Página do Rubens Stone
- Extraído do
Jornal de Pernambuco, edição do dia 29/07/1938, um dia após a morte de Lampião.
OS
DESCENDENTES DO CRIME
MACEIÓ, 26 (Da
Succursal do DIÁRIO DE PERNAMBUCO) - O Sr. Oswaldo Santos, da Associação
Alagoana de Imprensa, communica-nos o seguinte:
"Da acção
barbara, da sêde de sangue dos cangaceiros que infestam os sertões de Alagoas,
vêm-se as mais desoladoras notícias.
Andam em
grupos depredando, roubando, matando e fazem-se e fazem-se acompanhar por
mulheres que também tomam parte nos crimes. É mister que muitas dessas mulheres
dão a luz em plena catinga nos esconderijos, a filhos de seus maridos ou
amasios. E como as creanças são um embaraço á vida errante, inquieta e ameaçada
dos cangaceiros, estes encontraram como resolver o caso. Mandam deixar os
filhos em casa de pessoas de destaque das cidades e villas ou propriedades agrícolas
abastadas.
O portador da
creança é também o portador de uma carta com o nome, idade, recommendando que o
destinatário zele pela educação da creança e nos dizeres da carta vae sempre
uma como ameaça na responsabilidade assumida pelo depositário.
Vê-se como são
argutos esses scelerados, percebendo-se que em toda a sua hediondez, apparece
sempre um signal de amor paternal. E esses descendentes de crimes poderão vir a
ser, dias adeante, homens úteis á communhão social, de vez que convivem e se
educam sob cuidados de pessoas de responsabilidade e que terão a preocupação de
reformar a índole e o caracter das creanças mandadas entregar a varias pessoas:
Sylvio
Hermano, filho do cangaceiro Corisco, entregue ao padre José Bulhões, vigario
de Sant'Anna do Ipanema, que o educa carinhosamente e chega a dizer "que
foi a melhor dadiva que já recebera".
Francisco de
Salles, ao padre Dumuriez, vigario de Matta Grande.
Maria Celeste,
irmã de Sylvio Hermano, ao agrcultor Sebastião Wanderley, em Poço das
Trincheiras.
Maria Amalia e
Maria Celeste, ao vigario de Pão de Assucar, padre Soares Pinto.
José Mariano,
ao padre Manoel Firmino, ex-vigario de Matta Grande.
José Maria, ao
dr. Nestor Selva, juis municipal de Matta Grande.
Santelmo, ao
cel. Herculino Carvalho, em Maravilha.
Joaquim Manoel
Calumby, filho do cangaceiro Moita Brava, ao dr. Manoel Candido, promotor de
Agua Branca.
Maria de
Lourdes, a José Oscar de Alencar, commerciante em Matta Grande.
Ainda para
accentuar o pendor dos cangaceiros, transcrevemos, por copia, uma carta,
acompanhando a creança que foi confiada ao revmo. vigario de Sant'Anna do
Ipanema:
"Ilmo.
exmo. sr. reverendíssimo vigario da Freguezia de Sant'Anna do Ipanema -
Bulhões.
Desejo que esta vá lhe encontrar gosando perfeita saúde e paz de espirito, a si com os que lhe forem caros.
Sr. Bulhões segue em companhia desta carta, este menino para o Sr. criar como seu filho, e educar da forma que puder. A madrinha é Nossa Senhora e o padrinho é o Sr. mesmo, peço ao bom vigario que crie este menino da melhor forma que puder o pae do menino sou eu Capitão Christino Gomes da Silva Cleto, conhecido por Corisco. A mãe do menino é Sergia Correia da Conceição, conhecida por Dadá. Outro assumpto cuidado com meu filho, sou o mesmo Capitão Corisco, Chefe do Grupo dos Grandes Cangaceiros".
É esta a vida
dos cangaceiros que infesta o sertão de Alagôas, e sobre tudo isso meditem os
homens do governo, os que têm o dever de defender a sociedade, interessando-se
pelo sertão que, dia a dia mais se despovôa e mais empobrece".
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