*Rangel Alves
da Costa
Eu já tenho
mais de cem anos de idade. Talvez duzentos anos ou mais. E assim por que vivo e
convivo com o passado distante, com aquilo que comumente chamam de velharias ou
coisas velhas.
Enquanto uns
procuram se distanciar ou esquecer, eu simplesmente vou ao encontro e abraço,
pois amo o passado, a história, as raízes. Guardando as proporções, assim meu
pai Alcino fazia e assim eu faço agora.
Sou esse
Matusalém da História porque sinto a necessidade de que os de agora conheçam -
ao menos um pouco - os passos e a saga de Poço Redondo, seus personagens e suas
importâncias em determinados contextos do nosso percurso.
Sei um pouco
da história de Boboca, por exemplo, mas quero conhecer muito mais. Mas quem foi
Boboca, alguém há de perguntar. Um humilde e pobre sertanejo igual a tantos,
mas de igual importância aos grandes nomes ainda relembrados.
Preocupo-me
tanto com a história de Boboca como a de meus avôs China e Ermerindo ou minhas
avós Mãeta e Emeliana. A mim, a saga de cada sertanejo é que possui valia e
merecimento no contexto histórico, seja Tonho Biôto ou Alcino, seja Remígio ou
Seu Durval.
Acumulo e
entrelaço percursos passados para transmitir aos de hoje, objetivando mostrar a
importância de cada um. Assim faço no Memorial Alves Costa, assim faço nos meus
escritos, nas minhas palestras e nas postagens fotográficas que faço.
Tenho compromisso
com Poço Redondo. Deus não me deu conhecimento egoísta, e sim um destino de
sabedoria a ser partilhado com todos. Tudo o que aprendo, logo faço questão que
outros saibam. E assim vou dividindo conhecimentos do já esquecido por muitos.
Sou incansável
nessa luta pelo resgate da história, das velhas raízes. Possuo avidez em
partilhar da vida dos meus conterrâneos. Quero cada vez mais estar presente na
vida desse povo que também é minha raiz.
Por isso que
vou ao casebre mais distante e sinto o peito pulsar ouvindo o velho sertanejo,
a velha lanhada de tempo, o autêntico conterrâneo. Vou aonde se esconde a
humilde família, empobrecida e calejada de tempo, e de lá retorno cheio de
felicidade e contentamento.
Faço das
estradas, veredas e caminhos, meus mais costumeiros percursos sertanejos. Não
gosto de estar no centro da cidade, mas pelos arredores e distâncias no
convívio com a pedra, o bicho, a planta, o morador, a solidão dos casebres.
Coloco tudo no
meu aió da memória e depois retorno para mostrar aos de agora. Não sei se mais
tarde, quando eu já tiver mais de quinhentos anos e partir, alguém vai se
lembrar do meu nome ou se existi. Não importa. Importa o que faço agora.
Não quero
depois uma estátua em praça ou um nome de rua. Não quero outorga póstuma nem
reconhecimento tardio. Tudo o que faço agora é deixar para a posteridade um
caderno de vida, e esta entremeada de todo o passado de minha terra e do meu
povo.
E um dia serei
feliz. Daqui a mil anos ou mais, quando todos já se esqueceram daquilo que
distantemente existiu, eu ainda estarei vivo. Tão vivo quanto a eternidade dos
que agem para a imortalidade.
E assim por
que cultivo e planto sementes. E as espalho por aí. O vento do tempo nem a tudo
levará. Algumas frutificarão de tal modo que nada, absolutamente nada,
conseguirá apagar.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário