Antonio Pompêo
morreu. Um dos mais brilhantes e fundamentais atores brasileiros na árdua
batalha pela consolidação e valorização da arte negra no país sai de cena para
também virar constelação lá no infinito. Para a nossa tristeza (e não surpresa),
a perda é noticiada de forma tímida e pouco relevante. Nos principais
telejornais nem uma única menção sequer. Nos sites e portais de notícias,
registros protocolares. Antonio Pompêo, para que não nos esqueçamos, foi um dos
que alicerçaram o caminho para que nomes como Thaís Araújo e Lázaro Ramos
pudessem brilhar hoje como protagonistas de novelas e séries de TV. Ao lado de
um grupo de espetaculares atores e diretores, composto por Ruth de Souza,
Grande Otelo, Léa Garcia, Antônio Pitanga, Zózimo Bulbul, Abdias Nascimento,
Tony Tornado, Samuel dos Santos, Canarinho, Jacira Sampaio, Romeu Evaristo,
Cosme dos Santos, Milton Gonçalves, Luiz Antonio Pilar, Xica Xavier, Jorge Coutinho, Zezé Motta,
entre outros que não assinalo por desinformação ou ignorância, foi responsável
pela ressignificação do negro nas artes no Brasil, corriqueiramente subjugado a
papéis secundários e sem importância ou quase sempre caricaturais: o escravo, o
preto velho, o malandro, o favelado, o crioulo doido, a mulata gostosa.
Protagonizou "Quilombo", uma criação extraordinária de Cacá Diegues,
verdadeira obra-prima do cinema nacional, a qual assisti na minha
pré-adolescência no Cine Theatro Realengo, um lindíssimo prédio, de estilo
arquitetônico art-déco, construído em 1938 naquele bairro, onde meu avô até
hoje reside. A brilhante atuação do ator ao encarnar Zumbi dos Palmares
apresentou-se como um marco na minha vida estudantil, já na segunda fase que se
iniciava. Foi decisiva para a minha compreensão sobre a importância desse
personagem icônico da história do Brasil e todos os seus desdobramentos sobre
os quais, ainda hoje, debatemos. Lançou-me às pesquisas acerca da construção de
nossa identidade; despertou-me o senso crítico para reavaliar o conteúdo de
livros acadêmicos, que narram a nossa história sempre sob a perspectiva do
colonizador, jamais a do colonizado; apontou-me novos horizontes no cinema para
a descoberta de produções que versavam sobre temas pautados na ancestralidade
africana. O Zumbi de Antonio Pompêo fez isso na minha vida, tal qual, em meados
da década de 1980, o seu Budião, personagem a que deu vida na adaptação
televisiva de "Tenda dos Milagres", me sensibilizaria a descortinar
os mistérios da fé candomblecista. Li e reli várias vezes o romance de Jorge Amado,
descobri Pierre Verger aos 13 anos, fiz primeira comunhão pensando em Magé
Bassã, a mãe-de-santo de Xica Xavier na mesma série de TV. Antonio Pompêo tem
uma importância ímpar para mim e, tenho certeza, para muitas outras pessoas que
sempre lutaram por um país etnicamente respeitoso e tolerante. Antonio Pompêo,
minha gente, foi presidente do Centro de Documentação e Informação do Artista
Negro (Cidan) e diretor de Promoção, Estudos, Pesquisas e Divulgação da Cultura
Afro-Brasileira, da Fundação Palmares, vinculada ao Ministério da Cultura. Não
era qualquer um.
Fonte:
facebook
Página:
Vagner
Fernandes
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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