião decidiu abandonar o esconderijo e fugir. Após a saída do bando, a Volante contou suas perdas, totalizando três soldados mortos: Antônio Benedito Mendes (de Carnaíba-PE), o florestano Aristides Panta da Silva e Benedito Bezerra de Vasconcelos. Além dos mortos, sete militares foram feridos: o Tenente Higino, o Anspeçada Manoel de Souza Neto, o “Mané Neto”, o rastejador Antônio Joaquim dos Santos, o “Batoque”, João Pereira dos Santos, Altino Gomes de Sá, João Cavalcanti e João Pinheiro Costa.
Os corpos dos soldados mortos foram sepultados na margem esquerda do riacho da Maravilha, próximo ao local onde o riacho do Jacaré se une àquele. O riacho da Maravilha é atualmente a divisa entre os municípios de Floresta e Betânia. Outro episódio envolvendo os Pequeno foi a morte de José Pequeno na fazenda Favela em Floresta. O cangaceiro enfrentou duas vezes alguns “cabras de Ildefonso”. O primeiro combate se deu no córrego do Vitalino (nome do cangaceiro morto que acabou dando nome ao local). Esse combate foi coordenado por Toinho Ferraz, irmão de Ildefonso, que não concordava com a constante passagem dos cangaceiros por ali.
Zé Pequeno reagiu levando o rifle do companheiro, após ser baleado na mão. Na fuga, passou na fazenda Poço do Boi de Zeca da Barra, onde pediu uma cebola, que cortou e amarrou na mão ferida. No segundo combate, Zé Pequeno não teve a mesma sorte.  De passagem pela fazenda Favela, arranchou com a companheira Enedina, outra mulher e o cabra Aristides (alcunhado Fogo Pagou) perto da casa do proprietário, José Quincas de Souza Ferraz. Sinhô, filho de José Quincas, foi até  a fazenda Curral Novo e avisou a Ildefonso Ferraz, que mandou chamar Zé Liberato na fazenda Jatobá, de Manoel Marques de Sá (Sinô).
Agora residindo na fazenda Jatobá, Zé Liberato era convocado por Ildefonso Ferraz para ajudar a eliminar o cangaceiro Zé Pequeno. Quando ia saindo, alguém notou que estava calçando uma alpercata velha, sem rabicho, e ofereceu-lhe outra. Liberato recusou, dizendo não ser necessário. E explicou:
            - Eu não vou lá pra correr; essa serve...
Um grupo foi formado e ficou à espera dos cangaceiros em um local previamente combinado com Sinhô que voltou ao rancho dos cangaceiros e os convenceu a se retirar dali, pois aquele local era perigoso devido ao trânsito de pessoas e ser muito próximo à sede da fazenda. Os bandidos então se deslocaram até o local onde estavam Zé Liberato e seus companheiros emboscados à sua espera.
Sinhô os deixou arranchados, e voltou para casa. Ildefonso tinha dito que quem conseguisse pegar primeiro as armas dos cangaceiros ficaria com elas. Avistados os bandidos — dois homens e duas mulheres —, abriram fogo e rapidamente foram mortos o cangaceiro Zé Pequeno e seu companheiro Aristides que ainda conseguiu correr mas caiu dentro de um banco de macambira de onde foi retirado. Liberato avançou. Foi o primeiro a chegar onde ficaram estendidos os corpos e logo se apoderou de um rifle que pertencia a Zé Pequeno. Uma das mulheres (Enedina), de uma valentia indescritível, foi presa. 
Ângelo da Jia chegou poucos momentos depois. Reconheceu a arma tomada dos cangaceiros. Disse ser dele e a pediu. Liberato não quis entregar, só o fazendo após a intervenção de Ildefonso, que lhe prometeu outro rifle. Os corpos dos dois cangaceiros mortos foram levados para Floresta em lombo de burro, sendo apresentados à polícia e sepultados.

Cristiano Luiz Feitosa Ferraz, Pesquisador e Escritor
Floresta, Pernambuco - Maio de 2020
Bibliografia Consultada: Carvalho, Rodrigues de - Serrote Preto, Lampião e seus sequazes. 2 ed., sedegra s.a. - Gráficos e Editores. Rio, 1974
Ferraz, Marilourdes - O Canto do Acauã, Das memórias do Cel. Manoel de Souza Ferraz (Coronel Manoel Flor). 3 ed., Comunigraf Editora. Recife, 2011
Ferraz, Cristiano Luiz Feitosa e Sá, Marcos Antônio de - As Cruzes do Cangaço – fatos e personagens de Floresta. TDA Gráf., 2016


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93 ANOS DEPOIS, CARTA QUE REPRESENTA RESISTÊNCIA DE MOSSORÓ AO BANDO DO CANGACEIRO LAMPIÃO É ENCONTRADA POR:G1

Todos os anos, Mossoró, no Oeste potiguar, se enche de festa no mês de junho. Além de comemorar o período de São João, a cidade relembra através do espetáculo "Chuva de Bala", a resistência do seu povo a Virgulino Ferreira da Silva, o temido Lampião - ato que marcou, para alguns historiadores, o início do declínio daquele que ficou conhecido como rei do cangaço. A batalha aconteceu em 1927 e o bando de cangaceiros saiu fugido da região.
Em 2020, a festa não vai ser realizada por causa da pandemia do novo coronavírus. Mas os pesquisadores do tema estão muito mais entusiasmados pelo encontro de uma carta que foi escrita pelo prefeito coronel Rodolpho Fernandes em resposta ao bando de Lampião. Ela estava endereçada ao coronel Antonio Gurgel, que no momento das negociações, era refém do bando e foi escrita, provavelmente, no próprio dia 13 de junho de 1927, data em o ataque ocorreu.

O documento foi encontrado pelo professor, jornalista e escritor sergipano Robério Santos, que é um entusiasta do assunto e tem seis livros publicados sobre o cangaço. O documento chegou a ele em maio, durante sua pesquisa para a publicação da primeira de uma série de cinco obras que pretende escrever também sobre o tema. A carta será entregue por ele à prefeitura, oficialmente, no próximo dia 13. Não é possível satisfazer-lhe a remessa dos 400000 (quatrocentos contos) que pede, pois não tenho e mesmo no commercio é impossivel de arranjar tal quantia. Ignora-se onde está refugiado o gerente do Banco, Snr. Jayme Guedes, Estamos dispostos a recebe-los na altura em que elles desejarem. Nossa situação oferecce absoluta confiança e inteira segurança.
— Rodolpho Fernandes, prefeito de Mossoró em 1927
Ao G1, o pesquisador afirmou que adquiriu alguns recortes de jornais e outros materiais de uma idosa que mora no Rio de Janeiro e que prefere manter sua identidade em sigilo, mas que é ligada à história do cangaço.
"Ela tinha essa carta há muito tempo, mas não conhecia a importância dela, até porque não estava endereçada diretamente a Lampião. Ela tem muito material. Era uma resposta do prefeito a ele, porque o coronel Gurgel era refém e escreveu a outra carta, pedindo o dinheiro, com uma mensagem ditada pelo Lampião", explicou o pesquisador.
Na mensagem, o prefeito recusa o pedido por 400 contos de réis, feitos por Lampião e diz que a cidade está preparada para responder "à altura" ao ataque dos cangaceiros.
Robério Santos exibe carta que representa resistência de Mossoró ao bando do cangaceiro Lampião Foto: Cedida
Segundo os pesquisadores o gerente do Banco do Brasil, Jayme Guedes, era genro do coronel Gurgel e havia saído da cidade. Apesar de morar em Natal, o comerciante teria sido feito refém durante uma viagem que fez à região justamente para buscar sua esposa e filhos, ao saber do iminente ataque do grupo. Ao errar o caminho, o carro os levou de encontro ao acampamento dos cangaceiros. O motorista do comerciante teria servido de emissário entre as partes.
Assim como a carta enviada pelo coronel Gurgel ao prefeito, e outra escrita a próprio punho pelo Lampião, a carta encontrada já havia sido citada por jornais da época e em livros importantes sobre o assunto, mas o paradeiro dela era desconhecido, até porque o documento ficou com o próprio bando e não com o município."Eu fiquei assustado quando comecei a ler, me levantei imediatamente. Retirei do plástico para fazer uma análise, se era impressão ou se era escrito, e a assinatura. Realmente é uma carta escrita a punho, e na comparação com a assinatura e a escrita do prefeito, são iguais", considerou o pesquisador. "Acho que um documento desse não deve estar em posse de um particular, por isso busquei entrar em contato para devolver a carta a Mossoró", conta.
Conforme Asclépius Saraiva Cordeiro, diretor do Museu Lauro da Escóssia - nome do jornalista que presenciou e noticiou o ataque do bando de cangaceiros a Mossoró - ao tomar conhecimento da carta por meio de pesquisadores do tema que tiveram contato com Robério, a prefeitura resolveu pagar uma passagem para a ida do pesquisador ao município, quando será realizada a entrega da carta.
"A carta deverá ficar exposta no salão dos grandes atos, no Palácio da Resistência, que era a casa do prefeito e hoje é a sede da prefeitura municipal. Infelizmente não teremos o espetáculo Chuva de Bala neste ano, mas temos um motivo de soltar fogos", considerou.De acordo com o pesquisador e escritor Geraldo Maia, que é sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGRN) e da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço - SBEC, a carta encontrada seria uma das quatro trocadas entre o grupo que estava com Lampião e o prefeito, ditada pelo cangaceiro e escrita pelo refém coronel Gurgel. Outra missiva foi escrita e assinada pelo próprio Lampião, também respondida pelo prefeito. Ninguém sabe o paradeiro da carta original de Lampião - apesar de haver cópias da original - nem o paradeiro da última resposta.

Invasão e resistência.
Mossoró era uma cidade com pouco mais de 20 mil pessoas - uma cidade grande para a época, que tinha até uma agência do Banco do Brasil - a número 036. De acordo com os pesquisadores, bandos de cangaceiros geralmente não invadiam cidades deste porte. "Era uma coisa inimaginável", afirma Geraldo.
De acordo com os pesquisadores, um fazendeiro que acoitava cangaceiros em suas terras no Ceará, próximo à divisa com Mossoró, ordenou um ataque de Massilon, um cangaceiro que tinha um grupo pequeno, contra inimigos em Apodi, no interior do Rio Grande do Norte. O sucesso no saque à cidade teria despertado a cobiça por Mossoró. Dessa forma, os cangaceiros partiram para convencer Lampião, que não conhecia muito as terras do Rio Grande do Norte, a fazer um ataque conjunto também com o bando de Jararaca.
Ao todo, o grupo de cangaceiros tinha cerca de 80 pessoas. Ao saber das notícias que corriam pelo sertão, o prefeito começou a se preparar para defender o município. "A cidade tinha pouco policiamento, cerca de 10 soldados, então o prefeito se juntou aos comerciantes para fazer uma cota e mandar comprar armas e munições em Fortaleza. Elas ficaram armazenadas na prefeitura para o possível ataque", conta Geraldo.
Uma semana antes do ataque, o grupo com dezenas de cangaceiros entrou no Rio Grande do Norte pela região de Luis Gomes, no Alto Oeste, e arrasou oito municípios por onde passou, até chegar, no dia 12 de junho, a São Sebastião, onde hoje é a cidade de Governador Dix-Sept Rosado. Ainda de acordo com os historiadores, o telégrafo ainda conseguiu enviar uma mensagem a Mossoró, avisando do ataque.
Ao longo do dia, a cidade foi sendo esvaziada, com famílias pegando trem para deixar Mossoró e um grupo de resistência com mais de uma centena de homens começou a se preparar para o ataque. Segundo os estudiosos, era final da tarde do dia 13 quando o bando começou a percorrer as ruas vazias e começou uma trocou tiros durante cerca de duas horas com os moradores resistentes.
O bando acabou fugindo, deixando para trás homens feridos, como o cangaceiro Jararaca, que foi preso, morreu e foi sepultado em Mossoró. O prefeito, que tinha a saúde fragilizada, morreu meses após o ataque.
Por Igor Jácome, G1 RN
02/06/2020

EU E O SENHOR DOS MUNDOS

Clerisvaldo B. Chagas, 17 de agosto de 2020
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.366

      Ajeitei o chapéu de massa, aprumei o bornal e dei início a caminhada pela trilha. A meta era chegar ao topo do monte por veredas desconhecidas. Encontrei a primeira inclinação e subi por ela entre a vegetação de porte. Depois de muito andar subindo por aquele caminho estreito, parecia que eu estava só no meio do mundo. Eis que de repente avistei um homem alto de longos cabelos examinando os frutos de uma árvore. “Que bom! Alguém para me informar”. Fiz o cumprimento de praxe e o homem me perguntou: “Está indo para onde meu jovem?” Respondi: “Estou fazendo caminhada com destino ao topo, mas não sei se é por aqui.  Pode me indicar o caminho? Quem é o senhor?”. Eu achava que fosse um morador da serra, mas ele me respondeu: “Jesus, eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Um forte arrepio doce percorreu todo o meu corpo, da cabeça aos pés. 

(ILUSTRAÇÃO: B. CHAGAS)

“Venha, dê-me sua mão”, disse ele. Dei a mão automaticamente como se tivesse hipnotizado. Não consegui mais dizer nada. Senti me descolar do chão, flutuar com ele e subir a trilha como pássaro voando baixo, sem parar, até o cume. Lá em cima ele largou minha mão e disse: “Contemple quanto é belo esse panorama que você queria ver”. Ainda sem conseguir falar, escutei sua palestra sobre outras coisas até que ele disse: “Quero que você faça um cruzeiro de madeira e o coloque exatamente aqui”. Deu-me a metragem da cruz, disse o tipo da madeira, a profundidade do buraco e a metragem que deveria ficar soterrada. Após, mandou preencher o buraco com concreto e deixar um entorno na cruz para visitantes cansados descansarem da subida.
Depois, o Senhor indagou se eu tinha dúvidas. Respondi que não. E Ele: “Você me promete?” Falei pela segunda vez: “Mestre, prometer eu não prometo, prometo apenas tentar”. Ele nada respondeu, apenas disse que quando tudo estivesse como ele pediu, voltaria para um exame. Despediu-se e sumiu da minha vista. Eu me  belisquei por todo canto para ver se era verdade tudo aquilo. Desci a serra trêmulo de medo e de ansiedade.
Providenciei tudo que ele me pediu, com um carpinteiro. Contratei pessoas para transportar o cruzeiro de madeira de lei. O braço da cruz foi pregado lá mesmo no topo. Após tudo terminado, voltei lá sozinho, uma semana depois. Quando cheguei ao topo, o mestre já estava lá, sentado e contemplando a paisagem. Ele deu-se por satisfeito e eu apenas perguntei: “Senhor, eu posso plantar um pé de rosas vermelhas no pé da cruz?” Ele disse: claro que pode, mas medindo cinco metros à direita”. Eu havia levado a muda e fiz como ele mandou. Daquele dia em diante nunca mais fui o mesmo na  minha vida.


http://clerisvaldobchagas.blogspot.com/2020/08/eue-o-senhor-dos-mundos-clerisvaldob.html

BONSUCESSO: UMA FOTOGRAFIA TRADUZINDO A VIDA

*Rangel Alves da Costa

Recebo uma fotografia e nela encontro toda a história de uma povoação. Digo da comunidade de Bonsucesso, povoado pertencente ao município de Poço Redondo, no sertão sergipano, e que nasceu às margens do Rio São Francisco, no seu percurso interiorano e sertanejo.
Numa janela lateral da casa ribeirinha de seu irmão Netinho, a amiga Lorenna Carla clicou sem imaginar que sua fotografia traduziria toda a pujança da povoação poço-redondense e sergipana de Bonsucesso.
Na foto, a síntese de tudo: a história, a fé, o Velho Chico, a ribeira das águas e suas embarcações, as singelas moradias, a vastidão sertaneja subindo e descendo serras e montes. E o povo ribeirinho, nas entranhas desse singelo mundo, moldurando o viver.
No retrato, ao longe se avista o antigo e majestoso Casarão, construído em 1887 e por muito tempo suntuosa moradia dos Tavares. Edificado em local estratégico, pois em parte elevada que permite uma ampla visão desde o rio às serras, surgiu e continua rodeado por uma inigualável paisagem.
Casarão dos escravos, do coronelismo, das cercas erguidas na pedra, da senzala ao lado e da chibata sangrando vidas. Mas também da fé que fez tornar Nossa Senhora do Rosário a padroeira local. A santa, segundo dizem, foi trazida pela matriarca dos Tavares.
E a feição da fé e da religiosidade do ribeirinho está logo mais abaixo do Casarão. A igreja, construída defronte ao rio, abre os seus olhos para avistar o remanso das águas e suas margens.
Sua calçada alta, descendo em direção ao rio, faz com que o templo católico se afeiçoe a uma santidade em cima de andor. Mais abaixo, as canoas parecem sonolentas, meio adormecidas, enquanto as águas embalam seus sonhos de viagens e pescarias.
Uma vastidão de águas espelha a vida do rio. Por caminhos longos, os azuis vão chegando, vão passando, correndo e escorrendo, como seiva de vida que navega nas veias do povo do rio.
Como seiva pulsante de força e fé que percorre as veias do povo do rio...

Escritor
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ENTREVISTA DO EX-CANGACEIRO BALÃO, AO O ESTADO DE S. PAULO, PUBLICADA NA EDIÇÃO DE 01.08.1973, CONCEDIDA AO JORNALISTA CLÁUDIO BOJUNGA



BALÃO CABRA NO INPS

Trinta anos de luta. Agora, é um trabalhador aposentado e doente.

No dia 27 de outubro de 1972, o ex-cangaceiro Balão, de cabra de Corisco, Anjo Roque e Lampião, cabra macho, pai de 25 filhos, tendo o corpo fechado por um patuá secreto e inconfessável; Balão, portanto, na verdade Guilherme Alves, mas por direito Balão porque sempre teve o peito estufado, recebia nas costas cem quilos dentro de um poço desbarrancado, perdido na ocasião os dentes, fraturando as costelas, rachando os lábios, cegando os olhos, afundando o peito. A cidade de São Paulo liquidava um cabra que sobrevivera aos tiros de Mané Neto e que durante nove anos de caatinga nunca pisara em farmácia. O declarante tem algo a dizer?

- Sabia que aquele poço ia cair, mas o mestre de obras Guerino começou a me torrar. 

Entrei para ele ver. Só me lembro de ter enchido um balde de terra.

Aposentado.

O curioso é que, havendo lutado durante os primeiros trinta anos de sua vida e trabalhado durante os outros trinta que também viveu, nunca teve férias. Ouçam a história:

Depois de nascer em Paulo Afonso, Bahia, no ano de 1910 viu com quatro anos de idade o diabo – “um neguinho preto botando fogo na roupa”. O bicho desapareceu lá pelo Pilãozinho. Balão não chegou a ver seus pés de bode, mas diz que “o resto era homem de mesmo”. Foi a única vez que viu o diabo em pessoa. Depois, viu só suas obras. A seca era braba e a criação se acabava de sede. Chegou então a volante, sovou o pai em cima de um saco molhado de sal e cortou o couro cabeludo do irmão. Balão, tipo genioso, decidiu vingar. Nisso passa Corisco.

Briga – “recebi um fuzil comprido e seiscentas e sessenta balas. Gastei tudo no primeiro dia”. Comida – “quando achávamos uma rês ninguém ia percurar o dono; passava a do coco. Mas era difícil encontra e as vêis nós abria a boca pro céu e não encontrava nem uma salivinha na ponta da língua”. Ascendência – “minha bisavó foi pegada lá pros lados de Mato Grosso. Era da aldeia Carajá". Lampião - “num queria mudá nada, morreu purque tava cansado – brigar vinte anos num é vida de homi”.

CORPO ABERTO

Balão só viu o mar no dia em que se entregou. Foi em 1938, Salvador, na barra do rio Vermelho. Caiu n’água e gostou. Só que de noite teve a primeira dor nas costas de sua vida. Andaram dizendo que aquilo lhe abrira o corpo. Balão não acreditou, mas nunca pôde tirar a prova, já que a partir daquele dia nunca mais entrou num tiroteio.

Ficou um ano no quartel, foi bem tratado pelo capitão Aníbal e depois deu no pé a fim de procurar seu destino. Para quem nunca havia trabalhado aquele seu primeiro emprego na estrada de ferro, de trena e baliza na mão, foi até manso. Puxou com os “ingenhero” uma linha de Contendas a Monte Azul; tomou conta de noite do barracão de lentezinhas, acabou arranjando um caso com o dotô que lhe cortejou a namorada. Não bateu nele, não – deu só uns tiros numa porta – o dotô pulou uma janela e um abaixo-assinado removeu-o do local. Fugiu correndo para o Sul sem documento. Corpo agora definitivamente aberto.

Passou por um investigador da polícia em Pederneiras, passou por Tupã, encarou uma pensão portuguesa em Marília. Era o tempo da Guerra e do gasogênio, os carros corriam com um caldeirão atrás. Balão plantou um pouco de algodão, mas trabalho mais duro era um suplício – o homem que só tinha empunhado o fuzil criou 17 calos na mão no dia em que cortou sua primeira lenha. Sua época mais feliz foi logo depois, quando arrumou um barzinho à beira da estrada em troca de cem votos municipais. Depois inventaram um negócio de imposto e Balão veio para São Paulo – 30 de outubro de 1960. Foi dando logo uma entrada para comprar a casinha. Itaquaquecetuba. Por ali, perto de São Miguel Paulista, Balão descobria mais gente do que na cidade de Belém, por exemplo. Milhares de nordestinos. Isso aliás nunca o espantou – Balão disse que não se espanta com “panorama”, aliás não se espanta com nada.

E foi aí que começou o inferno. Começava sua carreira como poceiro – poços de 10 a 15 metros, sem ajudantes a não ser seus filhos “de menor” que trabalhavam de graça e não conseguiam alçá-lo do fundo da terra. Os peitos e as costas rebentadas de noite. Recebeu seu primeiro cheque sem fundo no dia 25 de outubro de 1963 – ele se lembra de que era o banco Auxiliar de São Paulo, emitido por dois larápios, o Norberto Tedesco e um outro pilantra vestido com uma falsa farda da Aeronáutica.

À PROCURA DOS DIREITOS

Num gesto de absoluta ingenuidade, Balão devolveu não só o primeiro mas o segundo e o terceiro. Depois assinou promissórias que ficaram sem resposta. Quando o prazo esgotou Norberto pediu a Balão que “desse o fora” e fosse procurar seu direito. Que voltasse quando conseguisse encontra-lo. Balão saiu desesperado com a desfaçatez. Nem pegou o elevador: desceu a escada a pé e foi comprar uma garrucha e 25 balas na rua Joaquim Nabuco. Mas “se os maiores estavam criados, os de menor não tinham parentes ou aderentes – estariam perdidos com um pai na cadeia”. Saiu procurando seus direitos – trocou a garrucha por um rádio de pilhas.

Depois venceu a sanfona de oitenta baixos, fez galeria na rua Santo Antônio (“o mestre de obras era ruim, quase meto a picareta no gogó dele”) trabalhou no ar comprimido para a SOBRAF – nunca tinha visto aquilo –, o português jogou-o lá dentro até o dia em que o médico disse que ele não tinha mais idade para aquele trabalho, bateu estaca na rua Veridiana. Sempre à procura de seus direitos, mas com um ditado à mão: “boi muito amassado dentro do curral se num soltar fica ruim”.

E foi indo até o dia em que o Guerino, o maldito Guerino, resolveu desafiá-lo a entrar naquele poço evidentemente apodrecido. Sabia que ia desabar. Mas ele torrou, e Balão cavou um balde – o último balde bem cavado de sua vida: dentes, costelas, olhos, peito – e a dor na virilha, a sinusite crônica, a urina avermelhada de sangue. E os direitos?

Balão nunca se separa das muitas carteirinhas ensebadas mas em ordem, dentro do bolso da camisa. Depois de tantos anos de vida sem lei, é quase uma obsessão a lei. Afinal, a cidade grande e o mundo industrial é que são os civilizados. Carteira profissional n° 2502, chapa 1180 da Sobraf, etc... A carteira está presa na Delegacia do Trabalho na rua Martins Fontes, pois Balão finalmente resolveu fazer um processo. Está liquidado, soterrado, o corpo mais que aberto e não recebe o devido. No bolso, cartõezinhos de advogado:

“Na forma combinada apresento-lhe o senhor Guilherme Alves, vítima daquele acidente em que ficou soterrado num poço de fundação”.

Um boi amassado dentro de um curral.

Está devendo duzentas pratas na venda, ainda não acabou de pagar a casa. Se num soltá fica ruim. Ultimamente deixou novamente seus cabelos crescerem. Encheu os dedos de anéis. Quem sabe, num arranja um papel em filme de cangaceiro. Está procurando seus direitos.

A última filha de Balão tem dez dias. Quem vai dizer a Balão que Corisco fez bem em não se entregar?


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ASSIM, ERA A CANGACEIRA DADÁ.


Por Dr. Lamartine Lima..Médico legista.



Entrevista completa do Dr. Lamartine Lima concedida à equipe do Centro de Estudos Euclydes da Cunha – CEEC/UNEB na ocasião da produção do documentário "ASSIM ERA DADÁ – A Vida Pós Cangaço de Sérgia da Silva Chagas". Direção Geral: Manoel Neto Direção de Fotografia: Lucas Viana Assistência de Produção: Vicente Rivelino Link para o documentário: https://youtu.be/rlo0A2bMKZU Inscreva-se no canal do CEEC para acompanhar nossas próximas produções: 
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JOSÉ LUCENA DE ALBUQUERQUE MARANÃO


Por Antônio Corrêa Sobrinho

O militar e político JOSÉ LUCENA DE ALBUQUERQUE MARANHÃO morreu no dia 19 de maio de 1955, aos 62 anos de idade.

O "Diário de Pernambuco" noticiou assim o fato:
UM COLAPSO CARDÍACO VITIMOU ONTEM, EM RECIFE, O HOMEM QUE MAIS COMBATEU O BANDITISMO NO NORDESTE


O CORONEL JOSÉ LUCENA MARANHÃO MORREU PLACIDAMENTE NUMA CAMA

Oficial de Polícia e prefeito de Maceió – Inimigo nº de Lampião

Repentinamente, faleceu, anteontem, no Recife, o prefeito constitucional de Maceió, capital de Alagoas, coronel José Lucena de Albuquerque Maranhão. Casado com a Sra. Benedita de Melo Lucena, contava o prefeito de Maceió 62 anos de idade, transcorrendo o seu último aniversário a 15 do corrente mês quando já se encontrava nesta cidade. Nasceu a 15 de maio de 1893.

Há pouco mais de um mês, o coronel Lucena passou o exercício da Prefeitura de Maceió ao seu substituto legal, vereador Cleto Marques Luz, presidente da Câmara Municipal, viajando para Recife, a fim de repousar e submeter-se a um tratamento de saúde. Estava internado na Casa de Saúde Maria Lucinda, surpreendendo-o a morte quando já se achava quase totalmente restabelecido e prestes a voltar ao seu Estado.

Como costumava fazer aos domingos e feriados, anteontem o coronel José Lucena foi passar o dia com o seu amigo Audalio Tenório, residente num apartamento do Edifício Capibaribe.

Anteontem, mais ou menos às 23 horas, em companhia do Sr. Audalio Tenório, ouvia o coronel Lucena um programa da Tamandaré, quando faleceu, repentinamente, de distúrbio cardíaco. Logo que os seus amigos residentes no Recife tiveram notícia de seu falecimento, acorreram ao apartamento do Sr. Audalio Tenório, onde permaneceram durante o resto da noite e dia de ontem, até a hora em que o corpo seguiu para Maceió em avião especial da FAB, cedido pelo comando da 2ª Zona Aérea.

LIGEIROS DADOS BIOGRÁFICOS

O coronel José Lucena Maranhão era natural de Quebrangulo, Alagoas. Ingressou na Força Policial de seu Estado como simples soldado, atingindo ao coronelato (mais alto posto) pelas suas qualidades cívicas, morais e de inteligência. Cumpriu brilhante folha de serviços, sendo promovido por merecimento e bravura. Foi a figura central no combate ao banditismo no Nordeste, sendo considerado como o mais terrível inimigo de Lampião.

Em 1930, por ocasião da Revolução, o coronel Lucena esteve ao lado da legalidade, acompanhando o governador de então, Sr. Álvaro Paes, até quando de sua deposição. Foi, ainda, comandante da Força Policial de Alagoas, da Guarda Civil, delegado regional de Ordem Política e Social no sertão de Alagoas, prefeito de Santana do Ipanema, deputado estadual pela Assembleia Legislativa de Alagoas (o mais votado) e, há pouco menos de um ano, se empossara na Prefeitura de Maceió, cujo mandato terminaria em outubro de 1958.

Deixa o coronel Lucena os seguintes filhos: Maria Tereza Quintela Lucena, Wilson e Terezinha, além de netos, sobrinhos e genro. No Recife, eram seus parentes o deputado Gerson Maranhão e os senhores Alcindo e Napoleão Maranhão.

Tão logo se soube em Maceió do falecimento do governador da cidade, seus parentes mais próximos (filhos e esposa) viajaram para Recife, em companhia do deputado petebista Abraão Fidelis, da Câmara Legislativa de Alagoas.

Diversos deputados pernambucanos, dentre eles o deputado Elpidio Branco, estiveram na residência do Sr. Audalio Tenório, apresentando condolências.

Ontem o corpo do coronel Lucena seguiu para a capital do vizinho Estado onde será sepultado hoje à tarde. A prefeitura de Maceió decretou luto e o corpo de seu primeiro prefeito constitucional ficará em câmara ardente, para visitação pública, no salão nobre da municipalidade.

Em visita ao corpo do coronel José Lucena estiveram na residência do Sr. Audalio Tenório, o prefeito Djair Brindeiro, o ajudante de ordens do governador do Estado, o Dr. João Roma e oficialidade da Polícia Militar de Pernambuco.

OFICIAL DE “VOLANTES”

Paradoxalmente, morreu sentado numa cama o homem que durante mais de 15 anos palmilhou os sertões de Alagoas em peregrinação a cangaceiros. Ainda tenente, Lucena Maranhão foi mandado pelo governador Fernandes Lima para a zona sertaneja, logo depois que um grupo de bandidos saqueou o povoado Pariconha. Eram os Porcinos, os Fragosos, Antonio Matilde e Lampião, este ainda jovem de 21 anos.

No povoado de Santa Cruz do Deserto, nas proximidades da cidade de Água Branca, a volante de Lucena cercou os bandidos e deu-lhes combate. Parte dos cangaceiros fugiu para as caatingas, enquanto um pequeno grupo, entrincheirado na casa dos Fragosos, sustentou o fogo com a polícia. No fim do tiroteio, estava morto Luiz Fragoso e um senhor de idade, que Zeca Fragoso, somente ferido num braço, informou ser o pai de Lampião. Desde este fato, Lampião passou a considerar Lucena o seu maior inimigo.

Quando os irmãos Porcinos, em 1922, deixaram o cangaço, Lampião assumiu a chefia do bando, que até 1928 percorreu cinco estados do Nordeste. Acossado pelas forças policiais conjugadas, entre as quais sempre se sobressaíram as “volantes” de José Lucena, Lampião atravessou o São Francisco, para a Bahia, nos meados de 1928.

No combate ao banditismo, Lucena Maranhão comandou o 2º Batalhão da Polícia de Alagoas, sediado em Santana do Ipanema, de que fazia parte a volante que deu cabo do grupo de Virgulino Ferreira, em julho de 1938.

Diário de Pernambuco - 21.05.1955


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