por Eugênio
Nascimento em Colunas
O tema do
cangaço, constantemente, nos surpreende, reaparecendo, a cada dia, em novas
versões sobre suas marcas na história e na cultura nordestinas. Desde quando
ainda era um problema social, o cangaço foi tema frequente na imprensa
brasileira e a morte de Lampião teve repercussão até em jornais estrangeiros,
como o New York Times, como registrado no Diário Oficial do Estado de Sergipe,
em 1938. O maior dos cangaceiros, inclusive, sabia manipular as imagens que
eram veiculadas, como é perceptível na famosa fotografia feita por Abraão
Benjamin, em 1936, em que posa lendo, provavelmente, a Noite Ilustrada, ao lado
da amada Maria Bonita. A repercussão destas imagens veiculadas na imprensa da
época incomodava, sobejamente, os governadores nordestinos e o próprio Getúlio
Vargas.
A iniciativa de Gilfrancisco de compilar as menções ao bando de Lampião durante os anos 1930 presentes no Noticiário Oficial de Sergipe, quando o famigerado bandoleiro se estabeleceu nas fronteiras dos Estados de Sergipe, Bahia e Alagoas, revela a preocupação dos governantes ao longo daqueles anos de afirmar a inexistência da presença de cangaceiros em terras sergipanas, quando sabemos de notícias de Lampião na região desde os idos de 1929.
De um modo geral, a imprensa sergipana, durante essa década, apresentava os cangaceiros como bandidos abjetos, sistematicamente violentos, inimigos da civilização e da sociedade. Assim, o cangaço aparecia como um dos elementos desestabilizadores da sociedade por conta da ausência da monopolização da violência pelo Estado e da necessidade de se civilizar o sertão. Portanto, o combate ao banditismo rural fazia parte de estratégias discursivas da governamentalidade, no sentido foucaultiano do termo. Assim, para além da temática do cangaço, o que percebemos neste livro é que a imprensa oficial de Sergipe registra ao longo do período de 1930-1938 as disputas entre as frações dominantes pela hegemonia política do Estado, especialmente a chamada Reação Conservadora (1935-1937), tão bem analisada pelo professor Ibarê Dantas, em Revolução de 1930 em Sergipe. Aliás, existe a preocupação recorrente do governador Eronides de Carvalho em se desvincular da imagem de coiteiro de cangaceiros, atribuída ao seu pai, o coronel Antonio Carvalho.
Governador Eronides de Carvalho e seu pai Antonio Caixeiro
A atual produção intelectual sobre o cangaço tem, sistematicamente, descartado as interpretações de que os cangaceiros eram meros bandidos assassinos e que o fim do cangaço representou o avanço da modernidade nos sertões brasileiros, tão presente na imprensa sergipana dos anos 1930 e acriticamente reproduzida, posteriormente, em determinadas pesquisas desenvolvidas por historiadores e sociólogos locais. Não se pode esquecer que a presença da violência e da criminalidade fez parte da formação da sociedade rural nordestina, com evidente associação entre coronelismo e cangaceirismo.
Penso que o livro de Gilfrancisco contribui para reafirmar a importância de se trazer a lume vestígios do cangaço presentes na história nordestina, contribuindo para que, finalmente, possamos ter, em Sergipe, um Museu do Cangaço do Nordeste.
Aos leitores,
boa leitura.
Antônio Fernando de Araújo Sá - Professor do Departamento de História da UFS
http://www.primeiramao.blog.br/post.aspx?id=9905&t=lampiao-no-diario-oficial-de-sergipe
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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