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sábado, 4 de janeiro de 2020

A MORTE DOS PAIS DE LAMPIÃO

Por Sálvio Siqueira

Para entender-se melhor o que ocorreu naqueles idos dias, se faz necessário retroceder mais um pouco no tempo.

José Ferreira casa-se com Maria Lopes, Maria Vieira da Soledade. Segundo alguns autores, dona Maria casou grávida e o pai da criança não era José Ferreira. Dona Maria trabalhava em uma fazenda e o dono dessa, tendo relações sexuais com ela, a engravida. Não podendo mais continuar trabalhando e morando naquela fazenda, devido à família do latifundiário morar na propriedade, dona Maria recebe uma propriedade, sítio Passagem das Pedras, que se situa na margem direita do riacho São Domingos, no município de Vila Bela, hoje Serra Talhada, PE, como bônus do fazendeiro. José Ferreira, homem de respeito, gostava de dona Maria Lopes. O fazendeiro vai até ele, no sítio Baixa Verde, no município de Triunfo, PE, de sua propriedade e faz-lhe a seguinte proposta: dele casar com dona Maria, eles receberiam a propriedade, ele registraria o criança como sua e iriam viver suas vidas. José Ferreira aceitou. Dessa gravidez nasceu, em meados de 1895, Antônio Ferreira, primogênito de dona Maria Lopes.


Na sequência das suas vidas, nasce em finais de 1896, Levino Ferreira, segundo filho de dona Maria Lopes e primogênito de José Ferreira. Pouco tempo depois, em meados de 1897, no registro civil, certidão de Nascimento e 1898 na certidão do batistério, vem ao mundo Virgolino Ferreira. Consequentemente, por casais daquela época levar a risca o que está escrito no livro Sagrado, “crescei e multiplicai-vos”, esse não fora exceção, pois foram pais d’uma prole de nove filhos, sendo cinco homens e quatro mulheres, fora, não sabemos dizer, se houve algum nascimento de feto morto ou mesmo abortado.

Pois bem, os filhos do casal José e Maria brincaram, divertiram-se, igual qualquer outra criança naqueles idos dias nas quebradas do Sertão nordestino, mais precisamente no vale do Pajeú das Flores.

Na escola, além de destacar-se sobre os irmãos no aprendizado mesmo sendo o mais novo dos três, Virgolino (Ferreira), nos intervalos entre as aulas, segundo a escritora Marilourdes Ferraz, em seu livro “O Canto do Acauã”, já liderava seus coleguinhas nas travadas lutas imaginárias entre bandido e soldado. Vindo mostrar que era um líder nato, apesar de ter escolhido o lado negro da vida.

Por volta de 1915, por motivos de roubos de animais, criações, na fazenda dos ‘Ferreira’, depois de muito procurarem, é encontrada várias peles dessas criações enterradas dentro dos limites da fazenda Pedreira, propriedade do Sr. Saturnino Alves de Barros, que, além dessa, era proprietário de outro imóvel rural, a fazenda Maniçobas, as quais passam a ser administradas, depois do falecimento do pai, pelo seu filho José Alves de Barros, alcunhado de Zé Saturnino, um dos seis herdeiros.

Zé Saturnino e os filhos de José Ferreira, Antônio, Livino e Virgolino, perambularam pelas caatingas, tomaram banho nas águas dos poços dos rios e fizeram tudo que os adolescentes praticaram na época. Saturnino e Virgolino destacam-se em pegar boi dentro da mata fechada. Eram vaqueiros que cuidavam das reses de suas propriedades.
Os irmãos Ferreira, segundo João Gomes de Lira, em seu livro “Lampião – Memórias de um Soldado de Volante”, eram amansadores de burros brabos, selvagem, vindo muita gente de lugares distantes e distintos para verem essa proeza dos rapazes.


As peles das criações que foram encontradas estavam enterradas próximas à casa de um ‘morador’ da fazenda Pedreira. Esse morador, Zé Caboclo, é levado preso por um representante da lei da cidade de Vila Bela, que era familiar dos Ferreira. Zé Saturnino não gosta, nem aprova aquele procedimento e, com a influência que tinha, ordena que soltem seu empregado, destitui a pessoa do cargo, coloca outra no lugar, de sua confiança, inclusive seu parente, e tem-se início uma das maiores desavenças já vistas no Pajeú das Flores.

Certo dia os irmãos Ferreira são emboscados nas terras da fazenda Pedreira, no sopé da Serra Vermelha, quando estavam a procura de animais extraviados, por Zé Saturnino e seus homens. Dessa emboscada sai ferido Antônio Ferreira, na altura dos quadris e sua montaria. Antônio é levado para a casa de um tio paterno, Antônio Matilde, e convalesce por vários dias. Saturnino tem conhecimento dessa ação que fizera o tio ao sobrinho ferido, então vai até sua casa, leva-o preso para sede do município e, durante os dias em que Matilde esteve preso, levava uma sova, surra, diária.

Os Ferreira iniciam então uma série de ataques e emboscadas ao inimigo e seus homens. 



A coisa começa a engrossar quando, os apaziguadores, aconselham ao Sr. José Ferreira mudar de moradia. O velho Ferreira, homem honrado e pacato, aceita os conselhos, vende sua propriedade por um valor muito abaixo do que valia e, comprando outra propriedade, Poço do Negro, distante dos limites da fazenda Pedreira, vai criar sua família, ou pelo menos tentar, em terras próximas ao Distrito de Nazaré do Pico, município de Floresta, PE. Sobre a venda da propriedade Passagem das Pedras, é sabido que fora dada uma entrada do valor e não fora feito o pagamento do restante. Segundo Metódio de Godoy, em entrevista, “...a fazenda (Passagem das Pedras) foi torrada de graça. Além do sinal, nada mais o velho José Ferreira recebeu!”. Fazia parte do acordo, os irmãos Ferreira não irem a feira livre de Vila Bela, nem Zé Saturnino ir a do Distrito de Nazaré. Os Ferreira levaram desvantagem até nessa parte do acordo por serem, também, almocreves e o comércio de Vila Bela ser muitas vezes maior do que a do povoado de Nazaré.

Zé Saturnino quebra o acordo feito e, junto a um cunhado, José Cipriano, ‘armados até os dentes’, vai ao povoado de Nazaré, segundo ele mesmo, receber um pagamento de um animal que vendera a Agripa Euzébio, que era por todos conhecido pela alcunha de “Agripe de Manoela”. Na ocasião Virgolino (Ferreira) encontrava-se no povoado, viu e não gostou da presença dos inimigos. O escritor José Bezerra Lima Irmão, em seu livro “Lampião, A Raposa das Caatingas”, refere que Virgolino, havia deixado suas armas em casa de uma pessoa conhecida, “(...) como de costume, deixou a pistola e a faca peixeira na casa do professor Domingos Soriano, na entrada do arraial (Nazaré). Quando viu os inimigos na feira, correu para apanhar as armas, mas o professor Domingos disse que só as entregaria se Virgulino prometesse ir para casa. Virgulino prometeu (...).”

Bufando de raiva, Virgolino retorna para o sítio Poço do Negro e, lá chegando, relata para um tio materno, Manoel Lopes, o que acabara de acontecer. Virgolino e seu tio pegam as armas e seguem estrada afora rumo a Nazaré. Em determinado local, no Serrote das Umburanas, se escondem e botam uma emboscada em Zé Saturnino e seu cunhado. Debaixo de fogo cerrado, Zé Saturnino e o cunhado tacam as esporas em suas montarias e dão no pé. Ninguém saiu ferido.


‘Soltando fumaça pelas venta’, Zé Saturnino chega à fazenda Pedreira , relata da emboscada que sofrera a outro cunhado, José Nogueira. Após alguns instantes, ordena que quinze homens preparem-se, armem-se, para irem atacar os Ferreira, no sítio Poço do Negro. Saturnino mantinha vários homens da espingarda sob sua proteção. Entre, ou dentre, os cabras que ‘trabalhavam’ sob suas ordens, destacamos os irmãos Zé e Antônio Guedes, esse último sendo conhecido na saga cangaceira pela alcunha de Batoque, Zé Cipriano, seu cunhado, Tibúrcio, os irmãos Beneditos e Zé Caboclo, aquele do roubo das criações. Por mais que sangrassem as barrigas das montarias com suas esporas, viajaram durante toda a noite nos lombos dos animais, só chegando ao sítio Poço do Negro, ao alvorecer do dia seguinte. Cercam a casa e atacam os que lá estavam.

De dentro da casa, tendo se levantado cedinho, Virgolino nota a manobra dos emboscadores desde a sua chegada. Estava com ele na casa, sua mãe, dona Maria Lopes, seu tio, Manoel Lopes e uma ‘reca’ de crianças. Ele ordena que a mãe proteja as crianças, seus irmãos e os afilhados dela que no momento encontravam-se lá, dentro de um quarto. Assim que Saturnino e seus homens iniciam o ataque, são repelidos com uma saraivada de balas, mesmo só estando dois homens em condições de lutar dentro da moradia.

A velocidade que Virgolino atirava era impressionante, e foi o que lhe salvou da morte por várias vezes. O combate se prolonga por boa parte da manhã. Os atacantes sofrem uma baixa importante, Zé Guedes é ferido nas pernas. Vendo a quantidade de disparos que vinha na direção em que estavam, Saturnino, sem saber da quantidade de inimigos que tinha dentro da casa, recua e vai embora. Dona Maria Lopes começa a sentir-se mal. Desde há alguns dias que ela vinha sentindo algum problema, com certeza, pelas agonias que vinha passando sua família.

Daí para frente a coisa pega fogo entre as duas famílias. Na sequência, iniciam-se as desavenças com os moradores de Nazaré. Livino é ferido em Nazaré e preso, é levado para cadeia em Floresta, PE. Em fim, a estada dos Ferreira naquelas paragens fica inaceitável. Não podendo mais ficarem naquela região, José Ferreira resolve mudar-se com sua família, novamente. Dessa vez ele procura refúgio numa região mais distante, em outro território, no vizinho Estado das Alagoas, devido lá morarem familiares da sua esposa. Não podendo ir todos de uma vez, partem primeiro os irmãos Antônio, Virgolino, Virtuosa e seu esposo, Luis Marinho. Os demais ficaram e iriam depois.

Com parte da sua família seguindo em rumo a outras paragens, José Ferreira, segue com os cuidados necessários para deixar sua ‘terra’, propriedade, com alguém. Dona Jacoza, sua sogra, migra da Passagem das Pedras e vem morar no Poço do Negro. Seu cunhado, Manoel Lopes, fica encarregado de cuidar do sítio, enquanto outras pessoas iriam cuidar da propriedade próxima a Baixa Verde. Nesse meio tempo, já em liberdade, Livino segue se recuperando do ferimento à bala sofrido em Nazaré. Escolhem para partida uma hora fria e, não há mais fria do que a madrugada, nos sovacos das serras do sertão nordestino.

A viagem foi longa e muito desgastante, principalmente para dona Maria que já vinha tendo problemas de saúde. Chegam alguns dias depois ao destino, na fazenda Olho D’água de Fora, imóvel rural pertencente ao Sr. Manoel Francelino, que era cunhado de Antônio Porcino, chefe de um pequeno grupo de cangaceiros que agiam nas Alagoas. Estando em casa de Francelino, José Ferreira procura o Padre Firmino e lhe narra tudo que estavam passando. O sacerdote faz uma missiva de recomendação e o envia ao coronel Gervásio Luna, que tinha a alcunha de ‘Capitão Sinhô’. Esse, porém, não pode, ou não quis dar guarida e trabalho para ele. Mandou-o procurar o coronel Zezé Abílio, em Bom Conselho de Papacaça, no Pernambuco. O coronel foi solícito com toda a família de José Ferreira. Com sua ajuda eles voltaram a almocrevar, na tentativa de recuperar o que perderam. 


Segundo José Bezerra Lima Irmão, em sua obra literária citada, Zé Saturnino, ao saber que os Ferreira encontravam-se na fazenda Olho D’água de Fora, escreve as autoridades de Água Branca narrando que aquela família tratava-se de bandidos: “(...) Zé Saturnino soube da mudança de seus desafetos para Olho D’água de Fora, escreveu várias cartas para as autoridades e pessoas importantes de Água Branca, denunciando os irmãos Ferreira e Antônio Matilde como bandidos perigosos, assassinos e ladrões. Pelo menos quatro pessoas receberam tais cartas: o coronel Ulisses Luna e seu irmão Sinhô, a Baronesa de Água Branca(Joana Vieira Siqueira Torres), e o comissário de polícia de Água Branca, Amarílio Batista Vilar (...).”

Logicamente que, naquela época, já estando o banditismo solto pelos sertões, aquelas pessoas que foram ‘avisadas’ ficaram em alerta. José Ferreira corre em busca de uma e de outra autoridade para dizer que sua família não era nada daquilo que disseram. Não adianta. Certo dia, o coronel Ulisses Luna, chama o irmão de José Ferreira, Antônio Matilde e o manda procurar outro patrão. Matilde arriba daquele lugar mais irado ainda com seu inimigo Zé Saturnino. Reuniu-se com os filhos mais velhos de seu irmão, José Ferreira, com planos para formarem um grupo, voltarem ao Leão do Norte e castigarem o seu inimigo em comum, Zé Saturnino. Terminando por formarem o bando, que, segundo Lima Irmão, assim ficou composto: Antônio Matilde, Higino e Luis Marinho, os irmãos Olímpio, José e Manoel Benedito, antigos ‘cabras’ de Saturnino, mais Chico de Salvador, Chico Chililim, Antônio, Livino e Virgolino Ferreira, formando um grupo de onze homens.

Esse grupo pintou e bordaram no município de Vila Bela, PE, e região. No entanto, nada daquilo que planejavam para matar Zé Saturnino, deu certo. Atingiu então, o patrimônio dele, suas fazendas, seu gado e, por aí as coisas seguiram. Retornando para as Alagoas, Antônio Matilde se esconde e os outros prosseguiram suas vidas. Notícias desencontradas chegam às autoridades de Água Branca, sem conseguir apurar nada o comissário encerra as investigações.

A partir desses movimentos, isso por volta do ano de 1918/19, os irmãos Ferreira, Antônio, Livino e Virgolino passam a fazerem parte do bando de cangaceiros denominado os “Porcino”, que atuava na região serrana do Estado das Alagoas. Esse bando destacou-se devido às crueldades praticadas em suas vítimas. Segundo o pesquisador/historiador Clerisvaldo Chagas, “Em Alagoas, o cangaço teve início em seus movimentos no extremo oeste, principalmente nas regiões de Mata Grande e, então, Matinha de Água Branca. A maioria das ações cangaceiras no estado aconteceu nessa região serrana, fronteira com Pernambuco, onde oficialmente Virgulino Ferreira da Silva tornou-se cangaceiro. Entre o homem trabalhador e ações violentas, vindo do estado vizinho, Virgulino começou a conjugar suas arruaças ao bando dos Porcino que atuava na área descrita.” Daí pra frente, a vida dos irmãos Ferreira resumira-se a fugas e pequenos ataques a fazendas, povoados e grupos de almocreves pelas estradas. As perseguições iniciam-se com bastante afinco, principalmente pela atuação dos “Porcinos”. Os irmãos Ferreira tiverem uma escola perversa e sangrenta junto a esse bando.

Nesse ínterim, João Ferreira, irmão de Virgolino, por ter ido comprar remédio em Água Branca para sua irmãzinha Lica, Maria Ferreira, que estava com uma otite, ao chegar à cidade, é preso pelo comissário Amarílio Batista. Alguém vai até a fazenda onde estão seus pais contar da prisão. A mãe, dona Maria Lopes, desespera-se ao saber da prisão de João, pois ele nada tinha haver com o que seus filhos mais velhos faziam, praticado alguma coisa fora da lei.

Os seus irmãos, Antônio, Livino e Virgolino, seu tio Antônio Matilde, e outros do grupo, são informados da prisão de João. Resolvem vir soltar o irmão na marra. Arranca-lo das mãos do comissário de Água Branca. O comissário desconfiou dos planos dos irmãos Ferreira, ou mesmo fez a prisão para que eles tentassem agir, já que suas buscas dentro da mata foram em vão, reuniu uma tropa de soldados e foi montar uma emboscada na estrada que levava a cidade. O grupo de resgate é surpreendido pelos disparos dos soldados. Saltam todos das montarias e dá-se início a uma troca de tiros acirrada. O fogo toma rumo diferente daquele imaginado pelo comandante e esse é obrigado a deixar o local onde se encontrava e sair numa desesperada carreira, sendo seguido pelos seus homens. Alguns autores citam que o comissário defecou, nas calças, por isso, antes de entrar na cidade, manda que um de seus homens vá até sua casa e traga uma calça limpa.

Voltando a entrar na cidade, retira o prisioneiro-mirim do quartel e transporta-o para o prédio da prefeitura, onde o acorrenta em cima de uma mesa. Assim passa-se o restante do dia e a noite inteira. No dia seguinte alguns moradores da cidade vão falar com José Ferreira a fim de evitarem uma luta nas ruas de Água Branca. Os três irmãos mandam um recado para o comissário para que ele solte João. Por fim, Amarílio termina por soltar o menino, pois João, nessa época não passava de uma criança. João retorna para sua família.

Após esse ocorrido, José Ferreira tem que arrumar suas tralhas e procurar outro lugar para descansar seu corpo. O velho José Ferreira, dona Maria, sua esposa e seu filho João Ferreira, iriam à frente para ver se encontravam um local para ficarem. Os três irmãos mais velhos, Antônio, Livino e Virgolino, foram incumbidos de levarem o restante da família, inclusive as meninas, para algum lugar seguro até receberem a notícia de que poderiam ir para onde estariam seus pais.

O proprietário da fazenda em que estavam, Manoel Francelino, diz para José Ferreira ir para a fazenda Engenho, propriedade de seu pai, que ficava no município de Mata Grande.

No início da nova caminhada, dona Maria desmaia novamente, e, só após alguns instantes, reanimada, colocam os pés no caminho. Chegando à fazenda Engenho, são bem recebidos pelo sinhô Fragoso e sua esposa, dona Totonha. Na fazenda existiam três casas. Numa delas, morava o velho Fragoso, em outra, morava um filho dele que era assassino, pois tinha matado uma pessoa e era procurado por isso, e, na outra, estando vazia, Fragoso a oferece ao velho José Ferreira. Instalados, José Ferreira vai até a cidade, Mata Grande, fazer compras e manda João ir amarrar os animais onde tivesse pasto. Dona Maria vai à casa do proprietário para prosear um pouco com a esposa dele. Lá estando, sentiu-se mal novamente e voltou a desmaiar. Gritos dali, chamados de cá, alguém fala para João correr e acudir sua mãe. João saiu numa carreira só, porém, ao chegar a casa, sua mãe, dona Maria Lopes, contando 47 anos de idade, estava morta. Alguém parte para informar seu esposo, o velho José Ferreira, da morte de sua esposa. Rapidamente José retorna para a fazenda Engenho, onde, meio desnorteado, envia recados aos outros filhos para que viessem para o sepultamento da mãe. O corpo de dona Maria, no dia seguinte é transportado em uma rede, levado pelos filhos, até o cemitério do povoado de Santa Cruz do Deserto.

Ocorrem fatos em nossas vidas que, por mais duros que possam parecer, conseguimos supera-los. No entanto, há aqueles em que não tem como haver uma superação, principalmente se ocorre com algo, ou alguém, a quem buscamos forças para superar as outras. Assim aconteceu com o velho José Ferreira. Aguentou tudo, ou quase tudo, que aconteceu com sua família de cabeça erguida para ir mais adiante, em busca de uma solução, menos quando da perda da esposa. A ‘partida’ prematura da companheira abateu muito, o moral e o ânimo do pai dos irmãos Ferreira.

Mas, a vida continua. E aquele pai tinha muitos filhos pequenos para proteger, dá moradia e alimentá-los todos os dias.

Após a morte de dona Maria Lopes, chega à cidade de Água Branca, AL, uma volante comandada pelo então sargento José Lucena Albuquerque Maranhão. Essa volante vinha com a ordem de irem à procura de criminosos, assassinos, bandoleiros e cangaceiros que estavam a infestar aquelas redondezas, principalmente o grupo dos “Porcinos”. O comandante da volante, em uma de suas andanças pela zona rural daquele município, vem, a saber, para onde os Ferreira teriam ido. Após essa informação, e tendo como guia o comissário Amarílio, o sargento José Lucena parte rumo à cidade de Mata Grande.


A volante chega à fazenda Engenho, onde se encontrava no alpendre da casa, o velho José Ferreira a debulhar milho. Os soldados da volante nada disseram, também nada perguntaram, apenas abriram fogo contra José Ferreira. O velho ainda tenta proteger-se pulando para dentro de casa. Segundo o pesquisador/historiador José Bezerra Lima Irmão, no livro “Lampião – A Raposa das Caatingas”, na página 100, diz: “Foi então que a polícia chegou. Não houve nenhum diálogo, não foi feita nenhuma pergunta – os soldados simplesmente cercaram a casa onde José Ferreira se encontrava e abriram fogo. José Ferreira ainda conseguiu entrar na casa, para proteger-se, mas os soldados entraram atrás, ele foi agarrado e executado sumariamente”. Já os pesquisadores/historiadores Antônio Amaury e Vera Ferreira, em seu “De Virgolino a Lampião”, 2ª Edição, na página 81, dizem: “Tudo aconteceu de repente, como costumam ser as grandes tragédias. Ouviram-se tiros, a porta da casa foi arrombada, a filha do velho Fragoso viu-se ferida e José Ferreira foi arrastado para um dos quartos, sendo sumariamente executado.” Quando de seu assassinato, José Ferreira contava com 48 anos de idade.

O corpo de José Ferreira, segundo alguns autores, fora enterrado no oitão direito da capela do arraial Santa Cruz do Deserto, ao lado da cova de dona Maria Lopes, sua esposa.

Alguns autores trazem nas entrelinhas de suas obras literárias, escritos que dizem que as mortes dos pais de Virgolino, dona Maria Lopes ocorreu aos 21 dias do mês de maio de 1920 e do velho José Ferreira, aos 29 dias de junho de 1920, um mês e oito dias de uma para a outra... já outros, referem que as mesmas ocorreram em, a de dona Maria, 30 de abril de 1921 e a de José Ferreira em 18 de maio de 1921, dezoito dias entre uma e outra morte... Antônio, Livino e Virgolino, já faziam parte de grupos de cangaceiros, porém, se existia alguma chance de um deles sair da vida de bandidos, essa fora extinta com o assassinato do velho seu pai. Virgolino, já como Lampião, andou colocando emboscadas para ver se matava, vingando, José Lucena, porém, foi abatido em 28 de julho de 1938, depois de uma longa vida como chefe de bando cangaceiro, vinte anos, e nunca conseguiu matar seus piores inimigos, José Alves de Barros, o Zé Saturnino e José Lucena Albuquerque Maranhão, comandante da volante que matou José Ferreira, seu pai... nas quebradas do Sertão alagoano.


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