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quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

O ALEMÃO QUE NÃO FEZ A SAUDAÇÃO NAZISTA – QUANTOS DE NÓS TERÍAMOS A MESMA CORAGEM?

Por: Rostand Medeiros

Hamburgo, Alemanha Nazista, 1936, uma multidão de pessoas se reuniu em um estaleiro para assistir ao lançamento do navio-escola da marinha SSS Horst Wessel, em que o próprio Adolf Hitler estava presente. Enquanto centenas levantavam obedientemente seus braços em uníssono na saudação nazista, um homem na parte de trás da multidão ficou com os braços cruzados sobre o peito e apertando os olhos para quem estava fazendo a saudação.

No destaque vemos  August Landmesser sem realizar a saudação nazista, em uma solenidade onde o próprio Hitler estava presente
No destaque vemos August Landmesser sem realizar a saudação nazista, em uma solenidade onde o próprio Hitler estava presente

Esta figura era desconhecida até 1991, quando a sua famosa foto foi publicada em 22 de março, no jornal alemão “Die Zeit”. Logo uma de suas filhas o identificou como sendo August Landmesser, um trabalhador do estaleiro Blohm + Voss, da cidade de Hamburgo.

August Landmesser
August Landmesser

Landmesser, nascido em 24 de maio de 1910,  foi inclusive membro de carteirinha do Partido Nazista, onde entrou em 1931 na esperança de conseguir um emprego, mas tinha uma razão muito pessoal para não fazer mais a infame saudação. No verão de 1935, de acordo com o ”Nürnberger Gesetze” (“Leis de Neuremberg”), o Estado nazista proibia Landmesser, como um não judeu, a se casar com Irma Eckler, a sua amada companheira.

Consta que a condição de judia de Irma não era totalmente correta. Seu pai, Arthur Eckler, nasceu da união de uma mãe judia e um pai não judeu. Com a morte de seu pai, seu padrasto conseguiu convencer Irma, sua mãe e suas irmãs a se converterem ao protestantismo e serem batizadas. Mas para o regime de Hitler a jovem Irma era uma judia.

Irma Eckler
Irma Eckler

Independente disso o casal seguiu adiante na sua luta para continuarem unidos. Em 29 de outubro de 1935 nasceu a primeira filha, chamada Ingrid. Em 1937 a família tentou fugir para a Dinamarca, mas Landmesser foi preso e se tornou conhecido que Irma estava grávida.

Landmesser então foi acusado pelas leis nazistas de “desonrar a raça”. Ele argumentou que não sabia se Irma era totalmente judia e foi absolvido por falta de provas em 27 de maio de 1938. Mas com o aviso de que uma reincidência resultaria em uma pena de prisão de vários anos.

Mesmo com o perigo a espreita, Landmesser e Irma continuaram seu relacionamento publicamente e esta atitude foi fatal.

No dia 15 de julho de 1938 ele foi novamente preso por ter se apaixonado e condenado há dois anos e meio em regime fechado. Entre as peças de acusação estava a foto que se tornaria famosa. Landmesser cumpriu a pena no campo de concentração de Börgermoor, onde os presos foram usados ​​para o trabalho forçado em fábricas de armamento e estaleiros.

Já Irma foi detida pela Gestapo e colocada na prisão de Fuhlsbüttel, em Hamburgo, onde ela deu à luz uma segunda filha, Irene. De lá ela foi enviada para o campo de concentração de Oranienburg, depois para o campo de Lichtenburg e em seguida campo de concentração das mulheres de Ravensbrück.

Ficha de Irma
Ficha de Irma

Suas filhas foram inicialmente levadas para o orfanato da cidade de Hamburgo. Ingrid mais tarde foi autorizada a viver com uma avó e Irene foi adotada por outra família. Algumas cartas de Irma Eckler chegaram até suas filhas em janeiro de 1942. Acredita-se que Irma foi levada para o chamado Centro de Eutanásia de Bernburg em fevereiro de 1942, onde ela foi morta na câmara de gás junto com outras 14 mil pessoas.

Landmesser foi libertado em 1941 e viveu como capataz de uma fábrica. Mas em fevereiro de 1944 ele foi convocado para servir no batalhão penal Bewaehrungsbattalion 999 (uma unidade do exército alemão formada por ex-criminosos). Foi declarado desaparecido em ação e supostamente morto durante combates ocorridos na Croácia, em 17 de outubro de 1944.

Landmesser, Irma e suas filhas
Landmesser, Irma e suas filhas

Irene Eckler publicou em 1996 o livro “Die Vormundschaftsakte 1935-1958:einer Familie Verfolgung wegen Rassenschande”, onde conta a história da destruição de sua família pelas leis racistas da Alemanha nazista. Publicado em alemão e em inglês, obteve grande sucesso na Alemanha e em outro países da Europa.

A autora buscou familiares da sua mãe que tivessem sobrevivido a guerra para descobrir o máximo que pudesse acerca do seu passado e esteve nos tribunais locais em busca de documentos. O livro inclui uma grande quantidade de fotos de materiais originais, como cartas de sua mãe e documentos de instituições estatais.

Quando eu olho para a fotografia de August Landmesser, eu vejo um homem que se recusou a realizar um nefasto gesto coletivo e, assim, optou por não ficar em silêncio e viver junto de quem amava.

August Landmesser em momentos mais aprazíveis
August Landmesser em momentos mais aprazíveis

Tenho certeza de que no meio da multidão naquele dia, havia muitos mais que desejariam não realizar aquela saudação infame, mas não tiveram a coragem de repetir o mesmo gesto de Landmesser. Quase oitenta anos depois é fácil ser crítico de todos aqueles que são vistos saudando. Mas isso é uma reação simples.

Mais instrutivo é olhar no espelho e se perguntar: “Qual tipo de sacrifício eu realmente faria por quem eu amo?”.

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