Por Sálvio
Siqueira
O centralismo
do poder retido pela força daqueles que tinham condições, aqueles que possuíam
grandes extensões de terras e eram ‘protegidos’ pelo poder estadual, colonial
em seu início, ou ainda imperial, e pelos que tinham o poder de executarem a
“Lei” nos sertões nordestinos contribuíram, e muito, para o alastramento do
banditismo rural naquela época
Seu poder era demostrado e executado, muitas vezes tomado, a base do chicote, palmatória, surras e balas. Para isso o “coronel”, normalmente chefe político da região, tinha sobre seu ‘comando’ um contingente de jagunços e pistoleiros os quais, pela força, faziam com que fossem ‘cumpridas’ as determinações de seu patrão.
Uma das
grandes razões, ou surgimento, de vários bandos de bandoleiros nas pradarias
semiáridas sertanejas foi justamente às intempéries climáticas. De tempos em
tempos ocorreu em nossa região, Região Nordeste, uma grande estiagem de uma
década cada de extensão, mais ou menos, isso é um fato comprovado pelos
estudiosos do assunto. A seca batendo ano após ano, o sertanejo da época não
tinha nada como proteção, nada como sair-se dela devido à falta de apoio social
dos administradores. Mesmo na época do Império, aqueles produtos, normalmente
milho, feijão e farinha, que eram enviados para aplacar um pouco a fome dos
sertanejos, os poderosos que tinha o poder político regional nas mãos não
faziam a devida distribuição. Quando muito vendiam os produtos que eram deles
mesmo, a eles próprios, porém, a maioria não tinha posses para pagar, então,
mais uma vez usavam de seu poder para, através dessa esmola, ter sempre parte
da população debaixo de suas “Leis” e ordens.
A História nos
mostra que inúmeros sertanejos padeceram, sofreram e morreram pelas veredas e
estradas de terra na tentativa de salvar-se ou salvar um parente que estava
padecendo sem nada terem para se alimentarem. Nesse meio tempo. Diante de tudo
isso, todo esse sofrimento, alguns viam no uso da espingarda uma saída para
poderem alimentar sua esposa, seus pais ou seus filhos e os bandos de bandoleiros
aumentavam seus contingentes além do surgimento de outros. Nisso entrevam
novamente o poder dos poderosos que inúmeras vezes usavam dos ‘serviços’ desses
homens para expulsarem os famintos que chegavam pedindo em seus lugares.
Voltando aos
poderes dos coronéis do sertão, notamos um fato interessante que é que havia
‘tomadas de poderes’, a força e a bala, entre os próprios partidários,
correligionários, outrora amigos, em busca de mais poderes e status perante os
governantes. A coisa era tão séria, ou ficara, que o maior poder político/
religioso naqueles tempos nos sertões nordestinos, localizado no cariri
cearense sob a tutela do Padre Cícero Romão Batista, elabora uma espécie de
acordo onde todos eles assinam e prontificam-se a não mais usarem daquele tipo
de método, ação violenta. No entanto, continuam exercendo os métodos antigos do
mesmo jeito, maneira, até bem próximo ao fim da Republica Velha. Esse documento
é conhecido como “O Pacto dos Coronéis”.
O poder, ou a
sua busca, direciona, ou redireciona, o homem por ou para caminhos tortuosos,
mal-assombrados, sangrentos e mortíferos. Socialmente notamos que fora uma
triste herança deixada pelos que fizeram a colonização sertaneja, ou seja, eram
atos que foram ‘migrados e implantados’ dos confins feudais europeus. O
sociólogo Pernambucano de Mello referindo sobre o assunto, nos diz o seguinte:
“... herança quase intocada dos primórdios da colonização sertaneja, vale
dizer, de um momento social em que a ausência do poder público impunha a guerra
privada como procedimento incontornável e, assim, legítimo." (MELLO, 2011)
Assinando o
‘Pacto dos Coronéis”, no primeiro meado de 1911, estes se comprometeram, sob a
referência de várias cláusulas, referindo-se aos ‘chefes’ políticos, ou seja,
aos coronéis, duas que discernia: “Nenhum chefe procurará depor outro chefe,
seja qual for a hipótese” e “cada chefe, a bem da ordem e da moral política,
terminará por completo a proteção a cangaceiros, não podendo protegê-los e nem
consentir que os seus munícipes, seja sob que pretexto for, os protejam,
dando-lhes guarida e apoio.” O que vemos na sequência histórica após as
assinaturas do pacto, são atos totalmente ao contrário daqueles que fora
acordado. Também pudera, se o próprio Padre Cícero, três anos depois, em 1914,
usa jagunços, cangaceiros e pistoleiros para derrubar o governo cearense?
Sempre foi assim, no papel estava, ou está, escrito uma coisa, no entanto, as
ações são praticadas totalmente ao contrário quando se referem a conquista de
poderes e ao domínio da população menos abastada social e culturalmente.
Mostraremos a
seguir, resumidamente, as ações executadas pelos ‘coronéis do poder’ buscando o
poder de outros e, pasmem, a maioria de seus aliados, num período de 28 anos
entre os anos de 1901 a 1928, onde se deu o epílogo da primeira fase do cangaço
e inicia-se a segunda:
“1901 – O
coronel Antônio Joaquim de Santana(um dos maiores coiteiros de todos os
tempos, tendo favorecido tanto a cabras de Antônio Silvino quanto, anos depois,
ao bando de Lampião), depõe violentamente seu correligionário político Antônio
Róseo Jamacaru, assumindo o comando da situação em Missão Velha. O deposto é
obrigado a retirar-se do município, indo refugiar-se em Jaguaribe, onde vem a
falecer.”
“1904 – Após tiroteio que se inicia a 27 de julho e se prolonga até as 15 h de
29, é deposto o chefe político do Crato, à época também vice presidente do
Estado, coronel José Belém de Figueiredo, pelo coronel Antônio Luís Alves
Pequeno, que recrutara um verdadeiro exército privado junto a Antônio
Clementino de Carvalho, o famoso Quelé do Santo André ( fazenda), em Belmonte,
Pernambuco. Nada faz o Presidente do Estado ante o fato consumado, conforme a
praxe.”
“1906 – Após oito horas de fogo, cai o chefe político da Barbalha, coronel Manuel Ribeiro da Costa, como resultado de um concerto de forças de correligionários seus, auxiliados por membros da oposição.”
“1907 – O coronel Gustavo Lima depõe a bala o próprio irmão, coronel Honório Lima, assumindo o comando político do município de Lavras.”
“1908 – O negociante Laurenço Gomes tenta depor a bala o intendente municipal
José Carlos Augusto, de Santana do Cariri. O resultado do tiroteio lhe sai
adverso. É cruelmente assassinado por correligionários da situação.”
“1908 – A vila de Campos Sales é atacada pelo coronel Raimundo Bento de Souza Baleco, que depõe o chefe político José Maia e o intendente municipal Cipriano Alves Feitosa.”
“1908 – Chefiando quatrocentos homens, o major José Inácio de Souza, do Barro, depõe o chefe situacionista de Aurora, coronel Antônio Leite Teixeira Neto, pondo em seu lugar o coronel Cândido Ribeiro Campos, pessoa da sua confiança. O deposto tem seus bens saqueados e incendiados e é escorraçado do município.”
“1908 – Dá-se a tentativa de deposição a bala do intendente municipal de Araripe, Ant^nio Matas, que reside, juntamente com o delegado de polícia, Sabino Clementino, conseguindo levar a melhor sobre os atacantes, a família dos Geraldo, da localidade Paus Pretos. Os Geraldo vêm a ser atacados posteriormente por Matas e Sabino, em Paus Pretos, em combate de que resultam quatro mortes do lado dos Geraldo e o desbaratamento da família audaciosa, que não mais volta a atacar Araripe.”
“1909 – Novamente Matas e Sabino são atacados em Araripe, já agora pelo coronel
Pedro Silvino de Alencar. Dessa vez a sorte não lhes sorri. Caem após duas
horas de cerrado tiroteio, no qual Sabino vem a ser morto.”
“1909 – Os chefes políticos de Milagres, Missão Velha, Barbalha e outros municípios próximos reúnem cerca de mil homens em armas para atacar o coronel Antônio Luís Alves Pequeno, do Crato, que levanta um exército equivalente em sua defesa. Da intervenção de alguns amigos comuns resulta, a muito custo, o apaziguamento dos ânimos, sendo evitado o combate.”
“1910 – Após oito horas de fogo, o coronel Gustavo Lima consegue repelir, em Lavras, ataque levado a efeito por Joaquim Vasques Landim, que pretendia depô-lo.”
“1915 – O coronel Raimundo Cardoso dos Santos, intendente do município de Porteiras, é deposto a bala, a 13 de junho, por líderes políticos de Brejo Santo.”
“1922 – Tiroteio em Lavras entre as facções do intendente Raimundo Augusto de Lima, filho do coronel Gustavo Lima, e do coronel José Leite de Oliveira, por motivos políticos, provoca a morte de três dos participantes e ferindo grave o intendente.”
“1923 – É assassinado em Fortaleza, por motivos políticos, o coronel e então
deputado estadual Gustavo Lima, chefe de Lavras.”
“1925 – Em meio a uma áspera disputa política que já durava meses, ferem-se vários tiroteios em Missão Velha entre os coronéis Isaías Arruda (um dos mais fortes coiteiros que Lampião possuía no Ceará), e Manuel Ribeiro Dantas, o Sinhô Dantas, este último, chefe político municipal.”
“1926 – Manuel Alexandre de Sá, à frente de cento e vinte homens, ataca Santana do Cariri com o fim de depor o prefeito municipal, coronel Felinto da Cruz Neves, cuja família tinha sido muito ligada ao famoso cangaceiro Sinhô pereira. Recuam os atacantes após dez horas de fogo.”
“1926 – A 18 de novembro, Manuel Alexandre de Sá, chefiando cem homens, ataca novamente o coronel Felinto Neves. Amarga nova derrota após trinta e seis horas de fogo, nas quais sofre quinze baixas graves entre seus homens, sendo uma fatal: a de um de seus filhos.”
1928 – Terceiro e último ataque de Manuel Alexandre ao coronel Felinto. Novo insucesso após quinze horas de fogo. Flinto seria assassinado anos depois, mas por outros inimigos.”
1928 – Tendo finalmente ascendido à chefia política de Missão Velha, por conta de apoio recebido do governo do Estado, Isaías Arruda vem a ser assassinado no trem, quando transitava pelo município de aurora.” (MELLO, pgs 174 A 177, 2011)
O surgimento
do Fenômeno Social Cangaço, que aflorou dentro de outro Fenômeno Social, o
“Coronelismo”, deu-se, em parte, devido ao Fenômeno Natural de Secas
Constantes.
Nos anos de 1919 a 1920, dois anos seguidos de seca, notamos um aumento bastante elevado de bandos de bandoleiros e, em seguida, nos anos de 1921 e 1922, o poder público dar maiores combate a vários deles com êxitos positivos. Outro fator que também elevava as ações dos grupos de cangaceiros, até mesmo contribuindo indiretamente para seu maior alastramento, foram os movimentos políticos regionais e nacionais.
O Fenômeno Social Cangaço, como tantos outros dentro e fora de nosso País, deram-se, surgiram, por motivos sociais.
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