Natália Queiroz
minha mãe, foi entrevistada em 1990 Esse texto foi
extraído do meu livro “memorias de um tempo fugaz”, Eis a entrevista:
P - onde a
senhora estava na véspera do ataque de Lampião a Mossoró? A senhora fugiu no
trem para Areia Branca?
N - Estava na casa do prefeito Rodolfo Fernandes, com um grupo de amigos e
familiares, todos curiosos com a evolução dos acontecimentos, pois o ataque de
Lampião a Mossoró poderia acontecer a qualquer momento. Sei bem que Júlio Maia
(um dos líderes da resistência e primo do prefeito), chegou e disse que nós
tínhamos que ir também para Areia Branca de trem. Continua Natália – os homens
estavam se organizando em trincheiras. O prefeito foi muito corajoso, decidido,
isso é que é a verdade, acho que fomos no último trem, já muito lotado. Foi uma
verdadeira folia. Eu era muito jovem, claro que estava com medo, mas naquela
idade tudo era aventura. Eu ainda não conhecia João Almino. Passamos três dias
em Areia Branca. Era tanto boato! As informações eram desencontradas, mas
voltamos no primeiro trem.
P- Já
sabiam que Lampião havia sido derrotado?
N- Deram ordem
para a gente voltar, pois Lampião já havia saído, mas tinha sempre aquelas
pessoas que duvidavam de tudo. No percurso, acho que já bem perto de Mossoró,
avistamos um carro, e o trem diminuiu a marcha para saber notícias. Nessa
ocasião o pai de Idália, (esposa de Chico Xavier de Queiroz), o senhor Antônio
do Carmo, muito nervoso perguntou ao motorista do carro em voz alta, como
estava a cidade. O motorista respondeu:- “tudo em paz”, mas ele entendeu “tudo
em bala”. Ficou então gritando para o trem parar. E dizia: – Tá vendo, tudo em
bala”. Foi um verdadeiro alvoroço. Algumas pessoas choraram, mas o maquinista
desceu e foi conversar com o motorista do veículo, ficando esclarecido que estava
tudo em paz. O trem prosseguiu viagem.
P- o
trem estava muito cheio?
N- Sim, estava,
mas nem todo o pessoal que tinha ido a Areia Branca voltou naquele dia, alguns
ainda permaneceram por vários dias, e a cidade de Mossoró ainda passou quase um
mês com boatos. Diziam que Lampião ia retornar ou que estava na Passagem do Rio.
Lembro-me de Jararaca na cadeia, fui olhar. Dr. João Marcelino foi o médico que
o atendeu. Dizem que Jararaca foi enterrado vivo, pelos policiais que iam
levá-lo para natal.
P- o que
aconteceu após a fuga de Lampião?
N- Sim,
mas o bando de Lampião fugiu em direção a Jucuri e de lá até a fazenda Veneza,
que era uma propriedade de Alfredo Fernandes. O gerente dela era Childerico
(Childerico Fernandes de Souza), primo de seu pai. Chegaram de manhã cedo (dia 14). A Bebela (Felisbela Rodrigues Fernandes) me
disse muito depois o sofrimento que passaram. Acabaram com toda a comida
existente lá, estoque de carnes, mataram muitas galinhas a tiro e mandaram
fazer comida. Eram mais de 50 cangaceiros. Saquearam tudo e ainda levaram
15 contos de reis que Childerico estava guardando para compra de umas reses. Bebela
me disse também que só conseguiu guardar um queijo que caiu e ela jogou para
debaixo de um armário. A certa altura Lampião perguntou se Childerico era primo
do prefeito. Ele disse que sim. Não houve confusão por isso, mas tinha um
cangaceiro chamado Massilon que evitou muito as agressões que alguns queriam
fazer. Eles ficaram na fazenda por todo o dia 14 e depois seguiram para
Limoeiro do Norte. Concluiu
Natália: – eu não conhecia ainda João Almino. Minhas amigas é que falavam dele
e diziam que ele era irmão de Celso Almino. Ora, se eu também nem sabia quem
era Celso.
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