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sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

ANÔNIMOS DA HISTÓRIA – CORONEL ISAÍAS ARRUDA


Naquela tarde cinzenta de sábado, dia 4 de agosto de 1928 quando muitos já se esqueciam dos episódios um ano antes relacionado à presença do rei do cangaço na região, aconteceu novo fato que deixou a cidade em polvorosa. A pedra da estação estava lotada de passageiros e visitantes que  esperavam o trem vindo da capital que trazia consigo as notícias e as novidades da Fortaleza e do mundo. Curiosos, viajantes, chapeados, crianças e vendedores ambulantes, todos se aglomeravam na expectativa da passagem do trem. O que todas essas pessoas não esperavam é que ali fosse ser palco de um atentado violento à ordem e a vida em nome da vingança. Era uma época marcada pelo coronelismo, engendrado pelos mais temíveis e truculentos líderes políticos que o Cariri cearense já experimentou. Mas aquela tarde na estação ferroviária de Aurora, seria o fim daquele que foi certamente o mais famoso e temível chefe político da região: o coronel Isaías Arruda. Filho do lugar, ex-delegado, agora prefeito de vizinha Missão Velha, e ainda, o maior dos coiteiros de Lampião no interior cearense. Um autêntico mantenedor de jagunços e hábil negociador político junto aos grandes da capital.

O relógio do prédio marcava 14h 25min quando, finalmente, todos puderam escutar o apito estridente da máquina que se aproximava. De repente, voltaram suas atenções na direção do corte-grande lá para as bandas do alto da cruz, do sito Frade. O trem da Fortaleza vinha ligeiro beirando o rio Salgado. Ao longe foi possível ouvir mais um apito e o barulho forte da locomotiva, em seguida, uma nuvem de fumaça cobriu o céu. O trem parou e um burburinho de pessoas se formou nas portas de saída, quando de repente, o som de um tiro seco ecoou no ar, em seguida vários outros disparos puderam ser ouvidos no interior do segundo vagão da primeira classe. Talvez sete ou oito no total, não de sabe ao certo. Vozes diziam tratar-se de uma discussão. Três homens saíram atracados e em seguida correram no sentido contrário do vagão,  em direção do armazém e depois para o beco da antiga rua que dava para o cemitério. Um quarto homem um tanto elegante, bem tratado, gestos aparentemente finos surgiu do segundo vagão da primeira classe. Vestindo impecavelmente um linho branco, ele andava de modo esquisito e desaprumado. Alguns passos apenas e cambaleando fitou a multidão como quem quisesse dizer algo, não foi possível, sangrando e com a mão direita colada ao peito chamava baixinho pelo primo. O linho branco do seu terno agora começava a se tingir de vermelho, seus sapatos de cor marrom e bem polidos contrastavam com o vermelho escuro do seu próprio sangue formando poças na plataforma. Era o coronel Isaías Arruda, chefe político, prefeito de Missão Velha, homem afamado em toda região e na capital do estado, devagar caiu no chão da plataforma ainda com arma junta ao cinto da calça. Não teve tempo de usá-la.

Alguém saindo de dentro do vagão posterior se aproxima dele e forra o chão da pedra com um jornal, seu braço esquerdo e parte superior do tórax estavam em frangalhos. Ferimentos gravíssimos provocados pelos sete balanços com que fora atingido. O coronel ferido seriamente pronunciava baixinho como que cansado:

– Os irmãos Paulinos me acertaram! Mas como é que nem o Viana nem ninguém me avisou que meus inimigos estavam aqui?! Bando de covardes… – Alguém me chame o farmacêutico! Foram os Paulinos, eles me acertaram… Bando de covardes!

A multidão agora abria caminho para o pessoal da rede ferroviária, muitos correram na direção da rua, se afastando da cena do crime, talvez com medo de um novo tiroteio. As janelas dos vagões ficaram cheias de curiosos passageiros, outros mais ousados e corajosos aos poucos foram se aproximando da vítima que gemia deitada no chão. Enquanto isso, um pouco afastado da estação José Furtado(Neguinho de Milica) primo da vítima saíra em perseguição dos irmãos Paulino: Antonio e Francisco, responsáveis pelo atentado.

Levado para a residência de Augusto Jucá, um antigo amigo na rua grande, Isaías foi socorrido, inicialmente por um farmacêutico, o único que existia na cidade. No dia seguinte dois médicos chamados às pressas, Dr. Antenor Cavalcante e Dr. Sérgio Banhos, atenderam ao coronel, porém, diante da gravidade dos ferimentos não tiveram como salvá-lo. Então, no dia 8 de abril, uma quarta-feira, às 6h da manhã, quatro dias após ser alvejado, Isaías Arruda faleceu. Rumores apontaram ter sido o assassinato uma vingança de Lampião pela traição do coronel um ano antes, durante a célebre tentativa de envenenamento do bando e o histórico cerco de fogo do sítio Ipueiras, propriedade de Arruda em Aurora em cujo local Virgulino se arranchara por diversas vezes. Ocasião em que o rei do cangaço fugia das volantes após o fracasso da invasão de Mossoró, arquitetada sob as estratégias de Massilon Leite e financiada pelo próprio Isaías. Mas o certo, segundo se provaria depois foi que os Paulino vingaram o assassinato do irmão mais velho, João, morto numa emboscada no serrote d’Aurora pelos jagunços de Arruda no ano anterior. Terminava ali, a saga de um dos mais temíveis e respeitados coronéis do Cariri – Isaías Arruda, bem como, sua rixa ferrenha contra os irmãos Paulino da Aurora.

Fonte: Prof. José Cícero – Sec. de Cultura de Aurora-Ce.
Leia também: Lampião em Aurora
Jaqueline Aragão Cordeiro

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