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sábado, 2 de julho de 2011

O ataque a Belmont Parte Final

Por: Rostand Medeiros

 
           Gonzaga não Acreditou no Vaqueiro. Marilourdes Ferraz informa que Ioiô Maroto agiu de forma dissimulada e buscou a paz com seu amigo e compadre, que diante desta atitude decidiu dispensar seus guarda costas. A  carta do misterioso “Um Assignante”, publicada no domingo, 11 de março de 1923, dá uma informação que se aproxima da versão de “O Canto do Acauã”. Consta que diante da surra em Ioiô Maroto, o comerciante Gonzaga começou a se desfazer de seus negócios em Belmonte, seguindo com a família para a cidade pernambucana de Bom Conselho. Então o próprio Ioiô Maroto teria escrito uma carta a Gonzaga, afirmando que não iria lhe fazer retaliações, que “era seu compadre e amigo”, que a amizade “voltaria a ser o que era”. A carta de “Um Assignante” afirma que Ioiô pediu então, certamente como prova de boa vontade, para Gonzaga dispensar os seis rapazes armados que ficavam em sua casa.
 
Crispim Pereira de Araújo, o "Ioiô Maroto" com seus filhos ou netos. Acervo de Ivanildo Alves da Silveira
          
             O jornal afirma que às dez da noite do dia 19 de agosto de 1922, um vaqueiro de Gonzaga conhecido como “Manoel Pilet”, foi a sua casa e afirmou ter visto muitos cangaceiros na propriedade “Cristóvão” de Ioiô Maroto, mas Gonzaga não acreditou. O vaqueiro chegou a se oferecer para fazer companhia e proteger o patrão em sua casa na cidade de Belmonte, mas Gonzaga recusou. Sua sorte estava selada.

 
            O Fogo de Belmonte. No livro “Serrote Preto”, de Rodrigues de Carvalho (1961. Págs, 157 a 161), o autor comenta que certa noite, provavelmente um ou dois dias antes da manhã de 20 de outubro, Lampião e seu bando chegaram a propriedade de Ioiô Maroto, prontos para resolverem a questão. Rodrigues de Carvalho afirma que o parente de Sinhô Pereira não queria mais a vingança e que seguiu com Lampião praticamente obrigado.
 
Rodrigues de Carvalho
 
           Já a carta publicada no jornal “A Província”, comenta que nesta época a cidade de Belmonte era guarnecida pelo sargento José Alencar de Carvalho Pires e mais 10 praças. Havia uma ordem que, no caso de serem ouvidos disparos, os comandados do sargento Alencar deveriam ir para o pequeno aquartelamento policial para serem tomadas as medidas de defesa. Depois de uma noite de muita chuva, que facilitou o ataque dos cangaceiros, as quatro da manhã do dia 20 de outubro de 1922, uma sexta feira, foram ouvidos tiros espaçados e depois a fuzilaria aumentou. Nesta manhã o sargento Alencar se achava adoentado na casa do seu sogro, o coronel João Lopes, irmão de Gonzaga. Mesmo assim Alencar saiu a rua e disparou contra os cangaceiros “cerca de 40 tiros” e foi para o pequeno quartel para dar ordens ao seu pessoal. Mas no lugar, ao invés dos 10 militares só estavam os praças Manoel Rodrigues de Carvalho, José Francisco e José Oliveira.
            A cidade entrou em polvorosa. Pessoas buscavam refúgio em baixo dos poucos móveis existentes nas suas casas. Muitos correram para o mato, deixando tudo para trás e saindo apenas com os familiares e a roupa do corpo. Em pouco tempo chegaram para defender a urbe os soldados Severino Eleutério da Silva e Heleno Tavares de Freitas. Este último foi logo alvejado e morto. Após isso o sargento Alencar distribuiu a munição e saiu a rua acompanhado dos soldados Manoel Rodrigues de Carvalho e José Oliveira. Ele deixou um soldado na casa do coronel João Lopes e outro na casa do escrivão Manoel Medeiros. O militar posicionado na casa do escrivão tinha ordens de abrir fogo contra o prédio do açougue, onde estava alojado um grande número de cangaceiros, pois o sargento Alencar iria atacar o açougue pela retaguarda. A fuzilaria era cerrada e desigual, pois a cidade era defendida, segundo afirma o jornal, por apenas 6 militares, uns poucos civis, contra 65 cangaceiros. Os militares que estavam no quartel, mesmo cercados, mataram Antônio Pereira da Silva, conhecido vulgarmente como “Antônio da Cachoeira” e primo de Ioiô Maroto e Sinhô Pereira.

Belmont em Pernambuco
 
            Pessoas da localidade participavam da defesa. Entre estes estavam Manuel Gomes de Sá, conhecido como Manuel Justino e seu filho João Gomes de Sá, que foi ferido. Um cangaceiro alcunhado “Baliza”, vendo este cidadão em apuros pulou o muro de sua casa disposto a matá-lo. A ajuda veio de Dona Luzia Gomes, esposa de João Gomes, que municiou o rifle e animou o esposo para a luta. João Gomes matou “Baliza” com um tiro no peito. Outro que pegou em armas foi o cidadão Luís Mariano, que junto com outros disparava contra a corja de bandidos de dentro do curral de Tertuliano Donato.
           Consta que o sargento Alencar expulsou os cangaceiros do açougue e de uma janela deste estabelecimento comercial, gritava palavras de apoio a Gonzaga e mandava bala contra os cangaceiros. O sargento imaginava que Gonzaga estava resistindo dentro de sua casa. Mas aí, segundo está textualmente descrito no jornal, o próprio Lampião gritou “-Eu levo daqui um comboio de fazenda; eu vou ficar rico!…”.
 
O rei Lampião
 
            Deixando entender que a situação do comerciante não era das melhores. Alencar percebeu que a única maneira de expulsar os cangaceiros seria atacar pela retaguarda da casa de Gonzaga. Mesmo com poucos homens e a munição acabando, ele seguiu para o local e abriu fogo contra a “cabroeira”.
             De dentro da casa eram ouvidos gritos de euforia e de pavor. Dona Martina, a mulher de Gonzaga, suas filhas e outras mulheres que estavam no interior gritavam pedindo proteção aos céus. Quando estive em Belmonte me narraram que um cangaceiro chamado José Tertuliano, conhecido como Zé Terto, e possuindo o vulgo de “Cajueiro”, protegeu as mulheres da família de Gonzaga da sanha de seus companheiros, empurrando-as para dentro de uma dispensa. Ainda dentro da casa os cangaceiros gritavam de euforia, parecendo que haviam alcançado a vitória desejada. Mas para o sargento Alencar e parte do seu valoroso destacamento, o que importava era entrar na residência e expulsar aquela corja para longe de sua cidade. A tática deu certo. Era perto das oito da manhã e depois de um fogo intenso o bando de Lampião saiu de Belmonte cantando a “Mulher Rendeira”.
             Provavelmente ao entrar na casa do comerciante, o sargento Alencar entendeu o porquê dos cangaceiros e Ioiô Maroto irem embora cantando.
             
Casa de Gonzaga - (Que luxo hein!)
 
            Saldo do Ataque- Gonzaga Ferraz jazia morto na sala existente logo na entrada. Estava envolto em panos, onde certamente os atacantes iriam atear fogo no falecido e consequentemente na casa. Ele teria tentado se defender da turba que buscava invadir o local pela porta dos fundos. Havia chegado a atirar com o que tinha, mas diante da desvantagem empreendeu fuga indo para o grande sótão. Ao tentar se esconder, ou buscar fuga utilizando uma janela, ele despencou na sala e teria morrido da queda, ou então sido chacinado pelos cangaceiros.
              O certo foi que Ioiô Maroto, mesmo ferido levemente, alcançou sua pretendida vingança. Já Lampião e seus homens roubaram o que puderam do comerciante. Para o “Rei do Cangaço” o produto do butim que mais lhe chamou atenção foi a aliança de Gonzaga. O saldo para o povo de Belmonte, além da morte de Gonzaga e do soldado Heleno Tavares de Freitas, foi a morte de um civil, que “A Província” chama apenas como “um velhinho” e que se achava na porta de sua casa quando foi alvejado. Já o jornal “Diário de Pernambuco”, transcrevendo um telegrama enviado pelo delegado Manuel Guedes ao então Chefe de Polícia, Desembargador Silva Rêgo, dá conta que o civil morto se chamava Joaquim Gomes de Lyra. 
 
 Luiz Gonzaga Ferraz
 
           Entre os defensores de Belmonte feridos, além do citado João Gomes de Sá, o próprio sargento Alencar estava com um ferimento leve, em decorrência de ter tido sua arma destroçada por um balaço dos cangaceiros. O jornal “A Província” de 1923 dá conta que depois de encerrado o tiroteio, cinco pessoas da cidade vieram “participar da defesa”, ajudando a transportar o “corpo” do sargento Alencar. Como este não estava morto, provavelmente desfalecido devido ao seu ferimento de natureza leve, se levantou e passou a maior descompostura naqueles que só ajudavam “carregando os defuntos”.
          Além de “Antônio da Cachoeira” e “Baliza”, os cangaceiros aparentemente tiveram um terceiro homem mortalmente alvejado pelos defensores da cidade. As fontes apontam que poderia ser um antigo membro do grupo de Sinhô Pereira, de alcunha “Pilão”, ou um cangaceiro conhecido como “Berdo”.
 
Sinhô Pereira - 1º. patrão de Lampião
 
            as fontes apontam sempre de forma controversa, que o número de feridos entre os atacantes chegou a até cinco homens e os nomes variam. A unanimidade é o nome do paraibano Cícero Costa, que seria uma espécie de enfermeiro do grupo e em menos de dois anos seria morto no tiroteio da Serra das Panelas.
 
Sérgio Teixeira Lins de Barros Loreto
           
             A notícia do ataque a Belmonte teve forte repercussão na imprensa pernambucana. Uma semana depois do ocorrido, o periódico recifense “Jornal do Commercio” fazia uma severa crítica ao então governador pernambucano, Sérgio Teixeira Lins de Barros Loreto pela falta de segurança no sertão. O jornal traz estampada uma carta da viúva de Gonzaga, datada do dia da morte do seu marido, pormenorizando os fatos e responsabilizando Ioiô Maroto.
 
 
Rostand Medeiros
 
Fonte de pesquisa: cariricangaço.com do amigo Manoel Severo.

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