*Rangel Alves
da Costa
Triste, no
alto da Montanha, reconheço a inteireza da verdade nas palavras do Eclesiastes:
Há um tempo de tudo. Tempo de plantar e tempo de colher, tempo de lua e tempo
de sol, tempo de chegar e tempo de partir, tempo de sorrir e tempo de chorar. E
o meu tempo em tudo...
Aqui, do alto
da Montanha, anuncio minha plenitude em Eclesiastes. Acreditava ser diferente,
mas percebi que realmente não há nada de novo debaixo do sol. Quem me fez
alegre me fez triste, quem me adoçou a boca respingou veneno. Que amei e desamei...
Entristecido
no alto da Montanha, eis que avisto a vida como se avistasse o tudo em seu
oposto. Ali a alegria e a tristeza se digladiando em busca de seu momento, o
silêncio e a algazarra em disputa pela prevalência no homem. E eu cansado de
sofrer pelas batalhas alheias.
Triste, no
alto da Montanha, confesso-me resoluto à aceitação. Não vou mudar o mundo pelas
minhas mãos. Não vou mudar a face da vida pelo meu querer. Não vou nada mudar
pelo meu querer. Ora, só quero a impossibilidade do possível. E é impossível
que assim aconteça.
Aqui, do alto
mais alto da Montanha, revelo que mantenho a porta de trás como mantenho a
porta da frente: aberta. Que tudo que venha passe, que tudo que chegue siga o
seu rumo, que tudo que se aproxima logo se vá em despedida. Não adianta nada
fazer permanecer. Se tudo muda, não sei da mão que na chegada me foi estendida.
Entristecido
no alto da Montanha, e mais abaixo avistando tudo, juro não desejar que
aconteça o que está predestinado a acontecer. Vejo ouro, vejo prata, vejo
diamante. E vejo o resto, vejo a sobra, vejo o nada, vejo a desilusão. Eis as
vaidades que se dissipam em pó de ventania.
Triste, no
alto da Montanha, tudo faço para não me desintegrar de vez do resto que me
resta. Sei que bastaria cuspir para lançar o sangue, sei que bastaria chorar
para tudo ressecar, sei que bastaria tirar um pedaço de mim para nada mais
existir. E já não tenho além de escombros que me recobrem uma inexistente
aparência.
Aqui, do alto
da Montanha, talvez não consiga negar a mim mesmo. Tenho de chorar e vou
chorar, tenho de sofrer e vou sofrer, tenho de me espantar com os motivos do
sofrimento e me assustarei. Os escondidos haverão de brotar como o dia após a
noite, como a morte após a vida.
Entristecido
no alto da Montanha, eis que sinto o ecoar cada vez mais forte do Eclesiastes
com suas verdades. Um ser que nada é, uma vida que já não será, apenas uma
passagem apressada. E sem tempo de dizer que fui feliz ou que simplesmente
tristeza.
Triste, no
alto da Montanha, ainda assim não quero descer de seu cume. Que cheguem os
temporais, os vendavais, as tempestades, os redemoinhos, todas as fúrias do
mundo. De que adiantaria descer se em tudo a ilusão do sorriso, do
contentamento, da felicidade? Adianta colher flores para depois perceber que só
restam os espinhos?
Aqui, do alto
da Montanha, toda a certeza alongada, sem pressa, exaustivamente vívida. A
profunda e tão necessária percepção que sobre os pés humanos há caminhos
essenciais e que jamais serão caminhados, experiências que jamais deveriam ser
olvidadas. Mas o homem sempre prefere o conforto do passo ligeiro e seguro.
A Montanha
parece se fazer mais alta, subir e subir. E daqui de cima tudo embaixo se torna
grão. Mas talvez não seja assim. É que a ilusão humana faz imaginar está na
altura ou no pedestal. Quando, na verdade, é o próprio homem o seu grão em
tudo.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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