Por: Rostand Medeiros
Hamburgo,
Alemanha Nazista, 1936, uma multidão de pessoas se reuniu em um estaleiro para
assistir ao lançamento do navio-escola da marinha SSS Horst Wessel, em que
o próprio Adolf Hitler estava presente. Enquanto centenas levantavam
obedientemente seus braços em uníssono na saudação nazista, um homem na parte
de trás da multidão ficou com os braços cruzados sobre o peito e apertando os
olhos para quem estava fazendo a saudação.
No
destaque vemos August Landmesser sem realizar a saudação nazista, em uma
solenidade onde o próprio Hitler estava presente
Esta figura
era desconhecida até 1991, quando a sua famosa foto foi publicada em 22 de
março, no jornal alemão “Die Zeit”. Logo uma de suas filhas o identificou como
sendo August Landmesser, um trabalhador do estaleiro Blohm + Voss, da
cidade de Hamburgo.
August
Landmesser
Landmesser,
nascido em 24 de maio de 1910, foi inclusive membro de carteirinha do
Partido Nazista, onde entrou em 1931 na esperança de conseguir um emprego, mas
tinha uma razão muito pessoal para não fazer mais a infame saudação. No verão
de 1935, de acordo com o ”Nürnberger Gesetze” (“Leis de Neuremberg”), o
Estado nazista proibia Landmesser, como um não judeu, a se casar com Irma
Eckler, a sua amada companheira.
Consta que a
condição de judia de Irma não era totalmente correta. Seu pai, Arthur Eckler,
nasceu da união de uma mãe judia e um pai não judeu. Com a morte de seu pai,
seu padrasto conseguiu convencer Irma, sua mãe e suas irmãs a se converterem ao
protestantismo e serem batizadas. Mas para o regime de Hitler a jovem Irma era
uma judia.
Irma
Eckler
Independente
disso o casal seguiu adiante na sua luta para continuarem unidos. Em 29 de
outubro de 1935 nasceu a primeira filha, chamada Ingrid. Em 1937 a família
tentou fugir para a Dinamarca, mas Landmesser foi preso e se tornou conhecido
que Irma estava grávida.
Landmesser
então foi acusado pelas leis nazistas de “desonrar a raça”. Ele argumentou que
não sabia se Irma era totalmente judia e foi absolvido por falta de provas em
27 de maio de 1938. Mas com o aviso de que uma reincidência resultaria em uma
pena de prisão de vários anos.
Mesmo com o
perigo a espreita, Landmesser e Irma continuaram seu relacionamento
publicamente e esta atitude foi fatal.
No dia 15 de
julho de 1938 ele foi novamente preso por ter se apaixonado e condenado há dois
anos e meio em regime fechado. Entre as peças de acusação estava a foto que se
tornaria famosa. Landmesser cumpriu a pena no campo de concentração de
Börgermoor, onde os presos foram usados para o trabalho forçado em fábricas
de armamento e estaleiros.
Já Irma foi
detida pela Gestapo e colocada na prisão de Fuhlsbüttel, em Hamburgo, onde ela
deu à luz uma segunda filha, Irene. De lá ela foi enviada para o campo de
concentração de Oranienburg, depois para o campo de Lichtenburg e em seguida
campo de concentração das mulheres de Ravensbrück.
Ficha
de Irma
Suas filhas
foram inicialmente levadas para o orfanato da cidade de Hamburgo. Ingrid
mais tarde foi autorizada a viver com uma avó e Irene foi adotada por outra
família. Algumas cartas de Irma Eckler chegaram até suas filhas em janeiro de
1942. Acredita-se que Irma foi levada para o chamado Centro de Eutanásia
de Bernburg em fevereiro de 1942, onde ela foi morta na câmara de gás junto com
outras 14 mil pessoas.
Landmesser foi
libertado em 1941 e viveu como capataz de uma fábrica. Mas em fevereiro de 1944
ele foi convocado para servir no batalhão penal Bewaehrungsbattalion 999 (uma
unidade do exército alemão formada por ex-criminosos). Foi declarado
desaparecido em ação e supostamente morto durante combates ocorridos na
Croácia, em 17 de outubro de 1944.
Landmesser,
Irma e suas filhas
Irene Eckler
publicou em 1996 o livro “Die Vormundschaftsakte 1935-1958:einer Familie
Verfolgung wegen Rassenschande”, onde conta a história da destruição de sua
família pelas leis racistas da Alemanha nazista. Publicado em alemão e em
inglês, obteve grande sucesso na Alemanha e em outro países da Europa.
A autora
buscou familiares da sua mãe que tivessem sobrevivido a guerra para descobrir o
máximo que pudesse acerca do seu passado e esteve nos tribunais locais em busca
de documentos. O livro inclui uma grande quantidade de fotos de materiais originais,
como cartas de sua mãe e documentos de instituições estatais.
Quando eu olho
para a fotografia de August Landmesser, eu vejo um homem que se recusou a
realizar um nefasto gesto coletivo e, assim, optou por não ficar em silêncio e
viver junto de quem amava.
August
Landmesser em momentos mais aprazíveis
Tenho certeza
de que no meio da multidão naquele dia, havia muitos mais que desejariam não
realizar aquela saudação infame, mas não tiveram a coragem de repetir o mesmo
gesto de Landmesser. Quase oitenta anos depois é fácil ser crítico de todos
aqueles que são vistos saudando. Mas isso é uma reação simples.
Mais
instrutivo é olhar no espelho e se perguntar: “Qual tipo de sacrifício eu
realmente faria por quem eu amo?”.
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