Por Honório
de Medeiros
Para François
Silvestre
Seu Antônio de
Luzia, oitenta e seis anos, sentado em sua cadeira de balanço, na calçada de
sua casa, no Sítio Canto, em Martins, é o próprio símbolo da passagem
inalterável das manhãs, tardes, noites, madrugadas, do ritmo lento dos dias que
se sucedem bucólicos, tais e quais as contas debulhadas do rosário de Sinhá,
oitenta e poucos não admitidos, que deslizam por entre seus dedos, à hora do
ângelus, enquanto seu pensamento vagueia nos limites de sua circunstância, e
nada escapa do seu olhar dardejante e de seus ouvidos “de tuberculoso”, como me
confidenciou.
Pergunto a Seu
Antônio acerca das coisas que estão mudando mundo afora, em uma rapidez
vertiginosa, impossível de serem acompanhadas. Lembro a ele a chegada do homem
na Lua, o computador, o celular...
Ele fica
calado um bocado de tempo. Quando penso que esqueceu o assunto, ergue um pouco
o braço e aponta com o dedo um passante, quebra o silêncio do final-de-tarde e
me diz: “desde que o mundo é mundo, podem as coisas ter mudado, mas o homem,
meu filho, é o mesmo de sempre”.
“Quando eu era
de menino para rapaz”, continua, “pensava que as pessoas lá fora eram
diferentes. Viajei, corri légua, vi e ouvi muitas coisas que eu prefiro
esquecer, e voltei. Fico comparando o homem que vive lá fora com o homem que
vive aqui, e não vejo diferença. Lá se mata, como aqui; lá se bebe, como aqui;
lá se trai, como aqui; lá se rouba, como aqui. Tudo que existe lá fora, maior,
existe aqui, menor”.
Fez-se
silêncio, novamente, durante algum tempo.
“Eu às vezes
penso” prosseguiu, “que tanto faz como tanto fez, o homem se engana demais com
as coisas, é como a roupa que a mulher veste: pode ser de qualquer tipo, mas
ela é sempre a mesma”.
E, depois de
beber um gole de café, arrematou: “lá fora o tempo passa e eu não vejo: durmo
novo e acordo velho; aqui, eu vejo que o tempo não passa: faz uma eternidade
que estou vivo!”.
Arte em
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