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sábado, 9 de junho de 2018

LAMPIÃO ESTUPRA ROMANA NA BAHIA


Por Sálvio Siqueira

Na segunda metade do ano de 1928 o “Rei do Cangaço”, o cangaceiro Lampião, para manter-se vivo e continuar com seu reinado sangrento, transfere-se para o Estado baiano. Antes de iniciar suas ações naquele reduto, o chefe cangaceiro pernambucano, procura fazer amizades com donos de propriedades rurais, trabalhadores/moradores deste e com comerciantes da região escolhida. Virgolino patrocina e realizar grades festas para a população. Ele consegue mostrar uma face totalmente diferente daquela que os periódicos o tinham descrito até então e assim as conversas entre eles, o boca - a – boca, levava aos quatro cantos do Estado o quanto “ele” era bom, farrista e resolvedor de problemas familiares, de terras e de moças ‘bolidas’ por rapazes que não queriam assumir. A coisa ficou tão apaziguada que vários casais tomaram ele para ser padrinho de seus filhos e codificaram seu nome de “O Homem”.
Tendo ganhado a confiança dos sertanejos baianos, começa outra etapa muito importante para seus objetivos que seria a reestruturação da sua malha de fornecedores, informantes e acoitadores, peças que foram o principal sustentáculo dos grupos cangaceiros nos séculos em que o Fenômeno Social sobreviveu, além de começar um recrutamento intenso. Da Bahia foram muitos, porém, do Estado sergipano, mais precisamente do município, hoje, de Poço Redondo, ele consegue um verdadeiro batalhão de jovens para prestarem seus ‘serviços’.


A Revolução de 1930 caiu como uma luva para quem vivia do banditismo rural naquela época. Principalmente o jovem pernambucano de Vila Bela, que não deixava passar certas oportunidades, tendo as Forças Públicas dos Estados sido obrigadas a desviar suas tropas combatentes para combaterem os contrários a Revolução, a população do sertão nordestino ficou quase que ao Deus dará. Então Lampião reinicia suas atividades sem quase ter quem lhe der combate.


A coisa aperta tanto que a imprensa da Capital do país começa a se movimentar e o “A Noite”, renomado veículo de comunicação em massa da época, resolveu enviar correspondentes para uma averiguação de perto dos fatos que ocorriam. Nas proximidades da cidade de Uauá, BA, já em princípios de 1931, deu-se um acontecimento que até aquele momento, principalmente para os baianos, era inédito quanto às ações de Virgolino e seus asseclas.


Segundo as notícias, o caso ocorreu no lugar chamado São Paulo, distando, mais ou menos, quarenta quilômetros de Uauá, BA. Havia naquele lugarejo um cidadão chamado Manoel José Cardoso, sendo mais conhecido como “José Pequeno”, casado com a senhora “Ana Cardoso”. Pois bem, Lampião recebe a notícia que esse dito cidadão havia avisado as autoridades que ele estava agindo naquelas redondezas. Depois de uma breve perseguição sofrida por uma volante, o “Cego” resolveu acertar as contas com o suposto delator. A lição teria que ser grande, tanto que quem notícia dela tivesse, longe o perto, perderia toda e qualquer vontade de caguetar os cangaceiros as autoridades. O medo sempre foi uma arma muito importante em qualquer conflito, na época do cangaço foi usado em abundância pelas duas partes, volantes e cangaceiros, nas brenhas sertanejas.


Chegando ao lugarejo, Lampião ordena que seus homens peguem “José Pequeno” e sua esposa, dona Ana, rasguem suas roupas e os colocassem pelados e amarrados no lombo de um cavalo. Em seguida o chefe dar uma nova ordem para que seus ‘cabras’ trouxessem todos até onde estavam, em frente a capela do arruado, para que vissem como ele tratava quem o ’traia’. Quando a população estava reunida em volta do casal Cardoso, o próprio Lampião saca seu punhal com mais de 70cm de comprimento e sangra o homem pela ‘saboneteira’ o enterrando por completa. Estando amarrada ao marido e vendo, sentido as contorções do corpo dele junto ao seu, levaram dona Ana a total loucura. Cardoso antes de ser sangrado tinha dito a Lampião que não teria sido ele a dedurar sua passagem e sim um cidadão chamado José Félix, que estando presente, foi abatido a tiros de pistola pelos cangaceiros logo em seguida.


No mesmo dia, o chefe mor do cangaço resolveu dar outo exemplo de como agia com grandes e pequenos que ficassem contra ele, então tortura o cidadão de maiores posses naquela ribeira, o coronel João Antônio Cardoso. Na fazenda Tapuia, do senhor Tibério Lucas Correa, que além de labutar na roçado tinha uma venda, bodega, em casa, também vítima do bando de Lampião. A cabroeira chega, sedenta de sangue e pinga, começa a mandar colocar garras de cachaças sobre um pequeno balcão que havia. Após alguns goles da marvada, Lampião tenta extorquir o agricultor/comerciante, que vendo que dizer não possuir ‘cobre’ não adiantaria muito, lascou os peitos na jurema e meteu-se dentro do mato que nem bala o alcançava. Sua esposa, dona Lúcia, que não teve como fugir, pagou o pato a través de chicotadas, tapas e bofetes da caterva. Sempre ameaçando de matar o esposo caso na próxima ‘visita’ não tivesse dinheiro para ele. Para o exemplo ser maior, Lampião manda que ela retire seus familiares de dentro da casa e, após a coitada em prantos retirar a filharada, ver sua moradia ser incendiada.


Lampião tinha tirado o mês de abril de 1931 para aterrorizar a região entre Uauá e Senhor do Bonfim, ambas na Bahia. Depois das ‘visitas’ aos lugares descritos acima, ele ainda apronta das suas, com os moradores das fazendas Pereiro, Riacho Seco, Caldeirão, Olho D’água, Vargem Seca, Junco e outras mais. Próximo a cidade de Senhor do Bonfim, BA, lugar onde os retos mortais de meu avô paterno encontram-se enterrados, e onde moram duas tias que nunca tive o prazer de vê-las, havia uma fazenda chamada Passagem. O dono dessa fazenda chamava-se Joaquim Gomes Cardoso, que mesmo sendo coxo d’uma perna, foi surrado e roubado pelos cangaceiros.


Ainda na fazenda Passagem, havia a casa do senhor Bertoldo Cândido dos Santos, esposo da senhora Maria Martins, que relatou como sua filha Romana foi estuprada pelo “Rei do Cangaço”, “(...) O enviado de A Noite afirma que no retorno de Lampião a casa da jovem sertaneja, aparentemente sem maiores delongas, este partiu para cima de Romana e a estuprou. Ela ainda foi ferida a punhal por tentar se defender. Não foi informado se outros cangaceiros se aproveitaram sexualmente da jovem indefesa (...). O correspondente informou que a irmã de Romana havia escapado por se encontrar fora de casa, mas em sua opinião o ataque sexual a garota havia desestruturado de tal maneira a sua família, que seu pai Bertoldo estava com características de “quem estava variando”. Ou seja, ficando louco” (Rostand Medeiros em seu Tokdehistória.com)


Segundo a matéria do periódico citado, Romana não foi a única vítima de estupro da horada selvagem comandada por Virgolino naqueles dias de abril de 1931.


“REFERÊNCIAS”

[1] A Noite foi um jornal vespertino criado pelo jornalista niteroiense Irineu Marinho e lançado em 18 de julho de 1911 no Rio de Janeiro. Empreendedor, Irineu Marinho vislumbrou já naquela época a ideia do conglomerado de mídia, com uma ação dinâmica no jornalismo. Em 1922, sendo seu jornal acusado de cooperar com o levante dos tenentes do Forte de Copacabana (18 do Forte), passou quatro meses preso na Ilha das Cobras (baía de Guanabara), de onde saiu com a saúde abalada. Partiu para a Europa com a família em 1924, de onde voltou para fundar, em 29 de julho de 1925, O Globo – herdado por seu primogênito, Roberto Marinho, com sua morte, em 21 de agosto, aos 49 anos. Sobre o envio do correspondente e do fotógrafo, as razões do envio destes profissionais não são comentadas.Ver – http://observatoriodaimprensa.com.br/…/_ed723_irineu_e_o_j…/
[2] Mesmo aparentemente o trajeto realizado pelos enviados do jornal em 1931 ser diferente das modernas estradas asfaltadas que ligam os dois municípios baianos, segundo o jornalista, sem maiores paradas, o trajeto por eles realizado levaria cerca de doze horas. Hoje é realizado, com tranquilidade, em duas horas e meia.
[3] Ver Jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de segunda-feira, 20 de abril de 1931, 2ª página (http://memoria.bn.br/).
[4] Ver Jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de segunda-feira, 11 de maio de 1931, 3ª página.
[5] A cidade mineira de Januária foi um importante entreposto comercial em uma época que o Rio São Francisco permitia a navegação de grandes barcos a vapor. A aguardente de Januária passou a abastecer todo o país, sendo apreciada e elogiada pelos maiores conhecedores, tornando a cidade um sinônimo de cachaça de qualidade produzida no Brasil. O primeiro engarrafador de aguardente em Januária, segundo informações locais, foi o Sr. Abílio Magalhães em 1926 com a marca “Januária Crystal”. Em 1928 o Sr. Claudionor Carneiro lançou a marca “Januária”, que posteriormente teria seu nome alterado para “Claudionor”. Outras marcas surgiram na cidade, muitas das quais já não existem mais. Ver http://cachaca.januaria.zip.net/
6] Ver Jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de segunda-feira, 11 de maio de 1931, 3ª página.
7] Ver Jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de segunda-feira, 11 de maio de 1931, 3ª página.
8] Ver Jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de terça-feira, 12 de maio de 1931, 3ª página.
[9] Ver Jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de quinta-feira, 14 de maio de 1931, 1ª página.
[10] Segundo uma das notas do jornal, a cidade de Senhor do Bomfim tinha no início da década cerca de 12.000 habitantes e apenas 23 policiais para protegê-la, sendo raras as localidades que tinham mais de 12 policiais. Ver Jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de segunda-feira, 1 de fevereiro de 1931, 1ª página.
[11] Ver Jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de quinta-feira, 14 de maio de 1931, 1ª página.
[12] Ver Jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de quinta-feira, 15 de maio de 1931, 1ª página.
[13] Vale lembrar que antes destes ataques no início do abril, Lampião evitou pela segunda vez um confronto contra os defensores da cidade baiana de Itiúba. Ver http://lampiaoaceso.blogspot.com.br/…/itiuba-repeliu-lampia…
[14] Ver Jornal “A Noite”, Rio de Janeiro, edição de segunda-feira, 18 de maio de 1931, 1ª página.
[15] FONTES, Oleone Coelho. Lampião na Bahia. 4a. ed. Petrópolis : Vozes, 2001. Páginas 214 a 217.

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