Juliana
Pereira Ischiara e Alcino Alves Costa
No alvorecer daquela quinta-feira, do dia 28 de julho de 1938,
naquele socavão ressequido e árido do Riacho do Angico, então jurisdição do
território de Porto da Folha, e hoje após o desmembramento de suas terras em 23
de novembro de 1953, pertencendo ao município de Poço Redondo, foi morto pelas
armas do tenente João Bezerra da Silva e sua volante, um dos maiores
personagens da história nordestina e brasileira, o famoso Virgulino Ferreira da
Silva, celebrizado com o nome fantástico de Lampião, ainda a sua amada
companheira Maria Bonita e mais nove de seus parceiros de desdita.
Lá
se vão 70 anos daquele fabuloso acontecimento. Num Brasil que se carrega a
cultura de não se preservar a História causa admiração à chama viva e ardente
que teimosamente não para de arder no sentimento do povo brasileiro que entra
ano e sai ano e a saga do rei dos cangaceiros é pesquisada, esmiuçada e
continua a ser escrita e comentada em verso e prosa por todo Brasil e além
fronteira.
É deveras motivo de admiração à magia desse caipira das barrancas do
Riacho São Domingos, nas terras da antiga Vila Bela, hoje Serra Talhada, que
com uma força portentosa continua a dominar e enfeitiçar todos os segmentos
sociais e culturais de nossa nação.
Aqui onde Lampião, Maria Bonita e mais nove integrantes de seu bando foram executados.
O
seu poder de persuasão chega às raias do inacreditável. O seu domínio sobre
seus semelhantes foi e é imenso e envolvente. E assim, Lampião coloca sobre os
que procuram enfadonhamente pesquisá-lo um campo recheado de intransitáveis e
misteriosos labirintos que deixa todos zanzando pra lá e pra cá sem alcançar a
verdade do que aconteceu em Angico.
Em meu
livro “Lampião além da versão”, no subtítulo “Mentiras e mistérios de Angico”,
eu discorro sobre o medonho mistério que o titã da Passagem das Pedras espalhou
naquela grota do riacho, e ainda, as descomunais mentiras que as mais diversas
testemunhas – coiteiro, soldado, cangaceiro – fizeram chegar até as páginas dos
incalculáveis livros que tem como finalidade registrar a epopeia cangaceira e
em especial a chacina de Angico.
Os
exemplos são muitos. Jaques Cerqueira, subeditor do Viver do Jornal Diário de
Pernambuco, é o autor de um artigo intitulado “A outra morte de Lampião”, que
saiu no jornal Página Certa, de Mossoró, no Rio Grande do Norte, afirmando com
convicção de que Lampião não morreu em Angico, e sim em setembro de 1981. No livro
“Lampião e Zé Saturnino – 16 anos de luta”, de autoria de José Alves Sobrinho,
que era sobrinho em segundo grau de José Saturnino, o inimigo número 1 de
Lampião, este respeitável senhor atesta com convicção que Lampião não morreu em
Angico, e sim aos 83 anos de idade, na fazenda Ouro Preto, em Tocantinópolis,
Goiás.
José Alves ainda afirma: “O Capitão Virgulino tinha o olho esquerdo com
pálpebra arriada, e não o olho direito fechado como o da cabeça decepada pela
Polícia e mostrada no Museu”.
Quase
sempre, é certo, aparecem livros que se enveredam pelas versões e mistérios que
estão fincados na Grota de Angico. Existe um boato de que ainda neste ano de
2008 serão lançados dois livros que com fundamentos poderosos desejam provar
que Lampião não morreu em Angico.
Tenho certeza absoluta de que tudo que se registrou sobre o cerco e o combate
de Angico não passa de uma grotesca e quase que ingênua mentira. Aliás, as mais
variadas mentiras que não se deve dar por elas nenhum crédito. Todavia, mesmo
acreditando que tudo pode ter acontecido naquele histórico riacho, jamais eu me
arriscaria em afirmar que Lampião não morreu naquele célebre combate com as
“forças” alagoanas. No entanto, o que é deveras muito estranho é a maioria dos
historiadores e estudiosos do cangaço não querer nem ouvir falar no que possa
ter acontecido de real e verdadeiro em Angico e que venha contrariar a versão
oficial mesmo que ela comprovadamente tenha sido edificada em cima de
depoimentos absolutamente mentirosos.
Todos sabem, e isto não é nenhuma novidade, que os testemunhos dos que
participaram de corpo presente, inclusive João Bezerra, do dia final de
Lampião, são absurdamente falsos e mentirosos.
Não consigo compreender qual a razão de muitos ainda continuar a dar
crédito aos depoimentos que estão registrados sobre o dia final de Lampião e do
cangaço quando os mesmos não oferecem nenhuma sustentação que se possa alcançar
a mais simples fundamentação.
Lampião morreu em Angico? Acredito que sim. Mas, me pergunto: por que os
estudiosos, os historiadores, os pesquisadores, enfim a sociedade brasileira,
não aceita sob hipótese alguma desfazer as terríveis mentiras que foram plantadas
naquele pedacinho histórico de sertão?
E
se Lampião não morreu em Angico, como é que fica a história?
Não
me surpreende o comportamento de muitos estudiosos do cangaço quando eles
apresentam versões que atestam não ter Lampião sido morto em Angico. Não desdenho
e nem fico fazendo chacota das mais diversas afirmações nesse sentido saídas de
pessoas de gabarito, responsabilidade e respeito, mas que, dominados pela
incomparável inteligência e habilidade de Lampião se vêem reféns de sua
misteriosa estratégia que tem envolvido por todos os anos de sua vida e morte
aqueles que nunca se cansaram de rastejá-lo.
Publicado nos blogs:
http://cariricangaco.blogspot.com
http://lampiaoaceso.blogspot.com
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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